Unidade e fragmento: uma leitura da composição proustiana a partir

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Unidade e fragmento: uma leitura da composição proustiana a partir
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UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO
FACULDADE DE FILOSOFIA, LETRAS E CIÊNCIAS HUMANAS
DEPARTAMENTO DE LETRAS MODERNAS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM
LÍNGUA E LITERATURA FRANCESA
Carla Cavalcanti e Silva
Unidade e fragmento: uma leitura da composição
proustiana a partir dos cadernos 53 e 55 de Albertine
São Paulo
2010
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UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO
FACULDADE DE FILOSOFIA, LETRAS E CIÊNCIAS HUMANAS
DEPARTAMENTO DE LETRAS MODERNAS
PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM
LÍNGUA E LITERATURA FRANCESA
Unidade e fragmento: uma leitura da composição
proustiana a partir dos cadernos 53 e 55 de Albertine
Carla Cavalcanti e Silva
Tese apresentada ao Programa de
Pós-graduação em Língua e Literatura
Francesa do Departamento de Letras
Modernas da Faculdade de Filosofia, Letras e
Ciências Humanas da Universidade de
São Paulo, para obtenção do título de Doutor
em Letras.
Orientador: Prof. Dr. Philippe Willemart
São Paulo
2010
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AUTORIZO A REPRODUÇÃO E DIVULGAÇÃO TOTAL OU PARCIAL DESTE
TRABALHO, POR QUALQUER M EIO CONVENCIONAL OU ELETRÔNICO, PARA
FINS DE ESTUDO E PESQUISA, DESDE QUE CITADA A FONTE.
Silva, Carla Cavalcanti.
Unidade e fragmento: uma leitura da composição proustiana a
partir dos cadernos 53 e 55 de Albertine/ Carla Cavalcanti e
Silva; orientador Philippe Willemart.
-- São Paulo, 2010.
411 f.
Tese (Doutorado – Programa de Pós-graduação em Língua e
Literatura francesa. Área de Concentração: Literatura francesa)
– Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas da
Universidade de São Paulo.
1. Em busca do tempo perdido – 2. Marcel Proust – 3.
Composição – 4. Unidade – 5. Fragmento – 6. História de
Albertine.
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FOLHA DE APROVAÇÃO
Carla Cavalcanti e Silva
Unidade e fragmento: uma leitura da composição proustiana a partir dos cadernos 53 e 55 de
Albertine.
Tese apresentada à Faculdade
Filosofia, Letras e Ciências Humanas
Universidade de São Paulo para
obtenção do título de Doutor.
Área de Concentração: Língua
Literatura Francesa.
Aprovado em:
Banca Examinadora
Prof. Dr. _______________________________________________________________
Instituição: _______________________ Assinatura: ____________________________
Prof. Dr. _______________________________________________________________
Instituição: _______________________ Assinatura: ____________________________
Prof. Dr. _______________________________________________________________
Instituição: _______________________ Assinatura: ____________________________
Prof. Dr. _______________________________________________________________
Instituição: _______________________ Assinatura: ____________________________
Prof. Dr. _______________________________________________________________
Instituição: _______________________ Assinatura: ____________________________
de
da
a
e
5
AGRADECIMENTOS
Ao professor Philippe Willemart, pela orientação, confiança e pela liberdade incondicional
que me concedeu ao longo de toda a pesquisa.
À professora e amiga Claudia Amigo Pino, pelos profícuos diálogos, pela inspiração e
amizade que me legou desde os tempos de minha graduação.
Às professoras Leda Tenório da Motta e Maria Cecília de Queiróz Pinto pela leitura atenta de
meu texto e pelas críticas e contribuições que tanto ajudaram na realização deste trabalho.
Ao Bernard Brun e Nathalie Mauriac Dyer, responsáveis pela equipe Proust em Paris, pela
ótima acolhida que me propiciaram e pela ajuda na consulta aos manuscritos proustianos na
Bibliothèque Nationale de France.
À Pyra Wise, secretária do Fonds Proust no ITEM, pela ajuda sempre atenciosa e alegre e
pelas sugestões bibliográficas preciosas.
Ao Sr. Guillaume Fau, responsável pelo departamento dos manuscritos proustianos, um
sincero agradecimento pela autorização conferida à consulta dos manuscritos originais.
A todos os amigos do Laboratório do Manuscrito Literário, em especial aos da primeira
geração, que contribuíram, incontestavelmente, para minha formação.
A todos meus amigos proustianos, em especial a Rodrigo Brucoli, José Carlos Souza e Valter
José pelas belíssimas conversas sobre a obra de Marcel Proust.
A todos os meus amigos que conheci nos anos de graduação e pós-graduação, pelo fervoroso
engajamento no estudo da literatura e da crítica e pela companhia, mesmo que virtual, mas
essencial nesses longos períodos de solidão inevitáveis na elaboração de uma tese.
Às amigas Teresinha Natal Meirelles, pela revisão deste trabalho e Samira Murad pela revisão
do abstract.
À Meire Knoll, minha primeira professora de francês, que graças à sua paixão pela língua
francesa, foi decisiva na escolha de minha carreira.
À minha família pelo apoio constante e incondicional com relação às minhas escolhas, à
minha mãe Mara, por todos os livros que me ofereceu, dos infantis até a minha primeira
edição em francês da obra Em busca do tempo perdido, ao meu pai Eduardo, pelas discussões
políticas, literárias e mundanas que tanto incitaram meu gosto pelas humanidades, à minha
avó Lucília pelas conversas tão agradáveis, aos meus irmãos Rogério e Renata, pelo
companheirismo e pelas boas risadas que ainda damos juntos, aos meus sobrinhos Vinícius e
Rafael, pela energia e diversão incontestes.
Ao Leandro, pela leitura, revisão e sugestões concernentes a este trabalho, pelo
companheirismo intenso, pelas conversas inteligentes, pela calma, paciência e, sobretudo, pela
forma sábia e madura com que lida com as adversidades.
Ao CNPq pela concessão da bolsa de doutorado, e à Capes, pela concessão da bolsa sanduíche
e pelo apoio financeiro para a realização desta pesquisa.
6
Et dans ces livres-là, il y a des parties qui n´ont
eu le temps que d´être esquissées,
et qui ne seront sans doute jamais finies,
à cause de l´ampleur même du plan de l
´architecte. Combien de grandes cathédrales
restente inachevées!
Marcel Proust,
Em busca do tempo perdido
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RESUMO
SILVA, C.C. Unidade e fragmento: uma leitura da composição proustiana a partir dos
cadernos 53 e 55 de Albertine. 2010. 411f. Tese (Doutorado) – Faculdade de Filosofia,
Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2010.
Embora o romance Em busca do tempo perdido seja incontestavelmente uma obra inacabada,
não se trata, entretanto, de uma obra incompleta. Seu fechamento circular, promovido pelo
diálogo entre o primeiro e último volumes, foi tema de grande parte da crítica proustiana.
Com relação à sua composição, seu processo escritural passou por diversas mudanças e a
construção, equiparada à execução de uma catedral, poderia igualmente ser caracterizada pela
colagem, montagem ou “costura” dos fragmentos textuais esboçados nos setenta e cinco
cadernos de rascunho. A busca pela unidade em meio a essa profusão de textos levou o
escritor à atividade incessante de releitura e reescritura e, consequentemente, ao inacabamento
da obra. O trabalho que ora apresentamos tem por objetivo o estudo dessa composição, a
partir da leitura e análise dos cadernos 53 e 55, ambos consagrados à elaboração da história de
Albertine.
Palavras-chave: Em busca do tempo perdido – Marcel Proust – Composição – Unidade –
Fragmento – História de Albertine.
8
ABSTRACT
SILVA, C.C. Unity and fragment: a reading of the Proustian composition using exercise
books 53 and 55 of Albertine as a starting point. 2010. 411f. Thesis (PhD) – Faculdade de
Filosofia, Letras e Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2010.
Although the novel In Search of Lost Time is certainly unfinished, it is not an incomplete
work. Its ‘round’ ending, promoted by the dialogue between the first and last volumes, was
the subject of much Proustian criticism. With respect to its composition, its writing process
has gone through many changes and the construction, equivalent to the execution of a
cathedral, could also be characterized by the process of ‘montage’ or the stitching of textual
fragments contained in Proust’s seventy-five exercise books. The search for unity amongst
this profusion of texts has led the writer to the ceaseless activity of rereading and rewriting
and thus to the incompleteness of the work. The analysis presented here is aimed at studying
this composition, having the reading and the analysis of exercise books 53 and 55, both
related to the elaboration of the story of Albertine, as a starting point.
Keywords: In Search of Lost Time – Marcel Proust – Composition – Unity – Fragment –
Story of Albertine.
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RÉSUMÉ
SILVA, C.C. Unité et fragment: une lecture de la composition proustienne à partir des
caheirs 53 et 55 d´Albertine. 2010. 411f. Thèse (Doctorat) – Faculdade de Filosofia, Letras e
Ciências Humanas, Universidade de São Paulo, São Paulo, 2010.
Quoique le roman À la recherche du temps perdu soit indubitablement une oeuvre inachevée,
il ne s´agit pourtant d´une oeuvre incomplète. Sa clôture circulaire, engendrée par le dialogue
entre le premier et le dernier volumes, a été le thème de la plupart de la critique proustienne.
Par rapport à sa composition, son processus scriptural a subi plusieurs changements et la
construction, comparée à l´exécution d´une cathédrale, pourrait être également caractérisée
par le colage, le montage ou le faufilage des fragments textuels esquissés dans les soixantequize cahiers de brouillons. La quête de l´unité dans cette profusion de textes a conduit l
´écrivain à l´activité incessante de relecture et reécriture et, par conséquent à l´inachèvement
de l´oeuvre. Le présent travail a pour but l´étude de cet composition à partir de la lecture et l
´analyse des cahiers 53 et 55, tous deux consacrés à l´élaboration de l´histoire d´Albertine.
Mots-clé : À la recherche du temps perdu – Marcel Proust – Composition – Unité – Fragment
– Histoire d´Albertine.
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LISTA DE ABREVIATURAS USADAS
As citações do romance de Marcel Proust foram feitas a partir da edição coordenada por
J-Y Tadié, publicada pela Gallimard, na coleção Bibliothèque de La Pléiade (1987-1989). A
fim de facilitar sua localização, as citações foram feitas entre parênteses no próprio corpo do
texto, enquanto as traduções dos trechos originais encontram-se em nota de pé e foram
extraídas da edição estabelecida pela Globo. As demais traduções, caso não façam menção
expressa a uma edição em português, são de responsabilidade da autora.
Du côté de chez Swann
CS
À l´ombre de jeunes filles en fleurs
OJFF
Le côté de Guermantes
CG
Sodome et Ghomorre
SG
La prisonnière
LP
Albertine disparue
AD
Le temps retrouvé
TR
Contre Sainte-Beuve
CSB
Jean Santeuil
JS
Les plaisirs et les jours
Pl. et J.
Correspondance
Corresp.
Cahier 53
C. 53
Cahier 55
C. 55
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LISTA DE CÓDIGOS DA TRANSCRIÇÃO
Mot
palavra ou passagem rasurada.
Mot
palavra ou passagem rasurada em mais de uma campanha de escritura.
Toutes/s
rasura feita por sobreposição de palavras. (tacha-se a parte rasurada e
dá-se a versão ulterior em caractere menor).
Odet/Albertine
rasura por sobreposição de palavra inacabada. (toda a palavra é tachada
e a versão ulterior permanece no mesmo corpo).
les/des
rasura por sobreposição quando somente a primeira letra é rasurada
(rasura-se toda a palavra e dá-se a versão ulterior em caractere menor).
,/.
rasura por sobreposição de pontuação.
[ill.]/ [n mots ill.]/
[passage ill.]
palavra(s) ou passagens cuja decifração não foi possível.
Mot *
leitura hipotética.
< >
adição interlinear (símbolo utilizado somente nas notas de rodapés para
as traduções dos trechos manuscritos originais).
12
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO
13
1. A HISTÓRIA DE ALBERTINE: O FIM DA CATEDRAL?
1.1 Sobre o nascimento de Albertine
41
1.2 Os cadernos de Albertine
53
2. A UNIDADE NO VESTIDO
2.1 A Prisioneira e o projeto Sainte-Beuve
68
2.2 O leitmotiv Fortuny
74
3. “LA FENÊTRE ÉCLAIRÉE” E A ESCRITURA CONSTELAR
3.1 Outro motivo
79
3.2 A “fenêtre écalirée” em Jean Santeuil
94
3.3 A janela de Barbey d´Aurevilly
107
3.4 As versões
118
4. AS NOTAS E A ESTÉTICA DA COMPOSIÇÃO
4.1 Lembrar e buscar novas formas
136
4.2 Os textos moventes e o não-lugar
146
4.3 A questão do “je”
160
CONSIDERAÇÕES FINAIS
177
BIBLIOGRAFIA
191
APÊNDICE
202
ANEXOS
326
13
Introdução
Comme elle est une construction,
forcément, il y a des pleins, des piliers,
et dans l´intervalle de deux piliers, je peux
me livrer aux minutieuses peintures.
Considerando a obra Em busca do tempo perdido1 um romance sobre um romance, ou
melhor, sobre os caminhos não prescritivos da busca pela vocação literária de seu
protagonista, teremos na figura do herói um escritor em potencial e isto o aproximaria do
autor da Recherche, podendo ser uma espécie de alegoria do percurso literário do próprio
Marcel Proust. Todavia, observando a carreira literária proustiana, percebemos que herói e
autor distinguem-se sobremaneira, notadamente com relação ao ato de escritura.
Se o herói nunca produz, ou o faz muito pouco, Proust, por sua vez, sempre escreveu,
possuindo ensaios e novelas elaborados na época do colégio. Em uma carta a Alberto
Lumbroso, o escritor afirma:
Vous ne vous doutez guère je pense que comme je sortais du collège, je
réunis divers essais et nouvelles écrits pendant les classes, en un volume, les
Plaisirs et les jours, pour lequel Monsieur Anatole France, que je n´ai pas
revu depuis 25 ans, écrivit une ravissante préface où il m´appelait un
Bernardin de Saint-Pierre dépravé et un Pétrone ingénu. (Corresp., t. XIX, p.
266)2
Proust termina essa coletânea aos 23 anos de idade, mas muitos dos textos haviam sido
produzidos ainda aos 14 anos. Essa antologia caracteriza-se por seu aspecto híbrido,
1
Doravante denominada simplesmente por Recherche.
“Você não duvidaria, penso eu, que como eu saía do colégio, reuni diversos ensaios e novelas escritos durante
as aulas em um volume, os Prazeres e os dias, para o qual o Sr. Anatole France, que não vejo há 25 anos,
escreveu um prefácio arrebatador no qual me chamava de Bernardin de Saint-Pierre depravado e um Petrônio
ingênuo”. Referência ao escritor do século XVIII, Bernardin de Saint-Pierre, autor de Paul et Virginie, e ao
escritor latino, Petrônio, autor de Satíricon que viveu entre os anos 27-66 d.C.
2
14
misturando diferentes gêneros tais como o poema em prosa, as novelas e os “portraits” de
artistas à maneira de La Bruyère. Segundo Jean-Yves Tadié:
Le premier ouvrage de celui-ci, Les Plaisirs et les jours, qui paraît chez
Calmann-Lévy en 1896, nous apprend beaucoup de la méthode de son
auteur, et de ses thèmes. Bien que ce livre soit loin d'égaler À la recherche
du temps perdu, ou même Jean Santeuil, presque tout en est déjà là, à l'état
de semence. Le premier trait à souligner est qu'il s'agit d'un recueil de textes
divers, plus de cinquante. L'écrivain a trouvé dès sa jeunesse la manière
d'écrire qu'il ne changera pas, et qui le rendra si heureux et si malheureux:
par fragments, par morceaux très différents de longueur, de ton, de contenu.
(1987, p. XI)3
Ao longo da preparação para a publicação dessa obra, Proust dedicava-se havia um
ano à escritura de seu primeiro romance, Jean Santeuil, livro inacabado, como outros projetos
do escritor, mas abandonado após um número expressivo de páginas, 784 impressas a partir
do manuscrito, publicadas postumamente, em 1952. Apesar desse abandono, é importante
salientar a transição que ocorreu da primeira obra para esta, etapa que revela a passagem da
forma breve, dos retratos, da novela e dos poemas em prosa para o gênero romanesco.
No entanto, é curioso verificar que embora Jean Santeuil utilize, diferentemente da
Recherche, um narrador em terceira pessoa, trata-se de um texto bastante autobiográfico, e
muitos críticos atribuem seu abandono a esse aspecto que funciona como o único elemento
organizador. Nas palavras de Tadié:
On note qu'il s'agit toujours de scènes autobiographiques, non encore
soumises au point de vue des personnages, à l'intrigue, à l'imaginaire d'une
fiction. C'est l'une des raisons d'un grand abandon, celui de cette masse de
pages: raconter sa vie, ses impressions, Proust, entre vingt-cinq et trente ans,
le pouvait; non leur donner une structure d'ensemble, un principe organisateur. (1987, p. XIX)4
3
“Sua primeira obra, Os Prazeres e os dias, que é publicada por Calmann-Lévy em 1896, nos ensina muito sobre
o método de seu autor e sobre seus temas. Ainda que o livro esteja longe de se igualar ao Em busca do tempo
perdido, ou mesmo a Jean Santeuil, quase tudo já está lá, no estado de semente. O primeiro traço a sublinhar é
que se trata de uma antologia de textos variados, mais de cinqüenta. O escritor encontrou, desde sua juventude, a
maneira de escrever que ele não mudará e que o fará tão feliz e tão infeliz: por fragmentos, por pedaços muito
diferentes em tamanho, tom e conteúdo”.
4
“Notamos que se trata sempre de cenas autobiográficas, ainda não submetidas ao ponto de vista dos
personagens, da intriga, do imaginário de uma ficção. É uma das razões de um grande abandono, o dessa massa
de páginas: contar sua vida, suas impressões, Proust, entre vinte e cinco e trinta anos, poderia; mas não dar-lhe
uma estrutura de conjunto, um princípio organizador”.
15
Sejam quais forem as razões, tema que será discutido ao longo desta tese, o fato é que
Proust, em 1899, renuncia a Jean Santeuil e se empenha na tradução dos trabalhos do esteta
inglês John Ruskin. Em uma carta a Marie Nordlinger, o escritor afirma: “Depuis une
quinzaine de jours je m'occupe à un petit travail absolument différent de ce que je fais
généralement, à propos de Ruskin et de certaines cathédrales” (Corresp., t. II, p. 377) 5.
Segundo Philip Kolb, nas notas que preparou para a edição das correspondências proustianas,
esse “pequeno trabalho” era um estudo que constituiria o prefácio ao Bíblia de Amiens e que
Proust publicaria em abril de 1900 na Gazette des Beaux-Arts e no Mercure de France.
Mas, o que era para ser apenas um estudo crítico e estético dos livros de Ruskin
tornou-se um projeto de tradução que levou seis anos para ser concluído. Com um inglês
precário, Proust contará com a ajuda de sua mãe e de Marie Nordlinger para traduzir os livros
do crítico de arte, La bible d´Amiens e Sésame et le lys. Esse considerável desvio em direção à
crítica de arte, sobretudo no estudo da arquitetura e das catedrais, e à tradução, embora pareça
excluir o projeto romanesco, reforça-o substancialmente. Conforme Henry Lemaître:
Or, la publication de Jean Santeuil apporte une précieuse confirmation à la
thèse selon laquelle le contact avec Ruskin détermina dans l'âme de Proust
une sorte de révolution spirituelle d'une plus profonde portée qu'une simple
influence littéraire: (...) on s'accordera sans doute à reconnaître que de Jean
Santeuil à la Recherche, il y a plus qu'une évolution; dans cet intervalle, il y
a, pour achever une continuité qui sans cela ne se fût point accomplie, une
découverte, découverte de soi-même, et des multiples liens par lesquels se
réorganiseront secrètement les expériences observées et transposées
fragmentairement dans Jean Santeuil. (1953, p. 59)6
O crítico concede à leitura e à tradução de Ruskin um peso enorme e decisivo na
realização da Recherche. O esteta inglês não trouxe para Proust somente a experiência
artística, mas suscitou a articulação das experiências da memória e da infância ainda dispersas
5
“Faz uns quinze dias que me ocupo de um pequeno trabalho, absolutamente diferente do que faço geralmente, a
propósito de Ruskin e de certas catedrais”.
6
“Ora, a publicação de Jean Santeuil traz uma preciosa confirmação à tese segundo a tese de que o contato com
Ruskin determinou, na alma de Proust, uma espécie de revolução espiritual de um alcance mais profundo que de
uma simples influência literária: (...) concordar-se-á talvez em reconhecer que de Jean Santeuil à Recherche há
mais que uma evolução; nesse intervalo, para encerrar uma continuidade que sem isso não seria levada a cabo,
há uma descoberta de si mesmo e das múltiplas ligações pelas quais se reorganizariam, secretamente, as
experiências observadas e transpostas fragmentariamente em Jean Santeuil”.
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em Jean Santeuil. Tadié declara que “La plume qui a commencé Jean Santeuil ne ressemble
guère à celle qui trace les premières lignes de ‘Sur la lecture’”. (1987, p. XXIV-XXV)7.
Na verdade, o estudo profundo dos trabalhos de Ruskin permitiu a Proust um
enriquecimento da linguagem artística, o crescimento de sua cultura e, o que consideramos
mais importante, forneceu-lhe uma reflexão crítica com relação ao seu projeto romanesco. O
escritor descobre a idolatria ruskiniana – que toma o belo pelo verdadeiro – e critica esse
deslumbramento na Recherche por meio dos idólatras da arte, como Swann.
Essa maneira de aprender a ver o mundo a partir do olhar do outro é ainda mais
evidente em outros projetos de Proust, como os pastiches. O escritor, a partir de um fato real,
o “affaire Lemoine”8, imitava voluntariamente o estilo de alguns escritores como Balzac,
Flaubert, Sainte-Beuve etc., em textos que, em sua maioria, eram publicados no Figaro. Sem
dúvida, os pastiches podem ser considerados como um exercício de estilo, nos quais Proust
buscava uma forma à maneira dos escritores pastichados, mas não devemos esquecer o caráter
zombeteiro e irônico desses textos com relação a esses autores.
Escrever pastiches era, ao mesmo tempo, um modo de mostrar o conhecimento
profundo da literatura feita por esses escritores, sua capacidade e genialidade de imitá-los,
marcando, com isso, sua originalidade, sua diferença a respeito desses grandes autores da
literatura francesa.
Todavia, os pastiches não foram simplesmente uma etapa evolutiva da escritura
proustiana que desembocaria na Recherche e que seria deixada de lado. Pensemos no romance
Le Temps retrouvé e na presença significativa do pastiche dos Goncourt. Segundo Jean Milly:
Sans entrer dans une comparaison détaillée des deux pastiches Goncourt,
rappelons que celui de la Recherche est à peu près contemporain, pour la
rédaction, des additions apportées au premier. On y retrouve, surtout dans
7
“A pluma que começou Jean Santeuil não se parece mais com aquela que traça as primeiras linhas de ‘Sobre a
leitura’”.
8
Engenheiro francês preso e julgado por ter enganado o diretor da De Beers, empresa que comercializava
minérios e diamantes, vendendo-lhe uma técnica secreta de fabricação de diamantes.
17
son début, l'imitation très dense des mêmes traits formels et des mêmes
thèmes. Mais peu à peu, ces ressemblances deviennent plus diffuses: le
second pastiche a moins de prétentions métalinguistiques et comiques. Il
présente, en revanche, un plus grand intérêt littéraire et théorique. Littéraire,
parce qu'il met en scène, sous un jour nouveau, des personnages du roman
déjà bien connus, et s'intègre par là à l'ensemble de l'œuvre. Théorique, en
illustrant par l'exemple l'esthétique des Goncourt, pour la comparer à celle
du Narrateur, c'est-à-dire en fait à celle de Proust lui-même. Elles s'opposent
comme un art des apparences et un art des relations profondes. Aussi cet
épisode prend-il place à juste titre, comme repoussoir, dans l'exposé de
principes qu'est Le Temps retrouvé. (1970, p. 156)9
Possuindo dois estados de rascunho, esse pastiche procura, pouco a pouco, reforçar a
diferença literária e estética existente entre os Goncourt e o narrador proustiano, e por que não
dizer, Proust propriamente dito. Seu objetivo não é apenas escrever “à maneira de”, mas oporse a essa forma de escrita e a esse modo de ver o mundo. O exercício do pastiche, da imitação,
não se restringe apenas a esse episódio, mas se apresenta, na Recherche, por meio dos
personagens que também falam à “maneira de”, como Mme. de Villeparisis, muito próxima
das noções estéticas proferidas por Sainte-Beuve.
Com relação a outro projeto igualmente inacabado do escritor, o Contra Sainte-Beuve,
Proust pretendia fazer uma discussão teórica sobre o método do crítico francês a partir, de um
relato ficcional. O livro seria uma conversação com a mãe sobre um artigo do protagonista
publicado no Figaro. Essa tendência à ficção e à discussão estética desempenhou um papel
decisivo na passagem do projeto Sainte-Beuve à Recherche. Tadié afirma que esse texto seria
uma primeira versão da obra literária de Proust, ao passo que Bernard Brun, restringindo seu
alcance ao último livro da Recherche, afirma:
Mais en remontant dans l'autre sens, il faut bien reconnaître que Le temps
retrouvé n'est qu'un dernier état du Contre Sainte-Beuve, projet de critique et
d'esthétique littéraires sur lequel Proust a travaillé pendant deux ans au
9
“Sem entrar em uma comparação detalhada dos dois pastiches Goncourt, lembremos que o da Recherche é mais
ou menos contemporâneo, pela redação das adições ao primeiro. Encontramos, sobretudo no começo, a imitação
muito densa dos mesmos traços formais e temas. Mas, pouco a pouco, essas semelhanças tornam-se mais
difusas: o segundo pastiche tem menos pretensões metalingüísticas e cômicas. Em compensação, ele apresenta
um grande interesse literário e teórico. Literário porque põe em cena sob um novo aspecto, personagens já
bastante conhecidos do romance, integrando-se ao conjunto da obra. Teórico, pois ilustra, por exemplo, a estética
dos Goncourt, comparando-a à do Narrador, ou seja, na verdade, à de Proust. Elas se opõem como uma arte das
aparências e uma arte das relações profundas. Também este episódio tem seu lugar justificado como contraste na
exposição dos princípios que é o Tempo redescoberto”.
18
moins (1908-1909) mais qu'il n'a jamais achevé. Cette filiation
problématique entre un essai et un roman explique la persistance, dans les
brouillons de la Recherche, de notes de critique et d'esthétique qui
poursuivent la réflexion sur Sainte-Beuve dans le même temps que l'écrivain
affirme son intention de les intégrer à son roman en chantier. (BRUN, 1981,
p.7)10
A indecisão entre os gêneros, ou melhor, a produção concomitante de diferentes
gêneros permeia todo o percurso literário de Marcel Proust. Isto não será, no entanto,
resolvido na Recherche, mas incorporado a ela, situação que pode ter influenciado seu
inacabamento, como veremos posteriormente.
Estas duas maneiras de dizer o mundo, pelo comentário ou pela fabulação, caminham
juntas em toda a história da carreira literária de Proust. Kasuyoshi Yoshikawa, analisando os
manuscritos de Sainte-Beuve, afirma:
Proust écrit en effet de deux façons dans les cahiers consacrés au SainteBeuve. On y trouve écrit sous forme classique le chapitre sur la méthode de
Sainte-Beuve ainsi que les fragments sur Nerval, sur Flaubert, tandis que les
chapitres concernant Balzac et Baudelaire sont entièrement rédigés sous
forme d'une conversation avec maman. (199? p.2)11
Essa tendência persiste na construção da Recherche e em uma carta a Louis de Robert,
na qual Proust fala de sua obra, classificando-a como um romance por ser “do romance que
ela se distancia menos”, ele confessa: “Je suis incapable d´en dire le genre”. (Citado por
GENETTE, 1987, p. 31)12.
Essa dúvida, no entanto, é altamente cara a Proust, pois o consolava, colocando-o na
mesma condição de seus admirados escritores: Nerval e Baudelaire. Para Barthes, essa
10
“Mas, remontando em outro sentido, deve-se reconhecer que o Tempo redescoberto é um último estado do
Contra Sainte-Beuve, projeto de crítica e estética literárias no qual Proust trabalhou pelos menos durante dois
(1908-1909), mas que nunca terminou. Essa filiação problemática entre um ensaio e um romance explica a
persistência, nos rascunhos da Recherche, das notas de crítica e estética que prosseguem a reflexão sobre SainteBeuve ao mesmo tempo em que o escritor afirma sua intenção de integrá-los ao seu romance em construção”.
11
“Proust escreve, na verdade, de duas maneiras nos cadernos destinados a Sainte-Beuve. Encontramos escrito
de forma clássica o capítulo sobre o método Sainte-Beuve, bem como os fragmentos sobre Nerval e Flaubert,
enquanto os capítulos concernentes a Balzac e Baudelaire são inteiramente redigidos sob a forma de uma
conversa com mamãe”. Conferência proferida no Collège de France.
12
“Sou incapaz de dizer o gênero”.
19
travessia proustiana repercute, de forma homóloga, na travessia vivenciada pelo protagonista
da Recherche:
Cette “traversée de la littérature” (…) si semblable au trajet des initiations,
empli de ténèbres et d´illusions, s´est faite au moyen du pastiche (quel
meilleur témoignage de fascination et de démystification que le pastiche?),
de l´engouement éperdu (Ruskin) et de la contestation (Sainte-Beuve). (1994,
p. 1369)13
Contudo, enquanto o herói proustiano experimentará todo um percurso psicológico
para se decidir a escrever, Proust lida o tempo todo com a matéria literária propriamente dita,
a linguagem. Em busca de uma forma, esta frase poderia resumir o que foi a composição da
Recherche, sua escrita incansável, perpétua, interrompida apenas por um fato contingente, a
morte do escritor.
Mas, embora uma parte da história de sua escrita possa ser caracterizada pelo
inacabamento, por reviravoltas e reelaborações incessantes, é seu caráter uno e coeso, sua
construção que Proust reforça nas correspondências. Em muitas cartas, datando tanto de 1913,
ano da publicação do primeiro romance, como de 1919 e 1920, em um estado mais avançado
da obra, o autor busca convencer seus interlocutores de que a Recherche, a despeito do que se
dizia nos artigos críticos, não era uma simples coletânea de lembranças, mas uma
composição, uma rigorosa construção: “La construction, inflexible, voilà justement ce que j
´aimerais à vous montrer par quelques exemples bien frappants” (Corresp., t. XVIII, p.
547)14. O argumento sistematicamente propagado pelo escritor e velho conhecido da crítica
proustiana é a escrita, senão concomitante pelo menos imediatamente sucessiva do primeiro e
último volumes de sua obra, chamada, na época, Les intermittences du coeur, ainda com uma
divisão bipartida entre Le temps perdu e Le temps retrouvé.
13
“Essa ‘travessia literária’, tão semelhante ao trajeto das iniciações, cheio de trevas e ilusões, fez-se por meio
do pastiche (qual melhor testemunho de fascinação e desmistificação que o pastiche?), da paixonite desvairada
(Ruskin) e da contestação (Sainte-Beuve)”.
14
“A construção inflexível, eis justamente aquilo que eu gostaria de te mostrar por meio de alguns exemplos bem
surpreendentes”. Carta escrita e enviada a Rosny aîné em 23/12/1919.
20
É notável como Proust reproduz em sucessivas cartas enviadas a diferentes
destinatários a mesma idéia e quase a mesma fórmula para se referir à composição de sua
obra: “(...) le dernier chapitre du dernier volume a été écrit tout de suite après le premier
chapitre du premier volume. Tout l´“entre-deux” a été écrit ensuite (...)” (Corresp., t. XVIII,
p. 536)15; “(le dernier chapitre du dernier volume, non paru, a été écrit tout de suite après le
premier chapitre du premier volume).” (Corresp., t. XVIII, p. 546) 16 ; ou ainda: “N´ayez je
vous prie nullement l´idée que ce soit des recueils de souvenirs. Le dernier chapitre du dernier
volume, non encore paru, a été écrit avant le premier chapitre du premier volume.” (Corresp.,
t. XIX, p. 267)17.
É curioso observar a partir desses exemplos que há uma variação temporal
concernente à escrita desses romances: ficamos em dúvida se o último capítulo do último
volume foi escrito antes ou depois do primeiro capítulo do primeiro volume. Contudo, ainda
que essa contradição sugira menos uma confusão do autor do que um discurso sobre a
realização de seu projeto escritural, é inegável que sua preocupação incidia sobre a validação
de sua obra como algo muito bem construído e arquitetado. A própria adoção de palavras
como “construction” e “piliers” (construção/pilares) demonstra a pretensão de uma literatura
que se quer sólida, constituída, noção que culmina na célebre imagem da realização do livro
como a construção de uma catedral: “(...) l´accepter comme une règle, le construire comme
une église” [“(...) aceitá-lo como uma norma, construí-lo como uma igreja”] (TR, p. 610;
Trad., p. 279).
15
“(...) o último capítulo do último volume foi escrito imediatamente após o primeiro capítulo do primeiro
volume. Todo o “entre-dois” foi escrito em seguida”. Carta a Rosny aîné. Este e todos os outros grifos são
nossos.
16
“(o último capítulo do último volume, não publicado, foi escrito imediatamente após o primeiro capítulo do
primeiro volume”. Carta a Paul Souday.
17
“Peço-te, não tenha, de nenhum modo, a idéia de que sejam coletâneas de lembranças. O último capítulo do
último volume, ainda não publicado, foi escrito antes do primeiro capítulo do primeiro volume”. Carta a Alberto
Lumbroso.
21
Essa imagem arquitetural do fazer literário remete-nos a uma simetria, a um plano ou a
um esboço pré-concebido, o que provavelmente suscitou, juntamente com as cartas vistas
acima, a leitura corrente da Recherche como uma unidade: coesa, fechada, circular. A visão
de estrutura, de um conjunto muito bem constituído, no qual o primeiro e último romances se
complementam e se explicam, perpassa inúmeras análises críticas, como a de Jean Rousset
que afirma:
De fait, ce roman, qui peut paraître touffu à la première lecture, trahit à la
séconde ou à la troisième une structure savante et subtile. Mais il y a plus: c
´est souvent cette structure même qui en révèle ou en précise la signification.
La Recherche est de ces oeuvres dont on peut dire que leur contenu est dans
leur forme. (1962, p. 137-8)18
Para Compagnon, esta simetria tão perceptível e incontestável entre o “tempo perdido”
e o “tempo redescoberto” era tão flexível que “peu à peu n´importe quoi pouvait s´insérer au
milieu” (1989, p. 10)19 e em termos de forma, esse equilíbrio propiciava ecos entre frases, fato
salientado pelo próprio Proust: “(...) à la première page du premier volume se superpose la
dernière phrase du dernier volume” (Corresp., t. XVIII, p. 365)20, ou ainda: “On méconnaît
trop en effet que mes livres sont une construction. (...) On ne pourra le nier quand la dernière
page du Temps retrouvé (écrite avant le reste du livre) se refermera exactement sur la
première de Swann” (Corresp., t. XXI, p. 41)21.
Com efeito, fica evidente que o advérbio da primeira frase do Côté de Swann
(“Longtemps je me suis couché de bonne heure” ; CS, p. 3) repete-se no último período do
último volume, o Temps retrouvé, (“Aussi, si elle m´était laissée assez longtemps pour
accomplir mon oeuvre (...)” ; TR, p. 625) e que esse “longtemps” repercute, de forma
18
“De fato, esse romance que pode parecer prolixo em uma primeira leitura, trai em uma segunda ou terceira,
uma estrutura sábia e sutil. Mas há algo mais: é, no geral, essa mesma estrutura que revela ou precisa sua
significação. A Recherche é uma dessas obras sobre as quais podemos dizer que seu conteúdo está dentro de sua
forma”.
19
“pouco a pouco, qualquer coisa poderia se inserir no meio”.
20
“(...) à primeira página do primeiro volume se sobrepõe a última frase do último volume”. Carta a Denys
Amiel.
21
“Desconhecem demais, com efeito, que meus livros são uma construção. (...) Não poderão negá-la quando a
última página do Tempo redescoberto (escrita antes do resto do livro) fechar-se exatamente sobre a primeira de
Swann”. Carta a Benjamin Crémieux.
22
singular, na expressão de encerramento da obra – “dans le Temps”. Para muito além da forma,
a noção de tempo esboçada no primeiro romance é finalmente compreendida pelo heróinarrador somente na conclusão do último livro.
No início, encontramos um narrador às voltas com seu sono entrecortado que,
perpassado por momentos de sonho e vigília, promove uma série de confusões a respeito do
tempo e do espaço em que vive.
A profusão de anos e lugares pelos quais o sujeito da narrativa passou foi
desencadeada tanto pela obscuridade do ambiente como pelo sono que propicia, por seu
caráter de desprendimento com a realidade, um contato profundo com a memória. Para o
narrador proustiano:
Un homme qui dort, tient en cercle autour de lui le fil des heures, l´ordre des
années et des mondes. Il les consulte d´instinct en s´éveillant et y lit en une
seconde le point de la terre qu´il occupe, le temps qui s´est écoulé jusqu´à
son réveil; mais leurs rangs peuvent se mêler, se rompre. (CS, p. 5)22
A consciência é instintiva, e essa ruptura entre presente e passado promove quase que
um desconhecimento de si próprio: “et quand je m´éveillais au milieu de la nuit, comme j
´ignorais ou je me trouvais, je ne savais même pas au premier instant qui j´étais” (CS, p. 5)23.
A noção de identidade e a memória da dimensão temporal são subitamente apagadas,
causando a ruptura da percepção de si mesmo: “j´avais seulement dans sa simplicité première,
le sentiment de l´existence comme il peut frémir au fond d´un animal” (CS, p. 5)24.
À situação de obscuridade, na qual tudo vacila – “Qui est-il? Il ne le sait plus, et il ne
le sait plus, parce qu’il a perdu le moyen de relier le lieu et les moments de son existence
antérieur. Sa pensée trébuche entre les temps, entre les lieux” (POULET, 1988, p. 13) –,
22
“Um homem que dorme mantém em círculo em torno de si o fio das horas, a ordem dos anos e dos mundos.
Ao acordar consulta-os instintivamente e neles verifica em um segundo o ponto da terra em que se acha, o tempo
que decorreu até despertar; essa ordenação, porém, pode-se confundir e romper”. (Trad., p. 22)
23
“assim, quando acordava no meio da noite, e como ignorasse onde me achava, no primeiro instante nem
mesmo sabia quem era”. (Trad., p. 23)
24
“tinha apenas, em sua singeleza primitiva, o sentimento da existência, tal como pode fremir no fundo de um
animal”. (Trad., p. 23).
23
sobrepõe-se uma das cenas de maior brilho e poder rememorativo, a da madeleine, que faz
desabrochar a cidadezinha de Combray e toda a experiência contida nesta parcela de vida do
narrador-herói. De uma perspectiva truncada do passado, da casa da tia Léonie e da cidade de
Combray, que não passava de um “pan lumineux, découpé au milieu d´indistinctes
ténèbres” (CS, p. 43)25, o narrador resgata uma história de vivências, uma parte significante de
seu passado que só pôde aflorar não pelo esforço da inteligência, mas pelo acaso de uma
sensação. Esse jogo entre claro-escuro dar-se-á, posteriormente, no último volume da
Recherche, no qual uma seqüência imbatível de memórias involuntárias, prefiguradas pela
madeleine, colocarão o herói, desiludido com sua vocação, no caminho da arte ou melhor, da
compreensão da arte.
O episódio do bolinho com o chá, embora possua uma força incontestável para a
narrativa, não explica a importância desses momentos privilegiados e mesmo o narrador
afirmando “J´avais cessé de me sentir medíocre, contingent, mortel. D´où avait pu venir cette
puissante joie?” (CS, p. 44)26, Proust posterga essa descoberta que será revelada somente no
final de sua obra. Essa cena inaugural não recupera somente um passado, pois lança
claramente a narrativa em um futuro, em um porvir, protelando e prometendo sua explicação:
“(quoique je ne susse pas encore et dusse remettre à bien plus tard de découvrir pourquoi ce
souvenir me rendait si heureux) (CS, p. 47)”27.
O relato de uma espécie de busca anunciada no primeiro volume parece ser, portanto,
o fio principal do tecido da Recherche, na qual o narrador, envolto primeiramente por uma
obscuridade e uma circularidade alternante de épocas e quartos, percebe o que chama de
tempo em estado puro, ou seja, a justaposição de um presente e um passado, ou melhor, de
uma sensação que não se restringe a esses momentos, embora tenha sido experimentada em
25
“lanço luminoso, recortado no meio de trevas indistintas”. (Trad., p. 69)
“Cessava de me sentir medíocre, contingente, mortal. De onde me teria vindo aquela poderosa alegria?”.
(Trad., p. 71)
27
“(embora ainda não soubesse, e tivesse de deixar para muito mais tarde tal averiguação, por que motivo aquela
lembrança me tornava tão feliz)”. (Trad., p. 74)
26
24
ambos. Como define o narrador proustiano: “Rien qu´un moment du passé? Beaucoup plus,
peut-être; quelque chose qui, commun à la fois au passé et au présent, est beaucoup plus
essentiel qu´eux deux” (TR, p. 450)28. A descoberta abarca a noção de tempo, mostrando que
um passado longínquo não está perdido para sempre, e mais do que isso, demonstrando que
esse tipo de memória advinda das sensações promove a intersecção entre um piso desigual e
Veneza, um tilintar de colher e as árvores vistas na viagem de trem, um guardanapo
demasiadamente engomado e Balbec. Essa conjunção entre elementos altamente distintos
suscitados pela memória seria, na verdade, um esboço da arte, ou em outros termos, a vida
fornecendo a matéria artística e prefigurando aquilo que, formalmente, a arte deveria buscar.
Como explica o narrador:
Alors ma mémoire affirmait sans doute la différence des sensation; mais elle
ne faisait que combiner entre eux des éléments homogènes. Il n´en avait plus
été de même dans les trois souvenirs que je venais d´avoir et où, au lieu de
me faire une idée plus flatteuse de mon moi, j´avais au contraire presque
douté de la réalité actuelle de ce moi. (TR, p. 452)29
Estabelecida a verdadeira importância desses momentos, o narrador discorrerá sobre o
real intuito da arte, que só terá relevância se buscar relações entre elementos distintos,
condensando-os em uma metáfora, uma imagem: “Une heure n´est pas qu´une heure, c´est un
vase rempli de parfums, de sons, de projets et de climats. Ce que nous appelons réalité est un
certain rapport entre ces sensations et ces souvenirs qui nous entourent” (TR, p. 468)30,
relação única que o escritor deve encadear em sua frase. O narrador é enfático e fortemente
prescritivo:
On peut faire se succéder indéfiniment dans une description les objets qui
figuraient dans le lieu décrit, la vérité ne commencera qu’au moment où
l’écrivain prendra deux objets différents, posera leur rapport, analogue dans
28
“Apenas um momento do passado? Muito mais, talvez: alguma coisa que, comum ao passado e ao presente, é
mais essencial do que ambos”. (Trad., p. 153)
29
“A memória me afirmava sem dúvida então as diferenças de sensações, mas nada fazia além de combinar entre
si elementos homogêneos. Não sucedia o mesmo com as três lembranças que me acabavam de assaltar e nas
quais, em vez de colher uma idéia mais lisonjeira de mim mesmo, encontrara, ao contrário, quase a dúvida da
realidade atual de meu eu”. (Trad., p. 154)
30
“Uma hora não é apenas uma hora, é um vaso repleto de perfumes, de sons, de projetos e de climas. O que
chamamos realidade é uma determinada relação entre sensações e lembranças a nos envolverem” (Trad., p. 167)
25
le monde de l’art à celui qu’est le rapport unique de la loi causale dans le
monde de la science, et les enfermera dans les anneaux nécessaires d’un
beau style. (...) Le rapport peut être peu intéressant, les objets médiocres, le
style mauvais, mais tant qu’il n’y a pas eu cela, il n’y a rien. (TR, p. 468)31
Tudo parece fazer sentido: o tempo fugidio, da alternância dos quartos em meio à
escuridão, da existência truncada e restrita ao drama do beijo materno, é finalmente
apreendido na figura de Mlle. Saint-Loup e nos velhos presentes na matinée do príncipe de
Guermantes. Não se trata mais de um tempo que vacila, escapa e não se fixa, mas de um
tempo materializado no corpo dos personagens: “Le temps incolore et insaisissable s´était,
pour que pour ainsi dire je puisse le voir et le toucher, matérialisé en elle, il l´avait pétrie
comme un chef-d´oeuvre”. (TR, p. 608-9)32, ou ainda, “J´avais le vertige de voir au-dessous
de moi, en moi pourtant, comme si j´avais des lieues de hauteur, tant d´années” (TR, p.
624)33 ; e mais uma vez, repetindo esse jogo entre claro-escuro, a Recherche que começa em
uma noite indeterminada, termina em uma matinée muito bem definida.
“La boucle est bouclée”, diriam os franceses, e assim, por muitos anos, a crítica
proustiana leria a Recherche nesta chave, nessa incontestável, desejada e fabricada
composição, nesse fechamento da obra sobre si mesma, do “romance do romance”. Contudo,
se retomarmos a passagem sobre a literatura e a catedral, encontraremos antes uma noção de
inacabamento do que propriamente de equilíbrio e simetria.
Et dans ces grands livres-là, il y a des parties qui n´ont eu le temps d´être
esquissées, et qui ne seront sans doute jamais finies, à cause de l´ampleur
même du plan de l´architecte. Combien de grandes cathédrales restent
inachevées! (TR, p. 610)34
31
“Podem-se alinhar indefinidamente, numa narrativa, os objetos pertencentes ao sítio descrito, mas a verdade só
surgirá quando o escritor tomar dois objetos diversos, estabelecer a relação entre eles, análoga no mundo da arte
à relação única entre causa e efeito no da ciência, e os enfeixar nos indispensáveis anéis de um belo estilo. (...) A
relação pode ser pouco interessante, medíocres os objetos, pobre o estilo, mas sem isso nada se faz”. (Trad., p.
167)
32
“O tempo incolor e fugidio se havia, a fim de que eu o pudesse por assim dizer ver e tocar, materializado nela,
modelando-a como uma obra prima”. (Trad., p. 278)
33
“Dava-me vertigem ver, abaixo de mim e não obstante em mim, como se eu tivesse léguas de altura, tantos
anos”. (Trad., p. 291)
34
“Nos grandes livros dessa natureza, há partes apenas esboçadas, que não poderiam ser terminadas, dada a
própria amplidão da planta arquitetônica. Muitas catedrais permanecem inacabadas”. (Trad., p. 279). Preferimos,
no entanto, traduzir “planta arquitetônica” por “planta do arquiteto” para manter a relação estabelecida por
Proust entre o arquiteto e o escritor.
26
Embora não refutemos a análise que privilegia a composição circular da obra
proustiana tomando por base a imagem da catedral, gostaríamos de pontuar, a partir do trecho
acima, que consideramos uma espécie de alegoria do próprio processo de composição da
Recherche, a importância dada ao inevitável inacabamento advindo de um projeto ambicioso.
Gigante e monstruosa como os personagens envelhecidos ao final da Recherche, a obra de
Proust pode ser comparada a uma catedral por sua monumentalidade e seu projeto audacioso;
no entanto, equipara-se igualmente a ela por seu modo de execução. Como na construção de
uma catedral, o escritor precisou de anos para erigir sua obra literária, utilizando materiais
provenientes de diferentes épocas escriturais, não escapando, todavia, de um inacabamento
que é próprio a essa monumentalidade literária.
A crítica, em maior ou menor grau, teve inevitavelmente de lidar com esse aspecto
inacabado da Recherche, mesmo mencionando apenas o fato incontestável das publicações
póstumas. Como sabemos, Proust morre em novembro de 1922, antes mesmo de corrigir as
provas do La prisonnière, com Albertine disparue em estado de datilografia e o Temps
retrouvé em manuscrito. No entanto, não nos referimos somente ao inacabamento da obra
devido à morte prematura de seu autor, mas ao processo que levou a tal incompletude.
Se Proust propalou a composição e o acabamento de sua obra já em 1913, quando
apenas Côté de Swann havia sido publicado – “Tout est écrit mais tout est à
reprendre” (Corresp., t. XII, p. 367)35 – sabe-se que durante a guerra ele modificará
substancialmente seu projeto ao incluir a história de Albertine. É a construção dessa história
que buscamos percorrer no primeiro capítulo, analisando seus primórdios e comentando os
cadernos utilizados para sua composição, notadamente os cahiers 53 e 55. O intuito da análise
é a verificação da importância da construção da história dessa heroína que permitirá mostrar
que, longe de ser uma transposição da relação entre Proust e seu secretário, Agostinelli, suas
35
“Tudo está escrito, mas tudo deve ser retomado”. Carta a André Beaunier enviada em 1913.
27
origens já haviam sido delineadas em outro texto proustiano, “La fin de la jalousie”, do livro
Les plaisirs et les jours. A história de Albertine permitirá também entender a transformação
de parte do projeto Sainte-Beuve, de certo modo autobiográfico, em um projeto de grande
envergadura ficcional, no qual a busca por uma verdade ainda se dará, ainda que por meio de
um herói-narrador. Se Proust assume o caráter filosófico de sua obra – “c´était justement à la
recherche de la Vérité que je partais” (Corresp., t. XIII, p. 99)36 – ele teve de se haver com a
composição concreta da Recherche e com outra busca não menos importante, a do herói por
sua vocação literária.
A história de Albertine modifica boa parte do curso inicial da obra proustiana – “En
1916 le manuscrit pour le futur Guermantes II est achevé, mais tout est déjà transformé depuis
deux ans, non seulement par la Guerre et l´interruption de la composition, mais surtout par l
´invention d´Albertine” (BRUN,2006)37 –, mas intensifica essa busca, sendo ela do herói ou
de Marcel Proust.
Todavia, não foi apenas a partir da história dessa heroína que a obra proustiana viu-se
irremediavelmente fadada ao inacabamento, à escrita sem fim, ou, se quisermos, “aux
minutieuses peintures”38 às quais o escritor se dedicaria até o final de sua vida. Basta olhar os
índices manuscritos e publicados para verificar que o crescimento do texto proustiano se deu
ainda em etapas anteriores à invenção da heroína, em 1913-1914.
I.
Manuscrito de 1912. Dois volumes
Les intermittences du coeur
Tomo I: Le temps perdu
36
“era justamente em busca da verdade que eu partia”. Carta a Jacques Rivière de 1914.
“Em 1916, o manuscrito para o futuro Guermantes II está acabado, mas tudo já está transformado há dois anos,
não somente pela Guerra e a interrupção da composição, mas, sobretudo pela invenção de Albertine”.
38
Expressão citada na epígrafe desta introdução e que provém de uma carta enviada a Jacques Rivière em 1920.
37
28
1ª parte: Combray; 2ª parte: Un amour de Swann; 3ª parte: Noms de pays: le nom/Autour de
Mme. Swann/ Nom de pays: le pays.
Tomo II : Le temps retrouvé.
II.
Manuscrito de 1913. Edição Grasset. Três volumes
À la recherche du temps perdu
Tomo I : Du côté de chez Swann (publicado) : Combray/ Un amour de Swann/ Nom de pays :
le nom].
Tomo II : Le côté de Guermantes (a ser publicado em 1914): Chez Mme. Swann/ Noms de
pays: le pays/Premiers crayons du baron de Charlus et de Robert de Saint-Loup/Noms de
personnes : la duchesse de Guermantes/Le salon de Mme. de Villeparisis.
Tomo III : Le temps retrouvé : À l´ombre des jeunes filles en fleurs/ La princesse de
Guermantes, M. de Charlus et les Verdurin/Mort de ma grand-mère/Les intermittences du
coeur/Les ‘Vices et les Vertus’ de Padoue et de Combray/Madame de Cambremer/Mariage de
Robert de Saint-Loup/L´adoration perpétuelle.
III.
Versão de 1918. Gallimard. Cinco volumes
Du cote de chez Swann (publicado)
À l´ombre des jeunes filles en fleurs (um volume publicado)
Le côté de Guermantes (sob impressão)
Sodome et Gomorrhe I (anúncio de 1918)
Sodome et Gomorrhe II – Le temps retrouvé (anúncio de 1918)39.
39
Para uma comparação mais detalhada dos índices anunciados e dos realmente publicados com os romances,
ver GENETTE, Gérard. “Le paratexte proustien”. Cahiers Marcel Proust nº 14, p. 21-24.
29
Como pudemos perceber, de um projeto inicial de dois volumes, Proust anuncia, pela
editora Grasset, três volumes que serão, em 1918, transformados em cinco, para, por fim,
serem acrescidos mais três romances cujos índices nunca foram anunciados – La prisonnière,
La fugitive e Le temps retrouvé – encerrando a obra, deste modo, em sete volumes – Sodoma
e Gomorra II juntando-se à sua primeira parte.
Essa dilatação da obra proustiana, essa “surnourriture” empregada pelo escritor aos
seus textos sempre foi uma das características marcantes da composição da Recherche. A
história de Albertine seria, nesses termos, um movimento natural da escritura proustiana e não
uma anormalidade ou um desvio do primeiro projeto romanesco, tal como afirmavam
diversos críticos salientados por Nathalie Mauriac Dyer:
(...) l´épisode d´Albertine – où certains voient aujourd´hui un organe mutilé,
d´autres voyaient hier, à cause du mouvement d´écriture inverse (le
développement de l´épisode à partir de 1913-1914) une “énorme
excroissance” maladive, une “tumeur monstrueuse” sur le corps jusque là
“harmonieux” du roman”. (2008)40
A escrita incessante, os retoques e os ajustes infindáveis tanto nos cadernos de
rascunhos como nas datilografias e provas, para desespero dos editores perpassaram toda a
construção da Recherche, embora em graus diferentes. Com esse tratamento minucioso de
seus textos, Proust mergulha em uma escrita sem fim, demonstrando, deste modo, um
inacabamento potencial e uma processualidade de sua escrita. Se em 1921, em uma carta a
Gaston Gallimard, Proust declara que seus cadernos podem praticamente ser publicados no
estado em que se encontram – “Pour les volumes suivants et derniers, il y a peu à faire pour
moi, et à la rigueur, après avoir donné à vous ou à Jacques quelques explications, mes cahiers
peuvent paraître tels quels, en cas d´événement fâcheux” (Corresp., t. XX, p. 147-8) 41 – em
40
“(...) o episódio de Albertine – no qual alguns vêem hoje um órgão mutilado, outros viam ontem, por causa do
movimento inverso (o desenvolvimento do episódio a partir de 1913-1914) uma ‘enorme excrescência’ malsã,
um ‘tumor monstruoso’ sobre o corpo até então ‘harmonioso’ do romance”. A autora refere-se, neste artigo, à
datilografia de Albertine disparue encontrada por Claude Mauriac em 1986, na qual Proust teria modificado, no
manuscrito XV, o local da morte da heroína, eliminando assim grande parte dos textos escritos nos cadernos XII
e XIV, e integralmente os do caderno XIII, tema que será tratado no capítulo I.
41
“Pelos volumes seguintes e os últimos, para mim há pouco a fazer, e a rigor, depois de dar algumas
explicações a você ou a Jacques, meus cadernos podem ser publicados tais como estão, em caso de
30
1922, ano de seu falecimento, o escritor parece compreender o inacabamento inerente à
arquitetônica de seu projeto:
Donc je ferai comme si nous devions être chez les libraires le 1er. Mai. Je ne
donnerai pas une seconde effort de moins. Mais je reste persuadé que nous
paraîtrons seulement le 1er. Mai 1923. Et comme j´ai tant de livres à vous
offrir qui si je meurs ne paraîtront jamais (A la Recherche du Temps perdu
commence à peine), comme d´autre part en Mai 1923 on aura oublié les
personnages qu´en Mai 1922, ce sera désastreux. (Corresp., t. XXI, p. 56)42
A imagem imponente da catedral, cujas características só poderiam sugerir solidez e
rigidez desmorona-se para dar lugar a uma metáfora ainda mais condizente com o processo da
escrita proustiana, a do flexível, maleável e fragmentado vestido: “car épinglant ici un feuillet
supplémentaire, je bâtirais mon livre, je n´ose pas dire ambitieusement comme une cathédrale,
mais tout simplement comme une robe” (TR, p. 610)43. É nesta “remendaria”, nesta costura de
fragmentos textuais que se dá, concretamente, a obra proustiana, elemento analisado por
Barthes, que considera a Recherche como uma “tierce forme” que seria “rhapsodique, c´est-àdire (étymologiquement) cousue” [“rapsódica, ou seja, (etimologicamente) costurada]
(BARTHES, 1984, p. 337). O verbo escolhido por Proust para especificar a construção da
obra – bâtir – significa tanto construir como alinhavar, correspondendo, portanto, à
construção de algo sólido e ao alinhavo de roupas.
Se pudéssemos resumir a composição da Recherche em poucas palavras, diríamos que
seu projeto e sua concepção são catedralescos, enquanto sua execução assemelha-se à de um
alfaiate. Como define Leda Tenorio da Motta: “Escrever é tarefa que se coaduna com as
Belas-Artes, com o estilo elevado, mas que não descarta, em sua busca eterna e inquieta,
expedientes menores, rudemente artesanais” (2001, p. 302).
acontecimento importuno”.
42
“Então farei como se nós devêssemos estar nas livrarias em 1º de Maio. Não darei um segundo a menos de
esforço. Mas continuo persuadido de que nós sé seremos lançados em 1º de Maio de 1923. E, como tenho tantos
livros a te oferecer que se eu morrer nunca serão publicados (Em Busca do Tempo perdido mal começou), por
outro lado, em Maio de 1923 terão esquecido os personagens que em Maio de 1922, isto será desastroso”.
43
“pois, pregando aqui e ali uma folha suplementar, eu construiria meu livro, não ouso dizer ambiciosamente
como uma catedral, mas modestamente como um vestido”. (Trad., p. 280)
31
Esses procedimentos artesanais explicam a enorme quantidade de cadernos de
rascunhos e manuscritos, bem como o grande número de papéis e “paperoles” colados e
montados nesses documentos; mas se há costura, montagem, isto implica, necessariamente,
que a obra é feita de fragmentos.
A tarefa de coadunar, buscando assim uma unidade para os incontáveis fragmentos
dispersos nos cadernos era, para Proust, uma das tarefas mais árduas da escrita de sua obra:
“Composer pour moi ce n´est rien. Mais rafistoler, rebouter, cela passe mon courage” (Citado
por TADIÉ, 1987, p. CIII)44 e talvez este seja o motivo pelo qual Proust, nos últimos anos de
sua vida e com o agravamento da doença, presumisse o improvável acabamento de sua obra:
“Un seul mot, parmi ceux que vous m´avez dits, m´a fait de la peine. Pourquoi désespérezvous d´achever votre oeuvre ? Moi, je suis sûr que vous la terminerez”. (Corresp., t. XXI, p.
250)45.
São esses dois eixos – o da busca por uma unidade e o da escrita pelo fragmento – que
norteiam o presente trabalho. Pretendemos mostrar que, mesmo imergindo em um contexto
escritural intenso, Proust não perde de vista seu projeto e procura, com certa obstinação,
elementos que promovam a unidade entre as partes de sua obra.
Esse tema é desenvolvido no segundo e terceiro capítulos, nos quais estudamos os
motivos elaborados pelo escritor – respectivamente o leitmotiv Fortuny e o episódio da
“fenêtre éclairée”, ambos pertencentes ao romance La prisonnière – para atingir tal
unificação.
Utilizamos, para nossa análise, fundamentalmente os manuscritos dedicados à
elaboração de tal romance, os cadernos 53 e 5546 e o estudo desses manuscritos levou-nos,
44
“Para mim, compor não é nada. Mas emendar, recolocar, isto ultrapassa minha coragem”. Carta enviada a
Gaston Gallimard em 1922.
45
“Só uma palavra, dentre as quais você tinha me dito, causou-me desgosto. Por que você se desespera para
terminar sua obra? Estou certo de que você a terminará”. Carta de Jacques Rivière a Proust de 1922.
46
A transcrição integral do caderno 53 é de minha responsabilidade e se encontra no apêndice, no final desta
tese. A do caderno 55, cujos fólios analisados neste trabalho constam nos anexos B foi realizada por Shuji
32
inevitavelmente, a certa leitura do modus faciendi do escritor e de certa estética da
composição que pôde ser apreendida nesses documentos.
Este é o tema do quarto e último capítulo que analisa, a partir das notas e lembretes
registrados por Proust, seus procedimentos escriturais, bem como a importância da unidade e
do projeto na fabricação textual, incluindo ainda a discussão sobre a construção do “je”
proustiano, tema que rendeu muitos debates com relação ao caráter autobiográfico da
Recherche.
Colocar-se como um leitor de manuscritos, notadamente dos cadernos proustianos, nos
quais reinam certa desarrumação e instabilidade escritural, não é tarefa fácil, sendo até certo
ponto constrangedor para o crítico da obra de Proust.
Em uma carta endereçada a Sydney Schiff em 21 de julho de 1922, Marcel Proust
afirma:
Or, même si tu ou vous ne m´aviez pas demandé d´attendre avant de vendre,
je n´aurais pas encore vendu. Non que je trouve le prix trop faible. Au
contraire, si je vends, j´ai l´intention d´abaisser à 5000 pour l´ensemble.
Mais ce qui me fait hésiter c´est que les bibliothèques de ce monsieur
doivent à sa mort aller à l´État. (Corresp., t. XXI, p. 372)47
A passagem apresentada acima se refere à possível compra por Jacques Doucet das
provas corrigidas do romance Sodoma e Gomorra II. Parece-nos flagrante o receio do escritor
diante da possibilidade de seus manuscritos pararem em bibliotecas públicas e serem alvo de
pesquisas e estudos. As preocupações de Marcel Proust são aclaradas ainda nessa mesma
carta, quando o autor confessa:
Or la pensée ne m´est pas très agréable que n´importe qui (si on se soucie
encore de mes livres) sera admis à compulser mes manuscrits, à les comparer
au texte définitif, à en induire des suppositions qui seront toujours fausses
Kurokawa e Nathalie Mauriac e cedida gentilmente por esta última. Constam ainda no anexo A, os inventários
dos cadernos aqui estudados, feitos pela equipe Proust de Paris.
47
“Ora, mesmo se você ou vocês não tivessem me pedido para esperar antes de vender, ainda não teria vendido.
Não que eu ache o preço muito baixo. Pelo contrário, se eu vender, tenho a intenção de baixar para 5000 o
conjunto. Mas o que me faz hesitar é que as bibliotecas desse senhor devem, após sua morte, pertencer ao
Estado”
33
sur ma manière de travailler, sur l´évolution de ma pensée etc. (Corresp., t.
XXI, p. 372-3)48
Embora saibamos que esse “n´importe qui” nos concerne diretamente, o que
impressiona neste texto é que Proust praticamente resumiu, com quase meio século de
antecedência, a disciplina que nasceria no final dos anos 60 e teria como principal objeto os
manuscritos de escritores, a Crítica Genética. Mais espantoso ainda é que, tendo certamente
consciência do caráter híbrido, compósito e caótico de seus cadernos, vislumbra com grande
perspicácia toda a problemática que seus escritos privados suscitariam nos críticos e leitores
desses rascunhos.
Resumindo, toda a pesquisa desenvolvida da década de setenta até hoje sobre os
manuscritos proustianos incidiu sobre a “evolução de [seu] pensamento”, como a análise de
variantes, personagens, nomes etc., e sua “maneira de trabalhar”, seja por fragmento, por
éclatement (estouro, dispersão) de seu texto ou pelo gonflement (dilatação) de sua escrita.
Contudo, perguntamo-nos se os próprios romances publicados do escritor já não
motivariam esse tipo de leitura que permeia tão fortemente a análise de seus cadernos. Ora,
um romance que fala sobre o romance, que reflete sobre a maneira pela qual alguém se torna
escritor, deixando ao público uma escrita lacunar, fragmentária, onde encontramos uma
profusão de repetições de imagens, formas, sonoridades, leitmotiv que aparecem de forma
constelar, evidencia, no mínimo, uma construção.
Em outras palavras, os textos publicados de Proust trazem, por si só uma forte
reverberação da maneira pela qual foram compostos, fazendo com que a presença dos
manuscritos não seja algo indispensável para se falar, por exemplo, de escritura ou de
processos de criação.
48
“Ora, não me é muito agradável a idéia de que qualquer um (se alguém ainda se preocupar com meus livros)
possa examinar meus manuscritos, compará-los ao texto definitivo, tirando suposições que serão sempre falsas
sobre minha maneira de trabalhar, sobre a evolução do meu pensamento”.
34
Há diversos estudos que refletem sobre essas questões a partir do romance, mas para
ficarmos com alguns exemplos, citamos Philippe Willemart49 que trata da questão da incerteza
– um dos elementos constitutivos do processo escritural – a partir de episódios específicos e
bem conhecidos como o da Madeleine.
Outro caso é o trabalho de dissertação de José Carlos Souza50 que explora a noção de
escritura por meio da personagem Albertine e de sua representação múltipla e fugidia no
romance, afirmando que ela seria uma espécie de alegoria do processo escritural.
Notamos que a preocupação de Marcel Proust com a leitura de seus manuscritos foi,
parcialmente, em vão, pois seus romances poderiam provocar reflexões acerca de sua forma
de trabalhar. No entanto, frisamos que apenas por um lado ela foi vã, pois sabemos que um
manuscrito não se deixa ler como um livro e que eles, inegavelmente, carregam consigo, de
maneira mais explícita e visceral, o trabalho de uma vida
Mas, dentre as inquietações levantadas pelo escritor, gostaríamos de destacar sua
afirmação categórica sobre a falsidade que as análises de seus cadernos acarretariam. Afora o
teor radical contido nessa declaração, um pesquisador do manuscrito deve sempre refletir
sobre ela. Será que, a partir de um pequeno recorte, de um manuscrito apenas, somos capazes
de especular sobre a forma de escrever de um autor ou será que só podemos nos ater a ela
quando circunscrita a um objeto de análise, seja ele um manuscrito, uma caderneta, uma
página etc.?
Obviamente, não pretendemos responder a essa questão de maneira epistemológica,
pois seria desprezar as características e importâncias de cada objeto de estudo. A escrita de
Proust não será como a de um Zola, ou a de um Flaubert e dentro do corpus proustiano, há
49
Cf. “O conceito de incerteza em Marcel Proust”. In: WILLEMART, Philippe. Crítica Genética e psicanálise.
p. 145-154.
50
Cf. SOUZA, José Carlos. Balbertinec: um litoral À l´ombre des jeunes filles en fleurs, 2009.
35
diferenças significativas entre os diversos tipos de cadernos utilizados nas etapas de escritura
e os procedimentos escriturais propriamente ditos.
Resumidamente, o corpus proustiano atual é composto de 75 cadernos de rascunho, 20
cadernos de mise au net51 e uma série de folhas avulsas contidas em uma caixa cinza. Nela,
encontramos tanto papéis que provavelmente caíram dos cadernos, quando Proust os
fragilizava arrancando suas folhas, como pedaços de textos e de paperoles52. Há também 18
volumes de datilografias e 14 volumes de provas. Os 62 primeiros cadernos entraram na
Biblioteca Nacional da França em 1962, sendo classificados por Florence Callu53. Quando
dizemos “primeiros” não nos referimos de forma alguma à ordem cronológica escritural
desses cadernos, mas apenas à ordem de entrada nos arquivos da BNF.
A própria numeração desses manuscritos é completamente contestável. A título de
organização, Callu estipulou cotas a cada documento com base tanto em uma leitura geral dos
rascunhos, quanto na ordem de chegada dos mesmos, o que gerou, evidentemente, muitas
discrepâncias. Atualmente, fundamentados nas pesquisas genéticas desenvolvidas de modo
mais detido, sabemos, por exemplo, que o caderno 58 é anterior ao 5754, ambos dedicados ao
Tempo Redescoberto e, para ficarmos no âmbito dos cadernos que serão analisados no
presente trabalho, sabemos que o caderno 71 é anterior ao 53 e ao 55, todos dedicados direta
ou indiretamente à Prisioneira.
Somente vinte e três anos depois, em 1985, os cadernos 63 a 75, que estavam em
poder do colecionador Jacques Guérin, entraram para a BNF, completando, deste modo, o
51
Procedimento de passar a limpo.
Nome dado pelo narrador proustiano, por intermédio da personagem Françoise, aos pedaços ou fragmentos de
papel. No processo escritural de Proust, as “paperoles” são geralmente utilizadas para acrescentar mais texto a
uma página que já está repleta de material escrito. São geralmente coladas seja na margem superior, seja na
inferior, podendo chegar a até 2 metros. Podem ser encontradas em menor quantidade nos cadernos de rascunhos
(brouillons) e massivamente nos cadernos de mise au net.
53
Arquivista da BNF que atribuiu as cotas da Nova Aquisição francesa (Nafr) aos manuscritos proustianos,
divididos em: Cadernos 1 a 62 (Nafr: 16641-16702) e cadernos 63 a 75 (Nafr: 18317-18325).
54
Cf. YOSHIKAWA, K. Études sur la genèse de la Prisionnière d´après des brouillons inédits. Em sua tese, a
partir de transcrições e análises detalhadas, Yoshikawa estipula algumas datas possíveis para os cadernos e
afirma a anterioridade do 58 ao 57, do 71 ao 53 e 55.
52
36
dossiê proustiano do qual temos conhecimento hoje. Apesar de possuírem a mesma
designação, os cadernos de rascunho são heterogêneos tanto no seu formato (original ou
restaurado), quanto na sua utilização.
Para exemplificar a complexidade desses brouillons, há os cadernos de rascunho, de
montagem – que agenciam fragmentos de diversos cadernos ou de páginas de um só caderno,
possuindo igualmente muitos desenvolvimentos e acréscimos característicos dos rascunhos –
e os cadernos de adição – espécie de caderno de bordo que servia para Proust efetuar
mudanças prévias enquanto aguardava as provas do romance.
Há ainda os cadernos de mise au net, numerados pelo escritor de I a XX, e que vão de
Sodoma e Gomorra ao Tempo redescoberto, e apesar de serem designados por esse nome,
também estão repletos de acréscimos, desenvolvimentos e paperoles, sendo, contudo mais
homogêneos quanto ao uso e mais próximos dos romances publicados.
A restauração sistemática que foi feita nos cadernos desde que eles entraram na BNF
criou certa desordem: intervenção ou mudança das capas, subversão na ordem dos fólios, o
que implica, inevitavelmente, que mesmo quando trabalhamos com o manuscrito original,
estamos ainda muito distantes da configuração inicial deixada por Proust. O material é
lacunar, não temos dúvidas, mas estas são apenas lacunas deixadas por processos externos ao
da composição da obra proustiana, alheias ao próprio escritor. Com relação às folhas avulsas,
ou ao chamado “reliquats des manuscrits”, Brun enfantiza:
Une belle reliure fabriquée pour les besoins de la cause souligne l´échec de
la classification thématique opérée par la BNF: ce ne sont pas des « restes »,
des déchets et leur exploitation est difficile mais passionante, car loin de
former des rédactions rejetées par l´écrivain, ce sont en général des feuilles
rédigées dans les cahiers et découpées pour préparer directement les
dactylographies. (2008)55
55
“Uma bela encadernação fabricada para as necessidades da causa assinala um fracasso da classificação
temática operada pela BNF: não são ‘restos’, dejetos, e sua exploração é difícil, mas apaixonante, pois longe de
formar redações rejeitadas pelo escritor, são, em geral, folhas redigidas dentro dos cadernos e cortadas para
preparar diretamente as datilografias”.
37
Embora a inoperância da classificação seja flagrante, Marcel Proust legou-nos
igualmente enormes lacunas, principalmente por compor de forma não linear. Inúmeros
críticos genéticos constataram essa não linearidade da escrita proustiana, e de acordo com
Jean Milly:
Nous pouvons aujourd´hui nous appuyer sur la meilleure connaissance que
nous avons de la genèse. Celle-ci, précisons-le, ne suit pas une progression
régulière, mais est faite d´innombrables fragments successifs, fréquemment
annulés et repris, ordonnés selon des constructions elles aussi expérimentales
et changeantes (1984, p. 190)56
Além desse hiato construído pela falta de continuidade e de linearidade da escrita
proustiana, há outro buraco, no nível documental, deixado pela destruição de alguns
manuscritos. Conforme Nathalie Mauriac Dyer: “Proust n'a pas caché avoir brûlé certains de
ses cahiers, dont les chercheurs peuvent parfois désigner aujourd'hui les places vides”(2006,
p. 21)57.
Entendemos com maior propriedade as palavras de Proust sobre certo falseamento que
a leitura de seus rascunhos provocaria. Consciente de seu material lacunar, híbrido e não
linear, o escritor provavelmente entreviu as dificuldades que encontrariam os leitores dos
brouillons. Além disso, não seria possível mencionar os textos mentais que não foram
registrados, mas que fizeram todo o sentido para o escritor compor sua obra. Proust estava
com a razão, pelo menos parcialmente.
Em um artigo anterior, cometemos algumas impropriedades ao tentar estabelecer uma
lógica da escritura proustiana com base no caderno 53. Felizmente, nossa leitura não foi
invalidada pelo contato que tivemos, posteriormente, com outros manuscritos do autor.
56
“Podemos hoje nos apoiar em um melhor conhecimento que temos da gênese. Esta, precisemos, não segue
uma progressão regular, mas é feita de inúmeros fragmentos sucessivos, freqüentemente anulados e retomados,
ordenados segundo construções igualmente experimentais e moventes”.
57
“Proust não escondeu ter queimado alguns de seus cadernos, cujos lugares vazios os pesquisadores podem às
vezes designar atualmente”.
38
O intuito aqui não será de arrolar a argumentação desenvolvida no artigo publicado em
2007, tampouco resumi-lo. Contudo, gostaríamos de nuançar e retificar algumas afirmações
categóricas que fizemos decorrentes, no entanto, da dificuldade de ler os rascunhos
proustianos:
No entanto, na medida em que caminhamos nessa tentativa de decifração do
texto, começamos a nos familiarizar com esses rascunhos e a perceber
algumas singularidades. Não encontramos, como possivelmente
pretendíamos, uma composição cronológica dos episódios que foram
publicados no romance. Também não encontramos seqüência alguma, nem
com relação à produção dos episódios romanescos, nem com relação a uma
seqüência processual nos próprios manuscritos. Em outras palavras, muito
raramente podemos constatar uma continuidade do desenvolvimento de um
episódio ou de uma descrição nas páginas dos cadernos utilizados como
suporte. Proust não costuma dar seqüência aos episódios trabalhados em uma
determinada página, o que significa que ao terminarmos de ler um fólio,
mesmo que as idéias nele contidas estejam incompletas ou inacabadas, muito
provavelmente não encontraremos a continuação do desenvolvimento destas
idéias no fólio posterior. O espaço dos cadernos utilizados por Proust é de
certa forma subvertido, pois o escritor não registra sua escritura na forma
prevista por um pesquisador iniciante e desavisado, ou seja, não utiliza de
forma seqüencial a frente e o verso do caderno, procedimento julgado padrão
(SILVA, p. 96)
O que devemos retificar nessa análise é que obviamente houve e há seqüências
cronológicas, contudo, elas não são lineares. O processo existiu, assim como a cronologia,
mas não conseguimos estabelecê-los de forma absoluta, pois não são apresentados de maneira
linear e porque escapam a qualquer crítico. A aparente falta de seqüência temática entre os
episódios é um fato nos cadernos de Proust, no entanto, ela existe e é buscada pelo escritor,
como mostraremos no corpo deste trabalho.
Acertamos quando dissemos que o espaço dos cadernos é subvertido e foi exatamente
essa subversão que provocou certa impropriedade em nossa leitura. Um dos índices que
revelam o seguimento do texto de Proust é a numeração feita por ele mesmo. A compostagem
realizada pela BNF, ou seja, a numeração fólio a fólio atribuída pelos conservadores, apesar
de garantir ordem e nomear a folha para fins analíticos, estabelece forçosamente uma
seqüência do texto proustiano que não se dá nesses parâmetros.
39
Outro ponto a ser reavaliado é que nos atemos, como dissemos, a apenas um caderno
dentro de um conjunto de 75. Não desejamos com essa colocação dar a entender que uma boa
crítica de manuscritos só possa ser feita se analisarmos uma grande quantidade de
documentos. Há muitos exemplos que provam o contrário, mas para o caso proustiano,
salientamos que a heterogeneidade dos rascunhos e sua característica compósita são fatores
incontestáveis e sobremaneira importantes.
Notamos, em alguns cadernos, textos mais limpos, com poucas adições que indicam
uma cópia de textos anteriormente desenvolvidos e que possuem deste modo, uma seqüência
textual mais facilmente detectável. Em outros, encontramos uma excessiva quantidade de
rasuras, de movimentos e fragmentos textuais hesitantes, demonstrando estados incompletos
de escritura e conseqüentemente, episódios mais isolados.
Outros cadernos estão completamente mutilados, o que pode denotar o provável
deslocamento de fólios para os cadernos de mise au net, sugerindo que os textos poderiam
estar muito próximos dos publicados e, portanto se situariam em um nível de elaboração mais
avançada. É desnecessário comentar que esse tipo de caderno contém um grau lacunar muito
alto e que seu estudo muitas vezes implica numa busca pelos fólios deslocados para que se
tenha uma idéia do documento tal como ele era inicialmente58.
Em suma, dizer que os manuscritos proustianos não possuem cronologia e seqüência
algumas foi uma afirmação categórica e genérica sobre a forma de compor de Proust, que
ignora os diversos outros procedimentos que encontramos nos demais cadernos. Além disso,
não podemos menosprezar a duração da escrita proustiana que começou, no caso do Em
busca do Tempo perdido, em 1908 e terminou, juntamente com a morte do escritor, em 1922.
58
Apesar das dificuldades de tal tarefa e de sua contestável eficácia e contribuição para os estudos do
manuscrito, o projeto de edição dos cadernos de Proust, promovido pela editora belga Brépols e pelas equipes
francesa, japonesa e brasileira, tem o objetivo de reconstituir os cadernos mutilados e apresentá-los ao público
como eram em seu estado inicial.
40
Nesse intervalo, Proust modificou sua forma de trabalhar e, para mencionarmos
apenas uma, os cadernos de mise au net, que demonstram um dos procedimentos mais
conhecidos e propalados pela crítica proustiana, o da montagem e da colagem, só começaram
a ser usados a partir do romance Sodoma e Gomorra.
Após essa breve deambulação pelos cadernos de Proust, gostaríamos de frisar que se
nosso trabalho se apóia na leitura e análise de manuscritos para compreender a composição da
Recherche, que se dá por fragmento e por uma constante busca por unidade e fechamentos,
não nos atemos, no entanto, ao estudo da gênese do texto proustiano. Embora algumas datas
sejam importantes para o entendimento da construção dessa obra monumental, é tarefa quase
impossível estabelecer sua gênese textual. De fato, esse processo escritural existiu, contudo,
por não ter sido linear e não seguir etapas evolutivas – veremos que um caderno não
necessariamente leva a outro em termos sucessivos de composição – é muito improvável
chegar a alguma cronologia fixa.
Utilizamos os manuscritos antes para refletir e indagar sobre a composição e o
inacabamento da Recherche, do que para estipular ou contestar datas. Ainda a respeito da
leitura dos rascunhos, buscamos explicar, muitas vezes, quais eram os procedimentos de sua
utilização, ou seja, como Proust registrava seus textos nos cadernos. Entretanto, não
pretendemos com isso tomar a tutela do leitor, explicando-lhe como ler o manuscrito
proustiano, mas apenas registrar as descobertas que fizemos ao longo da pesquisa e que tanto
nos ajudaram a sair de um estado de incompreensão provocado pelo caos completo, próprio
das primeiras incursões nos cadernos de Marcel Proust.
Por fim, esperamos que este trabalho consiga somar-se à já tão forte e rica crítica
proustiana, podendo acrescentar outras reflexões acerca da obra de Marcel Proust.
41
Capítulo 1
A história de Albertine: o fim da catedral?
cela est dû précisément
à cette surnourriture que je
leur réinfuse en vivant
1.1 Sobre o nascimento de Albertine
Embora o primeiro projeto da Recherche já possuísse em seu cerne as histórias que
integrariam sua versão publicada, tais como o amor de Swann e a explicação do significado
das experiências de memória involuntária, ele se difere fortemente daquilo que posteriormente
se tornará a obra proustiana em seu estado derradeiro.
Resumindo as etapas elaboradas pelo escritor, a primeira fase de escritura, datada de
1908-1909, estaria completamente voltada ao desenvolvimento do projeto Sainte-Beuve. Para
Bernard Brun:
Il ne faut pas oublier les importantes traductions de Ruskin, ainsi que les
nombreux articles de critique littéraire et d’esthétique, ainsi que les
pastiches, qui ont permis à Proust de fixer ses idées et son style. Mais ces
matériaux ont été transformés complètement par le projet du Contre SainteBeuve (fin 1908). Un projet contradictoire: une critique de la conversation à
travers une discussion avec Maman (Cahiers 3, 2,5 et 1). (BRUN, 2008)59
Esse projeto foi rapidamente transposto para a construção do romance proustiano,
inicialmente chamado Les intermittences du coeur. Ainda nas palavras de Bernard Brun: “Le
roman est né en 1909, d´une réutilisation des matériaux narratifs constitués par les oeuvres de
jeunesse, comme on dit (...): principalement le Jean Santeuil, discontinu, interrompu (deux
caractéristiques majeures de l´écriture proustienne)” (2008)60.
59
“Não se deve esquecer as importantes traduções de Ruskin, bem como os numerosos artigos de crítica literária
e de estética, assim como os pastiches que permitiram a Proust fixar suas idéias e seu estilo. Mas esses materiais
foram completamente transformados pelo projeto do Contra Sainte-Beuve (fim de 1908). Um projeto
contraditório: uma crítica da conversação por meio de uma discussão com Mamãe”.
60
“O romance nasceu em 1909 de uma reutilização dos materiais narrativos constituídos pelas obras de
juventude (...): principalmente Jean Santeuil, descontínuo, interrompido (duas maiores características da
escritura proustiana)”.
42
Possuindo ainda uma divisão bipartida entre “Tempo perdido” e “Tempo
redescoberto” como já demonstrado na introdução, esse projeto, desenvolvido entre
1909-1911, demonstra, pelo índice encontrado nos manuscritos de 1912, uma concentração
nos temas de Charles Swann, prenunciando parte do que será À l´ombre des jeunes filles:
Les intermittences du coeur: Tome I: Le temps perdu (712 feuillets
dactylographiés). 1re partie: Combray/ 2e partie: Un amour de Swann/ 3e
partie. Noms de pays: le nom; Autour de Mme. Swann; Noms de pays: le
pays, etc. Tome II: Le temps retrouvé (en cahiers): “Je donne un titre
différent aux deux volumes et ne les ferai paraîtres qu´à dix mois d
´intervalle”. (GENETTE, 1987, p. 21)61
O primeiro volume, Le temps perdu, foi apresentado a diversos editores, tais como
Fasquelle, Ollendorf, Gallimard e Grasset, tendo sido finalmente publicado por este último
em 1913. O índice que constava no anúncio dos próximos tomos – “Pour paraître en 1914” –,
nomeados com o título geral de À la recherche du temps perdu, já continha uma divisão
tripartida do romance. Além do primeiro tomo, cuja configuração era idêntica à que lemos
hoje – Combray, Un amour de Swann e Nom de pays: le nom – há o anúncio de mais dois
volumes, Le côté de Guermantes e Le temps retrouvé, cujos subtítulos das seções eram: “Chez
Mme. Swann, Nom de pays: le pays, Premiers crayons du Baron de Charlus et de Robert de
Saint-Loup, Noms de personnes: la duchesse de Guermantes, Le salon de Mme. de
Villeparisis”62 para o segundo tomo e para o terceiro e último volume:
À l´ombre des jeunes filles en fleurs, La princesse de guermantes, M. de
Charlus et les Verdurin, Mort de ma grand-mère, Les intermittences du
coeur, Les “Vices et les Vertus” de Padoue et Combray, Madame
Cambramer, Mariage de Robert de Saint-Loup, L´adoration perpétuelle.
(GENETTE, 1987, p. 21-2)63
61
“As intermitências do coração: Tomo I: O tempo perdido (712 folhas datilografadas). 1ª parte: Combray/2ª
parte: Um amor de Swann/3ª parte: Nome de terras: o nome; Em torno da sra. Swann; Nomes de terras: a terra,
etc. Tomo II: O tempo redescoberto (em cadernos): ‘Eu dou um título diferente aos dois volumes e os farei
publicar em apenas dez meses de intervalo”.
62
“Em casa da sra. Swann, Nome de terras: a terra, Primeiros retratos do Barão de Charlus e de Robert de SaintLoup, Nomes de pessoas: a duquesa se Guermantes, O salão da sra. de Villeparisis”.
63
“À sombra das raparigas em flor, A princesa de Guermantes, Sr. de Charlus e os Verdurin, Morte de minha
avó, As intermitências do coração, Os ‘Vícios e Virtudes’ de Pádua e Combray, Sra. de Cambremer, Casamento
de Robert de Saint-Loup, A adoração perpétua”.
43
Em ambos os casos, não encontramos menção à personagem de Albertine, ausente no
projeto. Contudo, ainda em 1913, antes mesmo da publicação de Côté de chez Swann, Proust
adiciona uma frase a esse romance que irá antecipar o impacto que a cena vista em
Montjouvain entre Mlle. Vinteuil e sua amiga terá na vida do herói. Segundo Yoshikawa:
Chose importante au point de vue de l´historique de la Recherche, alors que
la première phrase d´anticipation sur le sadisme figurait déjà dans la
dactylographie de Swann (1911-1912), la deuxième (‘On verra plus tard
[...]’) concernant La prisonnière n´a été introduite qu´au dernier moment
avant la publication de Swann, seulement après le mois d´août 1913. (1978,
p. 16)64
O crítico refere-se à frase “On verra plus tard que, pour de tout autres raisons, le
souvenir de cette impression devait jouer un rôle important dans ma vie” 65 que encerra a cena
de Montjouvain e as considerações do narrador-herói a respeito da idéia de sadismo revelada
por esse episódio de relação homossexual entre as duas jovens. Empregando o mesmo recurso
utilizado repetidamente na Recherche, Proust, em um acréscimo tardio, anuncia os
desdobramentos dessa situação em agosto de 1913. Essa data tornou-se o marco da invenção
da história de Albertine que como sabemos, irá declarar sua amizade com Mlle. Vinteuil,
fazendo com que o protagonista desconfie de sua sexualidade e decida levá-la a Paris para
vigiá-la de perto. Essa simples frase prefigura, portanto, toda a essência da história da heroína
que será contada nos romances La prisonnière e La fugitive.
O advento da heroína foi sistematicamente associado pela crítica proustiana à história
vivida por Proust e Agostinelli, rapaz que conheceu em Cabourg e que se tornou seu
secretário, indo morar, juntamente com sua mulher, na residência do escritor em Paris. Muitos
críticos viram nessa experiência certamente traumática para o escritor – da ida a Paris à fuga
de Agostinelli que causaria, meses depois, sua morte em uma queda de avião – o estopim da
64
“Coisa importante do ponto de vista do histórico da Recherche, se a primeira frase de antecipação sobre o
sadismo já figurava na datilografia de Swann (1911-1912), a segunda concernente à Prisioneira só foi
introduzida no último momento, antes da publicação de Swann, somente após o mês de agosto de 1913”.
65
“Ver-se-á mais tarde como a lembrança dessa impressão, por motivos muito diversos, devia desempenhar
importante papel em minha vida”. (CS, p. 157; Trad., p. 204)
44
história de Albertine e o aumento colossal do projeto da Recherche que passou de três a sete
volumes.
Para mencionarmos apenas alguns exemplos, Jean Milly afirma que:
En même temps, il introduit un long épisode amoureux, inspiré, avec
masquage et transposition de sexe, par le séjour d´Agostinelli chez lui, sa
fuite et sa mort. Pour cela, il développe un personnage secondaire de jeune
fille, déjà présent depuis 1913 dans les brouillons, et figurant dans un groupe
d´adolescentes rencontrées au bord de la mer. (1984, p.191)66
Fica evidente a leitura do crítico, que vislumbra no esqueleto da história de Albertine,
uma transposição da experiência realmente vivida por Proust, e na heroína uma transferência
de Agostinelli. Há ainda outros críticos que partilham dessa mesma opinião, como
Compagnon: “On sait qu'il fallut la mort d'Alfred Agostinelli, modèle d'Albertine, pour que
toute cette partie de la Recherche prenne forme dans le plan qui est le sien après la
guerre” (1996, p.85)67 e até mesmo Tadié que, grosso modo, distancia-se da aproximação
entre a vida e a obra de Marcel Proust: “Tout à coup, à partir du jour de mai 1913 où Proust
loge et prend comme secrétaire Alfred Agostinelli, elles [vida e obra] deviennent
perpendiculaires, la vie se met en travers de l´oeuvre” (1987, p. LXXXIII)68.
É incontestável a tristeza e desolação que esse episódio causou no escritor – “J´aimais
vraiment Alfred. Ce n´est pas assez de dire que je l´aimais, je l´adorais. Et je ne sais pourquoi
j´écris cela au passé car je l´aime toujours” (Corresp., t. XIII, p. 311)69 – e não pretendemos
desconsiderar o papel que sua vida desempenhou na composição de sua obra, um dos temas
que analisaremos no quarto capítulo. Todavia, cremos ser arriscado atribuir apenas a esse
66
“Ao mesmo tempo, ele introduz um longo episódio amoroso inspirado, mascaradamente e com transposição de
sexo, na estada de Agostinelli em sua casa, sua fuga e sua morte. Por essa razão, ele desenvolve um personagem
de moça secundário, já presente nos rascunhos desde 1913, figurando em um grupo de adolescentes encontradas
à beira mar”.
67
“Sabe-se que foi preciso a morte de Alfred Agostinelli, modelo de Albertine, para que toda essa parte da
Recherche tomasse forma em seu plano após a guerra”.
68
“De repente, a partir de maio de 1913, quando Proust aloja e contrata como secretário Alfred Agostinelli, elas
[vida e obra] tornam-se perpendiculares, a vida se mete de atravessado na obra”.
69
“Amava realmente Alfred. Não é suficiente dizer que o amava, o adorava. E não sei por que escrevo isso no
passado, pois ainda o amo”. Carta escrita a Reynaldo Hahn em 1914.
45
episódio vivido, toda a elaboração da história de Albertine. Kazuyoshi Yoshikawa parece ser
um dos poucos proustianos a relativizar a força da vida na construção da heroína:
La première rencontre avec Agostinelli à Cabourg dans l'été 1907, les
retrouvailles à Paris plusieurs années plus tard (en janvier 1913) et
l'installation d'Agostinelli comme chauffeur puis comme secrétaire, le
deuxième séjour avec lui à Cabourg durant cet été 1913, le brusque retour à
Paris, la fuite d'Agostinelli pour la Côte d'Azur en décembre 1913, sa chute
de l´avion le 30 mai 1914, tout cela ressemble curieusement à l´histoire d
´Albertine dans le roman. (1976, p. 35)70
Embora o crítico japonês não refute a aproximação feita entre Agostinelli e Albertine e
se mostre sensível a esse curioso entrelaçamento, ele percebe que só conseguimos fazer essa
leitura ao revés, ou seja, só estabelecemos esses liames após a leitura da obra de Proust.
Toda essa experiência vivida pelo escritor acaba sendo impregnada pela história de
Albertine e agenciada por elementos próprios à literatura e não à vida. Só podemos recontar a
história de Proust e Agostinelli, a qual ignoramos completamente, pelo menos no seu nível
psicológico, por meio da história fictícia de Marcel e Albertine, procedimento, no mínimo,
anti-proustiano.
Preferimos analisar essa expansão do projeto romanesco de Proust a partir de
implicações propriamente literárias que o advento da história de Albertine propiciaria ao
conjunto da Recherche. Com relação ao tema – o amor, o ciúmes e as suspeitas, o controle da
amada, seguido da fuga e da morte da jovem –, já o encontramos, de maneira extremamente
condensada, na novela “Fin de la jalousie” publicada em Les plaisirs et le jours. Esse texto,
dividido em três partes e escrito muito antes do encontro de Proust e Agostinelli – sua
publicação data de 1896 – carrega todo o desenvolvimento que o escritor fará com relação ao
amor na Recherche.
70
“O primeiro encontro com Agostinelli em Cabourg, no verão de 1907, os reencontros em Paris vários anos
mais tarde (em janeiro de 1913) e a instalação de Agostinelli como motorista, depois como secretário, a segunda
estada com ele em Cabourg durante o mesmo verão de 1913, o brusco retorno a Paris, a fuga de Agostinelli para
a Côte d´Azur em dezembro de 1913, sua queda de avião em 30 de maio de 1914, tudo isso se assemelha
curiosamente à história de Albertine dentro do romance”.
46
O casal Honoré e Françoise, guardadas as devidas proporções, prefigura Marcel e
Albertine, notadamente no que tange à peripécia da relação amorosa. No primeiro momento,
os personagens da novela possuem um amor aparentemente inabalável, e Honoré, espelhandose em suas relações anteriores, teme que esse amor por Françoise seja tão pouco duradouro
quanto os outros. Em um momento de desespero, o personagem masculino exclama: “Mon
Dieu! mon Dieu! faites-moi la grâce de l´aimer toujours” (Pl. et J., p. 237)71.
Mas, em um segundo momento, a partir de um comentário feito por M. de Buivres a
respeito da reputação de Françoise, Honoré passa a desconfiar de sua amada e a desenvolver o
sentimento tão caro à obra proustiana, o ciúmes. Essa cena estabelece um paralelo com o
episódio da Recherche no qual Cottard, fazendo uma consideração sobre a dança entre
Albertine e Andrée, desperta no protagonista os mesmos sentimentos de desconfiança, mas,
desta vez sobre a sexualidade da jovem:
“(...) Tenez, regardez”, ajouta-il en me montrant Albertine et Andrée qui
valsaient lentement, serrées l´une contre l´autre, “j´ai oublié mon lorgnon et
je ne vois pas bien, mais elle sont certainement au comble de la jouissance.
On ne sait pas assez que c´est surtout par les seins que les femmes l
´éprouvent. Et voyez, les leurs se touchent complètement.” En effet, le
contact n´avait pas cessé entre ceux d´Andrée et ceux d´Albertine. (...)
Andrée dit à ce moment un mot à Albertine et celle-ci rit du même rire
pénétrant et profond que j´avais entendu tout à l´heure. Mais le trouble qu´il
m´apporta cette fois ne me fut plus que cruel. (SG, p. 191)72
No texto de Os Prazeres e os dias, a partir dessa soirée em que Honoré ouve um
comentário excessivamente maldoso sobre sua amante – “(...) il y avait ce soir quelqu´un qui
se l´est payée, je crois que c´est incontestable, c´est ce petit François de Gouvres. (...) Je parie
que pas plus tard qu´en ce moment elle fait la noce quelque part” (Pl. et J., p. 239) 73 – uma
71
“Meu Deus! Meu Deus! Conceda-me a graça de amá-la sempre”.
“‘(...) Repare’, acrescentou, designando-me Albertine e Andrée, que valsavam lentamente, apertadas uma a
outra, ‘eu esqueci meu pincenê e não vejo muito bem, mas elas estão certamente no cúmulo do gozo. Não se
sabe bastante que é principalmente pelos seios que as mulheres o experimentam. E veja como os delas se tocam
completamente’. Com efeito, não havia cessado o contato entre os seios de Andrée e os de Albertine. (...) Andrée
disse naquele momento uma frase a Albertine e esta riu com o mesmo riso penetrante e profundo que eu ouvira
ainda há pouco. Mas a perturbação que desta vez me trouxe não me foi mais que cruel”. (Trad., p. 235).
73
“(...) nessa noite, havia alguém que a pagou, creio que é incontestavelmente esse pequeno François de
Gouvres. (...) Aposto que neste exato momento, ela faz a festa em algum lugar”.
72
47
revolução opera em sua vida, fazendo-o desejar o fim desse sentimento que só lhe trazia
desgosto e sofrimento:
(...) il priait Dieu, Dieu à qui, il y a deux mois à peine, il demandait de lui
faire grâce d´aimer toujours Françoise, il priait Dieu maintenant avec la
même force, toujours avec la force de cet amour qui jadis, sûr de mourir,
demandait à vivre, et qui maintenant, effrayé de vivre, implorait de mourir,
le priait de lui faire la grâce de ne plus aimer Françoise. (Pl. et J., p. 245)74
Essa temática amplamente desenvolvida na Recherche, a do amor aspirando antes ao
seu fim que à sua permanência, será mais detidamente tratada no terceiro capítulo, mas,
gostaríamos, por ora, de frisar que já em seus escritos de “juventude”75, Proust elabora um
tema que fundamentalmente não mudará e perpassará toda a sua obra futura.
Dando prosseguimento à análise da novela, o ciúme desencadeia a perscrutação e a
vigilância da amante – “(...) il ne quitta plus Françoise, épiant sa vie, l´accompagnant dans ses
visites, la suivant dans ces courses, attendant une heure à la porte des magasins” (Pl. et J., p.
246)76 –, atitude que traz certo apaziguamento ao protagonista, pois Honoré restabelece-se
completamente de sua angústia, acreditando ter pleno controle sobre o emprego do tempo de
Françoise. A reviravolta acontece quando, em um dia de passeio na Avenida do Bois de
Boulogne, Honoré é atropelado por um cavalo irritadiço, acidente que o força a amputar as
pernas.
Este acidente foi retomado pelo escritor para construir a morte de Albertine em uma
queda de cavalo, e embora haja aparentemente uma diferença fulcral entre os dois episódios,
pois quem morre na novela é o personagem masculino que padece do ciúme, – modificação
perfeitamente explicável, pois na Recherche a morte do herói-narrador implicaria no fim da
74
“(...) pedia a Deus, a quem há dois meses apenas, pedia para conceder- lhe a graça de amar para sempre
Françoise, pedia agora a Deus, com a mesma força, sempre a força desse amor que outrora, certo de morrer,
pedia para viver e que agora, perplexo de viver, implorava por morrer, pedia a Ele para lhe conceder a graça de
não mais amar Françoise”.
75
Utilizamos o termo “obra de juventude” ou “escritos de juventude” por não encontrarmos outro verbete que se
adéqüe ao tipo de texto referido, contudo, veremos que essa divisão categórica entre obra “de juventude” e de
“maturidade” revela-se imprópria quando se trata dos textos proustianos.
76
“(...) não largou mais Françoise, espiando sua vida, acompanhando-a em suas visitas, seguindo-a em suas
compras, esperando uma hora na porta das lojas”.
48
narração – encontramos a mesma noção de término do amor, e por conseqüência do ciúme,
atrelada à morte.
Assim como o herói da Recherche “cura-se” de seu sentimento após a morte de
Albertine, Honoré, no momento em que agoniza, nota que seu amor e seu ciúme se esvaem
com ele: “Mais il ne l´aimait pas plus et pas autrement que le médecin, que les vieilles
parentes, que les domestiques. Et c´était là la fin de sa jalousie” (Pl. et J., p. 260)77.
Observamos que a história de Albertine está totalmente vinculada aos temas
desenvolvidos antes e durante a Recherche, e que a origem da heroína e de sua história
conturbada com o protagonista aprofunda não somente a relação Swann-Odette, mas retoma
as questões amorosas, reforçando as noções da perda e do esquecimento inseridas pela morte
da avó.
Não é por acaso que a personagem da jovem concorre, nos manuscritos, com a avó do
protagonista no que tange essa questão. No caderno 53, no fólio 9vº, Proust registra: “À
propos de l´oubli de ma gd mère dont je parlerai là (en réalité c´est la mort d´Albertine qui m
´en donne l´idée mais il vaut mieux je crois mettre pour ma gd mère)”78. Albertine seria assim,
um aprofundamento desse esquecimento que se dará diferentemente para a avó.
Para a avó, o esquecimento estaria ligado a um subterfúgio do pensamento, incapaz de
recuperar um momento real vivido, substituindo-o por imagens sem importância:
(Quant à l´oubli de ma grand-mère ou j´avais vécu jusqu´ici, je ne pouvais
même pas songer à m´attacher à lui pour en tirer de la vérité ; puisqu´en lui
même il n´était rien qu´une négation, l´affaiblissement de la pensée
incapable de recréer un moment réel de la vie et obligée de lui substituer des
images conventionelles et indifférentes). (SG, p. 156-7)79
77
“Mas ele não a amava mais e de forma diferente que o médico, os velhos parentes, os criados. E era, pois, o
fim de seu ciúme”.
78
“A propósito do esquecimento de minha avó da qual eu falarei aqui (na verdade, é a morte de Albertine que me
dá a idéia, mas é melhor, creio eu, para minha avó)”.
79
“(Quanto ao esquecimento de minha avó em que eu até então vivera, nem sequer podia pensar em extrair-lhe
verdade; pois em si mesmo não passava de uma negação, da debilidade do pensamento, incapaz de recriar um
momento real da vida e obrigado a substituí-lo por imagens convencionais e indiferentes)”. (Trad., p. 196)
49
É somente no momento em que se despe no quarto de Balbec que o herói, invadido
por uma memória involuntária e tomado por uma súbita tristeza aliada à lembrança da avó,
compreende que a havia definitivamente perdido: “je ne faisais que de le découvrir parce que
je venais, en la sentant pour la première fois, vivante, véritable, gonflant mon coeur à briser,
en la retrouvant enfin, d´apprendre que je l´avais perdue pour toujours” (SG, p. 154-5)80. No
caso de Albertine, seu esquecimento é uma etapa do fim da relação amorosa, fases que
passam pela dor da perda, pelo desespero, para, finalmente, desembocarem na indiferença e
no esquecimento, mesmo que intermitente:
Je n´aimais plus Albertine. Tout au plus certains jours, quand il faisait un de
ces temps qui en modifiant, en réveillant notre sensibilité, nous remettent en
rapport avec le réel, je me sentais cruellement triste en pensant à elle. Je
souffrais d´un amour qui n´existait plus. Ainsi les amputés, par certains
changements de temps ont mal dans la jambe qu´ils ont perdue. (AD, p.
172)81
Curiosamente, essa imagem do amputado que sofre com a dor de um membro que não
existe mais já aparece na novela que viemos analisando até o momento, “La fin de la
jalousie”. Alternando entre angústia e apaziguamento, Honoré, mesmo tendo provas da
fidelidade de Françoise, é atravessado pela dor intermitente do ciúme, ilustrada pela imagem:
“Ainsi que nous tremblons encore à notre réveil au souvenir de l´assassin que nous avons déjà
reconnu pour l´illusion d´un revê; ainsi les amputés souffrent toute leur vie dans la jambe qu
´il n´ont plus” (Pl. et J., p. 242)82.
80
“Só agora o descobrira por que, ao senti-la pela primeira vez viva, verdadeira, enchendo meu coração até
afogá-lo, reencontrando-a enfim, eu acabava de saber que a tinha perdido para sempre”. (Trad., p. 194)
81
“Não amava mais Albertine. No máximo, em certos dias, quando fazia um desses tempos que modificando,
despertando nossa sensibilidade, recoloca-nos em relação com o real, eu me sentia cruelmente triste pensando
nela. Sofria de um amor que não mais existia. Da mesma maneira, os amputados, por certas mudanças de tempo,
sentem dor na perna que perderam”. Este período não consta na tradução brasileira, provavelmente por que ela
se baseou em uma versão não revisada e acrescida da Recherche. Damos, no entanto, a referência das páginas da
tradução para eventuais consultas do leitor: (Trad.,164-5).
82
“Da mesma forma que ainda trememos em nosso despertar ao recordar o assassino que já reconhecemos ser a
ilusão de um sonho, assim os amputados sofrem a vida toda da perna que não têm mais”.
50
Isso reforça nossa análise de que esse texto precoce foi a base para o desenvolvimento
da história de Albertine e dos temas vinculados a ela, demonstrando que não foi somente a
situação vivida entre Proust e Agostinelli que originou essa parcela narrativa da Recherche.
Outro fator importante é a nota na Caderneta 1, editada por Philip Kolb como Le
Carnet de 1908, na qual Proust registra o seguinte projeto de plano: “Dans la 2e partie du
roman la jeune fille sera ruinée, je l'entretiendrai sans chercher à la posséder par impuissance
du bonheur” (Carnet 1, 1976, fº 3rº) e, no fólio seguinte, acrescenta outra nota análoga: “dans
la seconde partie jeune fille ruinée, entretenue sans jouir d´elle (...) par impuissance d´être
aimé. Chartres” (fº 3vº)83.
Embora Kolb tenha dado a essa primeira caderneta o nome de Le Carnet de 1908, data
na qual Proust inicia o projeto Sainte-Beuve que consta massivamente nas notas dessa
caderneta, sabe-se que nem todas elas foram escritas na mesma época. Ignoramos, portanto, se
essa anotação foi feita em 1908 ou se é posterior a esse ano. O que nos importa é observar que
esse plano prefigura, em linhas gerais, a história de Albertine e Marcel, mostrando que Proust
já vislumbrava essa narrativa muito antes do aparecimento da Guerra, pois o uso das
cadernetas limita-se à primeira fase de escritura do romance (1909-1911).
A Guerra foi outro componente que desempenhou um papel considerável na expansão
do projeto da Recherche, sendo utilizada como matéria literária, propiciando, deste modo,
mudanças expressivas no desenvolvimento dos romances. Em uma carta a Gaston Gallimard,
futuro editor da obra, Proust pontua:
Mais depuis, les conversations stratégiques qui ont si je me rapelle bien
parus dans l´extrait que j´ai donné dans la N.R.F. (je n´en suis pas sûr, en
tout cas c´est entre Robert de Saint-Loup et ses amis officiers) (tout cela écrit
bien entendu quand je ne me doutais pas qu´il y aurait la guerre, aussi bien
que les conversations de Françoise sur la guerre dans le premier volume) m
´ont amené à faire à la fin du livre un raccord, à introduire non pas la guerre
83
“Na 2ª parte do romance, a jovem estará arruinada, eu a sustentarei sem buscar possuí-la por impossibilidade
de felicidade” (3rº); “na segunda parte, jovem arruinada, sustentada sem desfrutar dela (...) por impossibilidade
de ser amado. Chartres.” (3vº).
51
même mais quelques-uns de ses épisodes, et M. de Charlus trouve d´ailleurs
son compte dans ce Paris bigarré de militaires comme une ville de
Carpaccio. (Corresp., t. XV, p. 132)84
A Guerra não forneceu somente tempo para o escritor expandir seu projeto, uma vez
que não podia publicá-lo durante esse período, mas lhe serviu de matéria literária, levando-o
mesmo a reestruturar a obra, coadunando os volumes. A cidade de Combray, situada próxima
a Chartres, será deslocada para perto de Reims, ficando, assim, mais próxima da guerra, para
posteriormente, mostrá-la devastada pelo bombardeio85.
Não esqueçamos ainda a bela metáfora da fabricação do livro comparada à estratégia
de guerra traçada por um general: “Un general est comme un écrivain qui veut faire une
certaine pièce, un certain livre, et que ce livre lui-même, avec les ressources inattendues qu´il
révèle ici, l´impasse qu´il présente là, fait dévier extrêmement du plan préconçu” (TR, p.
341)86. Imagem por meio da qual vislumbramos a construção literária, seu caráter incerto e
instável que foi o da própria composição da Recherche, com seu “desvio” considerável
engendrado não somente pela história de Albertine, mas pelos episódios trazidos pela guerra.
Além disso, devemos destacar que a história da heroína encaixava-se no ciclo Sodoma
e Gomorra, e que somente em 1922 Proust decide colocar os títulos La prisonnière e La
fugitive: “(...) j´ai repensé à ce que m´a dit Tronche et j´ai pensé que je pourrais peut´être
intituler Sodome III la Prisonnière et Sodome IV la Fugitive quitte à ajouter sur le volume
(Suite de Sodome et Gomorrhe)”. (Corresp., t. XXI, p. 310-11)87. Com relação a esse ciclo,
84
“Mas desde as conversas estratégicas que foram publicadas, se me lembro bem, em um trecho que dei a N.R.F.
[Nouvelle Révue Française] (não estou certo, em todo caso, é entre Robert de Saint-Loup e seus amigos oficiais)
(tudo isso naturalmente escrito quando eu não suspeitava que houvesse guerra, bem como as conversas de
Françoise sobre a guerra no primeiro volume) levaram-me a fazer um ajustamento no final do livro, a introduzir
não a guerra, mas alguns de seus episódios, e o Sr. de Charlus encontra, aliás, seu proveito nessa Paris variegada
de militares como uma cidade de Carpaccio”.
85
Dado fornecido por Nathalie Mauriac Dyer em palestra no curso Génétique des texte et des formes ocorrido
em Paris, na École Normale Supérieure, no segundo semestre de 2008.
86
“Um general é como um escritor que quer fazer certa peça, certo livro, e esse mesmo livro, com recursos
inesperados que revela aqui, o impasse que apresenta ali, faz desviar extremamente do plano pré-concebido”.
Esse trecho não consta na tradução brasileira. Trad., p. 60-1.
87
“(...) repensei naquilo que me disse Tronche e pensei que poderia talvez intitular Sodoma III a Prisioneira e
Sodoma IV a Fugitiva, com o risco de acrescentar sobre o volume (Sequência de Sodoma e Gomorra)”. Carta a
Gaston Gallimard, enviada em 1922. Proust renuncia ao título A fugitiva depois que o escritor indiano
Rabindranath Tagore, prêmio Nobel em 1913, publica, em 1921, um romance com o mesmo título, traduzido
52
presente desde o anúncio feito em 1913, o escritor considera-o “uma audaciosa verdade de
pintura”, embora menos grave e profundo do que o último volume.
Em outra carta a
Gallimard, escrita em 1916, o autor, buscando alertá-lo dos riscos que correria ao aceitar
publicar seu livro, afirma:
Mon livre (plus long que je ne m´en rendais compte moi-même) comporte
un volume que d´après le vers de Vigny (La femme aura Gomorrhe et l
´homme aura Sodome) j´intitule Sodome et Gomorrhe. Ce volume n´est
certes ni la fin, ni la conclusion du livre, autrement grave et je crois
profonde. Mais enfin il a son importance (vous en avez vu l´amorce dans la
N.R.F. par le personnage de M. de Charlus). Or, sans aucune intention
immorale, ai-je besoin de vous le dire, il est de la plus complète et plus
audacieuse vérité de peinture. (Corresp., t. XV, p. 130)88
Essa série, de cunho mais romanesco do que propriamente filosófico, foi uma das
partes mais superalimentadas pelo escritor, na qual não apenas a história de Albertine
forneceu-lhe o tom, mas também a de Charlus e Morel, este último considerado como um
duplo da heroína.
Todo esse ciclo que, embora esteja aparentemente restrito apenas ao romance que
porta seu nome, estende-se aos últimos volumes da Recherche, no qual o narrador-herói não
cessa de fazer descobertas a respeito da sexualidade dos personagens, como Saint-Loup; e
Proust, mesmo antevendo os prováveis problemas que acarretariam essa pintura, não abria
mão desse projeto, tampouco o mudaria a pedido do editor: “(...) si je me sens plus de devoirs
envers vous qu´envers Grasset, je me sens plus (...) de devoirs envers mon oeuvre qu´envers
vous” (Corresp., t. XV, p. 131)89.
Em suma, se a história de Albertine proporciona certo desvio no tocante ao primeiro
projeto da Recherche, é antes pelo acúmulo de texto e escritura incessante, do que pela
para o francês somente em 1922. O título Albertine disparue constará nas datilografias que Proust corrigiu pouco
antes de falecer.
88
“Meu livro (maior do que eu mesmo supunha) comporta um volume que, segundo o verso de Vigny (A mulher
terá Gomorra e o homem terá Sodoma), intitulo Sodoma e Gomorra. Esse volume não é nem o fim, nem a
conclusão do livro, diferentemente grave e acredito eu, profunda. Mas, enfim, ele tem sua importância (você viu
o trecho na N.R.F. do personagem do Sr. de Charlus). Ora, sem nenhuma intenção imoral, preciso te dizer que se
trata da mais completa e mais audaciosa verdade de pintura”.
89
“(...) Se me sinto com mais obrigações com relação a você do que com Grasset, sinto-me com mais obrigações
com relação à minha obra do que com você”.
53
invenção da heroína e sua história que, como analisado anteriormente, provém de outros
projetos literários, integrando-se ao conjunto da obra proustiana, não sendo, portanto, uma
“excroissance”90 literária.
1.2 Os cadernos de Albertine
Dando prosseguimento à discussão sobre o nascimento da personagem Albertine,
concentremo-nos, neste tópico, no aparecimento de seu nome nos manuscritos, bem como nos
cadernos usados para a elaboração dessa história. Segundo Jean Milly:
Le nom d´Albertine apparaît pour la première fois dans une note tardive, que
l´on situe entre avril et août 1913, du cahier 13 (fº 28rº) : il s´agit d´un plan
pour une 2e année à Balbec, au cours de laquelle le héros fait, par l
´intermédiaire d´un peintre, connaissance de jeunes filles et tombe amoureux
de l´une d´elles, nommée d´abord Maria, puis, après rature, Albertine. (1984,
p. 12)91
Embora o caderno 13 tenha sido em geral usado na composição dos episódios do
último volume, como o “L´Adoration perpétuelle” e o “Bal de têtes”, ele possui igualmente as
duas estadas em Balbec que, posteriormente, irão se fundir no caderno 4692. Para se ter uma
idéia do papel que a história da heroína desempenhará na escrita proustiana, resumimos, pelas
palavras de Bernard Brun, os cadernos utilizados nesse processo de elaboração da
personagem:
Précisons la liste des cahiers pour Albertine, à partir de son invention en
1913, et des travaux de Nathalie Mauriac Dyer: Cahier 71 (“Dux” en 1913),
54 (“Vénusté” en 1914), 46 (deuxième séjour à Balbec), 72, 53, 73, 55 et 56,
74 et 57 (notes). Ces brouillons seront repris dans le manuscrit au net.
(2008)93
90
Termo usado por Albert Feuillerat, citado por Nathalie Mauriac Dyer no artigo “Proust Procuste: les fins
disjointes d´À la recherche du temps perdu”.
91
“O nome de Albertine aparece pela primeira vez em uma nota tardia que situam entre abril e agosto de 1913,
do caderno 13 (fº 28rº): trata-se de um plano para o 2º ano em Balbec, no curso da qual o herói, por intermédio
de um pintor, conhece jovens moças e se apaixona por uma delas, nomeada primeiramente Maria, e após rasura,
Albertine”.
92
Ainda nessa época, Proust vislumbrava a escrita de três estadas em Balbec, que se fundem, formando as
journées que conhecemos atualmente.
93
“Precisemos a lista de cadernos para Albertine a partir de sua invenção em 1913 e dos trabalhos de Nathalie
Mauriac Dyer: Caderno 71 (‘Dux’ em 1913), 54 (‘Vénusté’ em 1914), 46 (segunda estada em Balbec), 72, 53,
54
É notável a quantidade de documentos dedicados à construção dessa heroína que
certamente expandiu o texto da Recherche, tornando-se um dos personagens essenciais da
obra proustiana. O escritor, em uma carta-dedicatória enviada a Sra. Scheikevitch em
novembro de 1915, reconhece tal valor: “J´aimerais mieux vous présenter les personnages que
vous ne connaissez pas encore, celui surtout qui joue le plus grand rôle et amène la péripétie,
Albertine” (Corresp., t. XIV, p.281)94.
Discorrendo sucintamente sobre alguns desses documentos, o caderno 71, chamado de
“Dux” pelo escritor, contém, em linhas gerais, a narrativa da terceira estada em Balbec e a
relação do herói com Albertine. Curiosamente, Proust elabora o desgaste da relação e a
provável ruptura do casal, antes mesmo da construção da vida em comum com a jovem em
Paris. Conforme Shuji Kurokawa:
Sur les folios 31 rº à 32 vº Proust ébauche une scène où Albertine demande
pour la première fois au héros de ne plus la voir; le héros feint d'accepter et
sous prétexte de régler de menus détails, s'efforce de prolonger leurs
relations. Il est significatif que la scène se place au cours du séjour à Balbec.
C'est que les relations entre les protagonistes sont déjà très tendues sans
atteindre le point de rupture, comme le montre la scène de la querelle avec
Albertine, intercalée au beau milieu de la première partie (ffos 16ro à 21rº).
(1992, p. 66)95
No fólio 69vº, Proust registra: “Qd elle me quitte la 1re fois (?) la veille au soir, je
voulus la garder encore je lui dis cela ne vous ennuie pas de rester près de moi.” (C.71, fº
69vº)96. Esse desenvolvimento que, aos olhos do leitor da Recherche parece precipitado, seria
segundo Kurokawa uma transposição fiel da intriga desenvolvida no caderno 64, o “cahier
rouge”. Embora não faça parte do conjunto de documentos utilizados para a construção da
73, 55 e 56, 74 e 57 (notas). Esses rascunhos serão retomados nos manuscritos de mise au net”.
94
“Gostaria mais de te apresentar os personagens que você ainda não conhece, sobretudo este que desempenha o
maior papel e conduz a peripécia, Albertine”.
95
“Nos fólios 31rº a 32vº, Proust esboça uma cena na qual Albertine pede pela primeira vez ao herói para não
vê-la mais; o herói finge aceitar e sob pretexto de resolver pequenos detalhes, esforça-se para prolongar a
relação. É significativo que a cena se coloque ao longo da estada em Balbec. É que as relações entre os
protagonistas já estão muito tensas, sem atingir o ponto de ruptura, como o mostra a cena da querela com
Albertine, intercalada bem ao meio da primeira parte (fos 16rº a 21rº).
96
“Quando ela me deixa a 1ª vez (?) na véspera, à noite, quis ainda mantê-la, digo-lhe, isto não te aborrece de
permanecer perto de mim”. Transcrição feita por Shuji Kurokawa.
55
história de Albertine, esse caderno desenvolve, fundamentalmente, as estadas na cidade
balneária de Balbec, ainda chamada de “Querqueville”, colocando o protagonista em contato
com diversas jovens. Logo no primeiro fólio, temos o seguinte texto:
Solange
Je revis une fois ou deux Maria seule mais elle
était peu aimable. Du reste elle avait à ce moment-là Je
ne sentais aucun rapprochement réel possible entre nous et
d’ailleurs elle avait sa peau rose très couperosée en ce moment, ce
qui la rendait peu désirable. Mais j’espérais par elle connaître ses autres amies. Cela arriva au bout de peu de
temps. Une seule me partait dès que j’arrivais c’était
Maria mais Soit que
soit que
elle n’y mettait
pas un extrême empressement. Départ d’Alberte (voir
plus haut). (C.64, fº 2rº)97
Mesmo substituindo o nome Maria por Albertine no caderno 13, Proust ainda hesita
entre eles que ora designam personagens distintos, ora fundem-se em um só. Para Yoshikawa:
On sait que l´Albertine de Balbec est née d´une Maria qui jouait dans les
brouillons le même rôle que la future Albertine. (...) Mais, ne voir en
Albertine qu´une simple substitution au personnage de Maria serait aller en
peu trop loin ; car on voit ici une coexistence de ces deux personnages
apparemment distincts. (1976, p. 59)98
Isto se torna claro na leitura do fólio 2rº do caderno 64, pois o nome “Maria” reaparece
duas vezes, ainda que rasurado. Outro fato importante a ser frisado é a menção do nome
“Alberte”, uma espécie de abreviatura de Albertine. Verificamos que muitos críticos vêem em
Agostinelli um modelo para a heroína proustiana, todavia, se há um modelo, este seria
precisamente literário. O nome “Alberte” é utilizado para designar a protagonista da novela de
Barbey d´Aurevilly, “Le rideau cramoisi”, tema que será detalhadamente discutido no terceiro
capítulo. Por ora, mencionamos uma das semelhanças entre essas duas personagens, seu
97
“Revi uma ou duas vezes Maria <Solange> sozinha, mas ela era pouco amável. De resto, ela tinha nesse
momento Não sentia nenhuma aproximação real possível entre nós e, além disso, ela tinha a pele rosa, muito
atacada de roséola nesse momento, o que a deixava pouco desejável. Mas eu esperava, por meio dela, conhecer
suas outras amigas. Isto aconteceu ao cabo de pouco tempo. Uma só me partia assim que eu chegava era Maria,
mas Seja que
seja que
ela não dava uma extrema solicitude. Partida de Alberte (ver mais acima)”.
Transcrição feita por Françoise Leriche.
98
“Sabemos que a Albertine de Balbec nasceu de uma Maria que desempenhava nos rascunhos o mesmo papel
que a futura Albertine. (...) Mas, ver em Albertine apenas uma simples substituição ao personagem de Maria
seria ir longe demais, pois vemos aqui uma coexistência dessas duas personagens aparentemente distintas”.
56
caráter viril. Sem adiantar a comparação que será feita posteriormente, evocamos apenas o
fólio 89vº do caderno 71, no qual Proust assinala:
Même en certaines circonstances, elle montrait une dignité, une noblesse,
une franchise d´homme. Et par moments j´en étais même malheureux, ces
qualités viriles me semblaient tout d´un coup une argu présomption de plus
de son vice sapphique. (C.71, fº 89vº)99
Proust não retomará essa passagem em outros manuscritos aos quais tivemos acesso, e
como sabemos, o caráter “sáfico” de Albertine será antes sugerido pelas desconfianças do
herói-narrador, do que pelas qualidades da jovem em si, entretanto, esse excerto poderia
indicar um sinal de intertextualidade com Barbey d´Aurevilly, escritor que será tema da
discussão literária entre Marcel e Albertine em La prisonnière e que aparece como modelo
literário no Carnet 1, como veremos posteriormente.
Retornando ao caderno 71, a ruptura desenha-se gradativamente, deixando, no entanto,
poucas explicações a respeito das suspeitas do herói. Proust inventa, portanto, um elemento
decisivo que confirmará as suspeitas e dará outros contornos à história, a amizade entre
Albertine e Mlle. Vinteuil.
O escritor desenvolve, com isso, boa parte da história de Albertine, passando, primeiro
pelo caderno 54, no qual desenvolve a fuga e a morte da heroína – atitude que leva os críticos
a fazerem, inevitavelmente, a ligação entre a morte de Albertine e Agostinelli, visto que ele
morre em 1914, data da escritura desse rascunho – elaborando, posteriormente, no caderno 46,
a segunda estada em Balbec, na qual se passa o célebre episódio da “Danse contre seins” entre
Andrée e Albertine.
Após esse percurso, Proust começa a desenvolver a vida em comum do protagonista
com a jovem em Paris, servindo-se dos cadernos 53, 73 e 55, que comportam
99
“Mesmo em certas circunstâncias, ela mostrava uma dignidade, uma nobreza, uma franqueza de homem. E, em
alguns momentos, ficava até mesmo infeliz com isso, suas qualidades viris pareciam-me de repente uma argu
presunção a mais de seu vício sáfico”.
57
respectivamente: a vida em comum com Albertine e o ciúmes do herói; a soirée Verdurin e,
finalmente, a vida em comum com a jovem, sua fuga e morte.
Em meio a essa miríade de documentos – dez cadernos de rascunho mais oito de mise
au net (cadernos VIII a XV) – dedicados à história de Albertine, analisamos apenas dois, os
cadernos 53 e 55, que embora correspondam a uma pequena parcela da composição da
heroína, possuem todos os núcleos correspondentes a sua história. Esses cadernos, juntamente
com o 56 e 57, formam um manuscrito mais ou menos contínuo do Sodoma e Gomorra ao
Tempo redescoberto, sendo, em certa medida, muito próximos dos textos publicados.
Restringimo-nos aqui ao breve resumo dos cadernos 53 e 55, que serão pormenorizados nos
próximos capítulos100.
No tocante ao caderno 53, ele foi escrito por volta de 1915 e dedicado à elaboração do
romance La prisonnière, pois, diferentemente dos documentos que o antecederam, concentra
na maior parte de seus fólios a vida em comum do protagonista com a heroína. Seu início é
verossimilmente uma continuação de outro caderno, pois dá seqüência a um diálogo entre o
herói e Albertine, que revela, neste momento, conhecer Mlle. Vinteuil: “que j´espère retrouver
à Amsterdam, dans q.q. mois, en m´embar[quant] près d´ici, eh ! bien, regardez comme c´est
extraordinaire, c´est précisé[ment] la fille propre fille de Vinteuil »” (C.53, fº 1rº)101. Neste
trecho, que contém ainda um resquício da personagem Maria, a holandesa, Albertine é ligada
à Holanda e à cidade de Amsterdã, características que perpassam todo o caderno, sendo
posteriormente abandonadas pelo escritor.
Embora o início do cahier seja truncado, pois há muitas folhas ausentes, arrancadas e
coladas em outros documentos102, percebemos que se trata do término de Sodoma e Gomorra,
100
Para mais detalhes, ver Inventários dos respectivos cadernos feitos pela equipe Proust de Paris e localizados
no Anexo A.
101
“que espero reencontrar em Amsterdã, dentro de alguns meses, embarcando próximo daqui, eh! Veja, é
extraordinário, é precisamente a filha própria filha de Vinteuil’”.
102
Muitos desses fólios foram encontrados por Nathalie Mauriac Dyer e “recolocados” em seus lugares de
origem para a edição do caderno que será feita pela editora belga Brépols e que constará de dois volumes, um
contendo a transcrição e outro os fac-símiles.
58
quando o narrador-herói conduz a jovem a Paris (1rº-11vº). Do fólio 12rº em diante, Proust
desenvolve os episódios concernentes ao romance La prisonnière, concentrando-se na
presença de Albertine na vida do protagonista, nos passeios da jovem, nos devaneios do herói
desencadeados pela visão das jovens moças, em seu desejo de ir a Veneza e nos “hieróglifos”
da heroína que começam a ser decifrados.
Todos esses textos, ainda que pertencentes ao mesmo romance, são compostos de
forma fragmentada, ou seja, correspondem a unidades textuais que, nesse estado da
construção, possuem pouca articulação entre si. Somente em etapas posteriores, nos cadernos
de mise au net, o escritor recolhe alguns desses textos, coordenando-os com textos de outros
cadernos. Nos dizeres de Bernard Brun:
Un travail constant de relecture et de réécriture simultanées permet à Proust
un double mouvement: enrichissement des cahiers (de brouillon ou de
manuscrit) par ‘surnourriture’, ‘ajoutage’ des correspondances avec les
autres brouillons de la même époque, correspondant au même état du texte,
ou avec les volumes en cours de publication. (2008)103
Veremos no terceiro capítulo como esse procedimento de correspondência ocorre entre
os documentos, mas, no momento, frisamos que é com esse trabalho simultâneo dos cadernos
que Proust constrói a unidade de seus romances, enriquecendo os textos por acréscimos,
construindo ecos e repetições que formam verdadeiros fechamentos intermediários.
Para analisar o caderno 53, devemos inevitavelmente citar outros documentos que
elaboravam a história da heroína, bem como de outros manuscritos que prefiguravam, de uma
forma ou de outra, a arquitetônica dessa narrativa. Os cadernos 47, 48 e 50, por exemplo, não
eram destinados à construção da narrativa de Albertine, entretanto, continham passagens que
seriam incorporadas à história da jovem. Yoshikawa, cuja tese versou sobre essa gênese
103
“Um trabalho constante de releitura e reescritura simultâneas permite a Proust um duplo movimento:
enriquecimento dos cadernos (de rascunho ou manuscritos) por ‘superalimentação’, ‘acréscimo’ das
correspondências com outros rascunhos da mesma época, referindo-se ao mesmo estado do texto, ou com os
volumes em vias de publicação”. Brun faz a distinção entre “brouillon” (rascunho) e “manuscrit”, o primeiro
aludindo aos 75 cadernos e o segundo referindo-se propriamente aos manuscritos de mise au net que possuem
estados mais contínuos e articulados do romance.
59
afirma: “Quant à la partie qui se situait entre Guermantes et Le temps retrouvé (partie qui
concerne justement la genèse de La prisonnière), il disposait de deux cahiers qui se suivent
(cahiers 47 et 48), et d´un autre (cahier 50), tous écrits, nous semble-t-il, vers
1910-1911” (1976, p. 20-1)104.
Resumidamente, o caderno 47 já possuía o episódio da volta de Brichot e do
protagonista da soirée Verdurin, reunião focalizada na figura do barão de Charlus. Esse
mesmo manuscrito contém a morte da avó, episódio que continua a ser escrito no caderno 48,
que, por sua vez, possui o devaneio sobre Veneza suscitado não pelo vestido de Fortuny, mas
pela leitura do jornal que anuncia a ida de Madame Putbus à Veneza.
O caderno 50 desenvolve a viagem à Itália, que nesse momento, não se restringe
apenas a Veneza, abarcando igualmente Pádua e Milão. Nesse manuscrito, Proust desenvolve
a conversa com a camareira de Madame Putbus e o diálogo sobre as experiências amorosas da
moça. Há ainda a elaboração das ressurreições da avó, demonstrando que o episódio de
Veneza basculava, naquela época, entre as lembranças da avó e a conquista da camareira de
Madame Putbus.
Percebemos a partir dessas informações que Proust retoma fragmentos desses cadernos
para compor a narrativa da história de Albertine, incorporando-a, assim, ao conjunto de textos
escritos antes mesmo de sua invenção.
Nas palavras de Bernard Brun:
Albertine est ainsi redistribuée dans tous les volumes, à partir de la création
du personnage : dans À l'ombre des jeunes filles en fleurs (deuxième partie),
dans Le Côté de Guermantes, etc. La fin de la rédaction du manuscrit correspond en effet au début du travail de publication du deuxième volume
(Jeunes Filles). Il suffisait à Proust de relire et de réadapter chaque volume
au grand développement du roman, dans un mouvement de va-et-vient; tout
comme il faut que les chercheurs qui étudient brouillons et manuscrits les
104
“Quanto à parte que se situava entre Guermantes e O tempo redescoberto (parte que concerne justamente à
gênese da Prisioneira), ele dispunha de dois cadernos que se seguem (cadernos 47 e 48) e de outro (caderno 50),
todos escritos, nos parece, por volta de 1910-1911”.
60
lisent, non seulement dans le sens du récit, mais dans le sens de l'histoire du
texte. (2008)105
O desenvolvimento da história de Albertine implicou, portanto, em uma reintegração
das partes, proporcionando mudanças em todo o conjunto da Recherche. Longe de ser uma
personagem restrita aos romances La prisonnière e Albertine disparue, a heroína toma
dimensões gigantescas, tanto em sua participação na narrativa como nos cadernos de
rascunho.
Com relação ao caderno 55, dos fólios 9rº a 46rº, Proust continua a desenvolver a vida
comum do herói com a amada, passando a elaborar, do fólio 46rº em diante, uma seção que se
tornará Albertine disparue.
No que diz respeito ao ano de sua produção, Yoshikawa baseado em uma cartadedicatória enviada à Madame Scheikévitch, data o caderno de 1915, pois Proust utiliza,
como texto para a dedicatória, todo um pedaço desenvolvido nos manuscritos. Segundo o
crítico japonês:
On sait que l´écrivain parle longuement à Mme. Scheikévitch de l´histoire d
´Albertine, surtout de ce qui deviendra La Fugitive, dans une dédicace écrite
sur l'exemplaire de Swann, qu'il lui a envoyé en novembre 1915. Le texte de
cette dédicace, lorsqu´il raconte le chagrin et l´oubli après la fuite
d'Albertine, n´est pas un résumé, ni un plan projeté pour l'avenir, mais en
réalité un choix de textes qui correspondent à peu près à treize passages de
La fugitive. Et nous avons constaté que cette citation avait été faite, non pas
d'après le Manuscrit au net (qui constitue l'état final en ce qui concerne la
Fugitive), mais d´après la version des Cahiers 55 et 56. (1976, p. 8-9)106
105
“Albertine é desse modo, redistribuída em todos os volumes, a partir da criação da personagem: em À sombra
das raparigas em flor (segunda parte), em O caminho de Guermantes, etc. O fim da redação do manuscrito
corresponde, na verdade, ao início do trabalho de publicação do segundo volume (Raparigas em flor). Bastava
ao escritor reler e readaptar cada volume ao grande desenvolvimento do romance, em um movimento de vai- evem; tudo o que é necessário para que os pesquisadores que estudam rascunhos e manuscritos também o façam,
não somente na direção da narrativa, mas na direção da história do texto”.
106
“Sabemos que o escritor fala longamente à Sra. Scheikévitch da história de Albertine, sobretudo do que se
tornará A fugitiva, em uma dedicatória escrita no exemplar de Swann que ele lhe enviou em novembro de 1915.
O texto dessa dedicatória, quando ele conta a tristeza e o esquecimento após a fuga de Albertine, não é um
resumo, nem um plano projetado para o futuro, mas, na verdade, uma escolha de textos que correspondem a
aproximadamente treze passagens da Fugitiva. Constatamos que essa citação foi feita não de acordo com o
manuscrito au net (que constitui o estado final no que tange à Fugitiva), mas de acordo com a versão dos
cadernos 55 e 56”.
61
Sendo um caderno expressivamente mais volumoso do que o 53, no qual grande parte
dos fólios foi recortada e colada nos cadernos de mise au net XI e XII, o que indica uma
proximidade maior com os textos publicados. Yoshikawa, embora reconheça a
contemporaneidade dos dois documentos, imputa ao caderno 55 uma posteridade com relação
ao 53. Como veremos, notadamente no terceiro capítulo, essa noção de anterioridade entre os
documentos se mostra complexa e difícil de determinar no caso proustiano.
Yoshikawa conseguiu localizar parte desses fólios arrancados e deslocados para outros
manuscritos, e Shuji Kurokawa, que realizou a transcrição integral e diplomática desse
caderno, deu prosseguimento à tarefa de seu antecessor, encontrando muitos outros fólios.
Embora seja um desenvolvimento da história de Albertine, o caderno 55 procura
coordenar essa narrativa com o resto da Recherche e muitas de suas passagens serão de fato,
utilizadas para o último volume, Le temps retrouvé, como podemos verificar na seguinte
citação: “Dans cette conversation qui aura lieu non à Combray mais dans la dernière matinée
Guermantes, Gilberte me dira (...)” (C.55, fº 93rº)107.
O caderno 55 inicia com o episódio da “janela iluminada” que finaliza o 53, ainda que
não seja uma seqüência deste último, e mesmo sendo um caderno de rascunho, onde a
construção se dá por unidades textuais, ou fragmentos de textos, Proust já busca, nesse
documento, as conexões entre os diferentes episódios.
Como vimos, a invenção de Albertine aumenta consideravelmente o número de
volumes previstos anteriormente pelo escritor, que confessa na já mencionada carta a
Gallimard seu próprio desconhecimento a respeito das proporções que seu romance tomava –
“Mon livre (plus long que je ne m´en rendais compte moi-même)”. Albertine expande todo o
107
“Nessa conversação que acontecerá não em Combray, mas na última matinée Guermantes, Gilberte me dirá
(...)”.
62
ciclo de Sodoma e Gomorra, fazendo com que Proust se dedique quase integralmente à escrita
dos romances A prisioneira e Albertine desaparecida nos últimos anos de sua vida.
Sabe-se que meses antes de sua morte, o escritor havia enviado a Gallimard as
datilografias relativas à Prisioneira que continham, no entanto, não um acabamento
definitivo, mas um excesso de acréscimos e mudanças, próprios à escritura proustiana.
Conforme Yoshikawa:
La lettre adressée à Gallimard en 1922 confirme qu´à cette époque l'écrivain
travaillait en fait à la dactylographie de La Prisonnière. Ces dactylographies
ainsi que le manuscrit au net montrent clairement le “gonflement” de ce
volume, dû à d´innombrables ajouts apportés surtout dans ses premières
parties. (1976, p.16)108
Além disso, em seus dois últimos meses de vida, o escritor voltou-se às modificações
feitas em uma das datilografias de Albertine disparue que, em 1986, foi descoberta por
Claude Mauriac, causando grande desentendimento entre os críticos proustianos.
Sintetizando esse fato, cujas discussões serão retomadas no quarto capítulo, Proust
havia deixado duas datilografias de Albertine disparue que continham, na verdade, o mesmo
texto registrado duas vezes. Um desses documentos possuía poucas correções da mão de
Proust e foi utilizado por seu irmão, Robert Proust, na publicação do romance. A outra cópia,
que se mostrou posteriormente ser a original, continha, pelo contrário, inúmeras correções
autógrafas, inclusive o nome do romance que conhecemos hoje.
Por seu caráter inacabado e confuso, essa datilografia foi rejeitada pelos editores do
romance póstumo, tendo sido “engavetada” pelo irmão do escritor. Por essa razão,
entendemos porque o livro foi publicado primeiramente sob o título de La fugitive, que havia
sido, no entanto, abandonado pelo escritor por motivos já arrolados neste capítulo. A
datilografia empregada na edição, não possuía inscrição alguma referente ao título da obra, o
108
“A carta endereçada a Gallimard em 1922, confirma que nessa época o escritor trabalhava de fato na
datilografia de A Prisioneira. Essas datilografias, assim como os manuscritos au net mostram claramente o
‘inchamento’ desse volume, devido aos inúmeros acréscimos feitos, sobretudo, nas primeiras partes”.
63
que fez com que os editores, baseados nas cartas enviadas pelo escritor, adotassem a primeira
idéia mencionada por ele.
Ao longo dos anos, pesquisadores encontraram outros documentos que indicavam a
denominação almejada por Proust, permitindo-lhes, deste modo, fazer a mudança de título,
que passou para Albertine disparue (La fugitive). Contudo, a datilografia arquivada era
desconhecida por todos os pesquisadores dos manuscritos de Proust.
Após a morte de Robert Proust, todos os cadernos proustianos que estavam em seu
poder passaram para o domínio da única sobrinha do escritor, Suzy Mante-Proust. Em 1986,
após sua morte, seu genro, Claude Mauriac, encontrou uma pasta na qual estavam localizados
alguns papéis de Marcel Proust e a tal datilografia corrigida.
Nela constava a seguinte inscrição: “Ici commence Albertine disparue, suite du roman
précédent la Prisonnière” [“Aqui começa Albertine disparue, seqüência do romance
precedente, a Prisioneira] (DYER, 2008). Proust modificava o local da morte de Albertine,
que ao invés de falecer nos arredores da Touraine, residência de sua tia, Madame Bontemps,
lugar para onde a heroína fugira após abandonar o protagonista em Paris, morre próxima à
Vivonne, e portanto de Montjouvain, confirmando assim suas relações homossexuais com
Mlle. Vinteuil.
Com essa modificação, Proust retorna aos cadernos de mise au net e rasura quarenta
páginas do caderno XV dedicado ao romance em questão, o que fez com que, indiretamente,
ele suprimisse grande parte dos cadernos XII e XIV e a totalidade do XIII. Essa “supressão”
causou uma grande desestabilização no conjunto da Recherche, pois os episódios posteriores
à morte da heroína relativos à busca por sua verdadeira sexualidade, bem como o episódio de
Veneza que ressuscitam Albertine e recolocam as mesmas questões ao narrador-herói, não
64
tinham mais sentido, uma vez que ao morrer em Montjouvain, Proust confirmava a tendências
lesbianas da personagem.
A descoberta dessa datilografia abalou toda a leitura que se fazia da Recherche até
então, e muitos críticos atribuíram essa atitude do escritor à doença e à chegada da morte,
como se Proust, em um rompante inconsciente e delirante, destruísse a catedral, o todo
harmonioso de sua obra109. Contudo, não devemos esquecer que esse procedimento de
mudanças, acréscimos e reviravoltas sempre acompanhou a construção da obra proustiana,
que, desde 1908, enquanto ainda era Sainte-Beuve, tornou-se, entre 1909-1911, um esboço
romanesco dividido entre Tempo perdido e Tempo redescoberto que se tornaria, em 1913, um
enorme projeto romanesco, no qual muitos personagens e histórias surgiriam para dar
profundidade à narrativa literária, aos núcleos mundanos e à demonstração estética.
Embora essa mudança iniciada pelo autor tenha engendrado certa contradição na
Recherche, isto se deve antes ao inacabamento dessas modificações por conta da morte de
Proust, do que pela natureza da reelaboração propriamente dita.
Segundo Nathalie Mauriac Dyer110, que faz uma interpretação do que poderiam
significar essas transformações, Proust, ao fazer sua heroína morrer à beira das águas da
Vivonne – sem esquecer que a personagem aparece à beira das águas do mar de Balbec –
constrói, com isso, mais uma mentira contada pela jovem.
Se no final do romance La prisonnière, Albertine afirma que não conhecia Mlle.
Vinteuil e sua amiga, e que mentira para Marcel só para lhe parecer mais interessante – “C´est
vrai que je vous ai un peu menti. Mais je me sentais si dédaignée par vous, je vous voyais si
enflammé pour la musique de ce Vinteuil que, (...) j´ai crû bêtement me rendre intéressante à
109
110
Em seu texto “Proust: Procuste”, Nathalie Mauriac Dyer elenca uma série de críticos que fazem essa leitura.
Em conferência proferida em 09/11/2009 na Faculdade de Filosofia, Letras e Ciências Humanas.
65
vos yeux” (LP, p. 839)111 – ao colocá-la próxima das moças de Montjouvain, o narrador não
só confirmaria a homossexualidade da jovem, como frisaria seu caráter mentiroso.
Além disso, Proust daria uma reviravolta no personagem de Saint-Loup, que dizendo
ter encontrado Albertine em casa de sua tia, revela-se, assim como a jovem, um mentiroso e
um traidor. A traição seria, portanto, dupla – da amante e do amigo – e colocaria os dois
personagens como os verdadeiros representantes de Gomorra e de Sodoma, fato que será
esclarecido neste mesmo volume, quando o narrador-herói descobre a homossexualidade do
amigo.
Essa análise parece-nos pertinente, embora julguemos que a reflexão feita sobre algo
que Proust não realizou seja problemática, pois incorre no risco do crítico escrever aquilo que
o autor não terminou. Seja como for, as considerações feitas até o momento revelam que
Proust se inquietava por sua obra, notadamente pela história de sua heroína, incessantemente
reescrita. Por essa razão, o romance Le temps retrouvé, que Proust assegurava ter escrito
juntamente com Côté de Swann, foi o livro menos acabado dos três últimos, mesmo que bem
coadunado com o resto da Recherche, pois devido ao crescimento da história de Albertine,
sofreu mudanças, tendo ficado em estado de manuscrito.
A narrativa de Albertine requereu, deste modo, um grande engajamento do escritor
que chega a afirmar, em carta a Gallimard que “le travail de réfection de cette dactylographie
où j´ajoute partout et change tout est à peine commencé” (Corresp., t. XXI, p. 310-11)112. Sob
esse aspecto da escrita proustiana, Rainer Warning a considera sem fim, como uma “semiose
potencialmente infinita”, pois nenhum signo é capaz de fixar seu objeto, visto que novos
signos são constantemente produzidos. Essa análise faz com que o crítico diga que: “C'est
111
“É verdade que menti um pouco. Mas eu me sentia tão desdenhada por você, via-o tão entusiasmado pela
música desse Vinteuil que (...) pensei tolamente me tornar interessante aos seus olhos”. (Trad., p. 316)
112
“o trabalho de reparação dessa datilografia onde eu acrescento por toda a parte e mudo tudo apenas começou”.
66
ainsi qu'on a pu à bon droit dire qu´Albertine, ‘être de fuite’, était un peu la figure allégorique
du texte de Proust lui-même” ( WARNING, 1996, p. 30)113.
Se mantivermos essa leitura alegórica e entendermos Albertine não apenas como uma
personagem, mas como uma imagem do texto proustiano e sua produção, analisaríamos o
episódio das catedrais de sorvete saboreadas pela jovem como uma espécie de derrocada do
projeto de Marcel Proust: “(...) je me charge avec mes lèvres de détruire, pilier par pilier, ces
églises vénitiennes d´un porphyre qui est de la fraise et de faire tomber sur les fidèles ce que j
´aurais épargné”. (LP, p. 637)114.
Embora as análises que vislumbram na Recherche uma espécie de mimese de seu
próprio processo de construção sejam interessantes e belas, escaparemos dessa leitura, pois
não condiz com a real fabricação da obra proustiana, na qual a história de Albertine está longe
de ser uma destruição da catedral romanesca.
Preferimos conservar esse trecho no nível literário, entendendo-o como uma
prefiguração da visita a Veneza, onde o narrador-herói, após a partida de sua mãe e a
constatação de sua solidão nessa cidade que se lhe tornara tão estrangeira e indiferente, vê
ruir, ao som de Sole mio, todo seu sonho veneziano; e a consumação das catedrais de sorvete
torna-se a própria consumação de Veneza e de todo o devaneio do protagonista:
J´étais étreint par l´angoisse que me causait, avec la vue du canal devenu
tout petit depuis que l´âme de Venise s´en était échapée, de ce Rialto banal
qui n´était plus le Rialto, – par ce chant de désespoir que devenait Sole mio
et qui, ainsi clamé devant les palais inconsistants, achevait de les mettre en
miette et consommait la ruine de Venise. (AD, p. 233)115
113
“É assim que se pôde, com toda a razão, dizer que Albertine, ‘ser fugaz’, era um pouco a figura alegórica do
texto de Proust”.
114
“(...) me encarrego com os meus lábios de destruir, pilastra por pilastra, aquelas igrejas venezianas de um
pórfiro que é morando, e de fazer desabar sobre os fiéis o que eu tiver poupado”. (Trad., p. 121)
115
“Oprimia-me, com a vista do canal tornado pequenino depois que a alma de Veneza se lhe escapara, e do
Rialto banal que não era mais o Rialto, a angústia causada por esse canto de desespero que se tornara o Sole mio
e, que, clamado assim diante dos palácios inconsistentes, acabava de esmigalhá-los, consumando a ruína de
Veneza”. (Trad., p. 215)
67
Se a história de Albertine é umas das grandes responsáveis pela expansão da
Recherche, seu aparecimento não aconteceu de forma aleatória e desligada do projeto literário
do escritor, pois como averiguamos, seu núcleo já existia em outro texto do autor, escrito
muitos anos antes.
Mesmo tomando proporções enormes, o que fatalmente desencadeou um processo
escritural intenso, Proust procurava inserir essa narrativa em todo o conjunto de sua obra,
buscando, com isso, a unidade desejada da Recherche, tema que veremos no próximo
capítulo.
68
Capítulo 2
A unidade no vestido
le ‘leitmotiv’ Fortuny, peu développé,
mais capital jouera un rôle tour à tour
sensuel, poétique et souloureux
2.1 A Prisioneira e o projeto Sainte-Beuve
Vimos, no capítulo anterior, como Proust reaproveitou a novela do Plaisirs et les jours
para compor a história de Albertine que, embora seja um dos núcleos narrativos que
desencadeou um intenso movimento escritural, ele não foi, de maneira alguma, algo
desconectado do conjunto romanesco, que poderia romper sua harmonia. Neste tópico,
veremos como Proust transpõe certos elementos do projeto Contra Sainte-Beuve para a
história de Albertine, notadamente no livro La prisonnière.
Comparando este romance aos demais volumes, a passagem de uma narrativa em
grupo para o huis-clos é expressiva. De uma vivência plena de passeios aos arredores de
Combray, da viagem a Balbec, bem como a freqüentação dos salões, vemos tudo isso ser
substituído por um enclausuramento do protagonista.
A estrutura romanesca assemelha-se muito pouco às dos outros livros, aproximandose, contudo, de uma narrativa anterior à Recherche, a do Contre Sainte-Beuve. Em nenhuma
outra, encontramos o herói encerrado em seu quarto, esperando por seu artigo no Figaro e
tendo uma conversa sobre literatura, seja com a mãe ou com Albertine.
Vimos na introdução que esse projeto de um ensaio crítico sobre o método de SainteBeuve foi um dos desencadeadores da Recherche, tendo sido considerado como seu avanttexte. Muitos críticos viram no Temps retrouvé, sobretudo na matinée da princesa de
Guermantes, a transposição da conversa literária com a mãe. Nas palavras de Bernard Brun:
69
C'est dans les brouillons du Contre Sainte Beuve inachevé que commence
l'histoire du Temps retrouvé. La permanence est troublante et elle a donné
lieu à d'étranges polémiques. De l'un à l'autre la technique narrative utilisée,
la théorie esthétique qui soutient le récit et le contenu même de celui-ci ne
varient guère. La matinée chez la princesse de Guermantes vient simplement
remplacer une matinée de conversation avec Maman. (1981, p.9)116
De fato, é incontestável o caráter teórico do último livro do Em busca do tempo
perdido, amplamente dedicado aos comentários e demonstrações estéticas, contudo, o
romance A prisioneira concentra, mais do que o Tempo redescoberto, a estrutura inicial
existente em Sainte-Beuve.
Como declara Pierre-Edmond Robert:
Que la Recherche du temps perdu ait été écrite contre Sainte-Beuve nous le
savions depuis longtemps. Mais plutôt que dans la conclusion du Temps
retrouvé, où l'auteur expose son esthétique, c'est dans Prisonnière qu'il faut
chercher la méthode critique de Marcel Proust. Car La Prisonnière contient
ce qui reste du Contre Sainte-Beuve initial celui que Proust détaillait dans
une lettre à Louis d'Albuféra du 5 mai 1908, et qui comprenait entre autres “
un essai sur Sainte-Beuve” et “une étude sur le roman”. On sait bien que des
éléments du Contre Sainte-Beuve romanesque ont été utilisés dans La
Prisonnière, sept ans plus tard, pour donner un cadre temporel et thématique
à l´histoire d'Albertine, en particulier les réveils du narrateur dans sa
chambre et l'attente quotidienne du Figaro, dans lequel doit paraître un
article de lui. Celui-ci devait alimenter une “conversation avec Maman”,
devenue dans La Prisonnière une “conversation avec Albertine”. (1987, p.
20)117
Em termos de discussão literária, existem grandes semelhanças, como aponta Robert
entre os dois textos, sendo o motivo da matinée e a espera pelo artigo do Figaro os elementos
mais patentes. No entanto, há outros pontos comuns entre a estrutura narrativa de ambos os
textos.
116
“É nos rascunhos do inacabado Contra Sainte-Beuve que começa a história do Tempo redescoberto. A
permanência é perturbadora e deu lugar a estranhas polêmicas. De um a outro, a técnica narrativa utilizada, a
teoria estética que sustenta a história e seu próprio conteúdo não variam. A matinée da princesa de Guermantes
vem simplesmente substituir uma matinée de conversa com Mamãe”.
117
“Que o Em busca do tempo perdido tenha sido escrito contra Sainte-Beuve nós sabemos há muito tempo.
Mas, mais do que a conclusão do Tempo redescoberto, no qual o autor expõe sua estética, é na Prisioneira que é
necessário buscar o método crítico de Marcel Proust. Pois A prisioneira contém aquilo que resta do Contra
Sainte-Beuve inicial que Proust detalhou na carta a Louis d´Albufera de 5 de maio de 1908, e que compreendia
entre outros ‘um ensaio sobre Sainte-Beuve’ e ‘um estudo sobre o romance’. Bem sabemos que os elementos do
Contra Sainte-Beuve romanesco foram utilizados na Prisioneira, sete anos mais tarde, para dar um quadro
temporal e temático à história de Albertine, em particular, os despertares do narrador em seu quarto e a espera
cotidiana do Figaro, no qual deve ser publicado um artigo seu. Este último devia alimentar uma ‘conversa com
Mamãe’, transformada no A prisioneira uma ‘conversação com Albertine’”.
70
Os paralelismos são muitos, mas para citar os mais pertinentes, temos um herói
enclausurado, longe da vida mundana, que se dedica à leitura e às reflexões sobre a arte. A
mãe, presente no primeiro texto, desaparece de cena, pelo menos fisicamente, sendo, no
entanto, substituída por Albertine e Françoise, encarregada de levar-lhe o Figaro. No texto da
Recherche há logo no início do romance, uma comparação entre as personagens:
avant de me quitter, elle glissait dans ma bouche sa langue, comme un pain
quotidien , comme un aliment nourrisant et ayant le caractère presque sacré
de toute chair à qui les souffrances que nous avons endurées à cause d´elle
ont fini par conférer une sorte de douceur morale, ce que j´évoque aussitôt
par comparaison, ce n´est pas la nuit que le capitaine Borodino me permit de
passer au quartier, (...) mais celle où mon père envoya maman dormir dans le
petit lit à côté du mien. (LP, p. 520)118
Esse estreitamento entre a mãe e Albertine, ou melhor, entre o poder apaziguador que
ambas tinham sobre o protagonista, é, desde o início da narrativa, estabelecido. Sabemos que
em Contre Sainte-Beuve a figura da mãe, ainda bastante autobiográfica, desempenha um
papel fundamental na “narrativa”, termo que colocamos entre aspas, pois mesmo que
contenha traços romanescos, o projeto Sainte-Beuve não possui o mesmo caráter fictício do
texto da Recherche.
Sabemos que a mãe do Contre Sainte-Beuve possui contornos fortemente biográficos,
linhas que vão se diluindo conforme Proust se engaja na escrita da Recherche. A mãe, apesar
de sua importância passa a não mais concentrar os afetos e as considerações intelectuais tão
essenciais para o herói, pois esses elementos são igualmente distribuídos na figura da avó,
personagem fictício e o duplo da mãe.
Ainda que a mãe presente no ensaio crítico possua essas características
autobiográficas, percebemo-na antes como uma fabricação do discurso literário, posto que a
situação estabelecida pelo diálogo entre ela e o protagonista é fictícia. Nesse texto crítico,
118
“antes de eu me deitar, me metia na boca a sua língua como um pão cotidiano, como um alimento nutritivo, e
com o caráter quase sagrado de toda carne à qual as dores que sofremos por ela acabaram imprimindo uma
espécie de doçura moral, o que evoco logo por comparação não é a noite que o capitão de Borodino consentiu
que eu passasse no quartel (...), mas aquela em que meu pai mandou mamãe dormir na caminha ao meu lado”.
(Trad., p. 10)
71
Proust engendra um diálogo estético com mamãe, pretexto perspicaz para validar suas
concepções teórico-estéticas:
- Écoute, je voulais te demander un conseil. Assieds-toi.
- Attends que je trouve le fauteuil, je te dirai qu´il ne fait pas très clair chez
toi. (...)
- Enfin, écoute-moi. Le sujet serait : contre la méthode de Sainte-Beuve.
- Comment, je croyais que c´était si bien ! Dans l´essai de Taine [et] l´article
de Bourget que tu m´as fait lire, ils disent que c´est une méthode si
merveilleuse qu´il ne s´est trouvé personne dans le XIXe siècle pour l
´appliquer.
- Hélas oui, ils disent cela, mais c´est stupide. (CSB, p. 217-8)119
Nesse pequeno diálogo, pois, não esqueçamos, Sainte-Beuve é um texto inacabado,
percebe-se com facilidade a argumentação e as opiniões propriamente proustianas,
encobertas, no entanto, pelo diálogo fictício e pela presença da mãe. Em La prisonnière, essa
conversa literária torna-se um diálogo estético entre o protagonista e Albertine, tendo como
ponto de partida os escritores propriamente ditos. Mas, assim como a mãe, Albertine faz
poucas interferências e o que vemos arrolado é outro discurso teórico-estético senão de
Proust, da instância narrativa:
- Mais est-ce qu´il a jamais assassiné quelqu´un, Dostoïevski? Les romans
que je connais de lui pourraient tous s´appeler l´Histoire d´un Crime. C´est
une obsession chez lui, ce n´est pas naturel qu´il parle toujours de ça. – Je ne
crois pas, ma petite Albertine, je connais mal sa vie. Il est certain que comme
tout le monde il a connu le péché, sous une forme ou sous une autre, et
probablement sous une forme que les lois interdisent. (...) Je ne suis pas
romancier, il est possible que les créateurs soient tentés par certaines formes
de vie qu´il n´ont pas personellement éprouvées. (LP, p. 881)120
O diálogo, ainda que não mencione o crítico Sainte-Beuve, resvala na questão de seu
método por meio da fala de Albertine que busca compreender, pelo caráter e pela vida de
119
“ – Escuta, queria te pedir um conselho. Sente-se. – Espere eu pegar a poltrona. Eu te diria que não está muito
claro no teu quarto(...). – Enfim, ouça-me. O assunto seria: contra o método de Sainte-Beuve. – Mas como,
pensava que fosse bom! No ensaio de Taine e no artigo de Bourget que você me fez ler, eles dizem que é um
método tão maravilhoso que não se encontra ninguém no século XIX para aplicá-lo. – Infelizmente, sim,
disseram isso, mas é estúpido”.
120
“‘Mas Dostoievski um dia assassinou alguém? Os romances dele que conheço poderiam todos se chamar a
História de um crime. É uma obsessão nele, não é natural que fale sempre disso’. ‘Não creio, minha Albertine,
conheço mal a vida dele. É certo que, como todo mundo, conheceu o pecado, sob este ou aquele aspecto, e
provavelmente sob um aspecto que as leis interdizem. (...) Eu não sou romancista; é possível que os criadores
sejam tentados por certas formas de vida que não experimentaram pessoalmente”. (Trad., p.353)
72
Dostoiévski um traço marcante de sua obra. A simetria entre os dois textos fica evidente, pois
em ambos, o protagonista, fechado no quarto com sua interlocutora, discorre sobre literatura,
e a estrutura de diálogo presente nos dois trechos os aproxima de uma cena teatral.
Assim como o texto crítico, Proust “recolhe” suas personagens para dentro do
aposento, construindo um romance entre quatro paredes. Não é por acaso que ele, em carta a
Sra. Scheikévitch vista no capítulo anterior, afirma que Albertine desempenha o maior papel
na peripécia da Recherche. A escolha de tal palavra apromixa a narrativa do teatro e assim
como no texto de Sainte-Beuve, o romance A prisioneira cita os versos de Racine.
No texto de Sainte-Beuve, a mãe, temendo importunar o filhon e despertá-lo de seu
sono, cita os versos de Racine: “- Je te dirai que j´avais peur de m´être trompée et que mon
loup me dise: C´est vous, Esther, qui sans être attendue? Ou même: Sans mon ordre on porte
ici ses pas?// Quel mortel insolent vient chercher les trépas ? (CSB, p. 217)121.
Em conformidade com o texto do projeto Sainte-Beuve, o romance da Recherche traz a
mesma situação, Albertine citando os versos da mesma peça de Racine, Esther, pois não tinha
autorização para entrar no quarto de Marcel sem ser chamada:
La défense d´entrer chez moi l´amusait beaucoup. Comme elle avait pris
notre habitude familiale des citations et utilisait pour elle celles des pièces qu
´elle avait jouées au couvent et que je lui avais dit aimer, elle me comparait
toujours à Assuérus: [Et] la mort est le prix de tout audacieux//Qui sans être
appelé se présente à mes yeux. (LP, p. 528)122
Não há dúvidas de que Proust retomou a narrativa do ensaio crítico para construir
parte da história de Albertine, o que revela a importância do advento dessa heroína. A história
de Albertine propiciou ao escritor uma retomada de seus antigos textos, apontando para um
121
“Te digo que tive medo de me enganar e que meu lobo dissesse: É você, Esther, que sem ser chamada? Ou
mesmo: “Sem meu consentimento por aqui dão passos?//Que mortal insolente veio buscar aborrecimentos?”.
122
Divertia-se muito com a proibição de entrar no meu quarto antes que eu chamasse. Como tomara o nosso
hábito familiar das citações e utilizava para isso as das peças que representara no convento e que eu lhe dissera
apreciar, comparava-me sempre a Assuero: E do infeliz que ousar vir à sua presença//Sem um chamado seu é a
morte a recompensa”. (Trad., p.17)
73
dos procedimentos escriturais de Marcel Proust, a “reciclagem” e o reaproveitamento de seus
escritos.
Embora nossa análise seja possível de ser realizada pelo simples cotejamento dos
textos publicados, movimento que viemos fazendo até o momento, há singularidades nos
manuscritos que nos ajudam a reforçar nossa hipótese.
No fólio 44rº do caderno 53, encontramos o seguinte desenvolvimento:
D’ailleurs Andrée m’exaspère. Elle a été assomante tantôt. Je ne veux plus
sortir avec elle. Quand vous pouvez sortir nous sortirons ensemble. Quand
vous ne pouvez pas si votre mère veut de moi, ou quand ma tante viendra à
Paris si elle veut sortir avec moi, j’irai avec l’une ou avec l’autre. Mais je ne
sors plus avec Andrée. Vous pouvez le dire <annoncer> aux gens qui croient
<vous ont dit> que je suis revenue à Paris pour elle. (C.53, fº 44rº)123
Nessa passagem, é dada voz a Albertine. Temos a seguinte situação: o herói, para
investigar o passado da heroína, inventa o episódio das cartas anônimas. Ele blefa e pretende,
por meio dessas cartas inexistentes, descobrir se Albertine teve ou tem alguma relação
amorosa com Andrée, escolhida por ele como uma espécie de vigia de Albertine em seus
passeios e por causa de quem a heroína teria decidido ir a Paris.
Marcel, declarando a Albertine que as cartas anônimas revelam sua relação com
Andrée, faz a jovem se revoltar e decidir a não sair mais com a amiga.
Albertine anuncia, por fim, que só sairá com Marcel, com a mãe deste, ou com sua tia,
se esta for a Paris. Essa passagem é quase a mesma publicada no romance, sendo a fase em
que Albertine começa a se privar dos passeios e passa quase todo tempo cativa na casa do
herói. Contudo, a presença da mãe no manuscrito, ausente fisicamente no romance publicado,
aparece diversas vezes neste caderno, ilustrando, com isso, possíveis resquícios do projeto
Sainte-Beuve.
123
“Além disso, Andrée me exaspera. Ela foi maçante há pouco. Não quero mais sair com ela. Quando você
puder sair, sairemos juntos. Quando você não puder, se sua mãe quiser minha companhia, ou quando minha tia
vier a Paris, se ela quiser sair comigo, irei com uma ou com a outra. Mas não saio mais com Andrée. Você pode
dizer <anunciar> para as pessoas que acreditam <te disseram> que vim a Paris por ela”.
74
Mas, se Proust vislumbra na construção da história de heroína a retomada de antigos
projetos, eles não eram suficientes para integrá-la ao corpo narrativo da Recherche. O escritor
buscava algum elemento que unisse essa personagem ao restante de sua obra, para poder
desenvolver o ciclo de Sodoma e Gomorra, romance ao qual se dedicaria até o final de sua
vida124.
2.2 O leitmotiv Fortuny
Em 1916, Proust enviou uma série de cartas a Maria de Madrazzo pedindo-lhe
informações mais precisas sobre os vestidos criados por seu parente, o pintor e criador de
moda espanhol, Mariano Fortuny y Madrazo:
Savez-vous du moins si jamais Fortuny dans ses robes de chambre a pris
pour motif de ces oiseaux accouplés, buvant par exemple dans un vase, qui
sont si fréquents à St. Marc, dans les chapiteaux Byzantins. Et savez-vous
aussi s´il y a à Venise des tableaux (je voudrais quelques titres) où il y des
manteaux, des robes, dont Fortuny se serait (ou aurait pu) s´inspirer. Je
rechercherais la reproduction du tableau et je verrais s´il peut moi m
´inspirer. (Corresp., t. XV, p. 49)125
Essa carta condensa as idéias que perpassavam o escritor na busca por uma unidade na
construção da Recherche. Curiosamente, Proust utiliza praticamente a mesma imagem dos
pássaros em seu romance: “(...) et comme le proclament, buvant aux urnes de marbre et de
jaspe des chapiteaux byzantins, les oiseaux qui signifient à la fois la mort et la
résurrection”126.
Essa imagem, usada para caracterizar os vestidos de Fortuny que o herói daria a
Albertine, condensa o anúncio da morte e a ressurreição da jovem desencadeada pela visão
que o protagonista terá de alguns quadros no batistério de São Marcos, em Veneza. Proust
124
A prisioneira e Albertine disparue faziam parte do ciclo de Sodoma e Gomorra.
“Você sabe pelo menos se Fortuny algum dia usou como motivo para seus penhoares esses pássaros
acoplados, bebendo, por exemplo, em um vaso, que são tão freqüentes em São Marcos, nos capitéis Bizantinos.
E você sabe também se há em Veneza quadros (gostaria de alguns títulos) onde há sobretudos, vestidos e nos
quais Fortuny se inspirou (ou teria se inspirado). Eu procuraria a reprodução do quadro para ver se ele pode
inspirar-me”.
126
“e como o proclamam, bebendo nas urnas de mármore e de jaspe dos capitéis bizantinos, os pássaros, que
significam ao mesmo tempo a morte e a ressurreição”. (Trad., p. 344)
125
75
procurava elementos para construir a cena da “ressurreição”, baseando-se em dados concretos
sobre a pintura, procedimento raro na construção proustiana com pouquíssimas exceções em
suas correspondências.
É no quadro de Carpaccio – Patriarche di Grado – que Proust se inspira para
descrever o sobretudo de Albertine:
Or c´était dans ce tableau de Carpaccio que le fils génial de Venise l´avait
pris, c´est des épaules de son compagnon de la Calza qu´il avait détaché pour
le jeter sur celles des tant de Parisiennes qui certes ignoraient, comme je l
´avais fait jusqu´ici que le modèle en existait dans un groupe de seigneurs,
au premier plan du Patriarche di Grado, dans une salle de l´Académie de
Venise. (AD, p. 226)127
O casaco de Albertine, desenhado por Fortuny e inspirado nas pinturas de Carpaccio
era, de fato, um modelo de vestimenta masculino, nada mais sugestivo para caracterizar a
jovem, mas além desse dado nada aleatório para a construção do romance, Proust entreveu no
vestido o motivo, a unidade que faltava para conectar sua heroína a toda a trama romanesca e
a diversos personagens.
Em outra carta a mesma destinatária, Proust registra: “Donc à moins d´un
remaniement (possible d´ailleurs, si je le juge nécessaire) à son sujet, le ‘leitmotiv’ Fortuny,
peu développé, mais capital jouera son rôle tour à tour sensuel, poétique et
douloureux”(Corresp., p. 57)128.
Proust, intitulando ele mesmo o vestido como um “leitmotiv” confirma na carta seu
desenvolvimento ainda parco, considerando-o, contudo, um elemento essencial para a
narrativa. Segundo Jean Milly:
Ce récit, qui a eu un moment la forme d´un morceau continu dans les
ébauches de la Recherche, est ensuite découpé et intégré par le moyen d
127
“Ora, era nesse quadro de Carpaccio que o filho genial de Veneza o tinha tomado, são os ombros de seu
companheiro da Calza que ele havia destacado psrs jogá-lo sobre os ombros de tantas Parisienses que certamente
ignoravam, como eu até aqui, que o modelo existiu em um grupo de senhores, no primeiro plano do Patriarca de
Grado, em uma sala da Academia de Veneza”.
128
“Portanto, ao menos que haja um remanejamento (possível, inclusive, se eu julgar necessário) desse assunto, o
‘leitmotiv’ Fortuny, pouco desenvlovido, mas capital, desempenhara um papel alternadamente sensual, poético e
doloroso”.
76
´additions multiples au texte déjà existant. C´est ainsi qu´il apparaît de façon
complètement éclatée, dans le roman définitif (1983, p. 49)129.
Não encontramos esses esboços do desenvolvimento do motivo, apenas poucas
referências a toilette feminina. No caderno 53, Proust desenvolve, em um fólio não
compostado pela BNF (entre 22vº e 22bis), a sensualidade da jovem já despida, usando
apenas um penhoar de crepe chinês: “Elle s´était deshabillé, Elle portait quelqu’un de ces jolis
peignoirs en crêpe de chine dont j’avais demandé la description à Madame de
Guermantes” (C.53, fº 22vº-22bis)130.
Já nessa passagem, Proust vislumbra, por meio da vestimenta, um vínculo entre
Albertine e a aristocracia, uma vez que a duquesa de Guermantes sugere tais vestidos,
mostrando a ascensão social da jovem, muito diversa da moça pobre conhecida em Balbec.
Todavia, ao o que tudo indica, Proust ainda não havia descoberto o vestido de Fortuny, que
por sere inspirado na pintura, permitiria não somente a ascensão social da moça e sua
voluptuosidade, mas evocaria a cidade de Veneza, suscitando o desejo de viagem no
protagonista e seu aborrecimento com a presença da jovem que impede a realização desses
séjours venezianos.
Ainda na correspondência citada acima, Proust fornece detalhes sobre a importância
desse motivo, em uma verdadeira exposição da construção de seu romance:
Dans le début de mon deuxième volume, un grand artiste à nom fictif qui
symbolise le grand peintre dans mon ouvrage (...) dit devant Albertine (que
je ne sais pas encore être un jour ma fiancée adorée) que à ce qu´on prétend
un artiste a découvert le secret des vielles éttofes vénitiennes etc. C´est
Fortuny. (p.57)131
129
“Essa narrativa que teve, em um momento, a forma de um pedaço contínuo nos rascunhos da Recherche, foi
em seguida cortado e integrado por adições múltiplas ao texto já existente. Foi assim que ele apareceu de
maneira dispersa no romance definitivo”.
130
“Ela se despiu, Ela vestia alguns desses bonitos penhoares em crepe da China, cuja descrição eu havia pedido
a Madame de Guermantes”.
131
“No início de meu segundo volume, um grande artista de nome fictício que simboliza o grande pintor da
minha obra (...) diz diante de Albertine (que eu não sabia ainda que se tornaria um dia minha adorada noiva) que
esse que chamamos de artista descobriu o segredo dos velhos panos venizianos etc. É Fortuny.”
77
Esse plano estabelece um vínculo entre a personagem feminina e o pintor – assim
como Gilberte e Bergotte – conectando ainda a cidade de Balbec a Veneza, que reaparecerão
juntas no final do Temps retrouvé, por meio da memória involuntária.
Continuando sua descrição, Proust afirma:
Quand Albertine plus tard (troisième volume) est fiancée avec moi, elle me
parle des robes de Fortuny (que je nomme à partir de ce moment chaque
fois) et je luis fais la surprise de lui en donner. La description très brève, de
ces robes, illustre nos scènes d´amour (et c´est pour cela que je préfère des
robes de chambre (...)). (p.57)132
O vestido é, sem dúvida, um dos componentes que erotizam a jovem, mas que será
igualmente usado para mantê-la cativa, reforçando a frágil relação entre os personagens que
se sustenta, neste momento da narrativa, por presentes: “Je savais bien qu´elle ne pouvait me
quitter sans me prevenir; d´ailleurs elle ne pouvait ni le désirer (c´était dans huit jours qu´elle
devait essayer les nouvelles robes de Fortuny)” (LP, p. 900)133.
Com efeito, no caderno 55 no qual já há a menção ao vestido Fortuny, o
desenvolvimento do motivo ocorre de maneira breve, evocando apenas a atmosfera veneziana
sucitada pelas cores da vestimenta: “Mais tout d´un coup le décor changea <encore réveillé
quelques jours auparavant par la robe bleue et or de Fortuny>” (C.55, fº 43rº)134.
Dentro da narrativa, há igualmente pouquíssimas descrições desse motivo
fundamentalmente definido pelas cores “azul e ouro”, operando não como uma paramentação,
mas como uma unidade romanesca.
O escritor termina sua carta dizendo:
Le roman suit son cours, elle me quitte, elle meurt. (...) je vais à Venise mais
dans le tableaux de xxx (disons Carpaccio), je retrouve telle robe que je lui ai
donnée. Autrefois cette robe m´évoquait Venise et me donnait envie de
132
“Quando Albertine mais tarde (terceiro volume) for minha noiva me falará sobre os vestidos de Fortuny (que
nomeio a partir desse momento a cada vez) e eu lhe faço uma surpresa dando-lhe um. A descrição muito breve
desses vestidos ilustra nossas cenas de amor (e é por isso que prefiro penhoares)”.
133
“Eu sabia que ela não podia deixar-me sem me prevenir, aliás não podia nem desejá-lo (daí oito dias iria
experimentar novos vestidos de Fortuny)”. (Trad., p.371)
134
“Mas de repente o cenário mudou <ainda despertado alguns dias antes pelo vestido azul e ouro de Fortuny>”.
78
quitter Albertine, maintenant le Carpaccio où je la vois m´évoque Albertine
et me rend Venise douloureux. (p. 57)135
Essa explicação minuciosa da descoberta da unidade pelo vestido demonstra uma
vontade imensa de composição, de uma unidade “vital” porque apreendida a posteriori, no
jogo de escritura. Notamos que, se esse motivo da toilette feminina havia sido construído de
forma contínua, como afirma Milly, foi percebendo a dimensão do verdadeiro papel que o
vestido de Fortuny desempenhava que Proust dispersou o episódio, em uma escrita constelar,
como veremos no próximo capítulo.
135
“O romance segue seu curso, ela me deixa e morre. (...) vou a Veneza, mas no quadro de xxx (digamos
Carpaccio), eu reencontro tal vestido que lhe havia dado. Antigamente, esse vestido evocava para mim Veneza e
me dava vontade de deixar Albertine, agora o Carpaccio no qual a vejo, evoca para mim Albertine, deixando
Veneza dolorosa”.
79
Capítulo 3
“La fenêtre éclairée” e a escritura constelar
En brisant tous les petits bonheurs qui nous
cachaient notre grande misère, en faisant de
notre coeur un nu préau mélancolique, ils nous
ont permis de le comtempler enfin et de le juger
3.1 Outro motivo
Neste capítulo analisaremos uma das cenas de maior dramaticidade no romance A
prisioneira: o episódio da janela iluminada. Partiremos do texto publicado para
posteriormente confrontá-lo com todas as versões às quais tivemos acesso, inclusive os
cadernos 53 e 55 já vistos anteriormente, nos quais este trecho narrativo foi elaborado.
No episódio em questão, ao retornar da soirée Verdurin em companhia de Brichot, o
protagonista da calçada vê a luz do quarto de Albertine acesa, imagem que se torna
desencadeadora de uma série de reflexões. O momento é tenso e paradoxal, pois ao mesmo
tempo em que aparentemente conquista certo controle sobre a amada, o herói priva-se de
elementos essenciais para a atividade literária, como a liberdade de pensamento, a imaginação
e a solidão.
Nous étions arrivés devant ma porte. Je descendis de voiture pour donner au
cocher l'adresse de Brichot. Du trottoir je voyais la fenêtre de la chambre
d'Albertine, cette fenêtre autrefois toujours noire le soir quand elle n'habitait
pas la maison, que la lumière électrique de l'intérieur, segmentée par les
pleins des volets, striait de haut en bas de barres d'or parallèles. Ce grimoire
magique, autant il était clair pour moi et dessinait devant mon esprit des
images précises, toutes proches, et en possession desquelles j'allais entrer
tout à l'heure, était invisible pour Brichot resté dans la voiture, presque
aveugle, et eût d'ailleurs, été incompréhensible pour lui, puisque autant que
les amis qui venaient me voir avant le dîner quand Albertine était rentrée de
promenade, le professeur ignorait qu'une jeune fille, toute à moi, m'attendait
dans une chambre voisine de la mienne. La voiture partit. Je restai un instant
seul sur le trottoir. Certes, ces lumineuses rayures que j'apercevais d'en bas
et qui à un autre eussent semblé toutes superficielles, je leur donnais une
consistance, une plénitude, une solidité extrêmes, à cause de toute la
80
signification que je mettais derrière elles, en un trésor si l'on veut, un trésor
insoupçonné des autres, que j'avais caché là et dont émanaient ces rayons
horizontaux, mais un trésor en échange duquel j'avais aliéné ma liberté, la
solitude, la pensée. Si Albertine n'avait pas été là-haut, et même si je n'avais
voulu qu'avoir du plaisir, j´aurais été le demander à des femmes inconnues,
dont j´eusse essayé de pénétrer la vie, à Venise peut-être, à tout le moins
dans quelque coin du Paris nocturne. Mais maintenant, ce qu'il me fallait
faire quand venait l'heure des caresses, ce n'était pas partir en voyage, ce
n'était même plus sortir, c'était rentrer. Et rentrer non pas pour au moins se
trouver seul et, après avoir quitté les autres qui vous fournissaient du dehors
l'aliment de votre pensée, se trouver au moins forcé de le chercher en soimême, mais au contraire moins seul que quand j´étais chez les Verdurin,
reçu que j'allais être par la personne en qui j'abdiquais, je remettais le plus
complètement la mienne, sans que j'eusse un instant le loisir de penser à
moi, et même la peine, puisqu'elle serait auprès de moi, de penser à elle. De
sorte qu'en levant une derrière fois mes yeux du dehors vers la fenêtre de la
chambre dans laquelle je serais tout à l'heure, il me sembla voir le lumineux
grillage qui allait se refermer sur moi et dont j'avais forgé moi-même, pour
une servitude éternelle, les inflexibles barreaux d'or.(LP, p.833-4)136
Esse episódio extremamente condensado evidencia a passagem temporal que opera
tanto na narrativa como no protagonista. Para nos atermos primeiramente aos elementos
particulares do romance A Prisioneira, fiquemos no âmbito do herói.
A cena revela uma tensão, ou se quisermos um paradoxo que definirá a relação
amorosa de Marcel e Albertine que desde o início do romance, o narrador nos apresenta como
136
“Tínhamos chegado à porta de minha casa. Desci do carro e fui dar ao cocheiro o endereço de Brichot. Da
calçada eu via a janela do quarto de Albertine, aquela janela, antes sempre escura à noite, quando ela não
morava ali, e que a luz elétrica do interior, segmentada pelas reixas das venezianas, estriava agora de alto a
baixo de barras de ouro paralelas. Esse signo mágico, desenhando no meu espírito calmo imagens precisas,
próximas, na posse das quais eu ia entrar dentro em pouco, era tão claro para mim quanto era invisível para
Brichot, que ficara quase cego, no carro, e quanto aliás seria incompreensível para ele mesmo se pudesse ver
porquanto, como os amigos que me vinham visitar antes do jantar quando Albertine já estava em casa de volta
do seu passeio, o professor ignorava que uma moça inteiramente minha me estivesse esperando num quarto
pegado ao meu. O carro partiu. Fiquei um momento sozinho na calçada. Certo aquelas riscas luminosas que eu
avistava de baixo e que a outro haviam de parecer de todo superficiais, dava-lhes eu uma consistência, uma
plenitude, uma solidez extremas, por causa de toda a significação que eu punha atrás delas, num tesouro
insuspeitado pelos outros, escondido ali por mim, e donde emanavam aqueles raios horizontais, tesouro se
quiserem, mas tesouro em troca do qual eu alienara a liberdade, a solidão, o pensamento. Se Albertine não
estivesse lá em cima, e mesmo se eu procurasse apenas o prazer, teria ido pedi-lo a mulheres desconhecidas,
cuja vida tentaria penetrar, em Veneza talvez, ou pelo menos em qualquer canto de Paris noturno. Mas agora
que eu tinha que fazer quando chegava para mim a hora das carícias não era partir em viagem, não era nem
mesmo sair, era voltar para casa. E voltar não para ficar só, e, depois ter deixado a companhia dos outros, que
forneciam de fora o alimento do espírito, me ver pelo menos forçado a procurá-lo em mim mesmo, mas, ao
contrário, menos só do que quando estava em casa dos Verdurin, recebido que ia ser pela pessoa em quem eu
abdicava o mais completamente possível a minha, sem que eu tivesse um instante o lazer de pensar em mim,
nem mesmo o trabalho, pois ela estaria a meu lado, de pensar nela. De maneira que, levantando mais uma vez
os olhos para a janela do quarto onde eu estaria dentro de poucos instantes, pareceu-me ver as grades luminosas
que iam fechar-se atrás de mim e cujas hásteas de ouro eu mesmo forjara para uma eterna servidão”. (Trad., p.
308-9)
81
um vínculo que, notadamente aos olhos do herói, será baseado, em ciúmes, sofrimento e
tédio.
D´Albertine, en revanche, je n´avais plus rien à apprendre. Chaque jour, elle
me semblait moins jolie. Seul le désir qu´elle excitait chez les autres, quand l
´apprenant je recommençais à souffrir et voulais la leur disputer, la hissait à
mes yeux sur un haut pavois. Elle était capable de me causer de la
souffrance, nullement de la joie. Par la souffrance seule, subsistait mon
ennuyeux attachement. (LP, p.537-8)137
O desejo de possuir Albertine esteve sempre aliado à vontade de separá-la do mundo
gomorreano e das possíveis relações mantidas com as moças de Montjouvain. Uma vez
Albertine cativa, pois para surpresa do narrador-herói ela aceita a proposta de morar junto
dele em Paris, o que era anteriormente mistério e desconhecido, torna-se habitual e familiar.
O convívio diário estilhaça a imagem que Marcel tinha de Albertine quando a
conheceu na cidade balneária de Balbec – “(...) l´oiseau que j´avais vu un soir marcher à pas
comptés sur la digue, (...) avait perdu toutes ses couleurs”138 (LP, p. 678) – e a presença
cotidiana da jovem, mesmo trazendo certo apaziguamento ao ciúme do protagonista, torna-se
enfadonha. À imagem do pássaro colorido, sobrepõe-se a da “grise prisonnière” [“desbotada
prisioneira”]139 (LP, p. 679; Trad., p. 160).
No excerto da janela iluminada, percebemos claramente o peso negativo que o
narrador dá à companhia constante de Albertine: “ (...) sans que j'eusse un instant le loisir de
penser à moi, et même la peine, puisqu'elle serait auprès de moi, de penser à elle” [ (...) sem
que eu tivesse um instante o lazer de pensar em mim, nem mesmo o trabalho de pensar nela,
pois ela estaria a meu lado.].
E se havia satisfação em saber que todos ignoravam essa moça, inteiramente dele,
aguardando-o num quarto contíguo ao seu, o narrador é fortemente irônico ao mencionar que
137
“De Albertine, em compensação, nada me restava por descobrir. Cada dia me parecia menos bonita. Só o
desejo que ela excitava nos outros, quando, sabendo-o, eu recomeçava a sofrer e queria disputar-lha, elevava-a
aos meus olhos num alto pavês. Ela era capaz de ma causar sofrimento, mas de nenhum modo alegria. Só pelo
sofrimento subsistia o meu aborrecido apego”. (Trad., p.26)
138
“(...) o pássaro que eu vira andar pausadamente no cais, (...) perdera todas as suas cores” (Trad., p.160).
139
Podemos traduzir a expressão igualmente por “cinzenta prisioneira”.
82
estava mais sozinho no salão dos Verdurin, sugerindo que a mundanidade proporciona
momentos de solidão e reflexão inatingíveis na relação amorosa.
Sobre este aspecto da mundanidade em Proust, trazemos à baila a leitura deleuziana,
que afirma os signos mundanos ali existentes como vazios, pois substituem uma ação ou um
pensamento, e não são indícios de coisa alguma. Não há, assim, nada a decifrar por detrás dos
signos emitidos pelos personagens de salão, pois estes não possuem significação
transcendental.
Le signe mondain apparaît comme ayant remplacé une action ou une pensée.
Il tient lieu d´action et de pensée. C´est donc un signe qui ne renvoie pas à
quelque chose d´autre, signification transcendante ou contenu idéal, mais qui
a usurpé la valeur supposé de son sens. (1964, p. 12)140
Nada de cômico é dito nos Verdurin, mas o doutor Cottard faz sinal de que disse algo
engraçado e, em contrapartida, Mme. Verdurin faz sinal de que ri, signos tão bem apreendidos
por M. Verdurin, que procura uma careta apropriada para não ficar em posição inferior141.
Contudo, se em termos de ação e simbologia a mundanidade é vazia, não se deve
menosprezar o valor desse mundo na narrativa. Não devemos esquecer que se a experiência
da soirée Verdurin é marcada pela cena desoladora da humilhação do barão de Charlus
arquitetada pelos Verdurin, ela também é definida pela audição do septuor de Vinteuil,
altamente reveladora para o herói.
Outros episódios de grande envergadura para a narrativa da Recherche, como a
audição da sonata por Swann e as experiências privilegiadas do narrador no Temps Retrouvé,
passam-se igualmente em salões, demonstrando que a divisão radical que o narrador
proustiano faz entre o eu social e o eu profundo só poderia existir nessa construção
sistemática de episódios mundanos e muitas vezes comezinhos.
140
“O signo mundano aparece como substituto de uma ação ou um pensamento. Ele detém lugar de ação e de
pensamento. É, pois, um signo que não remete a nenhuma outra coisa, significação transcendental ou conteúdo
ideal, mas que usurpou o valor suposto de seu sentido”.
141
Cf. DELEUZE. Proust et les signes, p. 13.
83
Ainda segundo Deleuze, “L´apprentissage serait imparfait, et même impossible, s´il ne
passait par eux” (1964, p.13)142, pois a vacuidade de tais signos demonstra, de certa maneira,
um formalismo, uma ritualística de salão sem a qual o eu profundo não se forjaria.
Por isso, de nossa parte, cremos serem essenciais para a narrativa os inúmeros
personagens e episódios de salão, pois sem eles as experiências privilegiadas não teriam
grande relevância. Não há como frisar a importância e a intermitência desses momentos se
não houver um contínuo, um pano de fundo desses salões como contraponto. Em suma, não
haveria tempo, ou ao menos passagem do tempo, pois é na frequentação constante desse
mundo que percebemos o crescimento da compreensão do herói, que passa a ler e a
interpretar esses signos mundanos ao mesmo tempo em que trava um contato substancial com
a arte.
Essa dualidade entre mundanidade e momentos privilegiados existe na obra
proustiana, ainda que de modo irresoluto, desde Jean Santeuil. Blanchot, analisando essa obra
inacabada, afirma que Proust teria como projeto inicial a concepção de uma arte pura que se
concentrasse somente nos instantes privilegiados e evitasse o mero discurso romanesco.
Il semble que Proust conçoit alors un art plus pur, concentré sur les seuls
instants, sans remplissage, sans appel aux souvenirs volontaires, ni aux
vérités d´ordre général formées ou raissaisies par l´intelligence, auxquelles
plus tard il croira avoir fait une large place dans son oeuvre: en somme, un
récit “pur” qui serait fait de ces seuls points d´où il prend origine, comme un
ciel où, en dehors des étoiles, il n´y aurait que le vide143. (1959, p.30)
Esses momentos, contudo, por virem inteiramente desconectados do restante da
narrativa, formavam não um movimento, mas um retrato, ou se quisermos, imagens fixas que
não permitiam, obviamente, a mobilidade temporal, culminante na reflexão feita pelo
narrador no último romance da Recherche. Ao perceber as semelhanças entre a sensação
142
“A aprendizagem seria imperfeita, e mesmo impossível, se não passasse por eles”.
“Parece que Proust concebe então uma arte mais pura, concentrada sobre instantes únicos, sem
complementação, sem apelo às lembranças voluntárias, nem às verdades de ordem geral, formadas ou
compreendidas pela inteligência, às quais mais tarde ele acreditará ter dado um grande espaço em sua obra: em
suma, uma narrativa ‘pura’ que seria feita desses pontos únicos dos quais ela se origina, como um céu onde,
afora as estrelas, só haverá o vazio”.
143
84
presente (desnível do piso no pátio dos Guermantes) e a passada (o mesmo desnível nos
azulejos
do
batistério
de
São
Marcos,
em
Veneza),
o
narrador
compreende,
consequentemente, que por mais fugaz que seja essa experiência, por instantes, somos seres
fora do tempo.
Esta abolição temporal só pode ser expressa se estivermos completamente
mergulhados em uma temporalidade narrativa muito densa. Neste caso, na do universo dos
salões, pois como afirmamos, a intermitência dos momentos privilegiados só será detectada
dentro de uma continuidade espessa, ou como afirma Blanchot “(...) c´est par la continuité la
plus dense et la plus substantielle que l´oeuvre réussit à représenter ce qu´il y a de plus
discontinu, l´intermittence de ces instants de lumière d´où lui vient la possibilité d
´écrire”144 (1959, p. 33).
Retomando igualmente a noção de signos amorosos, se Deleuze os considera
mentirosos – “Les signes amoureux (...) ce sont des signes mensongers qui ne peuvent s
´adresser à nous qu´en cachant ce qu´ils expriment”145 –, nesse estado da narrativa podemos
afirmar que o amor esteriliza a imaginação. No universo proustiano, amar uma mulher e não
possuí-la permite a composição de um mundo imaginário e fictício em torno dela. É cercá-la
de histórias, de nomes, de espaços desconhecidos, como no caso do amor do protagonista por
Gilberte, pela duquesa de Guermantes, por Albertine. Amar seria, portanto, projetar-se em um
objeto que por si não tem tanta importância.
Depuis que j´ai vu Albertine, j´avais fait chaque jours à son sujet des milliers
de réflexions, j´avais poursuivi, avec ce que j´appelais elle, tout un entretien
intérieur où je la faisais questionner, répondre, penser, agir, et dans la série
indéfinie d´Albertines imaginées qui se succédaient en moi heure par heure,
l´Albertine réelle (...) ne figurait qu´en tête, comme la « créatrice » d´un rôle
(...). Cette Albertine-là n´était guère qu´une silhouette, tout ce qui s´y était
superposé était de mon cru (...).(OJFF, p. 213-4)146
144
“(...) é pela continuidade mais densa e mais substancial que a obra consegue representar aquilo que é mais
descontínuo, a intermitência desses instantes de luz dos quais provem a possibilidade de escrever”.
145
“Os signos amorosos (...) são signos mentirosos que só podem se dirigir a nós escondendo o que exprimem”.
146
“Desde que vira Albertine, fazia todos os dias mil reflexões a seu respeito, mantinha com o que eu chamava
Albertine todo um colóquio interior, em que lhe inspirava perguntas e respostas, pensamentos e ações e, na série
85
No amor, portanto, essas contribuições originárias do amante, que se sobrepõem ao
objeto desejado, muitas vezes “l´emportent – à ne se placer même qu´au point de vue de la
quantité – sur ceux qui nous viennent de l´être aimé” (OJFF, p. 214)147. No entanto, possuir a
mulher amada é, ao mesmo tempo, realizar um desejo, cessar a angústia, e ver desmoronar
diante de si todo esse universo construído para ela, que consiste em ver ruir o próprio
sentimento amoroso.
Si je n´aimais pas Albertine (ce dont je n´étais pas sûr), cette place qu´elle
tenait auprès de moi n´avait rien d´extraordinaire : nous ne vivons qu´avec
ce que nous n´aimons pas, que nous n´avons fait vivre avec nous que pour
tuer l´insupportable amour (...). (LP, p. 605)148
Nas palavras de Nicolas Grimaldi, “Como só podemos amar aquilo cuja ausência
obseda e devasta a nossa vida, sua presença, pelo contrário, ao mesmo em tempo que
tranqüiliza, destrói, contudo, nosso amor” (1994, p. 24).
Retornando a Albertine e ao episódio analisado neste capítulo, a presença da jovem é
sem dúvida castradora dos pensamentos do protagonista, mas não sem contradições, pois ela é
igualmente tida como valorosa, rica, comparada a um tesouro em troca do qual o herói
alienou sua liberdade, sua solidão, seu pensamento e que possui um significado para ele. É a
essa presença, metaforizada pela janela iluminada e que para os outros não passa de um dado
desinteressante, que o herói imputa um valor, uma consistência e uma plenitude que remetem
a toda a história de amor, desejo e conquista da mulher amada. O narrador justapõe dois
tempos, um passado feliz que se reporta à Albertine marinha, ao amor juvenil nascido em
Balbec e à dor suscitada pela desconfiança concernente à sexualidade da personagem
feminina, elementos que valorizam o objeto amado; e o presente que se refere a uma
indefinida de Albertines imaginadas que se sucediam em meu espírito de hora a hora, a Albertine de verdade,
(...)só figurava à frente como a criadora de um papel (...). Essa Albertine quase se reduzia a uma silhueta; tudo o
que se lhe sobrepunha era de minha invenção (...)”. (Trad., p. 512).
147
“(...) suplantam – ainda que apenas do ponto de vista da quantidade – aquelas que nos vêm da criatura
amada”. (Trad., p.513)
148
“Se eu não amasse Albertine (do que não estava certo), o lugar que ela ocupava junto a mim não teria nada de
extraordinário: é que não vivemos senão com o que não amamos, com o que fizemos viver conosco senão para
matar o insuportável amor (...)”. (Trad., p.89-90)
86
Albertine cativa, domesticada, a um amor espicaçado pelo cotidiano que torna a companhia
da amada já quase insuportável. “Je sentais que ma vie avec Albertine n´était, pour une part,
quand je n´étais pas jaloux, qu´ennui, pour l´autre part, quand j´étais jaloux, que
souffrance” (LP, p. 895)149.
Prazer e tédio tensionam-se, compondo o paradoxo deste episódio: há o momento das
carícias, mas ele é um empecilho para o desconhecido, para o desfrute de outras mulheres; há
satisfação na certeza da presença de uma jovem há alguns passos de seu quarto, mas há
enfado em privar-se de solidão.
Desta maneira, notamos que é por meio das imagens que metaforizam a janela
iluminada que Proust potencializa essa relação ambígua na qual os sintagmas “barres d´or
parallèles” [barras de ouro paralelas], “lumineux grillage” [grades luminosas] e “les
inflexibles barreaux d´or” [hásteas de ouro]150 ao mesmo tempo em que expõem o elemento
direto da representação – a janela – evocam de forma contundente a noção de prisão que
reverbera no episódio.
Vale lembrar que a palavra “barreaux”, por exemplo, pode ser aplicada tanto para
designar os componentes de uma janela como de uma prisão e mesmo que a tradução tenha
escolhido a palavra “hásteas”, poder-se-ia adotar o termo “grade”, que detém a imagem da
janela e da prisão construída por Proust.
Evidentemente, nosso intuito não é criticar a tradução brasileira, apenas frisar que a
escolha das palavras por Proust não foi aleatória, o que torna o termo “hásteas” incapaz de
condensar e remeter à idéia associada de janela e prisão, algo que se deve sobretudo ao fato
de que o léxico português para esse campo semântico é mais restrito do que o francês, e não
propriamente a uma imperícia.
149
“Sentia que minha vida com Albertine não era, de minha parte, quando eu não tinha ciúmes, senão
aborrecimento, e por outro lado, quando os tinha, senão sofrimento”. (Trad., p. 367)
150
Retomamos aqui a tradução brasileira.
87
Se em francês, as palavras barres, grillage e barreaux são completamente aplicáveis
tanto para à janela, quanto para à prisão, em português, grillage e barreaux possuem o mesmo
sentido – grade – causando, portanto, uma repetição que os tradutores preferiram, com acerto,
evitar.
Ademais, a supressão do adjetivo “inflexibles” na tradução rompe igualmente com a
imagem elaborada por Proust, que nesse momento da narrativa, produz metáforas que
repercutem não somente a relação paradoxal do protagonista e sua amada, mas o título do
romance, daí a importância de tal cena, desse “coup de théâtre” dado pelo escritor.
Sendo assim, a janela, caracterizada como cela, torna-se instrumento de tortura e de
sofrimento, forjados pelo próprio personagem principal que, mesmo estando fora, percebe sua
condição de cativo e de “servidão eterna”. O elemento ouro, por sua vez retoma a cor dourada
da luz emanada do quarto de Albertine (metonímia de sua presença) e o tesouro, a riqueza
escondida e insuspeita de todos, que consiste na posse da mulher amada.
É nessa composição ou justaposição de termos semanticamente antagônicos e
altamente sugestivos que Proust realiza a tensão existente no episódio, recuperando e
intensificando o título do romance e preparando seu desfecho com a fuga da jovem, pois
instaura uma relação que posteriormente saberemos ser insuportável para ambos.
Mais si je raisonnais au contraire d´après l´autre hypothèse, celle qui s
´appuyait non sur les paroles d´Albertine, mais sur des silences, des regards,
des rougeurs, des bouderies (...) alors je me disais que cette vie lui était
insupportable (...). (LP, p. 894)151
Mas se até aqui analisamos a importância que esse episódio terá na vida do herói e no
romance A Prisioneira, verificaremos doravante, seu valor e sua repercussão na Recherche.
O leitor da obra proustiana lembrar-se-á de outra janela, cuja cena é igualmente teatral,
referente aos personagens Swann e Odette. Por um erro de percepção, Swann engana-se de
151
“Mas quando eu raciocinava, ao contrário, de acordo com a outra hipótese, a que se apoiava não nas palavras
de Albertine, mas em silêncios, olhares, rubores, amuos (...) então eu concluía que aquela vida lhe era
insuportável (...)”. (Trad., p.366)
88
janela e acredita que Odette está em companhia de outro, fato reforçado pelas duas sombras
que o personagem vê passar diante da veneziana iluminada.
O coup de théâtre está prestes a ocorrer, com Swann a ponto de flagrar Odette e seu
suposto amante. Porém, logo descobrimos que o enciumado confundira as janelas,
surpreendendo assim dois velhos senhores que conversavam no interior do aposento.
Desfecho cômico e risível, muito distinto do episódio descrito em La Prisonnière.
Não é raro encontrarmos ao longo da Recherche repetições de temas e situações, e
poderíamos dizer que isto garante não somente uma unidade entre os diferentes romances,
mas também constrói uma memória no leitor. Por isso, cremos ser necessária a recuperação e
a análise desse primeiro episódio elaborado em Côté de chez Swann, pois somente assim
compreenderemos o efeito que tal repetição proporciona à narrativa.
Resumindo a cena, após uma forte tempestade, Swann chega à casa de Odette tarde da
noite, e ela, cansada e indisposta por causa do temporal, passa apenas meia hora com seu
amante e se recusa a “faire catleya” 152. Ele parte conformado, mas chegando ao seu
apartamento, é tomado pelo ciúme e pelas suspeitas com relação ao emprego que Odette fazia
de seu tempo. Percebe então que aquela indisposição poderia ser um pretexto para mandá-lo
embora e receber, quiçá, outro amante. Ele decide voltar à rua da amada para espioná-la e ter
a prova de sua traição.
(...) il descendit de voiture, tout était désert et noir dans ce quartier, il n´eut
que quelques pas à faire à pied et déboucha presque devant chez elle. Parmi l
´obscurité de toutes les fenêtres éteintes depuis longtemps dans la rue, il en
vit une seule d´où débordait – entre les voltes qui en pressaient la pulpe
mystérieuse et dorée – la lumière qui remplissait la chambre et qui, tant d
´autres soirs, du plus loin qu´il l´apercevait en arrivant dans la rue, le
réjouissait et lui annonçait: “elle est là qui t´attend” et qui maintenant, le
torturait en lui disant: “elle est là avec celui qu´elle attendait”. (CS, p. 268)153
152
Expressão usada pelo casal Swann e Odette para referir-se à relação sexual.
“(...) apeou do carro, o quarteirão estava deserto e às escuras, bastou-lhe andar alguns passos e foi dar quase
diante da casa de Odette. Em meio à obscuridade de todas as janelas de há muito apagadas na rua, viu uma única
de onde extravasava – entre os postigos que lhe premiam a polpa misteriosa e dourada – a luz que enchia o
quarto e que, em tantas outras noites, por mais longe que a visse ao entrar na rua, logo o alegrava, anunciandolhe: ‘Ela está aqui a esperar-te’ e que agora o torturava, dizendo-lhe: ‘Ela está aqui, com aquele a quem
153
89
É interessante notar que Proust recupera dessa cena alguns componentes que
integrarão o episódio da Prisioneira visto anteriormente. A frase “il descendit de voiture” do
Côté de chez Swann ecoa fortemente na frase “je descendis de voiture” do La prisonnière e a
composição entre a rua e a janela iluminada que se destaca de um cenário obscuro é
igualmente recuperada.
A cor dourada, bem como o elemento ouro são utilizados em ambos os trechos
“Certes, il souffrait de voir cette lumière dans l´atmosphère d´or de laquelle se mouvait
derrière le châssis le couple invisible et détesté, d´entendre ce murmure qui révélait la
présence de celui qui était venu après son départ” (CS, p. 268-9) 154, significando igualmente a
luz e a presença de pessoas – Albertine no La prisonnière, Odette e seu suposto amante em
Côté de chez Swann – cenário misterioso para Swann, mas familiar para o herói.
Notamos que a visão da janela iluminada é um instrumento de tortura para os
personagens masculinos, sofrimento desencadeado pelo ciúme e pela tentativa de posse do ser
amado.
Et pourtant il était content d´être venu: le tourment qui l´avait forcé de sortir
de chez lui avait perdu de son acuité en perdant de son vague, maintenant
que l´autre vie d´Odette, dont il avait eu, à ce moment-là, le brusque et
impuissant soupçon, il la tenait là, éclairée en plein par la lampe, prisonnière
sans le savoir dans cette chambre où, quand il le voudrait, il entrerait la
surprendre et la capturer (...)155. (CS, p.269)
Porém, apesar do sofrimento desencadeado primeiramente pela suspeita, e
posteriormente pela descoberta que julgava fazer, Swann contenta-se com elas. Satisfaz-lhe a
possibilidade de surpreender Odette e confirmar suas desconfianças, em um desejo frenético
esperava’. (Trad., p.335)
154
“Sofria ao ver aquela luz, em cuja atmosfera de ouro se movia, por trás dos postigos, o par invisível e
detestado; sofria ao ouvir aquele murmúrio que revelava a presença do homem que chegara após sua partida”.
(Trad., p. 335)
155
“E no entanto estava contente de ter vindo: a tortura que o tinha forçado a sair de casa perdera em acuidade o
que ganhara em precisão, agora que a outra vida de Odette, de que tivera naquele momento súbita e impotente
suspeita, ele a tinha ali, alumiada em cheio pela lâmpada, aprisionada sem saber naquele quarto, onde entraria
quando quisesse para a surpreender e capturar(...)”. (Trad., p. 335-6)
90
de conhecer a verdade. Este episódio é, assim como o do La prisonnière, portador de um
paradoxo, ou seja, do sofrimento e da alegria sentidos simultaneamente por Swann e pelo
protagonista.
É curioso verificar que tanto Odette como Albertine estão, em seus respectivos
momentos da narrativa, sob o julgo de seus amantes, e o adjetivo “prisioneira” cabe
igualmente a Odette e à jovem em flor. Se uma tem consciência de sua condição, a outra é
prisioneira sem o saber. Essa superioridade masculina revela-se, posteriormente, muito frágil
e enganosa, pois não os poupará de dissabores e tristezas: como vimos, o herói possui clareza
de sua situação de prisioneiro e Swann, mesmo apaziguado pela confusão que cometera, sofre
ao recordar essa aventura156.
Swann percebe-se suscetível a todos os signos, gestos e sorrisos emitidos por Odette e
busca, sem sucesso, compreendê-los e lhes dar sentido. No entanto, o desejo de verdade
instiga-lhe a curiosidade, e mesmo sabendo que declararia indiretamente seu excesso de amor
e de ciúme, não hesita em satisfazer sua vontade imediata e resolve bater nos postigos, como
sempre o fizera para alertar Odette de sua chegada.
Il savait que la réalité de circonstances qu´il eût donné sa vie pour restituer
exactement, était lisible derrière cette fenêtre striée de lumière, comme sous
la couverture enluminée d´or d´un de ces manuscrits précieux à la richesse
artistique elle-même desquels le savant qui les consulte ne peut rester
indifférent. Il éprouvait une volupté à connaître la vérité qui le passionnait
dans cet exemplaire unique, éphémère et précieux, d´une matière
translucide, si chaude et si belle. Et puis l´avantage qu´il se sentait – qu´il
avait tant besoin de sentir – sur eux, était peut-être moins de savoir, que de
pouvoir leur montrer qu´il savait. Il se haussa sur la pointe des pieds. Il
frappa. (...) Il regarda. Devant lui, deux vieux messieurs étaient à la fenêtre, l
´un tenant une lampe, et alors, il vit la chambre, une chambre inconnue 157.
156
“Mais, par moments, un mouvement de sa pensée venait en rencontrer le souvenir qu´elle n´avait pas aperçu,
le heurtait, l´enfonçait plus avant, et Swann avait ressenti une douleur brusque et profonde”. [“Mas por vezes
uma volta de seu pensamento ia, sem o perceber, ao encontro daquela recordação, batia-lhe, aprofundava-a mais,
e Swann sentia uma dor brusca e intensa”]. (CS, p.271; Trad., p. 338)
157
“Sabia que a realidade das circunstâncias, que ele daria a vida para reconstituir exatamente, achava-se ali
legível por trás daquela janela estriada de luz, como sob a capa, iluminada a ouro, de um desses preciosos
manuscritos, a cuja riqueza artística não pode ficar indiferente o erudito que os consulta. Sentia uma grande
volúpia em conhecer a verdade que o apaixonava naquele exemplar único, efêmero e precioso, de um translúcido
material, tão cálido e belo. E depois a vantagem que sentia – que tinha tanta necessidade de sentir – sobre eles
não consistia tanto em saber, mas em poder mostrar-lhes que sabia. Ergueu-se nas pontas dos pés. Bateu. (...)
91
(CS, p.270-1)
É notável como Proust recupera imagens desse episódio para compor o do La
prisonnière. Há semelhanças incontestáveis entre “la fenêtre striée de lumière” [“a janela
estriada pela luz”] do Côté de chez Swann e “ la lumière (...) qui striait de haut en bas de
barres d´or parallèles” [“a luz (...) que estriava, de alto a baixo barras de ouro paralelas”] de
La prisonnière. Além disso, a menção ao “precioso manuscrito”, cuja capa é iluminada a
ouro, alude ao “grimoire magique” do herói, traduzido como “signo mágico”, mas podendo
ser traduzido igualmente por “livro de magia”.
Se em Côté de chez Swann, a janela iluminada é comparada a um manuscrito precioso
e Swann ao erudito ansioso por decifrar, ler esse exemplar único, para o personagem
principal, o “livro de magia” lhe era tão claro quanto invisível a Brichot e a todos os amigos
que ignoravam a presença de Albertine: “Ce grimoire magique, tant il était clair pour moi (...)
était invisible pour Brichot resté dans la voiture, presque aveugle.” [“Esse signo mágico (...)
era tão claro para mim quanto era invisível para Brichot, que ficara quase cego, no carro”]
(LP, p. 833; Trad., p. 308).
Podemos dizer que enquanto Swann está em vias de “ler esse manuscrito único”, o
narrador-herói nesse nível da narrativa já leu seu “livro de magia”, já sabe o que lhe espera.
Esse jogo entre saber e não saber torna os episódios ainda mais interessantes, pois é nele que
os personagens se satisfazem e se sentem superiores. Swann realiza-se antes pelo fato de
mostrar que sabe do que pela descoberta em si. Sente-se superior a Odette e a seu hipotético
amante, pois eles ignoravam sua artimanha, seu conhecimento e sua presença, enquanto
Marcel satisfaz-se em saber que todos desconheciam a presença de Albertine.
Depois de traçados os paralelos entre os episódios, parece-nos evidente que Proust
retomou a cena da janela desenvolvida no Côté de Swann para compor a da Prisonnière,
Olhou. Diante dele, à janela, achavam-se dois senhores idosos, um dos quais segurava um lampião, e então viu o
quarto, um quarto desconhecido”. (Trad., p.337)
92
embora não tenhamos encontrado nenhuma referência a esse respeito nas versões manuscritas
utilizadas para a elaboração do episódio do La prisonnière, como veremos posteriormente.
Esse diálogo entre cenas muito semelhantes instaura uma unidade na narrativa da
Recherche, promovendo uma identidade entre Swann e o herói e colocando o protagonista na
linhagem de ciumentos descritos na obra. Além disso, permite fixar um dos temas mais
basilares da obra de Proust, problemática que ultrapassa os limites da Recherche o do amor,
ou em outros termos, o do ciúme, do amor como sofrimento158.
É a partir de casos particulares que o narrador proustiano chega às leis universais do
que seria o sentimento amoroso entre homens e mulheres. Tanto o amor de Swann, quanto o
de Marcel se estabelecem a partir de uma falta, de uma angústia pela ausência ou
inacessibilidade da mulher amada.
O amor de Swann não teria começado no instante em que ele não encontrara Odette
em casa dos Verdurin? O interesse do herói por Albertine não se iniciou muito mais pelo
desejo em adentrar em um mundo desconhecido, inatingível, do que pelas qualidades da
jovem? Segundo o narrador proustiano “Tout un processus d´angoisses se développe et suffit
pour fixer notre amour sur elle, qui en est l´objet à peine connu de nous. L´amour devient
immense, nous ne songeons pas combien la femme réelle y tient peu de place”. (OJFF, p.
213)159. Tudo é invenção, projeção de um estado de alma que, curiosamente, é desencadeado
pela angústia.
(...) puisque ce n´est pas notre goût délibéré, mais le hasard d´une minute d
´angoisse, minute indéfiniment prolongée par notre faiblesse de caractère,
laquelle refait chaque soir des expériences et s´abaisse à des calmants, qui a
choisi pour nous. (LP, p. 602)160
158
Como veremos mais adiante, Proust já desenvolve o tema do ciumento e do sofrimento amoroso em seus
textos anteriores, como Les plaisirs et les jours, com a novela “La fin de la jalousie” e em seu romance
inacabado Jean Santeuil.
159
“Desenvolve-se todo um processo de angústias, o que basta para sujeitar o nosso amor a essa mulher, objeto
que mal conhecemos, desse amor. A paixão chega a tornar-se imensa, e ocorre-nos reconhecer que lugar
diminuto ocupa dentro dela a mulher real”. (Trad., p. 512)
160
“(...) pois não é o nosso gosto deliberado, mas o acaso de um minuto de angústia, minuto indefinidamente
prolongado pela nossa fraqueza de caráter, a qual refaz todas as noites as experiências e se degrada até os
93
A inquietação é nutrida pelo anseio de integrar esse universo desconhecido do qual a
mulher amada faz parte, mundo imaginado e desejado por aquele que ama. Uma vez
conquistada a mulher, esse tormento intensifica-se pelo ciúme, pois o amante apercebe-se de
que essa “terra” é impenetrável: “Par instants, dans les yeux d´Albertine, dans la brusque
inflammation de son teint, je sentais comme un éclair de chaleur passer furtivement dans des
régions plus inaccessibles pour moi que le ciel (...)”. (LP, p. 887)161.
Por esse motivo, a relação amorosa traz sempre muito sofrimento e desgosto àquele
que ama. A pretensão é de entender, por exemplo, o que significa o enrubescimento de
Albertine, ou este ou aquele sorriso de Odette: tarefa impossível, que nada explica e só
aumenta o campo das possíveis causas.
Aquele mistério que outrora desencadeara o amor é agora fonte de desespero, “(...)
cette beauté qu´en pensant aux années successives où j´avais connu Albertine, (...) cette
beauté prenait pour moi quelque chose de déchirant” (LP, p.888)162.
Como afirma Franklin Leopoldo e Silva:
O amor realizado é, paradoxalmente, ocasião para uma das mais altas
manifestações da dor, somente inferior à dor da perda e da morte. A
realização do amor é aquele estágio em que, possuindo o ser amado, sendo
senhor de seus atos, tendo-o como prisioneiro, ao mesmo tempo não o
temos, porque não podemos penetrar na sua alma, não podemos pôr a nu a
faculdade de elaboração de signos, e isto é só o que nos daria completo
domínio sobre ele. (1972, p. 201)
Por isso, no universo proustiano, o sentimento amoroso almeja antes o esquecimento e
a interrupção do sofrimento do que a duração da relação: “E não será, com efeito, um dos
paradoxos do amor em Proust o aspirar ele bem menos à eternidade do que ao esquecimento,
e bem menos ao fervor ou ao frenesi do que a placidez e a indiferença?” (GRIMALDI, 1994,
p. 6).
calmantes, quem escolhe por nós”. (Trad., p.87)
161
“Por vezes, nos olhos de Albertine, no súbito afogueamento das suas faces, eu sentia como um relâmpago de
calor passar furtivamente em regiões mais inacessíveis para mim do que o céu (...)”. (Trad., p. 360)
162
“(...) aquela beleza que, ao pensar nos anos sucessivos que eu conhecera Albertine, (...) aquela beleza assumia
para mim não sei quê de pungente”. (Trad., p. 360)
94
Nesse sistema o amante, após cessar a dor e, por conseqüência, o amor, compreende o
quão ínfimo era o objeto de seu sentimento, que lhe causou tantos dissabores. Swann desabafa
“Dire que j´ai gaché des années de ma vie, que j´ai voulu mourir, que j´ai eu mon plus grand
amour, pour une femme qui ne me plaisait pas, qui n´était pas mon genre” (CS, p. 375)163. E o
narrador-herói, por meio da constatação do desaparecimento da dor que trazia certo
apaziguamento para suas angústias, declara: “je sentais le néant qu´elle [Albertine] était pour
moi, que je devais être pour elle” (LP, p. 538)164.
Essa lucidez dos personagens com relação ao amor agrava suas condições, pois
embora compreendam que tudo não passou de uma cristalização165 do objeto amado e de um
conhecimento de si mesmo (pois apenas se projetaram nesses seres), não são capazes de
desvencilhar-se do inferno que criaram.
Por todas as razões consideradas até aqui, podemos afirmar que o episódio da janela
iluminada ultrapassa sua condição de evento narrativo para atingir o de motivo literário, ou
por que não, de leitmotiv, análogo ao vestido de Fortuny, analisado no capítulo anterior.
Afinal, esses episódios de diálogo intenso estabelecem um elo entre personagens e
uma unidade na exposição filosófica do amor, do sofrimento e do ciúme, construindo, assim,
mais uma das unidades da Recherche. O amor de Swann especializa-se no do protagonista
para mostrar que, mesmo possuindo e controlando o ser amado, nunca o teremos por
completo, e os tormentos causados por essa posse não são de somenos.
3.2 A “fenêtre éclairée” em Jean Santeuil
É importante desdobrar o destaque anterior de que dentro do projeto escritural de
163
“E dizer que eu estraguei anos inteiros de minha vida, que desejei a morte, que tive o meu maior amor, por
uma mulher que não me agradava, que não era meu tipo”. (Trad., p. 455)
164
“eu sentia o nada que ela [Albertine] era para mim, e que eu devia ser para ela”. (Trad., p.26)
165
Termo cunhado por Stendhal para caracterizar a ilusão que construímos em torno de quem amamos e que será
comentado mais adiante.
95
Proust a cena da “fenêtre éclairée” do Côté de Swann já havia sido elaborada muito antes do
início da composição da Recherche.
É no romance inacabado Jean Santeuil, cujos manuscritos foram primeiramente
estudados e editados por Bernard de Fallois, e posteriormente revistos e corrigidos por Pierre
Clarac e Yves Sandre, que encontramos, na nona parte, em um capítulo intitulado “De l
´amour”, o episódio da “fenêtre éclairée” e o gérmen de toda a teoria do amor e do ciúme que
será desenvolvida na Recherche.
Se podemos atribuir, por exemplo, a cristalização do objeto amado e as questões
amorosas que operam na Recherche a um possível diálogo com Stendhal, essa
correspondência fica-nos evidente nesse capítulo de Jean Santeuil pelo uso que Proust faz do
título da obra stendhaliana. Além disso, o texto começa citando explicitamente parte da
concepção amorosa de Stendhal.
Stendhal qui est si matérialiste, pour qui les choses en dehors de nos
dispositions, même de nos dispositions physiques, semblent avoir une
importance réelle pour nous (...) a toujours mis au-dessus de tout l´amour,
qui pour lui semble faire un avec la vie intérieure. Ce qui fait qu´on aime la
solitude, qu´on y a mille pensées, que la nature nous devient compréhensible
et éloquante, pour lui c´est l´amour. Il semble n´avoir connu la poésie que
sous la forme de l´amour. (JS, p. 121)166
Neste excerto, o narrador de Jean Santeuil declara que Stendhal, sendo ele
materialista, considera importantes as coisas que estão fora de nossa vida interior, em
compensação, ele atribui a origem do amor a essa vida, o que, em outros termos, significa que
o sentimento amoroso parte somente daquilo que está contido em nossa alma, não de um
objeto exterior, no caso o ser amado.
Vimos no tópico anterior que Proust elabora uma filosofia do amor baseada na
angústia e no sofrimento. O amor só nasceria de uma falta, de uma ausência ou da
166
“Stendhal que é tão materialista, para quem as coisas fora de nossas disposições, mesmo de nossas
disposições físicas, parecem ter uma importância real para nós (...) sempre colocou acima de tudo o amor, que
para ele parece fazer um uno com a vida interior. O que faz com que amemos a solidão, com que tenhamos aí
mil pensamentos, que a natureza se torne compreensível e eloquente para nós, para ele é o amor. Parece que ele
só conheceu a poesia sob a forma do amor”.
96
impossibilidade de possuir o objeto amado. São esses estados de alma que selecionam o ser
amado a despeito de suas qualidades, que passam a uma condição menor.
Parece-nos que as concepções de Stendhal e Proust convergem, apesar de algumas
diferenças essenciais. Para Stendhal, não é a angústia a desencadeadora do sentimento
amoroso, mas a esperança: “Il suffit d´un très petit degré d´espérance pour causer la naissance
de l´amour”167 (1927, p.38). Contudo, elementos como o ciúme, a cristalização e a idealização
da mulher amada são pontos comuns entre os escritores.
Em seu tratado categorizador dos gêneros amorosos intitulado De l´amour, Stendhal
expõe, por uma bela imagem, o fenômeno da cristalização:
Aux mines de sel de Salzbourg, on jette, dans les profondeurs abandonnées
de la mine, un rameau d´arbre effeuillé par l´hiver; deux ou trois mois après
on le retire couvert de cristallisations brillantes: les plus petites branches,
celles qui ne sont pas plus grosses que la patte d´un mésange, sont garnies d
´une infinité de diamants, mobiles et éblouissants ; on ne peut plus
reconnaître le rameau primitif. (1927, p.33)168
Esse raminho tão fino como a pata de um passarinho, que ao cabo de alguns meses se
vê adornado por cristais de sal, não corresponderia, na obra proustiana, à beleza tão sem
importância de Odette ou à fina silhueta de Albertine na praia de Balbec?
Mesmo quando foram apresentados, a beleza de Odette de Crécy não era somente
indiferente, mas não despertava desejo algum em Swann:
(...) quand un jour au théâtre il fut présenté à Odette de Crécy, (...) elle était
apparue à Swann non pas certes sans beauté, mais d´un genre de beauté qui
lui était indifférente, qui ne lui inspirait aucun désir, lui causait même une
sorte de répulsion physique. (CS, p. 192-3)169
Mesmo com as constantes visitas de Odette, Swann não cessava de sentir certa
167
“Basta um pequeníssimo grau de esperança para causar o nascimento do amor”.
“Nas minas de sal de Salzburg, jogamos nas profundezas abandonadas da mina, um raminho de árvore
desfolhado pelo inverno; dois ou três meses depois, o retiramos coberto de cristalizações brilhantes: os menores
galhos, aqueles que não são mais grossos do que a pata de um canário-da-terra, ficam cheios de uma infinidade
de diamantes, móveis e ofuscantes; não se pode mais reconhecer o raminho primitivo”.
169
“(...) quando um dia no teatro foi apresentado a Odette de Crécy (...) ela se afigurara a Swann não por certo
sem beleza, mas de um gênero de beleza que lhe era indiferente, que não lhe inspirava nenhum desejo, que até
lhe causava uma espécie de repulsa física”. (Trad., p.247)
168
97
decepção ao ver aquele rosto excessivamente expressivo e fanado, apesar de sua juventude:
“et sans doute chacune d´elle [as visitas] renouvelait pour lui la déception qu´il éprouvait à se
retrouver devant ce visage” (CS, p. 194)170. Contudo, esse gênero de beleza que era tão
desinteressante a Swann é elevado ao estatuto artístico quando ele compara Odette a um
personagem de Botticelli pintado em um afresco da Capela Sistina. A primeira Odette, aquele
“raminho primitivo” foi cristalizado e adornado não pelos sais das minas de Salzburg, mas
pela pintura italiana.
Após essa associação entre a mulher real e a pintura, o corpo de Odette, que nunca
havia inspirado nada em Swann, torna-se o original carnal de Zéphora, a filha de Jéthro. E é
somente a partir desse momento que Swann encontra uma justificativa para as inúmeras horas
passadas ao seu lado. Seus defeitos primevos são, finalmente, suplantados pelas qualidades e
importância da pintura, fazendo com que Swann renove sua forma de olhar aquele rosto
outrora desagradável:
Il n´estima plus le visage d´Odette selon la plus ou moins bonne qualité de
ses joues et d´après la douceur purement carnée qu´il supposait devoir leur
trouver en les touchant avec ses lèvres si jamais il osait l´embrasser, mais
comme um écheveau de lignes subtiles et belles que ses regards dévidèrent,
poursuivant la courbe de leur enroulement, rejoignant la cadence de la nuque
à l´effusion des cheveux et à la flexion des paupières, comme en un portrait
d´elle en lequel son type devenait intelligible et clair. (CS, p. 220)171
Segundo Stendhal, o próprio da cristalização “c´est l´opération de l´esprit, qui tire de
tout ce qui se présente la découverte que l´objet aimé a de nouvelles perfections” (1927, p.
33)172. Mas essa descoberta nada mais é do que a coleção de prazeres, de desejos e satisfações
que o amante formará com relação à amada. Assim, Stendhal afirma que “la cristallisation
formée dans la tête de chaque homme doit porter la couleur des plaisirs de cet homme” (1927,
170
“e sem dúvida cada visita renovava para ele a sua decepção ante aquele rosto”. (Trad., p. 248)
“Não mais apreciou o rosto de Odette segundo a melhor ou pior qualidade de suas faces ou a suavidade
puramente carnal que lhes supunha encontrar ao contato dos lábios, se jamais ousasse beijá-la, mas sim como
uma meada de linhas sutis e belas que seus olhares dobavam, seguindo a curva de seu enrolamento, ligando a
cadência da nuca à efusão dos cabelos e à flexão das pálpebras, como num retrato dela em que seu tipo se
tornava inteligível e claro”. (Trad., p. 279)
172
“é a operação do espírito que tira de tudo o que se lhe apresenta a descoberta de que o objeto amado possui
novas perfeições”.
171
98
p.63)173. Nada mais corroborativo com relação ao amor na obra proustiana, quando o narrador
afirma que “(...) étant amoureux d´une femme nous projetons simplement en elle un état de
notre âme ; que par conséquent l´important n´est pas la valeur de la femme mais la profondeur
de l´état” (OJFF, p. 189)174.
A cor dos prazeres e das satisfações de Swann está fortemente aliada ao seu apego e
adoração pela arte, enquanto para o herói da Recherche, o mistério das moças em flor está
altamente ligado à paisagem marinha.
Mais quand, même ne le sachant pas, je pensais à elles, plus inconsciemment
encore, elles, c´était pour moi les ondulations montueuses et bleues de la
mer, le profil d´un défilé devant la mer. C´était la mer que j´espérais
retrouver, si j´allais dans quelques villes où elles seraient. L´amour le plus
exclusif pour une personne est toujours l´amour d´autre chose. (OJFF, p.
189)175
A partir dessas considerações feitas a respeito da cristalização stendhaliana e por que
não dizer igualmente proustianas, pôde-se verificar a expressiva estreiteza entre os pontos de
vista de ambos os escritores. Mas aquilo que notamos disperso na Recherche, ou seja, a
filosofia amorosa que surge entremeada por episódios romanescos, encontramo-lo de maneira
profundamente condensada nesse capítulo de Jean Santeuil.
Proust busca o entrelaçamento desse desenvolvimento das leis do amor com o
episódio fictício que será contado, o amor de Jean pela Mme. S.. Esse evento narrativo ficará,
no entanto, restrito a esse primeiro capítulo da nona parte e não terá conexão com as outras
seções. Poderíamos dizer que essa é uma das principais características desse romance
inacabado e uma das primordiais diferenças com a Recherche.
Como viemos analisando até este momento, escrever a Recherche era de certa forma,
173
“a cristalização formada na cabeça de cada homem deve conter a cor dos prazeres desse homem” (o grifo é do
autor).
174
“(...)ao nos enamorarmos de uma mulher, projetamos simplesmente nela um estado de nossa alma; que por
conseguinte o importante não é o valor da mulher, mas a profundeza do estado”. (Trad., p.485)
175
“Mas quando pensava nelas, embora sem o saber, sucedia que, ainda mais inconscientemente, elas eram para
mim aquelas ondulações monstruosas e azuis do mar, o perfil de um desfiladeiro diante do mar. Era o mar que eu
esperava encontrar, se fosse a alguma cidade onde estivessem. O amor mais exclusivo por uma pessoa é sempre
o amor por outra coisa”. (Trad., p.485)
99
elaborar repetições e leitmotiv que garantissem uma unidade entre os vários fragmentos
desenvolvidos nos manuscritos. Uma das possíveis causas do abandono do romance Jean
Santeuil poderia ser essa falta de vínculo profundo entre os episódios.
De caráter fortemente autobiográfico, Jean Santeuil inaugura o gênero romance na
carreira literária de Proust, mas ainda proporciona questões e dúvidas no jovem escritor. Em
uma carta a Marie Nordlinger, prima inglesa de seu amigo Reynaldo Hahn, Proust menciona:
Je travaille depuis très longtemps à un ouvrage de très longue haleine, mais
sans rien achever. Et il y a des moments où je me demande si je ne
ressemble pas au mari de Dorothée Brook dans Middlemarch et si je
n'amasse pas des ruines. Depuis une quinzaine de jours je m'occupe à un
petit travail absolument différent de ce que je fais généralement, à propos de
Ruskin et de certaines cathédrales. (Corresp., t. II, p. 377)176
O abandono do romance e o mergulho nas traduções das obras de Ruskin, desvio
considerável das atividades literárias, durou seis anos até Proust dedicar-se finalmente à
Recherche.
O inacabamento de Jean Santeuil, ou pior, a consciência de sua provável irrealização,
de seu previsto fracasso foi uma das preocupações de Proust que, em determinados
momentos, indagava-se sobre sua condição de romancista. Logo na introdução do romance
em questão177, Proust escreve: “Puis-je appeler ce livre un roman? C´est moins peut-être et
bien plus, l´essence même de ma vie recueillie sans y rien mêler, dans ces heures de déchirure
où elle découle. Ce livre n´a jamais été fait, il a été récolté” (JS, p.31)178.
Essa “colheita” irá justapor um grande número de episódios distintos, escritos tanto
em folhas avulsas, quanto em páginas de caderno, que ficariam por montar. Como
176
“Eu trabalho há muito tempo numa obra de grande fôlego, mas sem acabar nada. Há momentos em que me
pergunto se eu não pareço com o marido de Dorothée Brook em Middlemarch e se eu não estou juntando
ruínas”. Proust se compara ao personagem M. Brooke, do romance Middlemarch de George Eliot, que trabalha
toda a sua vida em uma obra insignificante e absurda.
177
Essa introdução, assim como as divisões dos capítulos e alguns títulos das seções foram estabelecidos pelos
editores. Os episódios, apesar de possuírem forte tendência de romance de formação, não foram escritos e
organizados cronologicamente por Proust.
178
“Poderia eu nomear esse livro romance? É menos talvez e muito mais, a essência mesmo de minha vida
recolhida sem nada misturar, nessas horas fendidas de onde ela vaza. Esse livro nunca foi escrito, foi colhido”.
100
mencionamos, esse seria um dos malogros do primeiro projeto de romance proustiano, algo
notado por Jean-Yves Tadié e já mencionado na introdução deste trabalho:
On note qu'il s'agit toujours de scènes autobiographiques, non encore
soumises au point de vue des personnages, à l'intrigue, à l'imaginaire d'une
fiction. C'est l'une des raisons d'un grand abandon, celui de cette masse de
pages: raconter sa vie, ses impressions, Proust, entre vingt-cinq et trente ans,
le pouvait; non leur donner une structure d'ensemble, un principe organisateur. (TADIÉ, 1987, p. XIX)179
Porém, mesmo contendo uma profusão de episódios autobiográficos, é incontestável
seu aspecto romanesco. Ainda segundo Tadié.
Ce roman marque à la fois une étape importante de la carrière littéraire de
son auteur, et un échec aux conséquences durables. L´étape, c´est le passage
de la forme brève, portraits, caractères à la manière de La Bruyère, poèmes
en prose, nouvelles, au genre romanesque, à un manuscrit de longueur
considérable: sept cent quatre-vingts pages imprimées. (1987, p. XVI)180
A entrada no universo romanesco trazia, porém, outro problema para o escritor
“Proust est en effet à la croisée de deux voies, de deux genres, tiraillé entre deux ‘côtés’, dont
il ne sait pas encore qu´ils peuvent se rejoindre (…): le côté de l´Essai (de la critique) et le
côté du Roman” (BARTHES, 1984, p. 334)181.
Essa indecisão de gêneros é finalmente aceita pelo escritor, que na Recherche utiliza
sem nenhuma restrição esses dois modos de dizer o mundo: o comentário e a fabulação.
Contudo, em todo o processo escritural de Proust esses dois tipos de expressão concorreram e
se imiscuíram. Jean Santeuil não foge a essa regra, especialmente o episódio tratado neste
tópico, no qual iniciando sua argumentação por Stendhal, Proust procura inserir momentos
romanescos no claro intuito de ilustrar essa filosofia amorosa.
179
“Notamos que se trata sempre de cenas autobiográficas, não submetidas ainda ao ponto de vista dos
personagens, à intriga, ao imaginário de uma ficção. É uma das razões de um grande abandono, o dessa massa de
páginas: contar sua vida, suas impressões, Proust, entre vinte e cinco e trinta anos, poderia; mas não lhe dar uma
estrutura de conjunto, um princípio organizador”.
180
“Este romance marca, simultaneamente, uma etapa importante da carreira literária de seu autor e um fracasso
com conseqüências duráveis. A etapa é a passagem da forma breve – retratos, caracteres à maneira de La
Bruyère, poemas em prosa, novelas – ao gênero romanesco, a um manuscrito de tamanho considerável: 784
páginas impressas”.
181
“Proust está, com efeito, no cruzamento de duas vias, de dois gêneros, balançando entre dois ‘lados’,
ignorando ainda que eles poderiam se juntar (...): o lado do Ensaio (da crítica) e o lado do Romance”.
101
Há passagens em que o narrador parece mencionar leis ou máximas do sentimento
amoroso para confirmar que ele não passa de uma projeção de nós mesmos: “Un individu, si
remarquable fût-il – et dans l´amour il n´a généralement rien de remarquable – n´a aucun droit
à limiter ainsi notre vie intérieure” (JS, p. 121) 182 ou ainda “Il n´y a aucun rapport réel et
profond entre tel profil, momentanément charmant pour nous, et notre vie intérieure” (JS, p.
121-2)183.
Todo esse texto é construído, de maneira sistemática, por explicações ou comentários
concernentes ao amor, entremeado, no entanto, pela possível paixão de Jean por Mme. S. O
protagonista está incerto sobre seus sentimentos, assim como, muitas vezes, o herói da
Recherche coloca em questão seu afeto por Albertine:
Et comme tout en nous a été adulteré par la vie, sensibilité, sincérité,
mémoire même, et jusqu´au sentiment bien net de notre personnalité et de la
réalité de nos sentiments, nous ne savons même plus parfois si nous sommes
amoureux ou non. (JS, p. 125)184
O personagem de Jean assemelha-se bastante ao protagonista da Recherche, sobretudo
por sua origem não aristocrática e pelas experiências privilegiadas que experimenta. Contudo,
muitas de suas características aproximam-no de Swann, especialmente por sua mobilidade
social – a freqüentação de diversos tipos de salões – e pela relação que estabelecerá com
Mme. S.. Isso fica ainda mais evidente nos episódios romanescos urdidos por Proust e que
foram integralmente reaproveitados para compor a história do casal Swann e Odette.
Em meio a um texto de conteúdo altamente teórico, Proust elabora apenas dois
eventos narrativos, sendo um deles o da janela iluminada. A relação de Jean com Mme. S, no
entanto, é menos complexa do que a de Swann e Odette. Mme. S é uma jovem viúva de
182
“Um indivíduo, por mais notável que seja – e no amor não há geralmente nada de notável – não tem nenhum
direito de limitar assim nossa vida interior”.
183
“Não há nenhuma relação real e profunda entre tal perfil, momentaneamente encantador para nós, e nossa
vida interior”.
184
“E como tudo em nós foi adulterado pela vida, sensibilidade, sinceridade, a própria memória e até o
sentimento bem claro de nossa personalidade e da realidade de nossos sentimentos, nós às vezes não sabemos
nem se estamos apaixonados ou não”.
102
reputação exemplar que Jean não possuía fisicamente.
Il s´était bientôt rendu compte qu´il ne pourrait coucher avec cette jeune
veuve indépendante (elle le recevait tous les soirs de diz heures à deux
heures du matin ; il ne la désirait d´ailleurs que très peu) mais honnête, qu´il
ne pourrait même l´embrasser. (JS, p. 123)185
A admiração de Jean pela moça, as atenções que ela lhe dispensava e certa intimidade
estabelecida entre os dois são os elementos que caracterizam o amor, quase platônico e sem
interesse físico de Jean. A simples desconfiança de que Mme. S sentia por ele o mesmo que
ele sentia por ela era o suficiente para promover o amor do protagonista, para “entretenir en
lui cet amour dénué en quelque sorte de l´objet de l´amour qui régnait en lui, comme bien des
passions que nous n´éprouvons plus qu´en idée, par la connaissance que nous avons prise de l
´impossibilité de leur réalisation” (JS, p. 123)186.
Embora Stendhal defina o ato de amar como “(...) avoir du plaisir à voir, à toucher,
sentir par tous les sens, et d´aussi près que possible, un objet aimable et qui nous aime” (1927,
p.32)187, Proust, mesmo dialogando intensamente com De l´amour, demonstra que, em amor,
não é necessária reciprocidade, tampouco esperança em possuir o ser amado.
Jean goza muito mais de seu sentimento do que das qualidades de Mme. S: “Mais
cette absence d´espérance précise dans la personne retournant ses pensées sur la satisfaction
qu´il y a à aimer, il jouissait plus de son amour que de son amante” (JS, p. 123)188.
É por meio dessa sensação amorosa que Jean sentia um prazer mais vivo do que
aquele experimentado até então na mundanidade, e por essa razão, lembrava de Stendhal e da
importância que ele dava ao amor: “(...) par là lui rappelaient Stendhal, lui faisant considérer l
185
“Ele logo tinha se dado conta que não poderia dormir com essa jovem viúva independente (ela o recebia
todas as noites de dez horas a duas horas da manhã; aliás, ele a desejava muito pouco) mas honesta, que ele não
poderia até mesmo beijá-la”.
186
“manter esse amor de certa forma desprovido do objeto do amor que reinava nele, como muitas paixões que
não experimentamos mais do que em idéia, pelo conhecimento que temos da impossibilidade de sua realização”.
187
“(...) ter prazer em ver, tocar, sentir por todos os sentidos, e o mais próximo possível, um objeto amável e que
nos ame”.
188
“Mas essa ausência de esperança característica à pessoa que volta seus pensamentos à satisfação que existe
em amar, ele gozava mais de seu amor do que de sua amante”.
103
´amour comme une façon infiniment plus agréable de goûter la vie et de trouver du charme à
la solitude” (JS, p. 123-4)189.
Entrementes, mesmo não possuindo Mme. S. e travando com ela somente uma forte
amizade, Jean não escapa dos momentos de dúvida. No dia seguinte a uma soirée em que
Mme. S ficou até tarde da noite em companhia dele, ela, excessivamente cansada, pediu-lhe
para partir à meia-noite. “Il lui dit au revoir, non sans avoir regardé dans l´autre chambre, et
partit” (JS, p. 129)190.
Essa desconfiança repentina não possui, no entanto, razões de ser dentro da narrativa.
Não há nada no texto que indique um passado misterioso de Mme. S, nem nada que revele o
caráter ciumento de Jean. Muito diferente de Swann e do protagonista da Recherche, Jean “ne
cherchait pas à se demander ce qu´elle avait été avant lui, ce qu´elle serait après” (JS, p.
126)191.
No entanto, após deixar a casa de Mme. S, “Rentré chez lui il eut envie de ressortir, il
prit un fiacre qu´il lâcha non loin de chez elle et entra dans la rue. Et tout de suite il aperçut
entre les volets fermés des deux petites fenêtres la lumière dorée qui emplissait la
chambre” (JS, p. 129)192.
Sem um motivo aparente para justificar a atitude do personagem, o que proporciona ao
texto certa incoerência, Proust começa a elaborar o episódio da janela iluminada que será
integralmente retomado em Côté de Swann. Constatamos com isso que Jean é o primeiro
germe, o primeiro esboço do ciumento, ainda muito inconsistente. Seu amor é platônico,
embora agradável, e raríssimos são seus momentos de sofrimento e angústia, que aparecem
189
“(...) por aí lhe lembravam Stendhal, fazendo-lhe considerar o amor como uma forma infinitamente mais
agradável de experimentar a vida e de encontrar charme na solidão”.
190
“Ele lhe disse até logo, não sem olhar dentro do outro quarto e partiu”.
191
“não procurava se perguntar o que ela tinha sido antes dele e o que seria depois”.
192
“Entrando em casa, teve vontade de sair, tomou um fiacre que largou não longe da casa dela e entrou na rua. E
em seguida, percebeu entre as venezianas fechadas das duas pequenas janelas, a luz dourada que preenchia o
quarto”.
104
em uma intensidade muito inferior ao dos experimentados pelos personagens da Recherche.
Porém, mesmo gozando de certo prazer por seu sentimento amoroso, Jean possui instantes de
dúvida e desconfiança, o que o situa na estirpe de ciumentos.
Maintenant, depuis plus de deux heures qu´il avait quittée, c´était la preuve
détestable qu´elle avait avec elle ce quelqu´un pour qui elle l´avait fait partir.
Il aurait bien voulu savoir qui c´était. Sans faire un bruit il se baissa, colla
ses yeux contre l´auvent pour voir par la fente, mais les volets obliques ne
laissaient rien voir. (...) Il entendait le bruit d´une conversation. (...) Sans
doute il souffrait, il détestait cette lumière qu´il voyait et où se mouvait le
couple ennemi (...). Mais du moins il venait de remporter sur eux comme
une sorte d´avantage, il les tenait là et s´il frappait pour se faire ouvrir la
fenêtre, ce serait tout de meme lui qui serait en ce moment-là le vainqueur
(...). (JS, p. 129-130)193
Os mesmos componentes de sofrimento – a percepção da luz dourada, a sombra de
dois corpos se movendo e o barulho de uma conversa – e de satisfação – a certeza de que
surpreenderá os faltosos e a superioridade que sente em relação a eles – vistos em Swann já
foram elaborados nesse episódio de Jean Santeuil.
A ânsia em mostrar sua esperteza suplanta, como em Côté de chez Swann, a vergonha
de bater na janela e mostrar-se ciumento: “Il était un peu honteux de frapper, de montrer qu´il
était revenu, mais d´un autre côté il ne pouvait pas résister au désir qu´ils sachent qu´il était
là, qu´il avait tout su” (JS, p. 130)194.
Jean sente o mesmo prazer que sentirá posteriormente Swann descobrindo a verdade,
mostrando que tomava conhecimento de tudo: “Il éprouvait une sorte de plaisir à sentir ces
faits qu´il allait toucher et qui se manifestaient à lui derrière ces volets éclairés” (JS, p.130)195.
Son coeur battait, il frappa. Il entendit venir à la fenêtre, commencer à ouvrir
et alors, satisfait qu´elle sût qu´il n´avait pas été trompé, qu´elle était prise,
193
“Agora, depois de mais de duas horas que ele a tinha deixado era a prova detestável que ela tinha consigo
alguém por quem ela o tinha feito partir. Ele gostaria muito de saber quem era. Sem fazer um barulho, ele se
abaixou, colou seus olhos contra o alpendre para ver pela fenda, mas os postigos oblíquos nada deixavam
entrever. (...) Ele ouvia o barulho de uma conversa. (...) Sem dúvida sofria, detestava essa luz que via e onde se
movia o casal inimigo (...). Mas ao menos, acabava de obter sobre eles uma espécie de vantagem, ele os detinha
ali, e se batesse para abrirem a janela, ainda assim seria ele, naquele momento, o vencedor”.
194
“Estava um pouco envergonhado de bater, de mostrar que voltara, mas por outro lado não podia resistir ao
desejo de que soubessem que estava ali e sabia de tudo”.
195
“Experimentava uma espécie de prazer em sentir esses fatos com os quais entraria em contato e que se lhe
manifestavam por detrás dos postigos iluminados”.
105
pour n´avoir pas l´air d´y tenir, avant même qu´elle eût ouvert, il dit : «Ne
vous dérangez pas, n´ouvrez pas, je voulais seulement voir, étant repassé par
ici et ayant vu la lumière, si vous n´étiez pas souffrante ». Le volet s´ouvrit
tout à fait, un vieux monsieur parut et un autre qui était auprès de lui. Un
instant il resta déconcerté. (...) Il comprit – et du reste la chambre inconnue
par les volets maintenant ouverts s´offrait à ses yeux – qu´il s´était trompé de
fenêtre, que la fenêtre éclairée n´était pas celle de son amie (...). (JS, p.
131-2)196
Fica evidente a similitude existente entre os episódios de Jean Santeuil e Côté de
Swann, embora as diversas imagens construídas para a janela na Recherche não apareçam em
sua totalidade nesse romance inacabado do escritor. Notamos uma ausência do confronto de
imagens e metáforas que correspondam à janela – como as relacionadas ao ouro, ao tesouro, à
janela como manuscrito precioso –, muito menos à prisão. Obviamente, ela é, assim como na
Recherche, elemento de tortura e sofrimento, mas sua descrição é muito sumária, quase
inexistente.
Apesar das diferenças, é incontestável que esse episódio serviu de base para a
elaboração da cena do Côté de Swann, juntamente com dois outros, desenvolvidos no
manuscrito de Jean Santeuil.
Após a cena da janela, há, em uma mesma seqüência cronológica presente em Côté de
Swann, o episódio da visita vespertina de Jean a Mme. S, que não abre a porta e alega
posteriormente, que dormia, e o da tentativa de leitura de uma carta que a jovem viúva
escrevera a outro homem, e cuja postagem havia incumbido a Jean. Esses mesmos eventos
ocorrem com Swann e Odette, nessa mesma ordem, embora a relação dos personagens da
Recherche seja mais complexa e se estendam a outro relacionamento, o do herói com
Albertine.
196
“Seu coração disparava, ele bateu. Ouviu alguém chegar à janela, começar a abrir, e então, satisfeito que ela
soubesse que não havia sido enganado, que fora descoberta, de parecer que não se importava, antes mesmo que
ela abrisse, ele disse: ‘Não se incomode, não abra, eu queria apenas ver, tendo passado novamente por aqui e
visto a luz, se você não estava indisposta’. O postigo se abriu por inteiro, um velho senhor apareceu e outro que
estava ao lado dele. Por um instante permaneceu desconcertado (...) Ele compreendeu – e de resto, o quarto
desconhecido pelos postigos agora abertos se oferecia a seus olhos – que se enganara de janela, que a janela
iluminada não era a de sua amiga”.
106
Proust, fortemente impregnado pelo tratado de Stendhal, acaba por elaborar um texto
de caráter fortemente moralista, deixando pouco espaço para a invenção romanesca. A
relativa falta de coerência desse episódio pode ter sido causada pela tentativa de seguir o
pensamento stendhaliano, conjugando-o à narrativa de experiências que, de fato, levavam
para outros caminhos da teoria amorosa.
Em todo caso, não há como não salientar as semelhanças entre o pensamento de
Stendhal e a filosofia do amor desenvolvida por Proust, sobretudo na Recherche. E o seguinte
trecho stendhaliano certamemnte caberia como alusão à própria história de Swann e Odette,
“Un homme rencontre une femme et est choqué de sa laideur ; bientôt, si elle n´a pas de
prétentions, sa physionomie lui fait oublier les défauts de ses traits, il la trouve aimable et
conçoit qu´on puisse l´aimer”197 (1927, p.).
A ausência de metáforas mais elaboradas em Jean Santeil também revela, de certa
maneira, um interesse maior pelo conteúdo de máximas e aforismos do que propriamente pelo
enredo ficcional. Ao escrever a Recherche, pelo contrário, Proust lança mão de muito
conteúdo romanesco e procedimentos literários, e seu narrador declara a importância da
construção de metáforas quando afirma que
On peut faire succéder indéfiniment dans une description les objets qui
figuraient dans le lieu décrit, la vérité ne commencera qu’au moment où
l’écrivain prendra deux objets différents, posera leur rapport, analogue dans
le monde de l’art à celui qu’est le rapport unique de la loi causale dans le
monde de la science, et les enfermera dans les anneaux nécessaires d’un
beau style. (...) Le rapport peut être peu intéressant, les objets médiocres, le
style mauvais, mais tant qu’il n’y a pas eu cela, il n’y a rien. (TR, p. 468)198
O episódio da “fenêtre éclairée”, bem como toda a seção intitulada “De l´amour” em
Jean Santeuil demonstra pouca densidade psicológica dos personagens, deixa fios soltos, sem
197
“Um homem encontra uma mulher e fica chocado com sua feiúra; mas logo, se ela não tem pretensões, sua
fisionomia o faz esquecer os defeitos de seus traços, ele a acha amável e concebe que é possível amá-la”.
198
“Podem-se alinhar indefinidamente, numa narrativa, os objetos pertencentes ao sítio descrito, mas a verdade
só surgirá quando o escritor tomar dois objetos diversos, estabelecer a relação entre eles, análoga no mundo da
arte à relação única entre causa e efeito no da ciência, e os enfeixar nos indispensáveis anéis de um belo estilo.
(...) A relação pode ser pouco interessante, medíocres os objetos, pobre o estilo, mas sem isso nada se faz”.
(Trad., p. 167).
107
articulações, o que, segundo Mireille Lipiansky, torna Proust “plus moraliste que romancier:
ses personnages, aussi bien Jean que ses amoureuses, manquent d´épaisseur et de vie” (1974,
p.172)199, o que, de forma alguma, retira da cena da janela iluminada 200 sua condição de
leitmotiv dos ciumentos.
Outro fator relevante é que, embora o tema do amor, do ciúme e do sofrimento tenham
sido constantes em toda a carreira literária de Proust – como visto no primeiro capítulo, já em
Les plaisirs et les jours, a novela “Fin de la jalousie” introduz as agruras das relações
amorosas – a recuperação não somente de um tema, mas de uma cena, demonstra que Proust,
assim que alcança uma imagem satisfatória, nunca mais a abandona. Isto pode ser
comprovado pela transposição que fará da cena da “fenêtre éclairée” em Jean Santeuil para
Um amor de Swann, e dos elementos desta última para A Prisioneira.
Isto indica que dificilmente poderemos fazer a clássica divisão literária de “obras de
juventude” e “obras de maturidade” ao falarmos dos manuscritos proustianos, embora não
busquemos negar as diferenças existentes entre as fases de escritura. Mas, no universo
escritural de Proust, esses limites se confundem, invadem-se, tal como o quadro do porto de
Carquethuit, pintado por Elstir, que “avait su habituer les yeux à ne pas reconnaître de
frontière fixe, de démarcation absolue, entre la terre et l´océan” (OJFF, p. 192-3)201.
3.3 A janela de Barbey d´Aurevilly
Analisamos até o momento o episódio da janela iluminada de Albertine no romance A
prisioneira e detectamos semelhanças com outro episódio da Recherche, situado em “Un
amour de Swann”. Após o cotejamento das duas cenas, percebemos que Proust construiu uma
199
“mais moralista que romancista: seus personagens, tanto Jean como suas namoradas, carecem de espessura e
de vida”.
200
Juntamente com o episódio da visita vespertina e com o das cartas, que serão apenas retomados em CS.
201
“soubera habituar os olhos a não reconheceram fronteira fixa, demarcação absoluta, entre a terra e o oceano”.
(Trad., p. 488-9)
108
unidade entre elas, ligando os dois romances, os personagens, e estabelecendo, com isso, uma
espécie de filosofia do amor. A partir dessas leituras, afirmamos que esse episódio seria não
apenas uma cena, mas um motivo, um leitmotiv para os ciumentos e para a relação amorosa.
Estudamos os primórdios dessa cena de Côté de Swann, elaborada no romance
inacabado Jean Santeuil. Seu uso para demonstrar o ciúme de Jean em um capítulo cujo foco
era a discussão do amor por meio do tratado de Stendhal, reforça nossa hipótese da cena como
um motivo ou uma abertura da história dos enciumados. Essa abertura posteriormente
retornaria um pouco variada, como no processo musical, para ilustrar o amor do protagonista
por Albertine.
O que estava concentrado em um capítulo em Jean Santeuil, dispersou-se na
Recherche em uma clara tentativa de estabelecimento de um vínculo entre as partes. Notamos
que, se Proust não consegue articular os diversos temas e fragmentos contidos em Jean
Santeuil, possível motivo para o abandono do projeto, ele busca fazê-lo na escritura da
Recherche, feita igualmente de fragmentos, alinhavados, porém, por leitmotivs como o
vestido de Fortuny, ou a janela iluminada.
Importa-nos agora refletir sobre os elementos trabalhados por Proust na composição
da janela iluminada em La prisonnière, bem como sua Albertine, que nos permitam
diferenciá-los das construções anteriores que lhe serviram como fundação. Em um artigo
intitulado “‘Les inflexibles barreaux d´or’: d´Alberte à Albertine”, Marie Miguet-Ollagnier,
analisando as versões manuscritas da construção desse episódio, atribui sua realização à
leitura que Proust fez da novela “Le rideau cramoisi”, do livro Diaboliques de Barbey d
´Aurevilly.
Partindo dos rascunhos editados pela Pléiade, Ollagnier estabelece uma comparação
entre as versões, que desembocará na análise das variantes e invariantes na construção do
109
episódio. Não temos o intuito de recuperar a totalidade da leitura feita pela autora, sobretudo
porque ela utiliza manuscritos editados que, como se sabe, não incorporam a integralidade do
rascunho, como, por exemplo, as rasuras, as adições interlineares etc.
De todo modo, a reflexão feita a partir das invariantes parece-nos interessante.
Conforme Ollagnier:
(...) le plus intéressant est de dégager des brouillons des invariants qu´on
retrouve aussi dans la dernière version. La scène se déroule à Paris, la nuit,
ce qui détache l´unique fenêtre éclairée du quartier, celle derrière laquelle
veille Albertine. Plus caractéristique, Proust tient toujours à ce que la fenêtre
éclairée ait deux spectateurs : l´un, le héros, la contemple d´en bas, dans la
rue, l´autre, Brichot, passe devant elle sans comprendre ce qu´elle représente
pour son compagnon. (1994, p. 19)202
Partindo dessa análise, a autora propõe uma leitura intertextual entre esse episódio do
La prisonnière e a novela citada anteriormente, “Le rideau cramoisi” de Barbey d´Aurevilly.
Segundo Ollagnier, a cena da Recherche teria uma analogia impressionante com a narrativa
de Barbey, o qual é assunto da conversação literária entre Marcel e Albertine.
Um dos fortes componentes para a comparação é a caracterização das personagens
femininas. Em Barbey, a heroína da história chama-se igualmente Albertine.
Mlle. Albertine (c´était le nom de cette archiduchesse d´altitude, tombée du
ciel chez ces bourgeois comme si le ciel avait voulu se moquer d´eux), Mlle.
Albertine, que ses parents appelaient Alberte pour s´épargner la longueur du
nom, mais qui allait parfaitement mieux à sa figure. (AUREVILLY, p.
30-1)203
Ollagnier destaca que muitos críticos proustianos já haviam sugerido que o nome de
Albertine poderia ter vindo da heroína aurevilliana. Além disso, frisa que “Les deux jeunes
sont des êtres de fuite, elles font l´objet de suppositions de la part de leurs amants qui n
202
“(...) o mais interessante é extrair dos rascunhos as invariantes que encontramos também na última versão. A
cena se passa em Paris, à noite, o que destaca a única janela iluminada do quarteirão, aquela por trás da qual
Albertine está acordada. Mais característico, Proust faz questão sempre de que a janela iluminada tenha dois
espectadores: um, o herói, a contempla de baixo, na rua, o outro, Brichot, passa diante dela sem compreender o
que ela representa para seu companheiro”. (o grifo é da autora)
203
“Mademoiselle Albertine (era o nome dessa arquiduquesa de altitude, caída do céu na casa desses burgueses,
como se o céu tivesse quisto escarnecer-lhes), Mlle. Albertine, que seus pais chamavam de Alberte para se
poupar do comprimento do nome, mas que caía perfeitamente melhor à sua figura”.
110
´arrivent pas à percer leur mystère” (1994, p. 20)204.
Com efeito, a caracterização de Alberte indica seu lado ousado, misterioso,
dissimulado, pois ao mesmo tempo em que simula indiferença com relação à presença de
Brassard, protagonista da história, recorre a um subterfúgio para pegar-lhe a mão
sorrateiramente:
Un soir, il y avait à peu près un mois que Mlle. Alberte était revenue à la
maison, et nous nous mettions à table pour souper. Je l´avais à côté de moi,
et je faisais si peu d´attention à elle que je n´avais pas encore pris garde à ce
détail de tous les jours qui aurait dû me frapper : qu´elle fût à table auprès de
moi au lieu d´être entre sa mère et son père, quand, au moment où je dépliais
ma serviette sur mes genoux... non, jamais je ne pourrai vous donner l´idée
de cette sensation et de cet étonnement ! Je sentis une main qui prenait
hardiment la mienne par-dessous la table. (AUREVILLY, p.32)205
Essa atitude audaciosa dá início à relação entre Brassard e Alberte que atravessava o
quarto dos pais quase todas as noites, no escuro e a tateio, para encontrar-se com seu amante
no cômodo que este alugara na residência. A história, contada pelo próprio protagonista ao
narrador da novela, foi desencadeada pela visão que ambos têm de uma janela iluminada, em
meio a uma intensa escuridão.
Viajando em uma diligência cujas rodas, desgastadas pela longa viagem, obrigaram a
carruagem a parar, o narrador, em companhia do capitão Brassard, avista, no escuro da noite,
uma única janela iluminada, cuja luz era “tamisée par un double rideau cramoisi dont elle
traversait mystérieusement l´épaisseur”. (p. 18)206. Brassard reconhece a janela como sendo a
de seu antigo quarto onde, trinta anos antes, possuía a jovem Alberte.
Em seu relato conta que, em uma dessas noites em que mantinha relações com a moça,
204
“As duas jovens moças são seres de fuga, elas são o objeto das suposições por parte de seus amantes que não
conseguem desvendar seus mistérios”.
205
“Uma noite, havia aproximadamente um mês que Mlle. Alberte tinha voltado a casa, nós sentamos à mesa
para jantar. Eu a tinha ao meu lado e dava tão pouca atenção a ela, que não havia ainda percebido este detalhe de
todos os dias que deveria ter me surpreendido: que ela estava à mesa, perto de mim, ao invés de estar entre sua
mãe e seu pai, quando, no momento em que eu desdobrava meu guardanapo sobre meus joelhos... não, jamais eu
poderia te dar a idéia dessa sensação e desse espanto! Eu senti uma mão que pegava ardilosamente a minha por
debaixo da mesa”.
206
“tamisada por uma dupla cortina carmesim, pela qual ela atravessava misteriosamente a espessura”.
111
ela morrera repentinamente, deixando de respirar, sem nenhuma causa aparente. Desesperado
com essa morte súbita e misteriosa, igualmente inquieto pela reação dos pais de Alberte e pela
reputação da moça, Brassard dirige-se ao quartel para pedir ajuda ao coronel de sua divisão.
Este, por sua vez, manda-lhe a outro agrupamento militar e promete resolver o assunto. Longe
de tudo, Brassard não pôde saber qual foi o resultado desse caso, e tendo o coronel morrido
antes que lhe contasse o que se passara, ele ignora, até o presente da narrativa, o que de fato
acontecera naquela noite.
A novela termina com uma aparição misteriosa, uma sombra por detrás das cortinas
carmesins: “ – Tenez! – me dit-il, – voyez au rideau! L´ombre svelte d´une taille de femme
venait d´y passer en s´y dessinant! – L´ombre d´Alberte ! – fit le capitaine. – Le hasard est par
trop moqueur ce soir, ajouta-il avec amertume” (p. 57)207.
O cenário da janela iluminada, visto por dois espectadores numa paisagem noturna,
faz com que Ollagnier aproxime o texto proustiano do de Barbey. Além disso, a autora
observa que o uso insólito do fiacre por Proust no episódio da Prisioneira repercute, de fato,
a diligência utilizada por Barbey. Nessa altura do romance proustiano, há uma sensível
passagem do tempo que opera pela introdução de técnicas modernas tais como a eletricidade,
o telefone, o automóvel, o avião. Contudo, Proust substitui o táxi pelo fiacre, o que, segundo
Ollagnier “pourrait être un signe d´allégeance à Barbey” (1994, p.21)208.
Essa leitura parece-nos plausível, mas, não podemos esquecer que o fiacre pode
igualmente ser um sinal de repetição do próprio texto proustiano. Swann também toma um
fiacre quando parte para a casa de Odette: “(...) il ressortit, il prit un fiacre et se fit arrêter tout
près de chez elle” [“(...) tornou a sair, tomou um fiacre e parou perto da casa de Odette”] (CS,
p. 268; Trad., p. 335). E como vimos, há uma intensa conexão entre esses episódios
207
“– Veja! – ele me disse – veja na cortina! A sombra esbelta do tamanho de uma mulher acabava de passar,
desenhando-se nela! – A sombra de Alberte! – disse o capitão. – O acaso está por demais zombeteiro esta noite,
acrescentou ele com amargura”.
208
“poderia ser um sinal de fidelidade a Barbey”.
112
proustianos. Aliás, Ollagnier não ignora esse dado e aventa a hipótese de Proust já ter
utilizado a novela de Barbey para compor a cena em “Um amor de Swann”, no entanto, ela
não menciona a elaboração dessa cena em Jean Santeuil, o que fragiliza seu argumento.
Todavia, sua leitura concernente às heroínas é sobremaneira pertinente. A Albertine de
Proust é, sem dúvida, um ser cambiante e desconcertante, que acumula, sucessivamente, uma
série de atitudes que, se postas lado a lado, contradizem-se. Indiferente de início, com relação
ao herói, ela lhe entrega, de súbito, um bilhete com uma declaração de amor, mas recusa o
beijo de Marcel. Posteriormente, em uma visita ao protagonista em Paris, permite o beijo
negado até então, e mais adiante aceita morar junto dele, sem estabelecer, no entanto, nenhum
tipo de união oficial. A dúvida a respeito de suas preferências sexuais reforça ainda mais seu
caráter fugidio.
A caracterização de Alberte também é baseada em dúvidas e mistérios. A jovem, que
retorna à casa dos pais, mostra-se impassível a esse hóspede que era Brassard, como se ele
não existisse: “(...) l´air qu´elle avait, et qui était singulier dans une jeune fille aussi jeune qu
´elle, car c´était une espèce d´air impassible, très difficile à caractériser” (AUREVILLY, p.
30)209. Essa sugestiva indiferença é repentinamente subvertida pela atitude que a moça tem no
jantar ao pegar a mão do jovem militar e pela presteza e dissimulação com que guarda dentro
de seu corpete, sem os pais perceberem, um bilhete que Brassard lhe entrega na noite
seguinte.
Posteriormente, Alberte retoma o seu lado frio e impassível, desconsiderando a
presença do protagonista. Quando Brassard não mais compreendia o que ocorrera, ela entra
em seu quarto, no meio da noite e dá início à relação voluptuosa e carnal com o rapaz.
Surpreendentemente, Alberte possui características viris e andróginas, sendo descrita
209
“(...) o ar que ela tinha, e que era singular em uma moça tão jovem como ela, pois era uma espécie de ar
impassível, muito difícil de caracterizar”.
113
como uma “grande personne” [“pessoa grande”, p. 29], cuja mão era “un peu grande, et forte
comme celle d´un jeune garçon” [um pouco grande e forte como as de um rapaz, p. 32], tendo
“sous sa peau fine presque autant de muscles que moi” [“sob sua fina pele quase tantos
músculos quanto eu”, p. 38].
Essa androginia, por mais que não indique, em Barbey, dúvidas em relação à
sexualidade de Alberte, pode ter sido um elemento sugestivo para Proust construir sua
ambígua heroína. Como visto no primeiro capítulo, Proust, no caderno 64, registra o nome
“Alberte” para designar sua heroína, e no caderno 71, dedicado à história da jovem, ele atribui
características viris a sua personagem.
Segundo Ollagnier, “(...) c´est la main de l´héroïne, cette main forte d´un personnage
androgyne qui prend possession d´un homme faible, Brassard. L´Albertine de Proust a pour sa
part un cou puissant” (1994, p. 20)210.
No entanto, gostaríamos de nuançar esse paralelo que a autora estabelece entre as
personagens femininas. Alberte é, sem dúvida, forte, audaciosa e corajosa e supera, de longe,
o medo, a timidez e a incapacidade do personagem masculino. Albertine, por seu turno, pode,
muitas vezes, sobressair ao herói da Recherche e possuir, em alguns momentos, atitudes viris,
porém não se pode esquecer que sua força não é corporal, sendo sua existência comparada,
enquanto dorme, a uma planta.
Étendue de la tête aux pieds sur mon lit, dans une attitude d´un naturel qu´on
n´aurait pu inventer, je lui trouvais l´air d´une longue tige en fleur qu´on
aurait disposée là ; et c´était ainsi en effet: le pouvoir de rêver que je n´avais
qu´en son absence, je le retrouvais à ces instants auprès d´elle, comme si en
dormant elle était devenue une plante. (LP, p. 578)211
Se o herói aurevilliano atraiu-se pelas qualidades físicas, morais e reais de Alberte, a
210
“(...) é a mão da heroína, essa mão forte de um personagem andrógino que toma posse de um homem fraco,
Brassard. A Albertine de Proust tem, por seu lado, um pescoço poderoso”.
211
“Estendida a fio comprido em minha cama, numa atitude de uma naturalidade que não se teria podido
inventar, dava-me a impressão de uma longa haste em flor que houvessem colocado ali, e o era efetivamente: o
poder de cismar, que eu só tinha na ausência dela, encontrava-o naqueles instantes a seu lado, como se dormindo
ela se tivesse convertido numa planta”. (Trad., p. 62-3)
114
força e a importância de Albertine parte, com efeito, da imaginação do protagonista, que lhe
imputa características. Em alguns momentos, pode ser forte, mas em outros, variando
segundo o pensamento de seu amante, possui a fragilidade de um vegetal.
A personagem de Barbey é claramente definida, apesar de suas contradições; de
Albertine, não podemos dizer o mesmo, pois ela é um acúmulo constante de percepções do
narrador proustiano, sendo essa uma das grandes diferenças entre Proust e seu modelo
aurevilliano.
Não pretendemos obviamente estender uma leitura comparatista e cotejar com
detalhes os textos dos dois escritores, tampouco rebater eventuais lacunas existentes na
análise feita por Ollagnier baseando-nos nas versões manuscritas às quais tivemos acesso.
Como veremos de modo mais detalhado no próximo tópico, os rascunhos proustianos dão-nos
pouquíssimas pistas sobre a forma como foi empreendida a escrita desse episódio.
Posto isso, cabe-nos destacar apenas um aspecto que demonstrou ser de importância
capital para a escrita proustiana: o do modelo literário.
No Carnet 1, utilizado quase massivamente para anotações concernentes ao projeto
Sainte-Beuve, encontramos algumas notas acerca de Barbey e sua obra. Essa caderneta,
oferecida a Proust por Mme. Strauss em fevereiro de 1908, juntamente com outras quatro, é
considerada como “le journal de bord du Contre Sainte-Beuve: 1e lecteur peut y suivre la
gestation des projets proustiens de cette période” (QUARANTA, 1998, p. 9)212.
Por se tratar de anotações fragmentárias, sua compreensão muitas vezes não se dá de
forma muito precisa. Porém, isso não inviabiliza seu entendimento, pois muitas dessas notas
deixam implícitos os contextos aos quais estão ligadas. No caso das anotações sobre Barbey,
Proust escreve, no fólio 35 vº: “Par là je veux peut´être plus Barbey que Flaubert” (Carnet 1,
212
“diário de bordo do Contra Sainte-Beuve: o leitor pode seguir nele a gestação dos projetos proustianos desse
período”.
115
p. 95)213. Esse trecho refere-se a toda uma concepção romanesca que é própria de Aurevilly.
Como cita Proust:
Belles formes ds un beau cadre, les bergers dans la lande. Couleur locale,
tous les usages, les objets notamment à l´enterrement faisant une trame
ancienne et locale à cette histoire, sentiment à comparer à celui de l´histoire
orale indiqué dans la préface, draps, pièces de monnaie blancs p. 264 etc.
(Carnet 1, 1976, p. 94)214
Essa nota, como bem salienta Philip Kolb, - responsável pela edição da caderneta –
inicia uma série de referências a obras de Barbey, sobretudo a Ensorcelée. Proust percebe
nesses textos um desenvolvimento da cor local, de um sentimento de ancianidade que não
estão presentes, por exemplo, em Un coeur simple de Flaubert, daí sua preferência pelo
modelo aurevilliano.
Segundo Kolb, em sua introdução à edição do Carnet 1, o fato de “querer” mais
Barbey do que Flaubert indicaria que Proust estava à procura de um modelo para seu
romance. Em outra nota, no fólio 43 vº, Proust registra “Notes sur Barbey écrites dans les
Diaboliques” [“Notas sobre Barbey escritas em Diabólicas”, p. 106], o que demonstra que
Proust leu e anotou o exemplar desse romance, infelizmente perdido.
Não há, pois, como recuperar o que Proust provavelmente usou do romance de Barbey
para escrever a Recherche, mas se ele percebe o escritor como um possível modelo para sua
escritura romanesca, podemos então reconhecer-lhe outro papel essencial. Em uma nota no
fólio 44 rº, em uma seção intitulada “Barbey d´Aurevilly, Proust desenvolve uma série de
reflexões teóricas sobre o escritor. Nesse trecho do Carnet 1, Proust assinala:
Ce qui est intéressant chez lui c´est que les choses matérielles y sont aimés
pour q.q. chose d´autre qui y est caché, les paroles de Me Tennenbourg ou du
Chevalier des Touches contiennent l´Histoire, comme les vieux usages
(Ensorcelée), les mots. Mais cette matière symbolique c´est surtout la
physiologie, le visage d´Aimée de Spens, de l´Ensorcelée, la main du
Rideau Cramoisi : De même le monde c´est le vieux prestige de l
213
“Por aí eu quero talvez mais Barbey do que Flaubert”.
“Belas formas num belo quadro, os pastores na lande. Cor local, todos os usos, os objetos, notadamente no
enterro fazendo uma trama antiga e local a essa história, sentimento de comparar àquele da história oral indicado
no prefácio, lençóis, moedas brancos p. 264 etc”.
214
116
´aristocratie sous les corps des nobles (la Clotte, c´est tous les roturiers, voir
les bourgeois anciens domestiques du Dessous de cartes) et l´Angleterre
cachée et parfumant
Qd il a dit joli comme un village d´Écosse il a rapproché ce qui est uni dans
tous ses livres. (Carnet 1, 1976, p. 106-7)215
Encontramos nessa anotação estético-crítica três temas que serão caros a Proust e que
aparecerão de um modo ou de outro, na Recherche. Primeiramente, esse amor pelas coisas
materiais revelaria, de fato, o amor de outra coisa. Nada mais interessante para o narrador
proustiano, do que a tentativa de descobrir esse material oculto e travestido dos personagens.
As sessões masoquistas de Charlus, por exemplo, escondem, na verdade, seu ideal viril, sua
paixão pelas histórias de tortura da Idade Média:
(...) au fond de tou cela il y avait chez M. de Charlus tout son revê de virilité,
attesté au besoin par des actes brutaux, et toute l´enluminure intérieure,
invisible pour nous, mais dont il projetait ainsi quelques reflets, de croix de
justice, de tortures féodales, qui décorait son imagination moyenageuse.
(TR, p. 419)216
Segundo Philippe Willemart, sofrer esse flagelo é uma forma de imitar, no corpo, as
cenas que definem uma época e que o faziam compartilhar o sofrimento dos supliciados da
Idade Média, é “a comunhão com os ancestrais que ele busca” (2000, p. 131).
Outro tema citado na nota é a importância que Barbey dá às antigas práticas e às
palavras antigas. Proust, por sua vez, recupera a forma provincial atávica de falar para
caracterizar Françoise e até mesmo a duquesa de Guermantes. O velho prestígio da
aristocracia talhado no corpo dos personagens é um campo fértil para o narrador compreender
os gestos, o menear de cabeça, os olhares, tudo aquilo que determina um atavismo, uma
herança e um ritual.
215
“O que é interessante nele é que as coisas materiais são amadas por alguma outra coisa que está escondida, as
palavras de Mme. Tennebourg ou do Cavaleiro des Touches contêm a História, como os velhos usos
(Enfeitiçada), as palavras. Mas essa maneira simbólica é sobretudo a fisiologia, o rosto de Aimée de Spens, da
Enfeitiçada, a mão do Rideau Cramoisi: Da mesma forma o mundo é o velho prestígio da aristocracia sob os
corpos dos nobres (a Clotte é todos os plebeus, ver os burgueses antigos domésticos do Dessous de cartes) e a
Inglaterra escondida e perfumando Quando diz bonito como uma aldeia da Escócia ele aproximou o que está
unido em todos os seus livros”.
216
“(...) havia, intato, seu sonho de virilidade atestada, se necessário, por atos brutais, havia, invisíveis para nós,
perceptíveis, porém, por alguns reflexos, as iluminuras interiores, com cenas e acessórios de suplícios, que lhe
decoravam a imaginação medieval”. (Trad., p. 124)
117
Até este momento, vimos que Barbey possui uma função de modelo literário para a
obra proustiana. Entretanto, uma passagem contida nessa nota chamou-nos sobremaneira a
atenção. Ao registrar: “Qd il a dit joli comme un village d´Écosse il a rapproché ce qui est uni
dans tous ses livres”, Proust destaca o elemento que dá unidade a todas as obras de Barbey d
´Aurevilly.
Curiosamente, essa nota aparecerá no romance La prisonnière quando da discussão
sobre arte entre o herói e Albertine. Nessa passagem do romance, compreendemos melhor não
somente a nota do Carnet 1, mas a importância que Barbey tem para Proust.
Et repensant à la monotonie des oeuvres de Vinteuil, j´expliquais à Albertine
que les grands littérateurs n´ont jamais fait qu´une seule oeuvre, ou plutôt
réfracté à travers des milieux divers une même beauté qu´ils apportent au
monde. (...) Ces phrases types que vous commencez à reconnaître comme
moi, ma petite Albertine, les mêmes dans la sonate, dans le septuor, dans les
autres oeuvres, ce serait par exemple, si vous voulez, chez Barbey d
´Aurevilliy une réalité cachée révélée par une trace matérielle, la rougeur
physiologique de l´Ensorcelée, d´Aimée de Spens, de la Clotte, la main du
Rideau cramoisi, les vieux usages, les vieilles coutumes, les vieux mots, les
métiers anciens et singuliers derrière lesquels il y a le Passé, l´histoire orale
faite par les pâtres au miroir, les nobles cités normandes parfumées d
´Angleterre et jolies comme un village d´Écosse (...). (LP, p. 877-8)217
Para Proust, a genialidade de uma obra artística reside nessa repetição de elementos,
que faz com que o autor, mesmo tendo escrito diversos romances, realize uma obra única,
introduzindo no mundo essa beleza singular trazida por seus livros.
Em Barbey, esses
elementos são a cor vermelha, a ancianidade dos antigos costumes, das velhas palavras, as
cidades normandas tomadas de Inglaterra, a fisiologia dos personagens etc. Esses
componentes promovem unidade, correspondência entre as obras, e compreendemos que, para
Proust, o que há de mais modelar em Barbey é a unidade que perpassa suas obras.
217
“E tornando a pensar na monotonia das obras de Vinteuil, eu explicava a Albertine que os grandes literatos
jamais escreveram senão uma obra única, ou por outra, nunca fizeram senão refratar através de meios diversos
uma mesma beleza que trazem ao mundo. (...) Essas frases-tipos, que vocês começa a reconhecer como eu,
minha Albertine, e são as mesmas na sonata, no septeto, nas outras obras, seriam, por exemplo, em Barbey d
´Aurevilly, uma realidade oculta que é revelada por um indício material, o rubor fisiológico da Enfeitiçada, de
Aimée de Spens, da Clotte, a mão de Rideau cramoisi, os velhos usos, os velhos costumes, as velhas palavras, os
ofícios antigos e singulares atrás dos quais está o Passado, a história oral feita pelos pastores do lugar, as nobres
cidades normandas cheirando à Inglaterra e bonitas como uma aldeia as Escócia (...)”. (Trad., p. 350)
118
Se em 1908, iniciando o projeto Sainte-Beuve que desembocaria na Recherche, Proust
buscava modelos para sua literatura, ele já tinha, entretanto, passado pela experiência mal
sucedida de Jean Santeuil, o que torna a busca por unidade, muito provavelmente, a maior
inquietação do escritor a partir de então.
3.4 As versões
Como já acenado, e a fim de arrematarmos o capítulo, analisaremos neste tópico as
versões manuscritas do episódio da “fenêtre éclairée”, localizadas nos cahiers 53 e 55, das
quais Yoshikawa faz uma importante recordação.
Quant ao cahier 53, son antériorité par rapport au cahier 55 nous paraît
évidente. Il existe quelques passages qui figurent dans les deux cahiers, et en
comparant ces deux versions différentes, on est convaincu que la plus
développée, autrement dit la plus proche du texte final est celle du cahier 55.
(1976, p. 1-2)218
Mesmo notando que essa divisão não é estanque e que muitas vezes nos parece
complexo determinar qual versão foi elaborada primeiro, no tocante ao episódio que aqui nos
importa, o crítico japonês afirma que a composição desse motivo teria a seguinte ordem:
Les cahiers 53 et 55 nous fournissent au moins six rédactions successives de
ce motif, dont la chronologie nous paraît avoir dû être la suivante : 1º Cahier
53, fos 52rº - 53rº; 2º Ibid., fº 56 rº; 3º Cahier 55, fos 9rº, 12rº - 13rº; 4º
Cahier 53, fos 56 rº mg – 55vº: ‘Page Hurlus’; 5º Cahier 55, fos 11vº - 12vº;
6º Ibid., fos 10vº - 11rº” (1976, p.142-3)219
Mesmo discordando levemente dessa cronologia pelas razões que serão expostas mais
adiante, adotaremos essa ordem para analisar cada versão do motivo. Iniciando com o caderno
53, a primeira escrita foi elaborada nos fólios 52r° e 53rº. Nestes rascunhos encontramos o
seguinte texto.
218
“Quanto ao caderno 53, sua anterioridade com relação ao caderno 55 nos parece evidente. Existem algumas
passagens que figuram nos dois cadernos, e comparando as duas versões diferentes, estamos convencidos de que
a mais desenvolvida, ou seja, a mais próxima ao texto final é a do caderno 55”.
219
“Os cadernos 53 e 55 nos fornecem aos menos seis redações sucessivas desse motivo, cuja cronologia nos
parece ter sido a seguinte: 1º Cahier 53, fos 52rº - 53rº; 2º Ibid., fº 56 rº; 3º Cahier 55, fos 9rº, 12rº - 13rº; 4º
Cahier 53, fos 56 rº mg – 55vº: ‘Page Hurlus’; 5º Cahier 55, fos 11vº - 12vº; 6º Ibid., fos 10vº - 11rº”.
119
Nous étions arrivés devant ma porte. Vous ne Il n´est pas
tard vous ne voulez pas me conduire jusque dans ma lointaine Odéonie me dit Brichot. Je me disais que si j´y
étais allé j´aurais pu rester à mi chemin et entrer chez la
maquerelle dont m´avait parlé St Loup et chez qui à
défaut du voyage à Venise j´aurais pu au moins connaître
ici soit la femme de chambre de Me Putbus, soit Mll
la jeune fille de famille. Mais devant la fenêtre de
la chambre de´Albertine dans notre appartement sombre,
la fenêtre de la chambre d´Albertine laissait passer
à travers ses volets une lumière qui signifiait qu´elle
m´attendais peignant. Il fallait rentrer, et je dis
Adieu à Brichot avec un mouvement de regret, un élan
du désir en pensant aux caresses que j´étais sûr de trouver, et (52rº)//
pourtant un regret comme si j´avais refermé moimême sur moi la porte de ma douce mais ennuyeuse
prison. (53rº)220
Logo na primeira versão constatamos o estabelecimento do paradoxo com relação ao
sentimento do protagonista que aparecerá na versão publicada. Notamos, neste
desenvolvimento, que existe uma obrigação de entrar (“Il fallait rentrer”) e isso provoca um
lamento no protagonista, pois não pode continuar sua noite e conhecer outras mulheres. No
entanto, essa queixa vem acompanhada de um desejo, pois ao entrar, o herói compartilharia
com a amada suas inúmeras carícias. A frase “comme si j´avais refermé moi-même la porte de
ma douce mais ennuyeuse prison” já aponta uma questão que será reiteradamente
desenvolvida em outros fólios de modo mais explícito: se há uma prisão, ela foi forjada pelo
próprio narrador, ele mesmo prisioneiro de seu ciúme. A prisão, caracterizada como doce e
entediante é o ponto culminante dessa relação paradoxal estabelecida entre o protagonista e
Albertine.
O herói não quer abandonar a jovem, pois ainda sente ciúmes. No entanto, sua
presença o impede de conhecer outras moças, de viajar, de trabalhar e de ficar só. Nesse
220
“Chegáramos diante minha porta. Você n Não é tarde, você não quer me conduzir até minha longe Odéonie,
disse-me Brichot. Eu me dizia que se eu tivesse ido lá, eu teria podido ficar no meu do caminho e entrar na
cafetina da qual ma havia falado St. Loup e onde, na falta da viagem a Veneza, eu poderia conhecer seja a
arrumadeira de Me. Putbus, seja Mlle a jovem de família. Mas diante da janela do quarto de Albertine em nosso
apartamento escuro, a janela do quarto de Albertine deixava passar através dos postigos uma luz que significava
que ela me esperava penteando. Era necessário entrar, e eu disse Adeus a Brichot com um movimento de pesar,
um ímpeto de desejo pensando nas carícias que eu estava seguro de encontrar e, no entanto um pesar como se eu
tivesse fechado eu próprio, sobre mim, a porta da minha doce, mas entediante prisão”.
120
primeiro esboço, constatamos uma condensação de todos os temas concernentes a este
episódio e sua situação limite. Contudo, percebemos que neste momento de composição há
pouquíssimas imagens referentes à janela, pois a palavra “prisão” é literalmente escrita e não
sugerida, como nas versões posteriores e no texto publicado.
Retornando à análise, o mesmo episódio é desenvolvido no fólio 56rº do mesmo
caderno 53, em uma página chamada Hurlus. Proust costuma nomear suas páginas a título de
localização e identificação com outros esboços. Neste fólio, encontramos o seguinte
desenvolvimento.
lumière de la
Je rentrai. D´en bas je vis la fenêtre d´Albertine
éclairée qui m´attendait (le dire mieux). Mais j´avais
depuis quelques temps si peu de plaisir avec elle qu´elle
fit l´effet de la fenêtre d´une prison, ce bonheur
perpétuel
situé hors que j´avais cette présence d´Albertine
qui remplissait ma vie n´y mettait plus de j joie.
En apercevant cette fenêtre je pensais à cet autre être qui
m´empêchait d´être seul, qui me faisait déjà mener
d´avance si jeune une vie de famille et, je n´eus qu´un
désir ce fut de m´en délivrer. Et quand je refermai la
porte cochère ce fut comme si je refermais la porte
ma
de une prison. (56rº)221
Partindo da contradição estabelecida no fólio 52rº, Proust tenta enfatizar nesta
passagem o lado negativo da relação do herói com Albertine. Vemos uma grande sequência
rasurada que procura dar conta desse sentimento de tédio e falta de prazer que a presença da
personagem feminina impunha. Essa presença preenchia sua vida (“remplissait ma vie”), mas
não trazia mais alegria. Vemos o germe da questão do hábito, que ao mesmo tempo em que
tranquiliza, aborrece por sua falta do novo. A janela remete imediatamente ao ser que o
221
“Eu entrei. De baixo eu vi a <luz da> janela de Albertine iluminada que me esperava (dizê-lo melhor). Mas eu
tinha fazia algum tempo tão pouco prazer com ela que ela teve o efeito da janela de uma prisão, essa <perpétua>
felicidade situada fora que eu tinha essa presença de Albertine que preenchia minha vida não lhe dava mais
alegria. Percebendo essa janela eu pensava neste outro ser que me impedia de ficar só, que me fazia levar
antecipadamente tão jovem uma vida de família e eu tive somente um desejo que foi o de me livrar. E quando
fechei o portão foi como se tivesse fechado a porta de uma <minha> prisão”.
121
“impedia” de ficar só, que o fazia “levar ainda jovem uma vida familiar”. Não há mais, como
verificamos no fólio 52rº, um anseio (“élan du désir”) pelas carícias, pelo contrário, o desejo
agora é de se livrar dessa condição (“je n´eus qu´un désir ce fut de m´en délivrer”). A palavra
“prisão” permanece, mas sem os adjetivos que a qualificavam anteriormente. A companhia de
Albertine é fortemente negativa.
Após a escrita dessas duas versões, Proust continuará a desenvolvê-las no caderno 55.
Sintetizando, Proust utilizou sete fólios, além dos já usados no caderno 53, para construir esse
motivo. Como mencionamos, a ordem dessa composição no caderno 55 é: 9rº, 12rº, 13r°,
11vº, 12vº, 10vº e 11rº.
Mesmo com esta flagrante falta de linearidade, há uma lógica composicional na
maneira como Proust usava o caderno e que foi possível de ser apreendida a partir da leitura
de vários outros manuscritos.
As frentes dos fólios formam entre si a primeira campanha de escritura dos episódios.
Os versos são escritos em etapas posteriores e estabelecem, na maioria dos casos, tanto uma
sequência, quanto uma unidade de leitura com a frente que o ladeia. Grosso modo, para
compreendermos a composição escritural em um caderno de Proust, o vai e vem da leitura é
incessante, pois podemos ler, primeiramente, o conjunto formado pelas frentes, voltar e ler
suas modificações nas margens e nos versos paralelos a elas, para em seguida ler o texto
formado pelos versos. Entretanto, no caso do caderno 55, constatamos que Proust não
desenvolve a elaboração do motivo dessa maneira, o que demonstra a particularidade de cada
documento e a dificuldade de apreender seu conteúdo em uma primeira leitura.
Retomando a análise, temos o seguinte desenvolvimento no fólio 9rº.
Brichot me demanda où j’allais, je lui dis répondis :
« chez moi. » « Cela c’est bien me dit-il de finir sagement
votre soirée dès cette heure ci. » Il ignorait que pour moi, elle
allait seulement commencer qui en avais seulement un peu
retardé le moment en allant chez les Verdurin, elle allait
122
seulement commencer, et qu’une jeune fille, prête à m’offrir
son corps, m’attendait un corps auquel que même loin d’elle
tous mes sens ne cessaient d’envelopper, m’attendait patiemment,
à la lumière de la lampe dans cette chamb cet appartement
que le vieux professeur s’imaginait vide et que remplissaient
pour moi, inconnues insoupçonnées de lui chaudes et
brillantes comme les ondes de clarté de la chambre d’Albertine, les insou les promesses d’un plaisir que j’étais pressé d’
aller goûter. Conversation avec Brichot. (9rº)222
Neste fólio, temos o resgate da carga positiva da relação amorosa de Marcel e
Albertine. Semelhante ao que foi elaborado no fº 52rº do caderno 53, o texto apresenta o herói
ansioso por experimentar os prazeres que o aguardavam dentro do apartamento (“les
promesses d´un plaisir que j´étais pressé d´aller goûter”). O diálogo rápido com Brichot e suas
palavras professorais estabelece certa comicidade, pois se o professor parabenizava o
protagonista por terminar cedo sua noite (“Cela c´est bien me dit-il de finir sagement votre
soirée dès cette heure ci”), o narrador, em contrapartida, alega que ela só estava começando.
Albertine, assim como nos fólios do caderno 53, é descrita de forma passiva, esperando
pacientemente, mas no fº 9rº, vemo-la erotizada, pronta para oferecer seu corpo (“et qu´une
jeune fille, prête à m´offrir un corps”). O sintagma “ondas de claridades quentes e brilhantes”
alude ao erotismo da situação e à presença de Albertine. Pela primeira vez, Proust inicia a
construção de imagens que metaforizam a luz e metonimizam a presença de Albertine.
Já nos fºs 12rº e 13rº, ocorre o inverso:
Com Je n’avais que de l’ennui de rentrer car je n’avais plus
de jalousie à l’endroit d’une rencontre possible de’Albertine avec
Mlle Vinteuil. Alber Mlle Vinteuil n’était pas venue à Paris.
Albertine devait le savoir par Me Verdurin. Et si au
contraire elle le savait Me Verdurin l’avait trompée en lui
disant le contraire, en tous cas elle n’avait pas hésité à me
sacrifier sa s Mlle Vinteuil, ce qui prouvait que je resterais
maître d’elle comme je voulais. Aussi la vue du rectangle de
222
“Brichot me perguntou aonde eu ia, eu lhe respondi: ‘para minha casa’. ‘Isso é bom, me disse ele, de terminar
sabiamente sua noite neste horário’. Ele ignorava que para mim, ela ia apenas começar, que havia apenas
postergado um pouco o momento, indo à casa dos Verdurin, ela ia apenas começar, e que uma jovem, prestes a
me oferecer seu corpo, me esperava um corpo ao qual que mesmo longe dela todos meus sentidos não cessavam
de envolver, esperava-me pacientemente sob a luz da lâmpada dentro desse quarto desse apartamento o qual o
velho professor imaginava vazio e que preenchia para mim, desconhecidas, insuspeitas dele quentes e brilhantes
como as ondas de claridade do quarto de Albertine, as promessas de um prazer as quais eu estava apressado em
experimentar. Conversação com Brichot”.
123
la
lumière que sa fenêtre d’Albertine faisait sur l’avenue me (12rº)// causa-t-il
un sentiment de plénitude, de douceur et d’ennui.
Je sentais que dans la demeure où je rentrais, où j’étais obligé de
rentrer comme un mari, (13rº)223
A situação é de completo aborrecimento (“Je n´avais que de l´ennui de rentrer car je n
´avais plus de jalousie à l´endroit d´une rencontre possible d´Albertine avec Mlle Vinteuil”), e
o texto, bastante incompleto e hesitante, concentra o ciúme do herói na figura de
Mademoiselle Vinteuil. Contudo, existe a certeza de que Albertine a sacrificaria em prol do
protagonista, que se torna, neste momento, seu mestre (“... ce qui prouvait que je resterais
maître d´elle comme je voulais”). A janela não é mais descrita de forma voluptuosa, sendo
substituída pela imagem fria e geométrica do “retângulo de luz”, minimizando o caráter
erótico e o deleite das carícias.
A escrita segue no fº 13rº, onde encontramos a mesma sensação de tédio descrita
anteriormente. Essa janela causava ao protagonista um sentimento de “plénitude, de douceur
et d´ennui. Je sentais que dans la demeure ou je rentrais, ou j´étais obligé de rentrer comme un
mari”. O texto é interrompido neste ponto, seguido de um grande espaço em branco. Após
essa lacuna, há um diálogo, inteiramente barrado que desenvolve a comédia da ruptura entre
Marcel e Albertine, mas fica evidente a escrita hesitante e entrecortada do fólio.
É curioso notar que a plenitude e a doçura nesse trecho não estão associadas aos
prazeres ou às carícias, mas à certeza de que o protagonista era o mestre da situação. Outro
elemento importante a ser observado é que Proust retoma o mesmo movimento escritural que
iniciou no caderno 53. Existe entre os dois cadernos, notadamente nos primeiros fólios
utilizados para compor o episódio, a mesma simetria entre episódios mais positivos (52rº e
223
“Como Eu só tinha tédio em entrar, pois eu não tinha mais ciúme a respeito de um possível encontro de
Albertine com Mlle. Vinteuil. Alber Mlle. Vinteuil não tinha vindo a Paris. Albertine devia saber por Me.
Verdurin. E se ao contrário, ela o sabia Me. Verdurin a tivesse enganado, dizendo-lhe o contrário, em todo caso
ela não teria hesitado em me sacrificar sua Mlle. Vinteuil, o que provava que eu quedaria seu mestre como eu
queria. Por isso a vista do retângulo de luz que sua <a> janela de Albertine fazia sobre a avenida me causava um
sentimento de plenitude, de doçura e de tédio. Eu sentia que na residência onde eu entraria, onde eu era obrigado
a entrar como um marido,”.
124
9rº) e altamente negativos (56rº, 12rº e 13rº). É como se Proust construísse as duas sensações
separadamente para fundi-las depois.
O que nos impressiona é que, mesmo tendo desenvolvido o episódio no caderno 53,
isto não garante uma “evolução” da escrita. Se Yoshikawa encontrou no caderno 55 episódios
muito mais desenvolvidos do que no 53, isto, em nossa opinião não acontece de forma tão
explícita e nem com todos os esboços. Os fólios 9rº, 12rº e 13rº revelam uma escrita bastante
hesitante, claudicante e incompleta, e nos perguntamos se esses fólios, dada a brevidade e
vacilação do texto, não teriam sido escritos antes do caderno 53, visto que não retomam,
tampouco completam os textos elaborados neste documento.
Poderíamos entender a ausência da palavra “prisão” nesses fólios como um indício de
que Proust ainda não havia desenvolvido a noção de catividade do protagonista – que se julga
mestre da situação –, o que nos levaria a crer que esses esboços do caderno 55 são anteriores
aos do 53. Contudo, pode-se pensar essa ausência como um sinal do apagamento de um termo
sobremaneira explícito e direto, evidenciando, com isso, uma busca pelo desenvolvimento de
imagens que conotem a prisão e não a denotem. Neste caso, os rascunhos do caderno 55
seriam posteriores aos do 53.
Talvez um exame mais detido dos textos comprovasse essa hipótese, embora saibamos
a pouca probabilidade de conseguirmos estabelecer cronologias definitivas, pois Proust não
datava seus rascunhos. Contudo, o que há de essencial na formulação dessas hipóteses não é a
tentativa de instaurar uma gênese textual, mas perceber que o caderno 53 não é uma etapa
escritural que desembocará, de uma vez por todas, no caderno 55.
Em um lembrete situado na margem superior esquerda do fólio 11vº do caderno 55,
Proust escreve: “et voir aussi dans le petit mince cahier bleu au recto et verso appelés Page
125
Hurlus et qui sont supprimée si j´ai bien mis ici tout ce qu´il y a dans cette Page Hurlus”224.
Proust diferenciava seus cadernos, que possuíam, muitas vezes, as mesmas configurações, por
características como cor da capa, contracapa, nome da filigrana etc.
O caderno 53 era o caderno azul e o que depreendemos a partir dessa nota é que o
escritor não abandonava os manuscritos antecedentes. Pelo contrário, ele ia e voltava a esses
documentos, como em uma tentativa de relacionar uns aos outros. Esse movimento revela que
muito
provavelmente
não
havia
caderno
central,
e
que
o
escritor
trabalhava
concomitantemente com vários manuscritos, hipótese lançada no primeiro capítulo. E se os
rascunhos precedentes colaboram na realização dos que os sucedem, esses documentos tardios
também intervêm nos primeiros cadernos.
O fato de voltar ao caderno 53 para escrever a margem do fólio 56rº e o 55vº após ter
supostamente escrito as versões contidas nos fólios 9rº, 12rº e 13rº, revela que Proust
trabalhava com mais de um caderno por vez e tirava dessa relação entre os textos formas que
melhor expressassem o conteúdo trabalhado. Baseados na hipótese cronológica de
Yoshikawa, podemos afirmar que os cadernos 53 e 55 alimentam-se reciprocamente, o que
mais uma vez evidencia a não linearidade do processo escritural proustiano e comprova o
diálogo entre os cadernos.
Seguindo a ordem de análise do motivo, recuperamos neste momento a margem do
fólio 56r° e o verso do 55vº do caderno 53.
D´en bas je
voyais au second
étage la fenêtre
celui de notre
à la fenêtre d´
Albertine dont la
lumière passait sous
irradiation
les rideaux ; émmanariche
224
“e ver também no pequeno caderno azul, na frente e no verso chamados Página Hurlus que foram suprimidos
se eu coloquei aqui tudo o que há nessa Página Hurlus”.
126
tion de la présence
qui mettait d tant
de plénitude dans mon
appartement, devenue
familiale et domestique,
apaisante
qui mettait irradiation
calme rayon
de la présence, devenue
riche
familiale et domestique.
Elle J´avais une sorte
Je rentr d´une froide
attente froide, d´une
présence devenue familiale
riche
et domestique. Mais elle
mais
n´étais plus et qui n´était
plus mystérieuse que pour
les autres. J Si je me
réjouissais de penser que
Brichot ne savait pas pourquoi je le quittais, c´était
par un retour égoïste sur
moi-même, et comme si mon
corps ne fût trouvé doublé, accru d´un autre corps invisible
aux autres. Mais je sentais
avec tristesse que maintenant
le plai Puis la pensée des
caresses qui m´attendaient
réveillaient mon
désir + (Margem, 56rº)225
Os textos das margens, assim como os dos versos dos fólios são em geral escritos a
posteriori e servem como uma espécie de acréscimo e ajuste dos escritos na parte principal da
página. Observamos que na margem do fólio 56rº, que tinha como eixo principal o
aborrecimento completo com relação a Albertine, Proust retoma e justapõe o paradoxo.
Albertine é descrita como uma irradiação, uma emanação que dá plenitude à vida do
herói, contudo, essa presença rica, tranquilizadora (“apaisante”) tornou-se familiar, doméstica,
225
“De baixo eu via no segundo andar a janela, <esse de nosso> a janela de Albertine cuja luz passava sob as
cortinas, emanação <irradiação> da <rica> presença que punha tanta plenitude no meu apartamento, tornada
familiar, <apaziguante> e doméstica, que colocava irradiação <calmo raio> da <rica> presença, tornada familiar
e doméstica. Ela Eu tinha uma espécie Eu entre de uma fria espera fria, de uma <rica> presença tornada familiar
e doméstica. Mas ela não era mais, <mas> que só era mais misteriosa para os outros. Se eu me regozijava em
pensar que Brichot não sabia por que eu o deixava, era por uma volta egoísta sobre mim mesmo, e como se meu
corpo tivesse sido duplicado, acrescido de outro corpo invisível aos outros. Mas eu sentia com tristeza que agora
o prazer Depois, o pensamento das carícias que me esperavam despertavam meu desejo+”.
127
sem mistérios. Essa passagem é massivamente rasurada, e Proust constrói, pela primeira vez,
a bela imagem de um corpo duplo, dilatado, acrescido ao herói, que é o da jovem. Este corpo
é invisível aos outros e, por um instante, o narrador reconhece que se possuía alguma alegria
em saber que Brichot, assim como os outros, ignoravam essa realidade, isto não passava de
uma falsa vitória. Mas, por fim, Proust retoma a idéia do desejo despertado pela lembrança
das carícias certas que o aguardavam.
Observemos ainda a palavra “rideaux”, que poderia indicar um diálogo com o episódio
descrito na novela Rideaux cramoisi e que não será utilizada, pois a imagem da luz estriada
pelos postigos da janela que remeterão, posteriormente, às grades de uma prisão, não poderia
ser construída juntamente com uma cortina. É igualmente interessante notar que Proust
começa a elaborar, de maneira mais sistemática, imagens que metaforizam e metonimizam a
presença de Albertine, e que ainda não haviam sido elaboradas nos fólios anteriores.
A pequena cruz que vemos no final da margem, denominada de “signe de renvoi”
pelos críticos de manuscritos, indica que o texto continua em outro local, neste caso no fólio
55vº. Este procedimento ocorre especialmente pela falta de espaço no caderno, o que explica
o porquê das folhas em branco deixadas pelo escritor e a falta de linearidade na construção
textual que mencionamos anteriormente.
Não era raro Proust deixar folhas em branco, pois estava certo de que em algum
momento da escrita elas seriam preenchidas nas etapas de releitura, com acréscimos e ajustes
textuais. Isto ocorre com os versos e com as margens, ambos sendo espaços reservados para
as etapas posteriores de escritura. No trecho em questão, isto ocorre com a página paralela ao
fólio 56rº, a página Hurlus. Possuindo esse mesmo nome, o fólio 55v° desenvolve, da metade
da folha para baixo, essa problemática do duplo. A metade superior, deixada em branco pelo
escritor, muito provavelmente serviria para outros ajustes e reformulações.
128
Page Hurlus
+ mais j’avais quelque tristesse à penser que maintenant désormais le plaisir
physique n’était plus pour moi l’appat qui m’aiderait à pénêtrer dans des
pays et dans des vies inconnues. Il Pour moi le trouver il ne me fallait plus Il
n’était pas
dans un double sa
dans les rues ne chassait* pas hors Et par une sorte de symbole car Albertine
par une
n’était pas seulement chez moi, elle était en moi, elle était devenue un
complément, un double, une annexe de moi-même, le plaisir n’était plus
maintenant pour moi au dehors dans l’inconnu de la rue, des
ce que je faisais ce n’était
routes, des pays, pour le trouver il ne me fallait plus partir en voyage ou en
c’était pas comme j’avais rêvé partir en voyage, ou simplement sortir c’était
rentrer. (55vº)226
O prazer físico não era mais o atrativo que permitiria a entrada do protagonista em
outros países, em outras vidas desconhecidas. Albertine não era apenas uma presença, ela
estava nele como um complemento, um duplo, e por este motivo, o prazer não poderia mais
ser vivenciado fora, nas ruas, nas estradas, nos países, no que ele esperava encontrar nas
viagens ou nos passeios. Essa noção, embora não tenha aparecido no texto publicado do La
prisonnière, confirma, de certa forma, a concepção do amor como um conhecimento de si
mesmo, visto que ele não passa de uma projeção de um estado de alma do amante, como
verificamos anteriormente. Esse trecho foi, na verdade, aproveitado para o romance Albertine
disparue, quando o narrador-herói reflete sobre a jovem após a sua morte.
Esse prazer do autoconhecimento estava em sua casa, e para apreciá-lo o herói deveria
adentrá-la, constatação muito diversa do narrador-herói no texto publicado, que percebe que a
presença da jovem é castradora de seus pensamentos. Notamos que essa página encerra o
episódio da janela iluminada no caderno 53, retomando o paradoxo desde o início esboçado
no fólio 52rº.
226
“Página Hurlus: + mas eu sentia uma tristeza em pensar que agora doravante o prazer físico não era mais, para
mim, a isca que me ajudaria a penetrar nas terras e nas vidas desconhecidas. Ele Para eu encontrá-lo não me era
mais necessário Ela não estava nas ruas não caçava*fora E por uma <por uma> < num duplo sua> espécie de
símbolo, pois Albertine não estava somente em minha casa, ela estava em mim, ela tinha se tornado um
complemento, um duplo, um anexo de mim mesmo, o prazer não era mais agora para mim lá fora, no
desconhecido da rua, das estradas, das regiões, para encontrá-lo <o que eu fazia> não me era mais necessário
partir em viagem ou não era como eu havia sonhado partir em viagem ou simplesmente sair, era entrar”.
129
Proust, pouco a pouco, justapõe palavras e frases antagônicas para dar conta dessa
ligação complexa e conflituosa entre Marcel e Albertine, em um aprofundamento exemplar da
relação conturbada de Swann e Odette. Ele escolhe palavras como “irradiação” e “emanação”,
que metaforizam tanto a presença de Albertine, quanto a luz que passa através das venezianas
da janela. Mas, apesar de trazer plenitude, esta presença é igualmente familiar e doméstica,
desprovida de mistério. Parece-nos que a busca por uma forma, por imagens que melhor
sugiram esse paradoxo, está na base das diversas reescrituras deste episódio.
Isto fica patente, sobretudo nas notas e lembretes que Proust registrou tanto nas
margens, quanto no corpo do texto. Na margem do fólio 52rº temos “tout cela et tout ce qui
précède est à réecrire beaucoup mieux”227. No fólio 56rº, encontramos inscrito, logo após a
primeira frase, o seguinte lembrete: “le dire mieux” [“dizê-lo melhor”].
Essa tentativa de compor uma forma que expresse de maneira adequada o paradoxo da
relação amorosa continua sendo a tônica da escrita desse mesmo episódio no caderno 55 dos
fólios 11vº-12vº, 10vº-11vº. Retomando a análise das redações pertencentes ao caderno 55,
encontramos uma margem esquerda no fº 13rº que começa a vislumbrar a fusão entre os
elementos positivos e negativos da relação amorosa.
A próxima etapa de escritura dar-se-á no fólio 11vº do cahier 55. Neste esboço, já
encontramos o amalgamento entre as sensações de desejo e tédio.
Brichot me demanda quelle adresse je il devait donner
au cocher et je lui dis la mienne. Il me « Ça c’est très
bien dit-il. » Pas plus que les amis qui venaient me voir et
que je faisais passer dans le couloir sans qu’ils rencontrassent
Albertine, il ne soupçonnait pas qu’en rentrant j’allais
trouver justement commencer ma soirée, que le temps que
j’avais passé chez les Verdurin n’avait été pour moi qu’un
court intervalle pendant lequel m’attendait paisiblement dans
sa chambre celle que j’avais hâte de retrouver. Et pourtant
nouveaux
j’étais ennuyé de rentrer, je pensais à tous les plaisirs inconnus
dont à la recherche desquels j’aurais pu aller si je m’
étais promené seul, si j’avais été dans la maison que
227
“Tudo isso e tudo que antecede é para ser reescrito muito melhor”.
130
m’avait indiqué Robert. Avec L’espoir La pénétration
d’une vie inconnue, l’espoir de me faire aimer d’un être qui
ne me connaissait pas, tout cela n’existait plus avec Albien connu
bertine. C’était là même plaisir sensuel, familial et
même,
domestique, goûté cet après midi que je revenais chercher
auprès d’elle auprès d’elle, dans cet appartement où sa
soigneusement cachée à Brichot
présence, ignorée de Brichot mettait comme une plénitude
une tré richesse insoupçonné, (11vº)228
O prazer era bem conhecido, sem mistérios, ainda que sensual. As palavras
anteriormente rasuradas no fólio 56rº como “familiar”, “doméstica”, retornam, o que
demonstra que no processo de criação de Proust, aquilo que é barrado, riscado, como se
tivesse sido refutado, pode ser reutilizado, denotando antes uma reserva do que uma recusa.
Soma-se ainda o início do desenvolvimento da imagem do tesouro, que corresponde, neste
estado da escrita, ao termo “richesse” [riqueza].
Como já mencionado, o fº 11vº contém um lembrete referente ao caderno 53. Porém,
há outra nota que frisa a importância da releitura dessa página para ver se o escritor “não
esqueceu nada”: “Voir dans ce verso et le suivant qui ne comptent plus s´il n´y a rien que j´aie
oublié de mettre dans le verso et le recto précédent”229. Esta nota, elaborada evidentemente
após a escrita do texto central indica que os versos 11vº e 12vº não serão usados como versões
definitivas, contudo, a volta a eles revela uma dificuldade imensa em renunciar ao que já foi
escrito.
228
“Brichot me perguntou qual endereço eu ele devia dar ao cocheiro e eu lhe disse o meu. Ele me ‘Isso é muito
bom, disse ele’. Não mais que os amigos que vinham me ver e que eu fazia passar no corredor sem que eles
encontrassem Albertine, ele não suspeitava que, entrando, eu iria encontrar justamente começar minha noite, que
o tempo que eu havia passado na casa dos Verdurin havia sido para mim apenas um curto intervalo durante o
qual, me esperando pacificamente dentro de seu quarto aquela que eu tinha ânsia de encontrar. E, no entanto, eu
estava aborrecido de entrar, eu pensava em todos os prazeres desconhecidos <novos> cuja em busca dos quais eu
poderia ter ido se eu tivesse passeado sozinho, se eu tivesse ido à casa que me havia indicado Robert. Com A
esperança A penetração de uma vida desconhecida, a esperança de me fazer amar por um ser que não me
conhecia, tudo isso não existia mais com Albertine. Era o mesmo prazer <bem conhecido>, sensual, familiar e
doméstico, provado nesta tarde <mesmo> que eu voltava a buscar perto dela perto dela, nesse apartamento onde
sua presença, ignorada por Brichot <cuidadosamente escondida de Brichot> impunha-se como uma plenitude,
uma riqueza insuspeita,”
229
“Ver neste verso e no seguinte, que não contam mais, se não há nada que eu tenha esquecido de colocar no
verso e na frente precedente”.
131
Proust, ao que parece, opera primeiramente por acúmulo e dispersão – o mesmo
episódio será elaborado em vários fólios, cujos acréscimos irão modificar sua sintaxe – e
posteriormente por condensação. Ele volta a todos os fólios, ou até mesmo a cadernos
anteriores, para se certificar de que não deixou passar nada. A cada fólio há sempre pedaços,
fragmentos textuais, que serão recuperados e postos em um mesmo texto, quando Proust for
condensar sua escrita.
O fólio 12vº, por exemplo, concentra quase todos os temas desenvolvidos
separadamente até então.
C’était chez
les Verdurin que j’étais seul, un moment privé de cette
riche
Albertine qui était devenu le complément de mon organisme
et hors de laquelle je ne m’aventurais qu’un moment, pressé
d’aller me rejoindre et m’unir à elle. D’ La voiture s’
était arrêtée devant ma porte. D’en bas je voyais le
grand carré de lumière qui faisait à travers les volets la
lumière de la fenêtre d’Albertine, comme les rayons de ce
si soigneusement caché à Brichot, à Robert, insoupçonné de tous
trésor qui m’attenda insoupçonné des autres qui m’attendait,
que j’étais si pressé de retrouver mais en échange duquel il
que j’étais si pressé de retrouver, mais en échange duquel
me semblait que j’avais vendu la liberté
j’avais vendu la liberté de ma vie et la possibilité
d’être seul ! (12vº)230
Temos a imagem do corpo duplo, da falta de solidão imposta pela presença da jovem e
da obrigação de entrar e abdicar do desconhecido. Finalmente, a imagem do tesouro se
concretiza e é em troca dele que o herói renuncia a sua liberdade. Através da janela, o
narrador pode ver os raios desse tesouro insuspeito e escondido dos outros, “à travers les
volets la lumière de la fenêtre d´Albertine, comme les rayons de ce trésor si soigneusement
230
“Era na casa dos Verdurin que eu estava só, um momento privado desse/a <Albertine> que tinha se tornado o
rico complemento de meu organismo e fora da qual eu me aventurava somente um momento, apressado de ir me
juntar e me unir a ela. O carro parou diante da porta. De baixo eu via o grande quadrado de luz que fazia através
dos postigos a luz da janela de Albertine, como os raios desse tesouro que me esperava insuspeita dos outros
<tão cuidadosamente escondida de Brichot, de Robert, insuspeita de todos>, que me esperava, quem eu estava
tão apressado em encontrar, mas em troca do qual eu havia vendido a liberdade <que eu estava apressado em
encontrar>, <mas em troca do qual me parecia que havia vendido a liberdade> de minha vida e a possibilidade
de ficar sozinho!”
132
caché à Brichot, à Robert, insoupçonné de tous”. A proximidade com o texto publicado é forte
e já encontramos quase todos os seus temas esboçados neste fólio.
As duas últimas versões dedicadas à elaboração do episódio da “fenêtre éclairée”, os
fólios 10vº e 11rº, são consideradas por Proust como definitivas. Em uma nota na margem
superior do fº 10vº, o escritor registra: “Sur ce verso et ce recto/Ceci est le morceau définitif
(quoique la forme soit à changer) qui annule les pages suivantes”231.
Nous étions arrivés devant ma porte. Ce fut Je descendis de
voiture et donnai au cocher l’adresse de Brichot. D’en bas
je voyais le à travers les volets les rayons de la lampe de
d’Albertine. Pour d’autres ils n’eussent peut’être été qu’
une lumière superficielle, mais moi sous leur éclat, je savais
toute la plénitude de vie qui m’attendait paisiblement là haut
en laquelle
et où mon corps et ma pensée allaient se perdre, se confondre
ennui, sans
se reposer Ce n’était pourtant pas sans regret que je voyais
m’attendre, me rappeler ces reflets dorés du
ces rayons m’attirer, me* me dire qu’on m’attendait (dire
aussi aussi
cela mieux) Ces reflets du trésor, insoupçonné de Brichot,
,orgueil secret de ma vie,
qui rempl qu’il était des amis qui venaient me voir et que
je reconduisais dans le couloir sans qu’e ils rien trahit la
présence d’Albertine, mais en échange duquel il me semblait
que j’avais vendu la liberté, la pensée, la solitude. Si Albertine
pour
n’avait pas été là haut, pour avoir un plaisir sensuel, pour
ce que j’aurais fait c’eût été sinon prendre un train, tout au
moins faire dans le Paris nocturne de ces promenades qui sont presque un
voyage, aller dans cette maison q dont m’avait parlé Robert et qui comme un
(10vº)232
Encontramos uma proximidade formal entre esse rascunho e o texto publicado, no
entanto, não há ainda nesse esboço as imagens que metaforizam a janela e a prisão. Outro fato
231
“Sobre este verso e essa frente/ Este é o pedaço definitivo (embora a forma deva ser mudada) que anula as
páginas seguintes”.
232
“Nós havíamos chegado diante de minha porta. Foi Eu desci do carro e dei ao cocheiro o endereço de Brichot.
De baixo eu via através dos postigos os raios da lâmpada de Albertine. Para outros eles teriam sido somente
talvez uma luz superficial, mas eu, sob seu brilho, sabia toda a plenitude de vida que me esperava pacificamente
lá no alto e onde <na qual> meu corpo e meu pensamento iam se perder, se confundir se repousar Não era
entretanto sem tédio, <sem> pesar que eu via esses raios me atrair <me esperar, me lembrar esses reflexos
dourados do> me dizer que me esperavam (dizer isso melhor) Esses reflexos do tesouro <tão tão> insuspeito de
Brichot, <orgulho segredo de minha vida>, que preench que havia amigos que vinham me ver e que eu
reconduzia no corredor sem que eles nada traísse a presença de Albertine, mas em troca do qual me parecia que
eu havia vendido a liberdade, o pensamento, a solidão. Se Albertine não estivesse lá em cima, para <para> ter
um prazer sensual, para o que eu teria feito seria, senão tomar um trem, ao menos fazer na Paris noturna esses
passeios que são quase uma viagem, ir nessa casa da qual me havia falado Robert e que como um”.
133
curioso, que verificamos em uma nota na margem superior do fólio, é a possível utilização
que Proust dará aos seus textos. O escritor registra: “Pour le morceau ci dessous il vaudrait
mieux insister sur l´ennui et laisser la douceur, la richesse de sensations por quand elle est
morte”233.
Na nota acima, encontramos o tom do episódio que, com efeito, no texto publicado,
não acentuará essa doçura, essa profusão de sensações, algo ainda muito presente nas versões
manuscritas, como os fólios 10vº e 11rº. Entretanto, esse lembrete revela-nos outro uso para
esse texto sistematicamente trabalhado que será retomado, em sua essência, quando Albertine
estiver morta.
Proust estabelece, dessa forma, pares antagônicos que se resumiriam em: a posse da
amada e o sentimento de aborrecimento; a perda definitiva da jovem e o prazer de viver ao
seu lado. Percebemos assim que Proust retoma trechos rasurados e modifica passagens
consideradas “definitivas”, o que revela uma propensão ao perpétuo refazer, ao inacabamento.
A imagem da prisão construída no caderno 53 é abandonada no 55. A noção de
tesouro é mantida nos fólios 10vº e 11rº, contudo, ele acrescenta o elemento da perda da
liberdade, do pensamento e da solidão decorrentes dessa troca “mais en échange duquel il me
semblait que j´avais vendu la liberté, la pensée, la solitude”.
Se compararmos com o texto publicado, essas versões diferem, fundamentalmente, no
que concerne às imagens construídas para a janela, destacadamente mais sugestivas do que as
dos rascunhos. Palavras como “desejo” e “tédio”, signos explícitos do paradoxo da relação
amorosa são suprimidas, muito provavelmente por explicitarem demasiadamente o episódio e
suas imagens.
Nessa comparação entre os rascunhos e o texto publicado, julgamos que o mais
233
“Para o trecho abaixo, seria melhor insistir sobre o tédio e deixar a doçura, a riqueza das sensações para
quando ela morrer”.
134
importante é a forma pela qual a noção de encarceramento se dissemina em diversos outros
signos que enfatizam sua idéia, tornando o episódio ainda mais paradoxal e complexo. A
palavra “prisão”, como vimos, já havia sido abandonada nas redações do caderno 55,
contudo, sua imagem pairava em quase todos os textos. No romance, Proust utiliza uma
profusão de signos que retomam essa invenção, como nos casos dos sintagmas “barreaux d
´or”, “grillage lumineux”, “inflexibles barreaux d´or”, mas também no caso de sintagmas e
frases que indicam uma submissão do herói, como “servitude éternelle” e “et dessinait devant
mon esprit des images précises, toutes proches, et en possession desquelles j'allais entrer tout
à l'heure”.
Embora condensado, o texto publicado resguarda procedimentos de sua escritura.
Assim como há uma explosão desse episódio em onze fólios manuscritos, a noção de prisão
se desdobra e se constela em diversos outros sintagmas. Com relação à sua escrita, na crítica
proustiana fala-se muito desse “éclatement”, dessa explosão de formas e temas que se
espalham, contudo preferimos utilizar outra imagem que acreditamos condizer ainda mais
com o procedimento escritural de Marcel Proust. Uma explosão implica uma destruição, e
como notamos, isto não ocorre necessariamente no caso proustiano. Adotamos, portanto a
concepção de uma escrita constelar que se abre, dispersando seus fragmentos, unindo, desta
maneira, diversos núcleos narrativos.
Se pensarmos no episódio da janela iluminada, ele servirá de motivo para constelações
distintas: Jean e Mme. S, Swann e Odette, Marcel e Albertine. A forma como Proust compôs
os episódios do vestido de Fortuny possui igualmente essa característica constelar, que teve
de se espalhar para poder construir unidade.
A análise desses episódios mostrou que, embora Proust considere determinadas
versões como definitivas, ele sempre as modifica. Fica-nos, assim, evidente que entre os
fólios 10vº e 11rº e o texto publicado houve ainda muitas outras etapas de escritura às quais
135
não tivemos acesso, pois o termo “definitivo”, no caso proustiano, é algo completamente
frágil e movediço.
Especialmente o romance A prisioneira que, como se sabe, foi publicado juntamente
com os dois últimos volumes da Recherche, após a morte de Proust. O que lemos hoje muito
provavelmente teria sofrido alterações se o escritor não tivesse morrido, pois Proust alterava
seus textos até a etapa de impressão, como indica Francine Goujon:
Dans la pratique de Proust, les épreuves sont encore un lieu d'écriture et de
création. Leur relecture est productrice. Alors que l'usage qu'on en fait
habituellement vise à conduire du manuscrit au livre sans remettre en cause
l'intégrité du premier ni la fragile perfection matérielle du second, Proust se
donne le droit d'y inscrire du nouveau. (1997, p. 79)234
Isto não apenas demonstra uma fragilidade da noção de definitivo, de acabado, mas ao
mesmo tempo suscita a hipótese de que esse episódio poderia ter sido publicado de forma
diferente se Proust tivesse revisto as datilografias, ou tivesse tido tempo de levar o romance à
etapa das provas.
Só tivemos acesso aos cadernos de rascunho e não pudemos acompanhar o movimento
escritural do romance em questão nos cadernos de mise au net, mas o estudo das diferentes
etapas de escritura não garante ao crítico uma exaustividade. Se Proust, em pouco mais de 10
anos, foi capaz de produzir em torno de 8.000 páginas, uma vida não é suficiente para um
crítico recuperar esse processo, nem mesmo em equipe. Isto comprova o quanto estamos, na
condição de leitores de manuscritos, afastados desse processo e o quanto nosso discurso será
sempre lacunar. Como salienta Bernard Brun: “La lacune est du côté de la critique plutôt que
de l'écrivain” [A lacuna está mais do lado da crítica do que do escritor ] (2003, p. 106).
234
“Na prática de Proust, as provas são ainda um lugar de escritura e de criação. Sua releitura é produtiva. Ainda
que o uso que se faz habitualmente vise a conduzir do manuscrito ao livro, sem pôr em questão a integridade do
primeiro e a frágil perfeição material do segundo, Proust dava-se o direito de reescrever nessas provas”.
136
Capítulo 4
As notas e a estética da composição
Ne mêlons pas la vie (et les
sympathies déférentes qui y
naissent) avec la littérature.
4.1 Lembrar e buscar novas formas
Estudamos, até o presente momento, o desenvolvimento dos textos romanescos, dos
motivos, e a busca proustiana por unidade em seus rascunhos. No entanto, é bom observar que
os cahiers não são compostos exclusivamente por esboços literários. As notas, que aparecem,
tanto na parte superior do fólio, como nas margens à esquerda (podendo vir integradas ao
corpo do texto literário), formam um conjunto muito importante para a compreensão do
modus operandi da escrita e do projeto literário proustianos.
Assim como o texto dos rascunhos, as notas são compósitas e podem funcionar como
simples lembretes ou como uma espécie de comentário do escritor com relação ao seu próprio
projeto, conforme observado por Anne Herschberg Pierrot.
Chez Proust, les notes ont un statut à la fois annexe et fondamental. On peut
distinguer d'abord les notations de carnet, comme celles du Carnet 1
(1908-1912). Ce carnet composite, qui accompagne la genèse saccadée du
Contre Sainte-Beuve, et les débuts de la Recherche, comprend à la fois des
indices biographiques (adresses, par exemple), la trace de projets, de
réflexions critiques et esthétiques, des listes de noms, et des esquisses de
rédaction. La note n'y a pas de finalité documentaire, elle tient plutôt d'un
tracé mémoriel: réserve de noms, de notations. À côté de cela, une seconde
série de notes, plus tardive, au statut plus uniformément métadiscursif,
apparaît en cours de rédaction de la Recherche, comme celles du Cahier 57
pour Le Temps retrouvé. Rédigées entre 1913 et 1916/17, elles commentent
et complètent l'état du texte écrit en 1911. (1994, p. 62)235
235
“Em Proust, as notas possuem um estatuto ao mesmo tempo anexo e fundamental. Podemos distinguir
primeiramente as notações da caderneta, como as da Caderneta 1 (1908-1912). Esta caderneta compósita, que
acompanha a gênese irregular do Contre Sainte-Beuve e os inícios da Recherche, compreende ao mesmo tempo
indícios biográficos (endereços, por exemplo), a pista de projetos, de reflexões críticas e estéticas, listas de
nomes e esboços de redação. A nota aí não tem finalidade documental, assemelha-se mais a um vestígio
memorial: reserva de nomes, de notações. Lado a lado com ela, uma segunda série de notas, mais tardias, com
um estatuto mais uniformemente metadiscursivo, aparece ao longo da redação da Recherche, como as do
137
A autora faz uma leve distinção entre “notação” e “anotação”, que seria,
respectivamente, o ato de notar, de pontuar algo por uma escrita breve ou por sistemas de
símbolos, e o ato de anotar, de fazer curtos comentários sobre o texto, produzindo notas de
caráter metadiscursivo. Entretanto, Pierrot afirma que, em se tratando de manuscritos, há uma
“difficulté de maintenir
la distinction entre notation, et annotation, langue et
métalangue” (1994, p.62)236. Obviamente, há diferenças entre um lembrete e um comentário,
mas no caso proustiano, todos estão a serviço de uma escrita e de uma composição literárias.
Analisando primeiramente as notas que servem de lembrete, algumas delas alertam
para o não esquecimento de textos que já foram elaborados em outras etapas, bem como em
outros cadernos. No fólio 10vº do caderno 55 visto no capítulo anterior, encontramos a
seguinte nota:
Ceci est le morceau définitif (quoique la forme soit à changer) Ma qui annule
les pages suivantes (mais non pas q.q. pages avant quand Brichot me demande l
´adresse). Mais regarder dans les pages suivantes où je disais moins bien la même
chose si je n´ai rien oublié237.
Verificamos que as notas, assim como o texto, partilham, senão do mesmo estatuto, do
mesmo grau de importância na escrita, pois elas também são rasuradas e sofrem acréscimos,
como observamos no exemplo acima, manifestando o prazer que Proust tinha pelo
comentário, ainda que breve e restrito ao lembrete.
Neste pequeno trecho, percebemos que ao nomear o fólio como definitivo, Proust tenta
garantir o acabamento de um episódio reescrito inúmeras vezes. Contudo, ele frisa entre
parênteses, como em uma espécie de comentário dentro do comentário, que a forma ainda
será trabalhada, revelando uma propensão ao inacabamento e ao refazer incessante.
Caderno 57 do Tempo redescoberto. Redigidas entre 1913 e 1916/17, elas comentam e completam o estado do
texto escrito em 1911”.
236
“dificuldade de manter a distinção entre notação e anotação, língua e metalíngua”.
237
“Este é o pedaço definitivo (embora a forma deva mudar) Ma que anula as páginas seguintes (mas não
algumas páginas antes, quando Brichot me pede o endereço). Mas olhar nessas páginas seguintes onde eu dizia
menos bem a mesma coisa se eu não esqueci nada”. A diferença de tamanho do corpo das letras denota
acréscimo.
138
Reforçamos o que foi mencionado no terceiro capítulo, que o definitivo ainda é passível de
mudança e o suprimido ainda serve de matéria literária.
No fólio 11vº do caderno 55, Proust registra:
Voir dans ce verso et le suivant qui ne comptent plus s´il n´y a rien que j´aie
oublié de mettre dans le verso et le recto précédent// et voir aussi dans le
mince cahier bleu au recto et verso appelés page Hurlus et qui sont
supprimées si j´ai bien mis ici tout ce qu´il y a dans cette Page Hurlus.238
Essas notas, que funcionam como verdadeiras advertências para uma boa construção,
revelam o hábito proustiano de releitura dos documentos e da escritura de textos a partir de
trechos já elaborados. Mesmo suprimidos, esses fólios podem conter idéias, palavras ou frases
que já tenham expressado, de alguma forma, o texto a ser elaborado em uma etapa mais atual
de escrita.
Como vimos no capítulo anterior, essa volta aos textos “suprimidos” pode demonstrar
uma grande dificuldade do escritor de renunciar ao que já havia realizado, ainda que “menos
bem”. Todavia, esse procedimento não só evidencia uma escrita fragmentada, dispersa e não
linear que opera nos cadernos, mas indica uma tentativa de amalgamar essas partes, pois se
Proust escreve por fragmentos, ele não perde de vista a unidade de seus romances e de sua
obra.
Sob esse aspecto, não é raro encontrarmos notas que fazem menção a outros
rascunhos, e vimos que no fólio 11vº, Proust retoma o caderno 53, apelidado de “caderno
azul”, para compor o episódio da “fenêtre éclairée”. Ainda no caderno 55, Proust refere-se a
outros documentos que devem ser consultados para a elaboração de episódios: “Je savais que
je ne savais pas regarder (voir dans Babouche), pas écouter, qu´il fallait les choses ne fussent
permis d´abord par l´imagination (...)” (C. 55, fº 62vº)239. Este caderno intitulado “Babouche”
238
“Ver neste verso e no seguinte, que não contam mais, se não há nada que eu tenha esquecido de colocar no
verso e na frente precedentes//e ver também no fino caderno azul, na frente e no verso chamados de página
Hurlus e que foram suprimidos, se coloquei aqui tudo o que há nesta página Hurlus”.
239
“Eu sabia que eu não sabia olhar (ver no Babouche) nem escutar, que era necessário que as coisas fossem
permitidas primeiramente pela imaginação”.
139
corresponde ao caderno 74, listado, segundo Bernard Brun240, como um dos documentos
utilizados para a composição da história de Albertine.
Algo que podemos encontrar ainda em uma nota que faz referência a outro caderno
destinado à história dessa heroína: “Capital Il faudra que je dise en pendant de ce que j´ai dit
(indiqué en marge du cahier Vénusté sur le gd rôle joué par Albertine dans ma vie) (...)”. (C.
55, fº 91vº)241; e uma vez mais, em um fólio em que Proust elabora o diálogo do herói com
Gilberte a respeito de Albertine, no qual a menção ao caderno “Vénusté” (ou cahier 54) tem
por objetivo a recuperação da importância da jovem na vida do protagonista, que no momento
atual da construção narrativa, conta sua relação com a moça em uma posição já distante do
conflito242.
Esse hibridismo e fragmentação da escrita proustiana ocorrem não somente entre
diferentes rascunhos, mas também entre textos de um mesmo caderno, pois se o escritor
menciona outros manuscritos em uma clara busca por conexão, ele registra, da mesma forma,
observações concernentes ao desenvolvimento de passagens contidas em um mesmo
documento, a fim de articulá-las.
Em uma nota no fólio 13vº, Proust escreve: “Ceci vient tout de suite après la fenêtre
éclairée. C´est par là que commence tout ce qui est se passe dans la maison” (C.55, fº 13vº)243.
Percebemos que essa anotação não é apenas um lembrete, mas a delimitação de um episódio
que deve vir imediatamente após o da “janela iluminada”, isto é, a cena da “comédia da
ruptura” entre o protagonista e Albertine.
240
Cf. Capítulo I.
“Capital É necessário que eu diga em contrapartida ao que eu disse (indicado na margem no início do caderno
Vénusté sobre o grande papel que tinha Albertine em minha vida) (...)”.
242
“(...) je l´avais raconté du dedans, maintenant à distance je l´apercevais du dehors”. [“(...) eu a contava de
dentro, agora à distância, eu a percebia de fora”] (C.55, fº 91vº).
243
“Isso vem logo em seguida após à janela iluminada. É por aqui que começa tudo o que é se passa dentro da
casa”.
241
140
A falta de linearidade dos rascunhos, ou melhor, da elaboração literária nos cadernos,
faz com que Proust se preocupe em destacar a seqüência à qual pertencem certos trechos. A
observação “Ce morceau ne vient pas ici, après douleur + mais après douleur + vient le
morceau qui commence au verso suivante, continue au verso d´après et finit ici” (C.55, fº
47vº)244 ilustra claramente o objetivo de tal anotação: evitar confusão e localizar o início e o
fim do texto. Se seguimos as indicações de Proust, descobrimos que o texto em questão, que
trata da dor sentida pelo herói com a fuga de Albertine, começou a ser construído no fólio
48vº, seguiu em 49vº e terminou em 47vº, em um exemplo flagrante da utilização não linear
dos cadernos.
Esse procedimento de desenvolver o texto por retrocesso, no sentido contrário ao fim
do manuscrito, não é raro e poderíamos até afirmar que se dá de forma sistemática em Proust,
seja por falta de folhas, já preenchidas em etapas anteriores, seja pelo conteúdo, pois como se
sabe, os versos se relacionam com as frentes que os ladeiam. De maneira geral, Proust realiza
esse procedimento sem necessariamente fazer notas, contudo, quando os textos são numerosos
e se assemelham, o escritor delineia seus limites por meio de breves comentários, como
verificamos na nota do fólio 90vº: “Ce verso finit au bas de ce verso, ce qu´il y a au verso
suivant ne s´y rattache pas” (C.55, fº 90vº)245.
Recorrendo a mais exemplos desse tipo, encontramos notas como:
Suivre 2 versos avant: J´avais cent fois pensé (ne pas confondre qu´à 1 verso
avant il y a aussi J´avais cent fois mais c´est parce que je redis 2 fois cette
formule. C´est 1 verso avant qui vient d´abord, puis ce verso-ci, puis 2
versos avant). (C.55, fº 49vº)246
Trata-se do mesmo caso dos versos vistos acima, mas em outra perspectiva.
Escrevendo no verso do fólio 49vº, Proust reforça que a seqüência do episódio se dará dois
244
“Esse trecho não vem aqui, após dor +, mas após dor + vem o pedaço que começa no verso seguinte, continua
no verso subseqüente e termina aqui”.
245
“Este verso termina embaixo deste verso, o que há no verso seguinte não se liga a ele”.
246
“Seguir 2 versos antes: Eu tinha pensado cem vezes (não confundir que em 1 verso antes, também há Eu tinha
pensado cem vezes, mas é porque eu redisse 2 vezes essa fórmula. É 1 verso antes que vem primeiro, depois este
verso, depois 2 versos antes)”.
141
versos antes, ou seja, no fólio 47vº, na passagem “J´avais cent fois pensé”. Contudo, ressalva
que essa frase também foi escrita no verso imediatamente anterior, o 48vº, frisando, por fim,
que a ordem textual será 48vº-49º-47vº. Proust utilizou duas notas para se referir a um mesmo
caso, o que demonstra que, no processo incessante e caótico da escritura, as notas estabelecem
os limites, servindo de guia para o escritor que tenta compreender e comentar seu próprio
processo de escrita.
É essencial salientar que as notas são massivamente utilizadas nos cadernos de
rascunhos quando os textos ainda estão em nascimento ou em fase de desenvolvimento. Nos
cadernos de mise au net, as anotações se rarefazem, pois os textos mais pertinentes ao escritor
já foram escolhidos, sendo essa etapa voltada sobretudo para os ajustes, os acréscimos e as
articulações dos fragmentos, o que explica o uso regular da colagem e da montagem.
Retomando o caráter dessas notas, elas possuem outro papel relevante na composição
proustiana, que é o de salientar a importância dos episódios ou do desenvolvimento posterior
a ser feito. As palavras “capital”, “capitalissime” e suas variantes, bem como a frase “Nota
Bene” ou simplesmente N.B. são utilizadas repetidamente, como podemos averiguar nos
exemplos a seguir: “Capital Certes Albertine ne m´avait jamais dit qu´elle crut que je fusse
épris d´elle” (C.55, fº 16rº); “Ce qui est en marge est Capitalissime, surtout l´enclave du
milieu” (C.55, fº 16vº); “Capitalissime Ajouter encore au verso en face tout à la fin de l
´ajoutage mince” (C.55, fº 24rº); “Capitalissimus pour ajouter au verso précédent, sans doute
après les baisers qu´elle avait reçus” (C.55, fº 38vº), “N.B. Dire quand elle est partie que je
me décide brusquement à tout ce devant quoi j´avais hésité jusque là (...)” (C.55, fº 51vº)247.
247
“Capital Certamente, Albertine nunca havia me dito que ela acreditava que eu fosse apaixonado por ela”; “O
que está na margem é capitalíssimo, sobretudo no enclave do meio”; “Capitalíssimo Adicionar ainda no verso
em frente no finalzinho do acréscimo fino”; “Capitalissimus para acrescentar ao verso precedente, talvez depois
dos beijos que ela havia recebido”; “N.B. Dizer quando ela partiu que eu me decido bruscamente por tudo aquilo
diante do qual eu havia hesitado até ali”.
142
A partir desses exemplos, reparamos que, em sua maioria, as notas atentam para a
questão da articulação dos textos ou da posição a ser ocupada por eles, que de modo geral
pertencem a etapas posteriores de escrita, sendo considerados como acréscimos àqueles
elaborados anteriormente. Sendo assim, as notas reforçam o lado essencial dessas passagens,
pontuando as mudanças e os novos rumos da história que não poderão ser esquecidos pelo
escritor, como constatamos na enfática nota “Toujours KKKKapitalissime” (C.55, fº 93rº)248.
Todavia, elas não possuem somente a finalidade de lembrar, mas são, muitas vezes,
verdadeiras reflexões e direções estéticas tomadas por Proust com relação ao seu trabalho:
Nota Bene
Ce qui est en bas de
la marge après le
mot alinéa, devra
être très court, très détaché
et finira le chapitre,
ou le volume si le
chapitre finit le volume. (C.53, fº 6rº)249
Afora o caráter indeciso da nota, que evidencia as dúvidas de Proust a respeito do
término do volume Sodome et Gomorrhe, observamos que o escritor não só comenta, como
também indica a forma como deve burilar o texto. Esse gênero de notas, chamadas “notes de
régie” fornecem pistas sobre o projeto escritural proustiano, permeado de hesitações e
reviravoltas. Essa nota, localizada na margem esquerda do fólio 6rº do cahier 53, refere-se ao
texto que elabora a decisão inusitada de Albertine de partir para Paris junto do protagonista.
Albertine
qui le matin même av
avait l´air de tenir tellement
à rester à Balbec, voulait
maintenant que nous partions
tout de suite. Je ne m´
expliquai pas pourquoi. Mais
nous nous étions au 15 Septembre.
Ma mère ne fit pas d´objections
248
“Sempre KKKKapitalíssimo”.
“Nota Bene O que está embaixo da margem, após a palavra alínea, deverá ser muito curto, bem desligado e
terminará o capítulo ou o volume, se o capítulo terminar o volume”.
249
143
au départ et le surlendemain
nous étions à Paris. (C.53, fº 6rº)250
Não nos espanta o comentário de Proust que prima, neste momento, por um episódio
mais curto, pois compreendemos que, na narrativa, essa atitude de Albertine configura mais
uma das reviravoltas, dos rebondissements próprios aos personagens da Recherche, ou seja,
fatos que não devem ser destrinchados, mas apenas evocados para surpreender o leitor,
explicando, em boa medida, a preocupação do escritor com a condensação do texto.
No fólio 45rº do caderno 55, encontramos: “Plutôt reserrer et mettre ici ce qui est trois
ou 4 pages plus loin combien la souffrance est le meilleur psychologue” (C. 55, fº 45rº)251e
percebemos o momento em que Proust visualiza a articulação de duas passagens já escritas no
mesmo caderno – a da notícia da fuga de Albertine, bastante desenvolvida neste fólio, e a do
sofrimento como o melhor dos psicólogos252 – o que levará, logo no início de Albertine
disparue, à impactante frase: “‘Mademoiselle Albertine est partie’! Comme la souffrance va
plus loin en psychologie que la psychologie!”253 (AD, p. 03).
Em outros momentos, Proust escreve verdadeiros monólogos a propósito de suas
frases e descrições: “Si je ne laisse pas les développements ci dessus mettre ailleurs cette
phrase excellente un nom qui met dans la bouche de ... cette phrase” (C.55, fº 67rº)254. Essa
frase “excelente” havia sido escrita e sublinhada por Proust no mesmo fólio, e era destinada a
Swann – “un nom qui met dans la bouche de Swann cette phrase : ‘Mais c´est un grand
250
“Albertine, que de manhã mesmo parecia fazer tanta questão de ficar em Balbec, queria agora que nós
partíssemos imediatamente. Eu não encontrava o porquê. Mas nós nós estávamos em 15 de Setembro. Minha
mãe não fez objeções à partida e, dois dias depois, estávamos em Paris”.
251
“De preferência estreitar e colocar aqui o que está três ou 4 páginas adiante, como o sofrimento é o melhor
psicólogo”.
252
Passagem desenvolvida no fólio 47rº do caderno 55, onde Proust registra: “ (...) combien la souffrance est
meilleure psychologue va plus loin en psychologie que le meilleur psychologue” [ (...) como o sofrimento é
melhor psicólogo vai mais longe em psicologia do que o melhor psicólogo”].
253
“A Srta. Albertine foi-se embora! Como, em psicologia, o sofrimento vai mais longe do que a
psicologia!” (Trad., p. 9).
254
“Se eu não deixar esses desenvolvimentos acima, colocar alhures essa frase excelente um nome que põe na
boca de... essa frase”.
144
écrivain, Stevenson (...)”255. Contudo, prevendo as possíveis mudanças que sofreriam os
rascunhos, Proust enxerga na frase uma espécie de fórmula a ser aplicada em qualquer outra
ocasião e a reserva para o futuro da obra.
Encontramos outro exemplo de nota estético-reflexiva no fólio 75rº do cahier 55, onde
Proust registra:
(N.B.) Peut’être cette description doit
continuer je ferai bien de voir, en tous cas
pendant que j’y pense je profite du morceau
de placer le morceau si important sur la Normandie, quitte à mettre entre bien des choses, et que
je pourrai morceau sur la Normandie que je
pourrai peut’être amener tout autrement que par
la nourriture. Mais dans le cas où j’enchaîne, il
Et Sur le plaisir Comme je faut au lieu d’un point
une virgule après ruban d’or. (C.55, fº 75rº)256
Descrevendo os hábitos normandos, Proust envereda pelo caminho dos pratos típicos
dessa região, refletindo sobre a possibilidade de estender essa representação e assim evocar a
Normandia exclusivamente por esse viés. Percebemos o número significativo de rasuras na
nota, como se Proust continuasse a elaboração da descrição literária que fazia anteriormente.
Curiosamente, os dois últimos exemplos de notas vistos acima surgem integrados ao corpo do
texto e não mais destacados em margens ou cabeçalhos, sugerindo que neste tipo de
comentário estético o texto pode muito bem incorporar seu comentário, sua glosa. Nada mais
semelhante, no manuscrito, ao que se passa em toda a Recherche.
Contudo, esses enunciados nem sempre revelam uma satisfação do autor com seus
escritos. Na nota do fólio 58vº, destacamos o seguinte descontentamento:
Je ne sais si je dis plus haut que en effet que son départ a refait pour
255
“um nome que põe na boca de Swann essa frase: Mas é um grande escritor, Stevenson (...)”. Esta frase foi
utilizada no último volume da Recherche.
256
“(N.B.) Talvez essa descrição deva continuar, eu faria bem de analisar, em todo caso, enquanto eu penso
nisso, eu aproveito o pedaço para colocar o pedaço tão importante sobre a Normandia, com o risco de colocá-lo
entre muitas coisas, e que eu poderia pedaço sobre a Normandia que eu poderia talvez trazer inteiramente
diferente pela alimentação. Mas no caso onde eu encadeio, é E Sobre o prazer Como eu necessário au invés de
um ponto, uma vírgula após a fita de ouro”.
145
moi ce qu’elle était pour moi à Balbec mais bien le redire en effet. La
suppression de l’habitude me força brusquemant à penser à ce qu’elle était à
me rappeler l’heure de vie interne* (c’est horrible mais le dire bien ces
heures si rares où la vie ne compte plus pour moi). (C.55, fº 58vº)257
A frase “hora de vida interna” não agrada a Proust, e se ele a mantém por se aproximar
do que pretendia dizer, é bem provável que a modifique futuramente, afinal, as notas de teor
formal servem para ressaltar a beleza de trechos, insistir no aprofundamento de passagens e
buscar formas mais adequadas de expressão, como evidencia a passagem “il faudra autant que
possible ne pas souligner les adjectifs étranges et souligner les mines drôlettes, le beau” (C.55,
fº 74vº)258.
Não é à toa que grande parte das notas registra a preocupação em reformular os
rascunhos elaborados, como podemos observar em diversas passagens: “Tout cela et tout ce
qui précède est à réecrire beaucoup mieux” (C.53, fº 52rº); “Je rentrai. D´en bas je vis la
lumière de la fenêtre d´Albertine éclairée qui m´attendait (le dire mieux)” (C.53, fº 56rº) ;
“(...) tel plaisir que je ne savais pas, dont sa présence chez moi la privait, et qu´elle avait envie
d´aller rejoindre (dire cela mieux)” (C.55, fº 24rº) ; “mettre en meilleure forme” (C.55, fº
38rº) ; “dire mieux (ce dire mieux peut´être dit plusieurs fois dans ce qui précède)” (C.55, fº
48rº)259, entre outras.
Se todos os exemplos elencados até o momento funcionaram direta ou indiretamente
como lembretes para o escritor, é incontestável que eles não cumprem um papel puramente
memorativo, mas operam como verdadeiros parâmetros e diretrizes escriturais. Assim sendo,
encontramos muitos outros grupos de anotações que incidem diretamente sobre a questão
composicional, como veremos no tópico seguinte.
257
“ Não sei se disse mais acima que de fato que sua partida refez para mim o que ela era para mim em Balbec,
mas redizê-lo de fato. A supressão do hábito me forçou bruscamente a pensar no que ela era a me lembrar a hora
de vida interna* (é horrível, mas dizê-lo bem essas horas tão raras onde a vida não conta mais para mim)”.
258
“Será melhor, tanto quanto possível, não sublinhar os adjetivos estranhos e sublinhar as caras engraçadinhas,
o belo”. Trecho referente à descrição da região normanda.
259
“Tudo isso e tudo o que precede é para ser reescrito muito melhor”; “Entrei. Debaixo, vi a luz da janela de
Albertine iluminada que me esperava (dizê-lo melhor); “(...) tal prazer que eu não conhecia, do qual sua presença
em minha casa a privava e ao qual ela tinha vontade de se juntar (dizer melhor isto)”; “pôr em melhor forma”;
“dizer melhor (esse dizer melhor talvez dito várias vezes no que está antes)”.
146
4.2 Os textos moventes e o não-lugar
Como vimos, a nota nos manuscritos proustianos não é mera prática de notação, mas
“un commentaire perpétuel des apparences, une continuelle mise en rapport de l´oeuvre avec
elle-même” (PIERROT, 1994, p. 69)260. Sob esse aspecto, há notas muito relevantes que sobre
a construção literária proustiana, nas quais se percebe de que maneira a escritura estava
embebida em seu projeto e de como ela, por sua vez, o conduzia.
No fólio 10vº dedicado ao episódio da “janela iluminada” visto no capítulo anterior,
Proust delimita o uso do texto dos rascunhos pela seguinte menção: “Pour le morceau ci
dessous il vaudrait mieux insister sur l´ennui et laisser la douceur; la richesse de sensations
pour quand elle est morte” (C.55, fº 10vº)261. Proust prospecta sua obra, agudizando tanto o
efeito do episódio atual, como o do que viria posteriormente. Como visto no capítulo anterior,
o tédio se intensifica na proximidade do ser amado, enquanto a doçura exacerba-se quando já
o perdemos de vez. Essa passagem indica que sua elaboração não estava restrita ou fixa a
apenas um romance ou episódio, pois poderia ser utilizada em outros momentos da narrativa,
demonstrando certa mobilidade dos textos.
Em outro trecho, Proust registra.
Ceci qui est Kapitalissime
pourrait être mis avant ou après pastiche
de Goncourt mais mieux dans la dernière partie quand je conçois l’œuvre d’art. Je l’
écris comme pour la Dernière partie. Si mis
après Goncourt il faut enlever la 1er phrase. (C.55, fº 81vº)262
260
“um comentário perpétuo das aparências, uma contínua relação da obra consigo mesma”.
“Para este pedaço abaixo valeria mais insistir sobre o tédio e deixar a doçura, a riqueza de sensações para
quando ela estiver morta”.
262
“Isso é Kapitalíssimo poderia ser colocado antes ou depois do pastiche de Goncourt, mas melhor na última
parte quando eu concebo a obra de arte. Escrevo-o como que para a Última parte. Se colocado depois de
Goncourt, deve-se tirar a primeira frase”.
261
147
Elaborando o episódio para um fim específico, Proust vislumbra novos encaixes
possíveis para esse texto, o que demonstra que mesmo havendo um projeto, a escrita não está
completamente submissa a ele, a essa “arquitetura” da obra. A percepção dessa mobilidade,
dessa flexibilidade dos episódios e das frases acaba por suscitar a própria anotação que
assinala, de maneira pontual, o momento em que o escritor se vê diante de caminhos
possíveis. O prazer da anotação subjaz nessa infinita possibilidade de conduzir a escrita e de
compor a obra. Ou, como afirma Pierrot : “Le plaisir de la note, on le sent bien, est dans cette
liberté du texte qui s'écrit momentanément et pose les possibles d'un texte à venir” (1994, p.
72)263.
Em outros exemplos, percebemos essa mutabilidade dos textos no que diz respeito às
personagens. Construindo um episódio sobre Albertine e sobre a dor causada pela escrita de
uma carta à jovem, Proust ressalva: “Cette partie-ci peut´être à supprimer et mettre à Gilberte”
(C.XII, fº 53rº)264, e em outra passagem, no caderno 53, o escritor pontua: “À propos de l
´oubli de ma gd mère dont je parlerai là (en réalité c´est la mort d´Albertine qui m´en donne l
´idée mais il vaut mieux je crois mettre pour ma gd mère)” (C.53, fº 9vº)265, compreendemos
claramente que a elaboração de textos destinados a certos personagens evoca muitos outros
que passarão a ser o foco da atenção do autor.
É curioso observar que no último exemplo dado, Proust faz questão de sinalizar que o
episódio sobre o esquecimento da avó foi suscitado, na verdade, pela morte de Albertine, que
ainda não existia em texto, mas em projeto. A nota carrega, portanto, a surpresa pela
descoberta desse paralelo. E se na Recherche existe uma diferença tênue entre os personagens
que se permutam, causando um efeito de espanto no leitor, isto não é menos inesperado para o
263
“O prazer da nota, sentimo-lo bem, está nessa liberdade do texto que se escreve momentaneamente e coloca
os possíveis de um texto porvir”.
264
“essa parte aqui a ser, talvez, suprimida e colocada para Gilberte”. O fólio 53rº, pertencente ao caderno 55, foi
localizado por Kurokawa recortado e colado no caderno de mise au net XII.
265
“A propósito do esquecimento de minha avó, da qual falarei aqui (na verdade, é a morte de Albertine que me
dá a idéia, mas é melhor, creio eu, para minha avó)”.
148
escritor; e sendo essa estreiteza entre os personagens considerada como mais uma perspicácia
da composição proustiana, verificamos que nem sempre ela se dá de forma completamente
consciente.
A construção maleável dos textos leva o escritor tanto a prospectar episódios ainda
não escritos, quanto a retroceder aos já elaborados para lhes acrescentar passagens. Isso fica
nítido no fólio 22vº, cujo texto se restringe, basicamente, a uma grande nota sobre as palavras
ditas por Albertine e que evocam o ciúme do protagonista. No final da passagem, Proust
acentua: “(peut´être mettre cela dans le cahier mince bleu qd j´entendai le calorifère, ou s´il
fait de la brume, ou si c´est dimanche) plutôt le calorifère et le dimanche sera pour après sa
mort” (C.55, fº 22vº)266. Em outra ocasião, Proust visualiza uma situação a ser elaborada no
caderno 53, ou em outro ainda não definido: “À un moment Albert de ce cahier ou d´un autre
Albertine me demandera si je tiens à ce qu´elle porte toujours cette coiffure” (C.53, fº 32vº)267.
Retrocedendo ou avançando, é incontestável que esses textos possuem um caráter
menos rígido e determinado dentro da construção da Recherche, podendo ser usados para
muitas situações, mas há ainda textos que não possuem sequer uma localização definida. Em
inúmeras passagens, o escritor anota: “Dire quelque part là” (C.55, fº 52vº); “Q.q. part là” (C.
55, fº 77vº); “Q.q. part capital dans ce cahier” (C.53, fº 10vº) ; “À un moment quelconque de
ce cahier, ou avant, ou pour autre chose (mais mieux pour cela)” (C.53, fº 13vº) ; “Il faudra à
un de ces moments met[tre] que je pense à autre chose et que tou[t] un coup je souffre” (C.
XII, fº 63vº) ; “Mettre q.q. part ici ou dans le verso recto en face ou dans le recto suivant, ou
ailleurs”(C.55, fº 93vº )268 etc.
266
“(talvez colocar isso no caderno fino azul quando eu escutei o calorífero, ou quando estava nublado, ou
quando era domingo) o calorífero e o domingo de preferência será para depois de sua morte”.
267
“Em um momento Albert desse caderno ou de outro Albertine me perguntará se eu faço questão de que ela
use sempre esse penteado”.
268
“Dizer em algum lugar”; “Em algum lugar aqui”; “Em algum lugar capital desse caderno”; “Em um momento
qualquer desse caderno, ou antes, ou por outra coisa (mas melhor para isso)”; “Será necessário em algum
momento colocar que eu penso em outra coisa e que de repente eu sofro”; “Colocar em algum lugar aqui ou no
verso folha em frente ou na frente seguinte, ou em outro lugar”.
149
A indefinição e o não-lugar dos textos são flagrantes nestes trechos e é essa
indeterminação que promove igualmente a escrita das notas. Nas palavras de Pierrot:
La note indique un lieu qui est un non-lieu, celui de l'utopie. Non que Proust
n'envisage de finir. Mais l'œuvre n'est pas encore fixée. Sa publication est
encore un horizon mouvant, et l'écriture de la note vaut aussi pour ellemême, pour le plaisir de dire, de ne pas oublier de dire: c'est un fragment de
texte en vacance, qui n'a encore de lieu nulle part, même s'il mobilise une
mémoire du tout ». (1994, p.75)269
A Recherche ainda é um canteiro de obras, e seus rascunhos não poderiam deixar de
conter tudo aquilo que caracteriza o ateliê, o laboratório, a fábrica da escritura, ou seja, o
caráter inacabado, movediço e incerto dos textos. Não nos surpreendemos, portanto, quando
encontramos simultaneamente nos manuscritos o anúncio do projeto e sua suspensão.
Chaînon important
À un des moments ou je dis que je veux
lui proposer le mariage, ou ne pas lui proposer,
enfin je veux dire à un des moments où je retarde l´idée d´
une séparation. (C.55, fº 21vº)270
E outros trechos indicam possibilidades ainda incertas quanto à escrita ou elaboração
de situações: “Cette phrase (apposition au mot chagrin serait mieux ailleurs si ailleurs j´ai l
´occasion de la mettre, si ailleurs je dis alors ramassant* mon chagrin (le chagrin qui n´est
nullement etc)” (C.55, fº 50vº)271, ou ainda “Si je laisse cette annexe là il faudra un bon alinéa
avant” (C.XII, p. 98rº)272.
Esse universo hipotético do “se” aponta para a grande instabilidade da escrita literária,
dos cadernos de rascunho e, por que não dizermos, do projeto literário proustiano. Conforme
Marine Garibal: “Composer ne saurait, dans ces conditions, se réduire à l'observation d'un
plan préconçu. La composition n'est jamais un fait acquis chez Proust, elle se
269
“A nota indica um lugar que é um não-lugar, o da utopia. Não que Proust não vislumbre terminar. Mas a obra
ainda não está fixada. Sua publicação é ainda um horizonte movente, e a escrita da nota vale também por ela
mesma, pelo prazer de dizer, de não se esquecer de dizer: é um fragmento de texto em vacância, que ainda não
possui lugar, mesmo que mobilize uma memória do todo”.
270
“Elo importante Em um dos momentos em que digo que quero lhe propor casamento, ou não lhe propor,
enfim, quero dizer em um dos momentos em que adio a idéia de uma separação”.
271
“Esta frase (aposição à palavra desgosto seria melhor alhures, se alhures eu tiver a ocasião de a colocar, se
alhures eu disser então colhendo* meu desgosto (desgosto que não existe mais etc.)”.
272
“Se eu deixar este anexo aqui, será necessária uma boa alínea antes”.
150
conquiert” (1992, p.91)273 ou nas palavras de Philippe Willemart: “A escrita literária se
constitui no decorrer das idas e vindas da mente do escritor ao manuscrito, por sua
mão” (2005, p. 68).
Todos estes exemplos poderiam nos levar a crer que o escritor não tinha um controle
total sobre sua obra e que seu projeto literário, tantas vezes comparado por ele mesmo a uma
catedral, não estava plenamente consolidado. Contudo, devemos nuançar essa hipótese, pois
se os manuscritos nos revelam uma instabilidade própria à escrita, não devemos supor que o
escritor deixava-se guiar completamente pele escritura e que não tinha uma dimensão global
do projeto da Recherche.
Em uma carta escrita a Paul Souday analisada na introdução deste trabalho, Proust
declara que sua obra foi minuciosamente construída e, assim, não era preciso a morte de seu
autor para que a Recherche ficasse pronta:
Je veux tout de même, au moment où la fatigue m´arrête, vous donner l
´assurance qu´il n´y a pas besoin de ma mort, comme voulait bien le dire un
critique, pour que je cesse d´écrire: A la Recherche du temps perdu. Cet
ouvrage (dont le titre mal choisi trompe un peu) est si méticuleusement
‘composé’ (je pourrais vous en donner de bien nombreuses preuves), que le
dernier chapitre du dernier volume a été écrit tout de suite après le premier
chapitre du premier volume. Tout l´‘entre-deux’ a été écrit ensuite, mais il y
a longtemps. La guerre m´a empêché d´avoir des épreuves ; la maladie m
´empêche, maintenant de les corriger. Sans cela, il y a beau temps que la
critique n´aurait plus à s´occuper de moi. (Corresp., t. XVIII, p. 536)274
Com o fim da Primeira Grande Guerra, Proust buscava consolidar-se no meio literário
e, por essa razão, o número de correspondências endereçadas a homens de letras e editores,
em 1919 foi bastante expressivo. Em outra carta, desta vez enviada a Rosny aîné, Proust volta
a insistir sobre a questão da composição.
273
“Compor não seria, nestas condições, reduzir-se à observação de um plano preconcebido. A composição não é
nunca um fato adquirido em Proust, ela se conquista”.
274
“Gostaria mesmo assim, no momento em que o cansaço me pára, de dar-te a garantia de que não é necessária
minha morte, como bem gostaria de dizer um crítico, para que eu cesse de escrever: Em busca do tempo perdido.
Esta obra (cujo título mal escolhido engana um pouco) é tão meticulosamente ‘composta’ (eu poderia dar-te
inúmeras provas) que o último capítulo do último volume foi escrito logo em seguida ao primeiro capítulo do
primeiro volume. Todo o ‘entre - dois’ foi escrito em seguida, mas há muito tempo. A guerra me impediu de
fazer as provas; a doença me impede, agora de corrigi-las. Sem isso, há muito tempo que a crítica não teria mais
de se ocupar de mim”.
151
Car je veux que tout paraisse ensemble pour qu´on comprenne la
composition à laquelle j´ai tout sacrifié et qu´on méconnaît tellement qu´on
croit que c´est un recueil de souvenirs fortuits! La construction, inflexible,
voilà justement ce que j´aimerais à vous montrer par quelques exemples bien
frappants. (Corresp., t. XVIII, p. 547)275
Obviamente, espantamo-nos com essas afirmações, ditas ainda em 1919, sugerindo
que tudo já estava escrito e construído, pois, como sabemos, em 1922, ano de sua morte,
Proust não havia conseguido finalizar o La prisonnière, não tendo revisto suas provas,
tampouco havia terminado Albertine disparue, ainda em datilografia, e o Temps retrouvé, em
estado de manuscrito. Segundo Nathalie Mauriac Dyer : “Il faut de toute évidence attribuer à
la stratégie littéraire la part de l´exagération. Proust cherche à affirmer une méthode de
rédaction, à confirmer contre les critiques une forte volonté de composition” (DYER,
2001)276.
Todavia, reduzir essa “vontade de composição” a uma estratégia literária que visava
apenas à publicação, é no mínimo atribuir má fé ao escritor e ignorar que, já em 1913, Proust
mencionava tal complexidade de composição, bem como o término da escrita da Recherche:
“(…) au point de vue de la composition, elle est si complexe qu'elle n'apparaît que
tardivement quand tous les ‘thèmes’ ont commencé à se combiner” (Corresp., t. XII, p. 92)277.
Ou ainda em outra carta: “Quant à ce livre-ci, c'est au contraire un tout très composé, quoique
d'une composition si complexe que je crains que personne ne le perçoive et qu'il apparaisse
comme une suite de digressions. C'est tout le contraire.” (t. XII, p. 82) 278. Algo que se
confirma uma vez mais na conhecida carta a Jacques Rivière, em que Proust declara com
satisfação: “Enfin je trouve un lecteur qui devine que mon livre est un ouvrage dogmatique et
275
“Pois quero que tudo apareça junto para que compreendam a composição pela qual eu sacrifiquei tudo e que é
de tal forma desconhecida que se acredita ser uma coletânea de lembranças fortuitas! A construção, inflexível,
eis justamente o que eu gostaria de te mostrar por alguns exemplos bem surpreendentes”.
276
“É necessário, com toda evidência, atribuir à estratégia literária a porção de exagero. Proust procura afirmar
um método de redação e confirmar contra os críticos uma forte vontade de composição”.
277
“(...) do ponto de vista da composição, ela é tão complexa que só aparece tardiamente, quando todos os
‘temas’ começaram a se combinar”. Carta a René Blum de 1913.
278
“Quanto a este livro, é, ao contrário, um todo muito composto, embora de uma composição tão complexa, que
eu temo que ninguém a perceba e que pareça uma seqüência de digressões. É exatamente o contrário”. Carta a
René Blum de 1913.
152
une construction !” (t. XIII, p. 99)279, e ainda em outra correspondência a André Beaunier,
onde diz: “Tout est écrit mais tout est à reprendre” (t. XII, p. 367)280.
É claro que nem tudo estava escrito: a história de Albertine só foi iniciada durante a
guerra. Mas tudo deveria ser retomado, retrabalhado, assim como viemos notando na análise
detida dos manuscritos. A mudança, os acréscimos, os ajustes sempre fizeram parte do
processo escritural proustiano, o que não necessariamente implica uma falta de composição.
Compreendemos a afirmação de Nathalie Mauriac a respeito da construção literária de
Marcel Proust, sobretudo após a autora ter encontrado a datilografia de Albertine disparue
rejeitada pelos primeiros editores. Embora o documento portasse correções feitas pela mão do
escritor, essas mudanças promoviam certa reviravolta na história de Albertine e,
conseqüentemente, propiciavam grandes contradições no conjunto da Recherche, fato muito
mal recebido pelos críticos proustianos.
Mauriac, buscando sustentar a validade de sua hostilizada descoberta, acaba
diminuindo a força dada à composição para acentuar o caráter movediço e inacabado da
escrita proustiana. E, defendendo-se, seleciona, em meio à crítica vigente, elementos dos
estudos que viam a Recherche como um todo orgânico, harmônico e acabado, qualidades que
a datilografia encontrada teria feito cair por terra. Em suas palavras:
La résurgence de la dactylographie originale a constitué, semble-t-il, un
événement traumatique, une sorte d´attentat à ce qui est conçu comme une
entité physique et vivante – organisme et corps. Qu´on en juge par ces
formules: dactylographie tronquée, version amputée, mise en pièces, longue
partie excisée, version sauvagement racourcie. Le geste d´écriture est
comparé à un acte violent, agressif, mutilant, opéré sur un corps vivant.
(2001)281
279
“Enfim, encontro um leitor que adivinha que minha obra é dogmática e uma construção”. Carta escrita em
1913.
280
“Tudo está escrito, mas tudo é para retomar”. Carta escrita em 1913.
281
“O surgimento da datilografia original constituiu, parece, um evento traumático, uma espécie de atentado
àquilo que é concebido como uma entidade física e viva – organismo e corpo. Julgue-se por essas fórmulas:
‘datilografia truncada’, ‘versão amputada’, ‘em pedaços’, ‘grande parte extirpada’, ‘versão encurtada de modo
selvagem’. O gesto de escritura é comparado a um ato violento, agressivo, mutilador, operado sobre um corpo
vivo”. Os grifos são da autora.
153
Não pretendemos reacender a discussão iniciada no final da década de 1980 e que
perpassou quase toda a década de 1990, apenas pontuar, à luz desse afastamento histórico, as
impropriedades cometidas por ambos os lados da crítica. Não há como ignorar o aspecto
inacabado e lacunar da Recherche, embora vislumbremos, em sua leitura, sua composição e
arquitetura indiscutíveis. Além disso, sabemos que a publicação póstuma dos três últimos
volumes se deu a partir de documentos manuscritos sobre os quais Proust, se não tivesse
falecido, teria, provavelmente, se debruçado ainda durante anos. E o que lemos hoje
concernente aos últimos romances é fruto de um arranjo literário feito pelos editores e por
Robert Proust.
Contudo, não nos parece que salientar apenas o aspecto inacabado da obra proustiana,
na tentativa de diminuir o da composição, seja uma saída interessante à leitura tradicional,
pois se Nathalie Mauriac traz uma análise pertinente ao frisar essa riqueza de mudanças e esse
constante devir dos rascunhos de Proust que ela nomeia “espace d´effervescence”, ela peca
quando radicaliza e afirma que:
À la recherche du temps perdu n´a jamais existé en tant qu´oeuvre achevée,
oeuvre complète, oeuvre bouclée préalablement à la restauration éditoriale
dont elle a fait l´objet de manière posthume. Restauration qui s´est toujours
avancée masquée, à laquelle le temps a conféré, par une lente cristallisation,
une très forte solidité dans la représentation collective, et qui jouit aujourd
´hui de toute la patine de l´authenticité. Sans elle, À la recherche du temps
perdu ne serait peut-être pas devenu le monument que l´on sait (...). (2001)282
De fato, a Recherche não pode ser considerada uma obra acabada, visto que Proust
faleceu antes de seu término, que as edições, como apontou Mauriac, foram “restauradas” a
partir de manuscritos e que as escolhas foram feitas não pelo escritor, mas por terceiros.
Entretanto, não há como negar que a obra possui um fechamento e que os romances se
correspondem, dialogam e levam a algum lugar. Isso se deve à construção, à composição
282
“Em busca do tempo perdido jamais existiu como obra acabada, obra completa, obra esta fechada
previamente à restauração editorial da qual foi objeto de maneira póstuma. Restauração esta que sempre avançou
disfarçadamente, à qual o tempo conferiu, por uma lenta cristalização, uma fortíssima solidez na representação
coletiva, e que goza hoje de toda a pátina de autenticidade. Sem ela, Em busca do tempo perdido não teria talvez
se tornado o monumento que conhecemos”. Os grifos são da autora.
154
“dogmática” e “inflexível” da Recherche. Ademais, afirmar que essa restauração velada que
se pretende autêntica seja, provavelmente, o motivo pelo qual a obra proustiana tenha se
consolidado, é atribuir aos editores uma genialidade que não lhes pertence.
A restauração é incontestável, mas se deu a partir de textos que Proust elaborou,
mesmo que rasurados, e se a escolha para a edição não foi feita pelo autor, não podemos dizer
o mesmo da escrita. O ataque feito por Nathalie Mauriac a essa visão acabada e harmônica
que se tem da Recherche respinga, involuntariamente talvez, na própria composição do
escritor. É perfeitamente plausível que nas correspondências de 1919, em que Proust
reforçava a construção de sua obra, haja realmente uma estratégia literária de publicação. No
entanto, não compreendemos por que a autora simplesmente não mencionou as
correspondências de 1913, nas quais Proust tocou nas mesmas questões.
Supomos que o erro esteja na confusão que se faz entre composição e escrita,
elementos completamente interligados, mas que são de certa forma, independentes. Quando
Proust qualifica sua composição de “inflexível”, ele não estaria necessariamente se referindo a
uma escrita submissa a um plano pré-concebido, mas a componentes, temas e questões que
desde o início de sua carreira literária ele almejava tratar. De Jean Santeuil, passando por
Contre Sainte-Beuve e pelas traduções de Ruskin, Proust sempre vislumbrou uma discussão
teórica sobre a arte e a literatura que, com efeito, concretizou-se na Recherche, pelos
inúmeros comentários do narrador ou na conversa do herói com Albertine. O tema do escritor
perpassou igualmente todas as etapas de escritura para desembocar, posteriormente, na busca
por tornar-se escritor, presente na Recherche. Essas, assim como muitas outras, seriam as
invariantes que Proust jamais abandonou e das quais nunca abriria mão, e que formam um
todo coeso, uma arquitetura, um projeto literário que tinha um ponto de partida e de chegada
muito bem definidos para ele.
155
Todavia, essa composição não advém apenas de um plano concebido a priori, pois não
devemos ignorar igualmente as palavras do narrador proustiano quando menciona os grandes
romances do século XIX:
(...) je songeais combien tout de même ces oeuvres participent à ce caractère
d´être – bien que merveilleusement – toujours incomplètes, qui est le
caractère de toutes les grandes oeuvres du XIXe siècle ; du XIXe siècle dont
les plus grands écrivains ont manqué leurs livres, mais, se regardant
travailler comme s´ils étaient à la fois l´ouvrier et le juge, ont tiré de cette
auto-contemplation une beauté nouvelle, extérieure et supérieure à l´oeuvre,
lui imposant rétroactivement une unité, une grandeur qu´elle n´a pas. (LP, p.
666)283
Estas considerações sobre a literatura produzida no século XIX são pertinentes para
compreender não somente Balzac, Victor Hugo ou Michelet, mas a própria Recherche que,
embora possua indubitavelmente características modernas, liga-se à tradição literária tendo
igualmente como modelo de unidade romanesca os grandes escritores do século XIX francês.
Em um artigo, Jacques Rivière chega a equiparar Proust aos clássicos franceses,
notadamente com relação à psicologia aguçada e ao conhecimento extremo que o escritor tem
de si mesmo: “C´est la grande tradition classique qu´il renoue ainsi. Racine fait-il autre chose
que d´aller chercher autrui en lui-même?”284 (1985, p.65) ; leitura que parece ter agradado
muito a Proust que comentou, “Et quand j´arrive à penser non plus même à mon livre, mais à
un article de vous [,] je ne peux considérer cet article que sous l´aspect de l´éternel, je
souffrirais mille morts si vous y changiez un mot (...)” (Corresp., t.XIX, p.99)285.
283
“(...) considerava eu quanto, em todo caso, essas obras participam do caráter de ser – ainda que
maravilhosamente – sempre incompletas, caráter que é o de todas as grandes obras do século XIX, cujos
escritores mais eminentes deixaram nos seus livros a marca de sua personalidade, mas, observando-se a si
próprios ao trabalhar, como se fossem ao mesmo tempo o operário e o juiz, extraíram dessa autocontemplação
uma beleza nova, exterior e superior à obra, impondo-lhe retroativamente uma unidade, uma grandeza que ela
não tem”. (Trad., p. 148)
284
“É a grande tradição clássica que ele restabelece aqui. Racine faz outra coisa senão ir buscar outro nele
mesmo?”.
285
“E quando chego a pensar não mais em meu livro, mas em um artigo seu, só posso considerar este artigo sob
o aspecto do eterno, eu sofreria mil mortes se você trocasse em uma palavra (...)”. Carta escrita a Jacque Rivière
em 1920.
156
Retornando ao narrador proustiano, ele continua suas reflexões acerca de Wagner,
compositor que sem saber ou sem uma intenção prévia, compôs uma Tetralogia, uma
descoberta que deve ter-lhe feito provar:
(...) un peu de la même ivresse que Balzac quand celui-ci, jetant sur ses
ouvrages le regard à la fois d´un étranger et d´un père, trouvant à celui-ci la
pureté de Raphaël, à cet autre la simplicité de l´Évangile, s´avisa
brusquement en projetant sur eux une illumination rétrospective qu´ils
seraient plus beau réunis en un cycle où les mêmes personnages
reviendraient et ajouta à son oeuvre, en ce raccord, un coup de pinceau, le
dernier et le plus sublime. Unité ultérieure, non factice. (...) Non factice,
peut-être même plus réelle d´être ultérieure, d´être née d´un moment d
´enthousiasme où elle est découverte entre deux morceaux qui n´ont plus qu
´à se rejoindre, unité qui s´ignorait, donc vitale et non logique, qui n´a pas
proscrit la variété, refroidi l´exécution. (LP, p.666-7)286
São flagrantes as semelhanças existentes entre essa passagem e os manuscritos
proustianos vistos neste trabalho, pois constatamos, a partir das notas, que Proust também faz
descobertas concernentes à unidade, seja de personagens, de passagens etc. Unidade
igualmente não factícia, feita a priori, mas ulterior, não lógica e, portanto, vital. A
composição inflexível de Proust estaria não apenas ligada às invariantes das quais falamos,
mas a essa busca por uma unidade posterior, que se dá na releitura e reescritura dos
rascunhos, provando, mais uma vez, que a Recherche é uma construção. Conforme Rivière,
no artigo “Proust et la tradition classique” citado acima: “C´est un rongeur: il fera beaucoup
de débris, avant que l´on puisse comprendre que ça n´en est pas, que ce sont les matériaux d
´une vaste et magnifique construction” (1985, p. 64)287.
Mas se a Recherche é uma obra “dogmática”, profundamente ligada aos modelos
literários de unidade do século XIX, sua escrita é moderna, pois compósita e fragmentada.
286
“(...) um pouco do mesmo transporte que sentiu Balzac quando, lançando aos seus romances o olhar a um
tempo de estranho e pai e achando num a pureza de Rafael, noutro a simplicidade do Evangelho, considerou
subitamente, ao projetar sobre eles uma iluminação retrospectiva, que ficariam mais belos reunidos num ciclo em
que as mesmas personagens reaparecessem e acrescentou à sua obra, nesse trabalho de coordenação, uma
pincelada, a última e mais sublime. Unidade ulterior e não factícia (...). Não ficaria, talvez, até mais real por ser
ulterior, por ter nascido de um momento de entusiasmo em que é descoberta entre pedaços a que só falta uniremse. Unidade que se ignorava a si mesma, logo vital e não lógica, que não proscreveu a variedade nem arrefeceu a
execução”. (Trad., p. 149)
287
“É um roedor: ele fará muitos escombros, antes que possamos compreender que não é isso, que são materiais
de uma vasta e magnífica construção”.
157
Quando mencionamos a escrita, referimo-nos igualmente ao modo de execução da obra, que,
indiscutivelmente, está longe de seguir os mesmos parâmetros do século XIX. Basta lembrar
de Flaubert, cujos planos, roteiros e pesquisas antecedem a escritura dos romances, ou se
quisermos, pensemos em outro caso curioso, os manuscritos de Zola, que se restringem,
fundamentalmente, a pesquisas, planos e roteiros; ou seja, diferentemente de Flaubert e de
Proust, que reescreviam incessantemente os episódios, Zola não se dedicava à escrita dos
rascunhos, não tendo deixado nenhum brouillon288.
Enquanto alguns geneticistas afirmam que Zola se dedicava muito pouco à etapa dos
rascunhos, tendo, muito provavelmente, se desfeito deles, muitos outros chegam a dizer que o
autor de Germinal sequer passava por ela. Em Proust, não há planos, e os que existem,
reduzem-se a pequenas notas registradas nas cadernetas. Daí a grande dificuldade para
estabelecer o ponto de partida da obra proustiana, identificar o primeiro caderno utilizado na
escrita da Recherche, pois possivelmente não houve primeiro, mas primeiros cadernos.
Em suma, a Recherche é inteiramente composta pela escritura de episódios, ato que
começa nos cadernos de rascunhos e perpassa todas as outras etapas, de mise au net, à
datilografia e às provas. Nas palavras de Almuth Grésillon.
Les scripteurs se rangent tous plus ou moins dans l'une de ces deux
catégories, ils se situent toujours, au moins tendanciellement, soit dans le
processuel et l'improvisation, soit dans le programmatique et la
rationalisation, même s'il existe bien entendu de nombreux degrés
intermédiaires entre le comportement où l'on s'abandonne au flux d'écriture
et celui où l'on développe systématiquement un programme. (1996, p.
100)289
Grosso modo, Flaubert e Zola seriam escritores programáticos, enquanto Proust seria
um escritor processual, embora ele e Flaubert se aproximem fortemente pela importância dada
288
Estas reflexões foram desenvolvidas por Daniel Ferrer e apresentadas no curso Génétique des texte et de
formes na École Normale Supérieure de Paris em 2008/2009.
289
“Os scriptors classificam-se todos, mais ou menos, dentro dessas duas categorias, eles se situam sempre, ao
menos tendencialmente, seja no processual e na improvisação, seja no programático e na racionalização, mesmo
que haja vários graus intermediários entre o comportamento daquele que se abandona ao fluxo da escritura e
aquele que desenvolve sistematicamente um programa”.
158
à escritura em seus processos de composição290. Em uma escrita puramente processual, é
comum, portanto, encontrarmos grande desorganização cronológica, abandonos de passagens,
retomadas, hesitações e incertezas.
Todos os exemplos analisados neste tópico poderiam sugerir uma escritura a esmo e
uma obra que se constitui no momento de sua execução. Entretanto, se nos deparamos com
diversas passagens em que Proust não sabe onde colocar seus textos e como ligá-los,
igualmente existem muitas outras que indicam uma certeza e um domínio da composição.
Para ilustrar alguns desses casos, damos os seguintes exemplos: “pour Vinteuil à
mettre dans ce développement (je ne dis pas à cette page-ci mais faute de place, je le mets là,
c´est pour ces pages-ci)” (C.55, fº 30rº), ou ainda “Ajouter à ce que je dis des oeuvres diverses
et pareilles de Vinteuil (pareilles les 2 motifs questionnateurs et virginal de la Sonate, du
Quintette de Franck, différents préludes fugue et variations)” (C.55, fº 32vº)291.
Constatamos, assim, que contrariamente ao que se passava com as notas estudadas
anteriormente, Proust já havia dado um destino certo às passagens que elaborava, e mesmo
quando o escritor registra “mettre cela en son temps” (C.XII, fº 53rº) ou “Mettre ou je le
jugerai opportun” (C.55, fº 83vº)292, podemos nos questionar se essas referências que nos
parecem vagas, seriam suficientemente claras para seu autor.
Em outras notas, Proust é ainda mais nítido com relação ao destino dos episódios: “Il
faudra en son temps mettre la phrase sur les bleuets non dans les promenades avec Me de
Villeparisis mais dans la promenade en Auto allant de q´Albertine” (C.55, fº 42vº)293, ou no
trecho em que escreve: “Capital Dans cette conversation qui aura sans doute lieu non à
290
A propósito da relação de Flaubert com a escritura, ver GALÍNDEZ-JORGE, Verónica. Fogos de artifício:
Flaubert e a escritura.
291
“para Vinteuil, colocar nesse desenvolvimento (eu não digo nesta página, mas por falta de espaço, ponho aqui,
é para essas páginas aqui)”; “Acrescentar ao que eu digo das diversas e parecidas obras de Vinteuil (parecidos os
2 motivos questionadores e virginal da Sonata, do Quinteto de Franck, diferentes prelúdios fugas e variações)”.
292
“Colocar isto no seu tempo”; “Colocar onde eu julgar oportuno”.
293
“Será necessário em seu tempo colocar a frase sobre as centáureas não no passeio com Mme. de Villeparisis,
mas no passeio de Automóvel indo de q Albertine”.
159
Combray mais dans la dernière matinée Guermantes, Gilberte me dira” (C.55, fº 93rº)294.
Percebemos que o escritor projeta os episódios para outros momentos, o que sugere, em maior
ou menor grau, uma visão do conjunto da obra.
Assim sendo, quando estudamos os rascunhos proustianos, entramos em contato com
um universo instável, incerto e até certo ponto caótico, mas que revela, no intenso trabalho
dos episódios e das invariantes, um desejo por uma construção, uma composição, uma
unidade e, por essa razão, não é contraditório perceber nos cadernos de Proust essa vontade de
composição construída por esse “espaço de efervescência” que é sua escrita.
Por fim, gostaríamos de evocar uma passagem de um artigo de Philippe Willemart
sobre a escrita literária que, a nosso ver, sintetiza o que encontramos nos rascunhos de Marcel
Proust. Segundo o crítico:
Não se trata de intencionalidade ou de realidade subjetiva, mas de um
escritor – preso nas malhas da escritura e do vir-a-ser – que, a cada
conclusão da rasura passa o bastão, como numa corrida, para a instância do
autor e descobre-se não uma intenção primeira, mas o porta-voz de um
desejo desconhecido e de uma comunidade que até pode ser universal. Por
outro lado, cada conclusão e ratificação de uma frase, de um parágrafo ou de
um capítulo pelo autor, supõem o contato com “o texto móvel”, que pode
sempre questionar o que foi feito. (WILLEMART, 2005, p. 80)295
O paralelo entre escritor e autor no excerto acima não se aproximaria da metáfora
proustiana do autor que contempla seu trabalho e que seria, ao mesmo tempo, operário e juiz
de sua obra?
294
“Capital Nessa conversação que se passará talvez não em Combray, mas na última matinée Guermantes,
Gilberte me dirá”.
295
O conceito de “texto móvel” desenvolvido por Willemart se propõe a substituir a noção romântica de “musa”,
utilizando, para tanto, um viés psicanalítico. O “texto móvel” submeteria o escritor à atividade de escrita,
conduzindo-o e obrigando-o a “dar mil voltas e bifurcações”. Ainda segundo o crítico, “(...) o ‘texto móvel’
força o escritor a descobrir, aos poucos, o caminho da escritura e a administrar o pedaço de Real envolvido no
‘texto móvel’”. (p. 70). Cf. WILLEMART, Philippe “Como se constitui a escritura literária?”.
160
4.3 A questão do “je”
Estudando o conjunto de notas nos cadernos de rascunho, deparamo-nos com um tipo
de anotação que ressuscita um dos temas mais intrigantes da obra proustiana e de sua
escritura: a questão do “je”. Obviamente, em notas dedicadas à estética e à realização da obra,
não poderia deixar de existir o “je”, marca do escritor, como vemos em alguns exemplos já
evocados: “(...) à mettre dans ce développement (je ne dis pas à cette page-ci mais faute de
place je le mets là (...))” (C.55, fº 30rº); “Cette phrase (...) mieux ailleurs si ailleurs j´ai l
´occasion de la mettre, si ailleurs je dis alors (...)” (C.55, fº 50vº); “Peut´être tout de suite
Avant Goncourt quand j´ouvre le volume” (C.55, fº 62vº); “Si je ne laisse pas les
développements ci dessus mettre ailleurs cette phrase excellente” (C.55, fº 67rº); “Je l´écris
comme pour la Dernière partie”. (C.55, fº 81rº); “Mettre où je jugerai opportun” ou ainda, no
mesmo fólio “Quand Albertine est morte (je choisirai le moment sans interrompre un
développement)” (C.55, fº 83vº)296, etc.
Em todos esses exemplos, o escritor se coloca como o realizador das tarefas, o
operador da escritura, e embora o uso da primeira pessoa seja comum nesses casos, nos
manuscritos proustianos o “je” do escritor nem sempre se manifesta quando se refere a
atividades e remanejamentos próprios à escrita da obra literária. Como vimos, Proust
costumava utilizar muitos infinitivos para registrar as mudanças que deveria fazer, como
“mettre quelque part”, “mettre en son temps”, “le dire mieux” etc.
Mas há outro “je” que provoca estranhamento no leitor do manuscrito e que se
encontra nas notas dos cadernos: “Pour mettre un peu plus loin quand notre vie avec Albertine
296
“(...) colocar neste desenvolvimento (eu não digo nesta página aqui, mas por falta de espaço, eu o coloco aqui
(...))”; “Essa frase (...) é melhor alhures, se alhures eu tiver a ocasião de colocá-la, se alhures eu disser então
(...)”; “talvez logo em seguida Antes de Goncourt quando eu abro o volume”; “Se eu não deixar os
desenvolvimentos acima, colocar alhures essa frase excelente”; “Eu o escrevo como que para a Última parte”;
“Colocar onde eu julgar oportuno”; “Quando Albertine estiver morta (eu escolherei o momento, sem interromper
um desenvolvimento)”.
161
à la maison commence” (C.53, fº 8vº)297; “Quand je dis que ma mère est obligée d´aller à
Combray” (C.53, fº 12vº)298 ; “Mettre (capitalissime je me à l´endroit où cela pourra se
placer dans notre vie, qd bien avant la soirée Verdurin)” (C.53, fº 18vº)299. O uso da primeira
pessoa alterna-se entre o “je” do escritor, daquele que constrói e, portanto, tem a autoridade
sobre as mudanças e notas, e o “je” do herói, acompanhado do emprego de pronomes
possessivos como “ma mère” e “notre vie” que demonstram essa intersecção.
Há outros exemplos em que o “je” de Marcel Proust embaralha-se diretamente ao do
protagonista: “(...) je dirais (capital) qd je dis qu´alors je ne souffre plus” (C.53, fº 13vº)300,
“Quand je suis jaloux dire” (C.53, fº 32rº)301; “Pour ajouter à ces lieux, à ces années, où elle
avaient vécu qui me troublent” (C.55, fº 38rº)302; “Je ne sais si je dis plus haut que en effet que
son départ a refait pour moi ce qu´elle était pour moi à Balbec” (C.55, fº 58vº)303; “Quand je
suis à Combray” (C.55, fº 91rº)304.
Percebemos, em quase todos os casos, um “je” híbrido que se refere tanto a Proust –
àquele que elabora, constrói, disse ou ainda irá dizer – quanto ao herói da Recherche – o
único “je” cujos anos vividos por Albertine agitam, para quem a jovem foi alguma coisa ou
que já não sofre mais. Esse emaranhamento patente entre escritor e personagem faz ressurgir,
inevitavelmente, uma das discussões mais espinhosas sobre a Recherche e seu autor, a de que
a obra proustiana é uma coletânea de lembranças, uma autobiografia.
Evidentemente, não procuramos reacender essa questão, pois ela seria um retrocesso
para a crítica proustiana, uma vez que já sabemos, a partir de diversos estudos, que a
297
“Para colocar um pouco mais longe quando nossa vida com Albertine começa em casa”. Todos os grifos das
passagens são nossos.
298
“Quando eu digo que minha mãe é obrigada a ir a Combray”.
299
“Pôr (capitalíssimo eu me no lugar onde isso poderá ser colocado em nossa vida, qd bem antes da soirée
Verdurin”.
300
“Eu diria (capital) quando eu digo que então eu não sofro mais”.
301
“Quando eu estiver com ciúme dizer”.
302
“Acrescentar a esses lugares, a esses anos onde ela havia vivido e que me perturbam”.
303
“Não sei se disse mais acima que de fato que sua partida refez para mim o que ela era para mim em Balbec”.
304
“Quando eu estiver em Combray”.
162
Recherche não é uma autobiografia e que entre Proust e o narrador existem diferenças
expressivas.
Para citar alguns casos, Gérard Genette afirma que a obra proustiana é uma resposta
exemplar ao que o crítico chamou de “questão da escritura” ou em outros termos, as
dificuldades ou até mesmo a impossibilidade de escrever uma obra de ficção. E considera
que: “ce qu´est à coup sûr la Recherche du temps perdu, quand bien même on la considérerait
(ce qu´elle n´est évidemment pas) comme une pure autobiographie” (GENETTE, 1980, p.
7)305, ao passo que Tadié sustenta que “(...) une fois le livre publié, et jusqu´à nos jours, des
lecteurs, des critiques trompés par la présence d´un récit à la première personne y ont vu un
écrit intime, une autobiographie, aux mieux un roman personnel” (TADIÉ, 1971, p. 17)306 e
persevera, mais adiante, declarando que “Cette première personne, si claire, si simple, a une
histoire trouble, complexe; loin d´être donnée, elle a été conquise avec acharnement à la fois
sur l´intimité, prête à se confesser et sur l´impersonnalité du monde où s´écrivent les
romans” (p.19)307.
Poderíamos recorrer ao próprio Proust quando afirma, em uma carta a Henri de
Régnier escrita em 1920 que:
Comme les auteurs les plus flattés ne sont jamais contents complètement de
leur portrait, laissez-moi vous dire (ce qui n´enlève rien à ma gratitude
infinie) que je ne suis pas d´accord avec vous quand vous voyez des
Mémoires, des Souvenirs, dans une oeuvre construite où le mot fin a été
inscrit au terme du dernier volume (non paru encore) avant que fussent écrits
ceux qu´on vient de publier. Le “je” est une pure formule, le phénomène de
mémoire qui déclenche l´ouvrage est un moyen voulu, comme si vous
voulez la grive entendue à Montboissier qui ramène Chateaubriand à
Combourg. (Corresp., t. XIX, p. 630-1)308
305
“é o que, seguramente, é a Em busca do tempo perdido, mesmo quando a considerariam (o que ela,
evidentemente não é) como uma pura autobiografia”.
306
“(...) uma vez o livro publicado, e até nossos dias, leitores, críticos enganados pela presença de uma narrativa
em primeira pessoa, viram nele um escrito íntimo, uma autobiografia, ou melhor, um romance pessoal”.
307
“Essa primeira pessoa, tão clara, tão simples, tem uma história turva, complexa; longe de ser dada, ela foi
conquistada com obstinação, ao mesmo tempo, pela intimidade prestes a se confessar e pela impessoalidade do
mundo no qual se escrevem os romances”.
308
“Como os autores mais lisonjeados nunca estão completamente contentes com seu retrato, deixe-me dizer-lhe
(o que não diminui em nada minha gratidão infinita) que não estou de acordo com você quando você vê
Memórias, Lembranças, numa obra construída, onde a palavra fim foi inscrita ao término do último volume
163
Insistindo na construção de seus livros, Proust revela que a primeira pessoa faz parte
dessa composição e não se pode atribuir à Recherche – uma obra cujo fim foi elaborado antes
mesmo dos volumes que formam o “entre-deux” – um caráter memorialista, pois a própria
memória involuntária é pretendida e igualmente construída, servindo apenas como
desencadeador da história. Algo que também aparece em Roland Barthes:
Les deux discours, celui du narrateur et celui de Marcel Proust, sont
homologues, mais non point analogues. Le narrateur va écrire, et ce futur le
maintient dans un ordre de l´existence, non de la parole; il est aux prises
avec une psychologie, non avec une technique. Marcel Proust, au contraire,
écrit, il lutte avec les catégories du langage, non avec celles du
comportement. (1994, p. 1370)309
Nosso objetivo, portanto, não é discutir, a partir dos exemplos vistos nos manuscritos,
se a Recherche é ou não um romance pessoal, pois assim como os críticos citados, não a
vemos como tal, mas refletir a respeito dessa construção do “je” proustiano, que como bem
salientou Tadié, foi algo conquistado pelo escritor. Para tanto, devemos fazer uma breve
deambulação histórica pela carreira literária de Proust, a fim de observar em qual momento
ele começa a empregar a primeira pessoa e em que medida ela estava mais ou menos ligada à
sua vida.
Em Les plaisirs et les jours, as principais novelas como “La mort de Baldassare
Silvande, vicomte de Sylvanie”, “Violante ou la mondanité”, “Mélancolique villégiature de
Mme. de Breyves” e “La fin de la jalousie” foram escritas em terceira pessoa. Se atentarmos
para algumas passagens, notaremos que Proust recorre ao procedimento clássico da narrativa
realista, incorporando um narrador que não se mistura aos personagens. Selecionamos os
seguintes incipit, respeitando a ordem das novelas mencionadas acima:
(ainda não publicado) antes que fossem escritos aqueles que acabam de ser publicados. O ‘eu’ é uma mera
fórmula, o fenômeno da memória que desencadeia a obra é um meio tencionado, como, se você quiser, o tordo
ouvido em Montboissier que leva Chateaubriand a Combourg”.
309
“Os dois discursos, o do narrador e o de Marcel Proust são homólogos, mas não análogos. O narrador vai
escrever e esse futuro mantém-se dentro de uma ordem da existência, não da palavra, ele está ligado a uma
psicologia, não a uma técnica. Marcel Proust, ao contrário, escreve, ele luta com as categorias da linguagem, não
com as do comportamento”. Os grifos são do autor.
164
L´espoir de recevoir un cheval et le souvenir qu´il avait treize ans firent
briller, à travers les larmes, les yeux d´Alexis. Mais il n´était pas consolé
puisqu´il fallait aller voir son oncle Baldassare Silvande, vicomte de
Sylvanie. (Pl. et J., p. 17)310
Em “Violante ou la mondanité”, temos: “La vicomtesse de Styrie était généreuse et
tendre et toute pénétrée d´une grâce qui charmait. L´esprit du vicomte son mari était
extrêmement vif, et les traits de sa figure d´une régularité admirable” (p.47) 311. E em
“Mélancolique villégiature”, encontramos a seguinte abertura: “Françoise de Breyves hésita
longtemps, ce soir-là, pour savoir si elle irait à la soirée de la princesse Élisabeth d´A..., à l
´Opéra, ou à la comédie des Livray”312 (p. 107). Ou ainda, em “La fin de la jalousie”, lemos:
“Elle voulut fermer la porte de sa chambre sur Honoré, mais il lui dit encore : ‘Cou!’ et elle
tendit aussitôt son cou avec une docilité, un empressement exagérés qui le firent éclater de
rire” (p.233)313.
Como podemos observar, as novelas iniciam-se, em maior ou menor grau, com uma
narrativa similar ao romance realista, não possuindo nenhuma delas o teor misterioso e
obscuro da célebre frase da Recherche “Longtemps, je me suis couché de bonne heure”.
Excetuando-se alguns escritos que se assemelham a contos e a poemas em prosa, em
que a primeira pessoa aparece, aproximando-se, no entanto, de um eu-lírico impessoal, a
novela “La confession d´une jeune fille” é a única narrada por um “je” feminino: “Enfin la
délivrance approche. Certainement j´ai été maladroite, j´ai mal tiré, j´ai failli me manquer” (p.
137)314. No entanto, conforme Tadié.
310
“A esperança de ganhar um cavalo e a lembrança de que ela tinha treze anos fizeram brilhar, através das
lágrimas, os olhos de Alexis. Mas ele não estava consolado, pois era necessário ir ver seu tio Baldassare
Silvande, visconde de Sylvanie”.
311
“A viscondessa de Styrie era generosa e terna e inteiramente penetrada por uma graça que encantava. O
espírito do visconde seu marido era extremamente vivo, e os traços de seu rosto eram de uma regularidade
admirável”.
312
“Francçoise de Breyves hesitou durante muito tempo, naquela noite, para saber se iria à soirée da princesa
Elisabeth de A..., à Ópera, ou à comédia dos Livray”.
313
“Ela quis fechar a porta de seu quarto sobre Honoré, mas ele lhe disse ainda: ‘Pescoço!’ e ela estendeu
imediatamente seu pescoço com uma docilidade, uma solicitude exageradas que o fizeram morrer de rir”. O
texto inicia-se por um diálogo entre Mme. Seaune e Honoré.
314
“Enfim, a libertação se aproxima. Certamente eu fui desajeitada, eu atirei mal, eu quase me perdi”.
165
La Confession d´une jeune fille, qui traduit certaines obsessions profondes de
l´auteur et annonce quelques thèmes importants de la Recherche, montre, à
travers la transposition des sexes, le je d´un personnage beaucoup plus
proche du il de Jean Santeuil que du je de l´oeuvre future. (1971, p. 19)315
Esses temas que Tadié mencionou são, notadamente, a relação visceral entre a heroína
e sua mãe, seu caráter sensível e doentio, próximos ao do herói da Recherche e o conhecido
“beijo de boa noite” que a mãe lhe dispensava nos dois dias em que passava com a filha:
Ses venues si courtes étaient la chose la plus douce et la plus cruelle.
Pendant ces deux jours elle me prodiguait des tendresses dont
habituellement, pour m´endurcir et calmer ma sensibilité maladive, elle était
très avare. Les deux soirs qu´elle passait aux Oublis, elle venait me dire
bonsoir dans mon lit, ancienne habitude qu´elle avait perdue, parce qu j´y
trouvais trop de plaisir et trop de peine. (Pl. et J., p. 138)316
Outros assuntos presentes na novela, e que serão recuperados na Recherche, são: a
falta de vontade da protagonista que inquietava sua mãe: “Ce qui désolait ma mère, c´était
mon manque de volonté” [“o que desolava minha mãe era minha falta de vontade”] (p. 143),
bem como a mundanidade e o esnobismo que cessam os prazeres da solidão e diminuem
assim o alcance real da arte: “Jamais, tout occupée au désir d´être admirée dans une loge
élégante, je n´ai senti moins profondément la musique. J´écoutais et je n´entendais rien” (p.
145)317. Para Tadié, essas questões obsedantes para Proust são de cunho mais biográfico do
que propriamente ficcionais, daí a aproximação que o crítico faz com Jean Santeuil.
Esse romance inacabado, iniciado quando Proust ainda elaborava Les plaisirs et les
jours, foi igualmente escrito em terceira pessoa, seguindo a prática dos escritos que o
antecederam. Sendo esse o primeiro projeto propriamente romanesco do escritor, Proust, “par
cette médiation, veut créer un héros distinct de lui et qui pourtant l´exprime; l´exprime trop,
315
“A confissão de uma jovem, que traduz certas obsessões profundas do autor e anuncia alguns temas
importantes da Recherche, mostra, através da transposição dos sexos, o eu de um personagem muito mais
próximo do ele de Jean Santeuil do que do eu da obra futura”. Os grifos são do autor.
316
“Suas vindas tão curtas eram a coisa mais doce e mais cruel. Durante esses dois dias, ela me prodigalizava
ternuras das quais, habitualmente, para me endurecer e acalmar minha sensibilidade doentia, ela era muito avara.
Nos dois dias que passava nos Oublis, ela vinha me dizer boa noite em minha cama, antigo hábito que perdera,
pois eu encontrava nele demasiado prazer e excessiva pena”.
317
“Nunca senti menos profundamente a música, inteiramente ocupada que estava pelo desejo de ser admirada
num camarote elegante. Eu escutava e não ouvia nada”.
166
car
‘Jean
Santeuil
apparaît
bien
plus
naïvement
autobiographique
qu´à
la
Recherche’” (TADIÉ, 1971, p. 19)318.
Muitos são os críticos que vislumbraram em Jean Santeuil inúmeras passagens que
foram colhidas a partir de episódios da vida de Proust, elemento salientado por ele no
pequeno prefácio a esse livro, visto no terceiro capítulo. Nas palavras de Jean Milly:
En ce qui concerne le je du narrateur, on a constaté que le contenu de Jean
Santeuil, malgré l´emploi de la troisième personne, était plus proche de l
´expérience vécue par Proust que la Recherche sur plusieurs points : Proust y
évoque des vacances enfantines dans un lieu appelé tantôt Eteuilles (nom
fictif), tantôt Illiers (nom réel); des séjours en Bretagne, près du Lac de
Genève, en Hollande, qui disparaîtront dans la Recherche; des souvenirs de
sa vie au lycée et de ses rapports avec ses professeurs; une de plus grande
participation aux événements de l´Affaire Dreyfus. (1987, p. 7)319
O uso da terceira pessoa não evitou o viés biográfico da obra, e talvez esse seja, como
já dito anteriormente, um dos motivos do inacabamento do romance, pela inarticulação na
sucessão de acontecimentos e episódios, desligados uns dos outros, sem uma consciência
central que participasse, compreendesse e julgasse esses momentos. Na verdade, pensamos
que o problema não está propriamente no uso das experiências vividas pelo escritor, uma vez
que, mesmo para a Recherche, Proust confessa utilizar episódios de sua vida para compor seu
protagonista320, mas na falta de uma instância narrativa profunda, que Proust finalmente
conquistará na Recherche.
Mas, antes da Recherche, há ainda outro projeto literário no qual Proust construiu um
“je” narrativo distante, entretanto, de traços biográficos: o Contre Sainte-Beuve. Segundo
318
“por essa mediação, quer criar um herói distinto dele e que, no entanto, o exprime; o exprime
demasiadamente, pois ‘Jean Santeuil aparece bem mais ingenuamente autobiográfico do que a Recherche”.
Tadié cita o texto de André Maurois no prefácio à edição de Jean Santeuil, edição utilizada na presente tese.
319
“No que concerne ao eu do narrador, constatou-se que o conteúdo de Jean Santeuil, apesar do emprego da
terceira pessoa, era mais próximo da experiência vivida por Proust do que a Recherche sob vários aspectos:
Proust evoca as férias infantis num lugar chamado tanto Eteuilles (nome fictício), quanto Illiers (nome real); os
dias na Bretanha, próximo ao Lago de Genebra, na Holanda, que desaparecerão na Recherche; lembranças de sua
vida no colégio e as relações com seus professores; uma maior participação nos eventos do Caso Dreyfus”.
320
“Il est vrai que par excès de fatigue, pour des détails purement matériels, je me dispense d´inventer pour mon
héros et prends des traits vrais de moi (...)” [É verdade que, por excesso de cansaço, para detalhes puramente
materiais, eu me dispenso de inventar para meu herói e tomo traços verdadeiros de mim mesmo (...)”.] (Corresp.,
t. XIX, p. 580). Carta endereçada a Jacques Boulenger, em novembro de 1920.
167
Tadié: “Ce qui caractérise le passage de Jean Santeuil au Contre Sainte-Beuve, et du Contre
Sainte-Beuve à la Recherche, c´est l´élimination des traits autobiographiques importants et l
´accumulation de traits inventés” (1971, p. 23-4)321.
Para elaborar um ensaio a respeito do método de Sainte-Beuve, Proust constrói todo
um aparato ficcional a fim de engajar um “eu”, uma instância profundamente narrativa, para
provar, por meio de experiências involuntárias, que o verdadeiro “eu” estaria no passado,
nessa matéria tão necessária à literatura e que só o acaso e as sensações poderiam recuperar,
uma vez que a inteligência só nos dá o passado como sucessão, e não como essência.
Chaque jour j´attache moins de prix à l´intelligence. Chaque jour je me rends
mieux compte que ce n´est qu´en dehors d´elle que l´écrivain peut ressaisir
quelque chose de nos impressions passées, c´est-à-dire atteindre quelque
chose de lui-même et la seule matière de l´art. Ce que l´intelligence nous
rend sous le nom de passé n´est pas lui. (CSB, p. 211)322
Proust condensa, neste curto projeto de prefácio, basicamente todas as experiências
privilegiadas da Recherche tais como a madeleine, aparecendo aqui como uma torrada, que
recuperará a casa de campo onde esse narrador passava férias, os pisos desiguais de um pátio
qualquer remetendo ao batistério de São Marcos, em Veneza, e o barulho da pequena colher
que evoca, assim como na Recherche, o som produzido pelo martelo contra as rodas do trem.
Esses momentos estão claramente atrelados à ilustração, ou melhor, funcionam como
exemplos da ineficácia da inteligência que, por sua vez, retorna à questão para esclarecer
quais serão os reais problemas do método empregado por Sainte-Beuve. Para o narrador:
La méthode de Sainte-Beuve n´est peut-être pas au premier abord [un] objet
si important. Mais peut-être sera-t-on amené, au cours de ces pages, à voir
qu´elle touche à de très important problème intellectuels, peut-être au plus
grand de tous pour un artiste, à cette infériorité de l´intelligence dont je
parlais en commençant. Et cette infériorité de l´intelligence, c´est tout de
même à l´intelligence qu´il faut demander de l´établir. (...) Bien que chaque
jour j´attache moins de prix à la critique et même, s´il faut le dire, à l
´intelligence, car de plus en plus je la crois impuissante à cette recréation de
321
“O que caracteriza a passagem de Jean Santeuil ao Contra Sainte-Beuve, e do Contra Sainte-Beuve à
Recherche é a eliminação de traços autobiográficos importantes e a acumulação de traços inventados”.
322
“Cada dia eu atribuo menos valor à inteligência. Cada dia eu me dou mais conta de que é somente fora dela
que o escritor pode retomar algo de nossas impressões passadas, ou seja, alcançar algo dele mesmo e a única
matéria da arte. O que a inteligência nos fornece sob o nome de passado não é ele”.
168
la réalité qui est tout l´art, c´est à l´intelligence que je me fie aujourd´hui
pour écrire un essai tout critique. (CSB, p. 216)323
Essa oscilação entre ficção e crítica, problema que nunca será resolvido, mas
incorporado por Proust em sua obra, revela a alternância entre o “je” do escritor, aquele que
critica e comenta, e o “je” de um narrador que inventa, fabula e constrói uma ficção. Proust
elabora um diálogo fictício entre o narrador e sua “maman” para, finalmente, discutir sobre o
método do crítico francês, promovendo, com isso, a entrada definitiva desse “je” na
fabulação:
...Maman me quitte, mais je repense à mon article et tout d´un coup j´ai l
´idée d´un prochain Contre Sainte-Beuve. Dernièrement, je l´ai relu, j´ai pris
contre mon habitude des quantités de petites notes que j´ai là dans un tiroir,
et j´ai des choses importantes à dire là-dessus. Je commence à bâtir l´article
dans ma tête. (...) Je voudrais bien demander à maman ce qu´elle en pense. J
´appelle, aucun bruit ne répond. (CSB, p. 217)324
É a partir do Contre Sainte-Beuve que Proust estabelece uma instância narrativa que,
embora diga “eu”, não se refere diretamente ao escritor e às suas experiências. Para Tadié:
“Le ton est trouvé, et c´est lui qui s´épanouit dans le projet sur Sainte-Beuve: Proust préfère à
la formule de l´essai celle de la conversation avec sa mère” (1971, p. 21) 325, e embora Proust
insira um diálogo com essa mãe, “le caractère autobiographique de cette conversation est tout
à fait illusoire, puisque Mme. Proust est morte depuis trois ans: c´est dans un récit imaginaire
que le narrateur fait sa véritable apparition” (TADIÉ, 1971, p. 21)326.
323
“O método de Sainte-Beuve talvez não seja, à primeira vista, [um] objeto tão importante. Mas talvez, sejamos
levados, ao longo dessas páginas, a ver que ele toca em problemas intelectuais muito importantes, talvez no
maior de todos para um artista, nessa inferioridade da inteligência da qual eu falava no começo. E essa
inferioridade da inteligência é, apesar de tudo, à inteligência que devemos pedir para estabelecer. (...) Mesmo
que a cada dia eu atribua menos valor à crítica e mesmo, se for necessário dizer, à inteligência, pois cada vez
mais eu a acredito impotente nessa recriação da realidade que é toda arte, é na inteligência que me fio hoje para
escrever um ensaio inteiramente crítico”.
324
“... Mamãe me deixa, mas volto a pensar em meu artigo e de repente, tenho a idéia de um próximo Contra
Sainte-Beuve. Ultimamente, eu o reli, contra meu hábito, tomei quantidades de pequenas notas que tenho lá,
numa gaveta, e tenho coisas importantes a dizer a respeito. Eu começo a construir o artigo em minha cabeça. (...)
Gostaria muito de perguntar a mamãe o que ela pensa. Eu chamo, nenhum barulho responde”.
325
“O tom é encontrado e é ele que desabrocha no projeto sobre Sainte-Beuve: Proust prefere à fórmula do
ensaio aquela da conversação com sua mãe”.
326
“o caráter autobiográfico dessa conversação é completamente ilusório, pois Madame Proust morrera havia três
anos: é numa narrativa imaginária que o narrador faz sua verdadeira aparição”.
169
Percebemos, portanto, que o “je” proustiano está diretamente unido à narrativa fictícia,
à invenção, mas embora a Recherche seja o lugar privilegiado dessa criação e construção, a
primeira pessoa não se deu de forma completamente espontânea. Há alguns trechos nos
manuscritos, notadamente nos dedicados aos primeiros volumes, em que a passagem do “il”
ao “je” é flagrante, como podemos observar no caderno 26:
Swann
Et j’ai bien reconstitué d’après les récits de mon
cousin, le charme de la qu’avait la vie m pour
Swann sa vie mondaine pendant les longues
amour
périodes où il y incorporait un sentiment. C’est
un plaisir de voir le jour tomber la nuit venir mais de
se dire que la vie qui semble finir se* ressusciter* plus
au salon
resplendissante aux lumières, et que’ dans le
dans le salon
où
dîner vers lequel on se croira* fêter, désiré,
fêté, applaudi par tous, une pers femme sera là,
p
même
à qui on dira bonjour plus distraitement qu’aux autres,
mais faite en une matière qui est la délice de
et
notre cœur, celle pour, pareille aux autres en
apparence, mais d’une matière qui est tout le désir
de notre cœur (...). (C.26, fº 26rº)327
No trecho acima, temos o desenvolvimento da vida mundana e amorosa de Swann,
que, já neste fólio, transforma-se em “on” (“on se croira désiré, fêté, applaudi”/ “à qui on dira
bonjour”) para posteriormente permutar-se em “nous” (“qui est tout le désir de notre coeur”).
Essa tendência em pluralizar o sujeito não é rara em Proust e aparece de modo geral, quando o
escritor constrói leis universais dos afetos humanos, neste caso, o sentimento amoroso.
327
“Swann// E eu reconstitui de acordo com as histórias de meu primo, o charme da que tinha a vida m para
Swann sua vida mundana durante os longos períodos em que ele incorporava um sentimento <amor>. É um
prazer ver o dia cair, a noite chegar e de se dizer que a vida parece acabar ressuscitar* mais resplandecente às
luzes, e que dentro <no salão> jantar em direção ao qual <onde> se acreditará* festejar, desejado, festejado,
aplaudido por todos, uma pesso mulher estará ali, a quem diremos bom dia mais distraidamente que às outras,
mas feita de uma matéria que é a delícia de nosso coração, parecida com as outras em aparentemente, mas de
uma matéria que é todo o desejo de nosso coração”. A transcrição do caderno 26 foi realizada por H. Yuzawa.
170
Em outro fólio, ainda se referindo a um terceiro, há um “il” que alude a Swann, mas
que, no entanto, não porta mais seu prenome. A partir de então, Proust desenvolve uma
passagem sobre as jovens que nos remete, sem dúvida alguma, às raparigas em flor de Balbec.
La société des jeunes filles a cela de
charmant
Il est ch délicieux de vivre au milieu
Sans doute elles n’avaient pas gardé le charme
mystérieux qui les lui avait fait imaginer si
particulières. Entre lui et chacune d’elles des rapports
humains (...). (C.26, fº 28rº)328
Essas moças que encantavam esse “il”, surpreendendo-o com suas características
cambiantes, possuem o mesmo mistério das jovens de Balbec quando o protagonista ainda as
conhecia bem pouco. Proust continua o texto reforçando esse dado, colocando-as sempre em
relação com esse “il” que faz descobertas.
La fille du grand seigneur breton n’
était plus différente des autres jeunes filles, la golfeuse é
tait intellectuelle et sensible, il y avait une douce
soumission dans celle qui lui avait paru rebelle et
inassimilable, celle qui semblait bête et fourbe
avait des mots charma exquis et [ill.]répondait avec
à ses procédés
délicatesse et droiture. [ill.] Pour elles comme
pour toutes choses, la vie Il était arrivé d’elles
comme de ces mythologies qui de loin paraissent
si mystérieuses et qui sont au fond anthropomor
phiques et où on retrouve les hommes et les femmes
que nous connaissons. Mais malgré cela il y a dans la
société j’étais heureux d’avoir de pouvoir les avoir,
les retenir, les grouper autour de moi. (C.26, fº 28rº)329
Sem nenhuma indicação prévia, Proust muda de registro, passando da terceira para a
primeira pessoa, tendo por intermédio apenas a frase anterior em que os pronomes “on” e
“nous” surgem (“où on retrouve les hommes et les femmes que nous connaissons”) naquele
328
“A sociedade das jovens tem isso de encantador É delicioso viver no meio Talvez elas não tivessem guardado
o charme misterioso que lhe havia feito imaginá-las tão particulares. Entre ele e cada uma delas, relações
humanas (...)”.
329
“A filha do grande senhor bretão não era mais diferente do que as outras moças, a golfista era intelectual e
sensível, havia uma doce submissão naquela que lhe parecera rebelde e inassimilável, aquela que parecia tola e
falsa tinha palavras charm delicadas e [ill.] respondia < a seus comportamentos> com delicadeza e retidão. [ill.]
Para ela como para todas as coisas, a vida Sucedeu-lhes como dessas mitologias que, de longe, parecem tão
misteriosas e que são, no fundo, antropomórficas e onde encontramos os homens e as mulheres que nós
conhecemos. Mas apesar disso havia na sociedade eu estava feliz de ter de poder tê-las, conservá-las, agrupá-las
ao redor de mim”.
171
mesmo contexto de universalidade mencionado acima. Não se trata apenas de uma ligação, de
um parentesco entre o narrador-herói e Swann, como assinalado por Jean Rousset – “Le
personnage de Swann a des rapports intimes avec le héros, il est à la fois son père spirituel et
son frère aîné. (...) Il est davantage encore son frère, son double (...)” (1962, p. 146)330 –, mas
de um problema de perspectiva, de instância narrativa, de uma alternância entre contar por
meio de um “ele” ou de um “eu”.
Percebemos com isso que o “je” não foi um recurso narrativo que surgiu naturalmente
na escrita proustiana, mas algo que despontou ao longo dos vários anos da carreira literária do
escritor e se consolidou, curiosamente, no distanciamento entre literatura e biografia. De
acordo com Tadié.
Cette évolution qui mène au narrateur tel qu´il figure dans A la recherche du
temps perdu montre bien que, pour Proust, écrire à la première personne n
´était pas simple; cette difficulté, il ne l´aurait pas rencontrée s´il avait voulu
écrire son autobiographie; mais le je dont il découvre l´emploi n´est plus
celui de la confidence, c´est un je qui est aussi un il; passé par le purgatoire
de la troisième personne, il rompt avec le moi de Proust pour devenir
personnage. (1971, p. 21-2)331
Com o início da Recherche, Proust começa a se desvencilhar de episódios e
características pessoais que armavam a narrativa em Jean Santeuil, tais como as viagens, as
aulas de filosofia, a relação com os pais, que foram inteiramente modificados ou
simplesmente eliminados da Recherche.
No tocante ao prenome do escritor, outro possível indício de um relato autobiográfico
que aparece no romance La prisonnière, Jean Milly salienta que “l´étude des brouillons et
330
“O personagem de Swann tem relações íntimas com o herói, ele é, ao mesmo tempo, seu pai espiritual e seu
irmão mais velho. (...) Ele é mais ainda seu irmão, seu duplo (...)”.
331
“Essa evolução que desemboca no narrador tal ele figura no Em busca do tempo perdido mostra bem que,
para Proust, escrever em primeira pessoa não era simples; essa dificuldade, ele não teria encontrado se quisesse
escrever sua autobiografia; mas o eu cujo emprego ele descobre não é o da confidência, é um eu que é também
um ele; passado pelo purgatório da terceira pessoa, ele rompe com o eu de Proust para se tornar personagem”.
172
épreuves nous montre qu´il était plus fréquemment employé dans ces ébauches, et que
progressivement Proust l´a supprimé presque partout” (1987, p.7)332.
A partir do conjunto de reflexões desenvolvidas até o momento, pensamos que esse
“je” que surge nas notas, embaralhando as instâncias autorais e narrativas, consiste na
expressão máxima do narrador proustiano, construindo-se, implicando-se na história a todo o
momento, e tornando-se, ao final do volume, escritor. Embora seja o operador, o autor dos
rascunhos, Proust reserva os cadernos exclusivamente para a construção literária, afastando
peremptoriamente sua vida de sua obra, como pertinentemente ressalva Tadié.
Les carnets et cahiers d´esquisses ne doivent pas porter à confusion: l´on y
chercherait vainement la moindre notation datée, le moindre commentaire
sur une rencontre ou une journée achevée ; rien n´y reflète la vie. L´auteur
qui note au jour le jour “est perdu”. (1971, p. 17)333
Nada mais apropriado e justo para falar dos cadernos, bem como das cadernetas, do
que tais considerações de Tadié, pois como vimos Proust muitas vezes se apaga como
“operário” da escrita ao despersonalizar as ações concernentes a ele, colocando-as no
infinitivo: “mettre cela en son temps”, “le dire mieux”, “Pour ajouter” etc; e quando
encontramos vestígios desse “je” autoral, ele geralmente vem imbricado ao “je” narrativo.
Para relembrar alguns desses casos, bastam-nos estes exemplos “Je pense que j´ai dû
marquer ailleurs (sans cela marquer ici) que cela ajoute au caractère familial de mes relations
avec Albertine” (C.55, fº 18vº)334; “Qd je dis que je l´ai domestiquée dire” (C.55, fº 26rº)335;
“N.B. Dire quand elle est partie que je me décide brusquement à tout ce devant quoi j´avais
332
“o estudo dos rascunhos e das provas nos mostra que ele era freqüentemente empregado nesses esboços e
que, progressivamente, Proust o suprimiu quase por toda parte”.
333
“As cadernetas e os cadernos de esboços não devem trazer confusão: procurar-se-ia em vão a menor notação
datada, o menor comentário sobre um encontro ou uma jornada acabada; nada ali reflete a vida. O autor que
anota dia-a-dia ‘está perdido’”.
334
“Penso que devo ter marcado em outro lugar (sem isso marcar aqui) que isso acrescenta ao caráter doméstico
das minhas relações com Albertine”.
335
“Quando eu digo que a domestiquei dizer”.
173
hésité jusque là, l´épouser et la commande immédiate d´un yacht et d´une Rolls” (C.55, fº
51vº)336 etc.
Mesmo não se tratando de um escrito pessoal e autobiográfico, é incontestável que
Proust tensiona entre a vida e a literatura, nada mais surpreendente para um autor, que já em
Contre Sainte-Beuve, afirma, em trecho já visto anteriormente, que a verdadeira matéria
artística consiste nas nossas impressões passadas: “ (...) que l´écrivain peut ressaisir quelque
chose de nos impressions passées, c´est-à-dire atteindre quelque chose de lui-même et la seule
matière de l´art” (CSB, p. 211). De qualquer forma, não podemos esquecer que todo seu
projeto embasa-se na crítica à leitura feita por Sainte-Beuve, que só consegue perceber a obra
a partir do escritor; e que já em Jean Santeuil, Proust anuncia a diferença existente entre autor
e obra: “(...) et que nous comprendrions quels sont les rapports secrets, les métamorphoses
nécessaires qui existent entre la vie d´un écrivain et son oeuvre, entre la réalité et l´art” (JS,
t.I, p. 54)337.
Se Proust promove essa imbricação entre vida e literatura ao dar ao herói da
Recherche seu prenome, ele não o faz sem ressalvas.
Elle retrouvait la parole, elle disait: “Mon” ou “Mon chéri”, suivis l´un ou l
´autre de mon nom de baptême, ce qui, en donnant au narrateur le même
prénom qu´à l´auteur de ce livre, eût fait: “Mon Marcel”, “Mon chéri
Marcel”. (LP, p. 583)338
O uso do condicional modaliza, restringindo assim a certeza de que o nome do
narrador seria realmente o mesmo do autor do livro. Além disso, segundo o volume da
Pléiade, nas notas preparadas por Pierre-Edmond Robert, o prenome do escritor teria sido
massivamente usado nos cadernos 2 e 5, dedicados ao projeto Sainte-Beuve, no qual o herói
336
“N.B. Dizer quando ela partir que eu me decido bruscamente por tudo isso, diante do qual eu havia hesitado
até ali, casar com ela e o pedido imediato de um iate e de um Rolls”.
337
“(...) e que nós compreenderíamos quais são as relações secretas, as metamorfoses necessárias que existem
entre a vida de um escritor e sua obra, entre a realidade e a arte”.
338
“Logo que recuperava a palavra, dizia: “Meu” ou “Meu querido”, seguidos um ou outro do meu nome de
batismo, o que, atribuindo ao narrador o mesmo nome que ao autor deste livro, daria: “Meu Marcel”, “Meu
querido Marcel”. (Trad., p. 67)
174
chamava-se Marcel, e que, como Proust, tinha um irmão chamado Robert. Tudo isso foi
apagado da Recherche e a retomada do prenome não seria, portanto, um vestígio desses
estados primitivos do romance, pois sua adição foi tardia, dando-se nos cadernos de mise au
net, assim como na datilografia, em que Proust acresce a frase “en donnant au narrateur le
même prénom qu´à l´auteur de ce livre”.
Para Edmond Robert, “On voit bien que cette démarche, chez Proust, est tout le
contraire d´une supression de l´autobiographie, mais plutôt le désir de souligner à la fois la
proximité et l´éloignement de l´auteur du roman par rapport à son narrateur” (LP, p. 1718) 339.
Essa aproximação é, como vemos, muito bem construída, arquitetada e deliberada,
aparecendo igualmente em outros momentos da Recherche. Para nos atermos a alguns
exemplos, há a referência aos trabalhos feitos a partir da obra de Ruskin: “(...) je montais me
préparer dans ma chambre pour sortir avec ma mère, et, pour prendre des cahiers ou je
prendrais des notes relatives à un travail que je faisais sur Ruskin” (AD, p. 224)340; où “(il
faisait allusion à une traduction de Sésame et les lys de Ruskin que j´avais envoyé à M. de
Charlus)” (TR, p. 411)341.
Há ainda uma alusão aos escritos colegiais do narrador, remetendo ao livro Les
plaisirs et les jours de Proust: “J´avais eu de la facilité, jeune, et Bergotte avait trouvé mes
pages de collégien ‘parfaites’” (TR, p.618)342. No entanto, se há semelhanças voluntárias entre
Proust e seu herói-narrador, há igualmente diferenças que os separam fortemente. Quando o
narrador diz a Albertine: “Je ne suis pas romancier” [“Eu não sou romancista”] (LP, p. 881;
Trad., p. 353), Proust pontua o distanciamento existente entre ele, escritor, e um aspirante a
339
“Vemos que essa iniciativa, em Proust, é completamente contrária à supressão da autobiografia, sendo, de
preferência, o desejo de sublinhar ao mesmo tempo a proximidade e o distanciamento do autor do romance com
relação a seu narrador”.
340
“(...) eu subia ao quarto para me preparar e sair em companhia de mamãe.” (Trad., p.211). A tradução não
contém a frase sobre Ruskin, o que não configura propriamente uma omissão, mas, talvez, uma limitação devida
à edição utilizada para a tradução. Traduzimos a seguir o trecho ausente: “e para pegar cadernos onde eu tomaria
notas relativas a um trabalho que eu fazia sobre Ruskin”.
341
“(aludia à tradução de Sesame and lilies, de Ruskin, que eu mandara ao sr. de Charlus)”. (Trad., p. 118)
342
“Jovem, denotara alguns dons, e Bergotte achara ‘perfeitas’ as minhas composições de colegial”. (Trad., 286)
175
artista, cuja história é de uma vocação e para quem a literatura não havia desempenhado o
menor papel: “Ainsi toute ma vie jusqu´à ce jour aurait pu et n´aurait pas pu être résumée sous
ce titre: Une vocation. Elle ne l´aurait pas pu en ce sens que la littérature n´avait joué aucun
rôle dans ma vie” (TR, p. 478)343 : nada mais diverso do que a experiência proustiana,
essencialmente literária.
Mesmo nas correspondências, nas quais Proust utiliza sistematicamente o “je” como se
estivesse realmente implicado na narrativa e esta o representasse – “En tout cas n´enlevez pas
tout à fait au début le Professeur que je rencontre en cherchant un fiacre et chez qui je mène
ma grand-mère”(Corresp., t. XIX, p. 658)344 – ele reforça a todo momento a distância entre ele
e seu herói, sobretudo quando houve confusão por parte do interlocutor.
Em uma carta endereçada a Jacques Boulenger, Proust delimita muito claramente seu
herói, tratando-o em terceira pessoa:
Dans Guermantes II, quand Mme. de Guermantes n´est plus aimée par mon
héros (qui a aussi bien aimé Albertine petite bourgeoise et l´aimera mille fois
plus), elle ne cesse d´inviter le dit héros, qu´elle dédaignait seulement parce
qu´elle s´en sentait aimée. (Corresp., t.XIX, p. 580)345
E em uma carta a Paul Souday, Proust protesta : “Comment, sachant probablement que
j´ai toute ma vie connu des duchesses de Guermantes, n´avez-vous pas compris l´effort qu´il
m´avait fallu faire pour me mettre à la place de quelqu´un qui n´en connaîtrait pas et
souhaiterait d´en connaître ?” (Corresp., t.XIX, p. 574)346.
343
“Assim minha existência até este dia poderia e não poderia resumir-se neste título: uma vocação. Não poderia
porque a literatura não desempenhara nela o menor papel”. (Trad., p. 175).
344
“Em todo caso, não tire, no começo, o Professor que eu encontro procurando um fiacre e à casa de quem levo
minha avó”. Há muitos outros exemplos em que Proust utiliza o “je” referente à sua pessoa, implicando-se na
obra.
345
“Em Guermantes II, quando Senhora de Guermantes não é mais amada pelo meu herói (que também amou
Albertine, pequena burguesa, e a amará mil vezes mais), ela não cessa de convidar o dito herói, que ela
desprezava somente porque se sentia amada”.
346
“Como, sabendo provavelmente que durante toda a minha vida eu conheci duquesas de Guermantes, você não
compreendeu o esforço que me foi necessário para colocar-me no lugar de alguém que não as conheceria e
desejaria conhecê-las?”.
176
Como viemos constatando, esse “je” faz parte de toda a construção que é a Recherche,
sendo, portanto, um artifício do discurso literário, não um dado biográfico. Mais uma vez com
Tadié:
Le je permet alors de concilier dans l´oeuvre l´avenir et le passé, de vivre les
événements comme futurs et présents, mais de les raconter comme passés.
Le je du narrateur et le moi du héros ne coïncident qu´à un seul instant: au
“dernier chapitre”, la matinée Guermantes du Temps retrouvé, lorsque le
héros découvre son esthétique; mais parce que ce “chapitre” a été écrit en
premier, en même temps que les premières pages de Combray. (1971, p.
32)347
Sendo o narrador um artifício literário, finalmente delineado pelo escritor e que
durante muito tempo oscilou entre primeira e terceira pessoas, Proust poderia aproximá-lo de
si quando julgasse oportuno. Todavia, devemos ter claro que todas essas aproximações
também fazem parte desse processo engenhoso que é a composição da obra proustiana e das
polêmicas possivelmente voluntárias suscitadas por essa ligação348.
Por fim, com relação às notas vistas neste tópico, por que não pensarmos que, em vez
de se tratar do “je” biográfico, do empréstimo da vida pela literatura, trata-se, na verdade, da
obra invadindo a vida, apagando assim os traços do escritor que, neste momento percebe que
“a verdadeira vida é a literatura”?
347
“O eu permite, então, conciliar na obra o futuro e o passado, viver os acontecimentos como futuros e
presentes, mas contá-los como passados. O eu do narrador e o eu do herói coincidem em apenas um instante: no
‘último capítulo’, a matinée Guermantes do Tempo redescoberto, quando o herói descobre sua estética, mas
também porque esse ‘capítulo’ foi escrito primeiro, ao mesmo tempo em que as páginas de Combray”.
348
É curioso o fato de que Proust, em inúmeras correspondências, a maioria delas datada de 1920, perpetua o
diálogo a respeito dessas semelhanças entre narrador e autor, tão comentadas pelos críticos da época. Além
disso, é sintomático o acréscimo do nome “Marcel” nos esboços da Prisioneira, posteriores à datação das
correspondências, o que sugere, no mínimo, que Proust gostaria de alimentar essa polêmica.
177
Considerações finais
Traiter vingt fois, avec des lumières diverses, le
même thème, ayant la sensation de faire
quelque chose de profond, subtil, de puissant, d´écrasant,
d´original, de saisissant,comme les cinquantes cathédrale
ou les quarante nénuphars de Monet.
Em uma carta de 1908 a Louis d´Albufera (Corresp., t.VIII), Proust alega ter: um
estudo sobre a nobreza, um romance parisiense, um ensaio sobre Sainte-Beuve e Flaubert, um
ensaio sobre as mulheres, um ensaio sobre a pederastia, um estudo sobre os vitrais, um estudo
sobre as pedras tombais e um estudo sobre o romance.
A partir daí, compreendemos melhor porque a Recherche é sobremaneira híbrida e
compósita, e o porquê do autor reconhecer que “c´est encore du roman que cela s´écarte le
moins” (citado por GENETTE, 1987, p. 29)349. Toda essa miríade de estudos e ensaios será de
uma forma ou de outra, incorporada ao romance proustiano, cujo projeto, por englobar
gêneros tão distintos e por sua monumentalidade, só poderia ser comparado a uma catedral.
Constatamos, ao longo da tese, que Proust não abandona seus estudos e escritos, mas
os “recicla”, transpondo-os para seu romance, como vimos no caso da novela “La fin de la
jalousie” de Les plaisirs et les jours, da qual Proust extrai grande parte da matéria literária
para a construção da história de Albertine. Percebemos ainda que o projeto Sainte-Beuve foi
reaproveitado na história de Albertine, notadamente na construção do La prisonnière, e
transfigurado de uma “conversation avec maman” para uma conversa literária com a heroína.
349
“é ainda do romance que isto se distancia menos”. Carta a René Blum de 1913.
178
O espaço recluso do quarto de Contra Sainte-Beuve poderia explicar tanto o
enclausuramento do herói da Recherche nesse romance, como a passagem da narrativa em
grupo e dos espaços abertos – a experiência de Balbec e a freqüentação dos salões – para o
huis-clos e o face a face com a amada.
A estrutura de matinées criada no caderno 3 de Sainte-Beuve e modificada ao longo de
muitos outros documentos foi inteiramente usada na construção do romance A prisioneira,
formando, juntamente com o Côté de Swann uma arquitetura, ou se quisermos, uma unidade
que viria a ser mais um traço marcante da Recherche.
Embora a história da heroína proustiana não existisse na primeira fase do projeto
romanesco, o plano ou o estudo sobre a homossexualidade desde cedo estiveram presentes.
Assim, Albertine, longe de ser uma “excroissance”, um desvio da construção romanesca, não
só retomou antigos projetos do escritor, como se coadunou com o resto da narrativa.
Foi com a descoberta do leitmotiv Fortuny que Proust agenciou as inúmeras histórias,
conectando, desta forma, sua heroína com o restante das personagens. Em termos de
composição, foi por meio desse vestido que o escritor encontrou a unidade que faltava para
integrar sua Albertine a todo o conjunto da Recherche, vinculando-a à pintura por intermédio
do artista Elstir, à cidade de Balbec, a Paris e ao núcleo aristocrata – a toilette da duquesa de
Guermantes e os conselhos do barão de Charlus com relação às vestimentas da jovem.
O vestido engendrou ainda o desejo do protagonista pela viagem a Veneza, sempre
presente na composição da Recherche, mas evocada inicialmente por questões mundanas e
sensuais: a leitura do jornal no qual era anunciada a ida de Mme. Putbus e sua camareira à
cidade italiana.
Quanto à peripécia narrativa, a “robe de Fortuny” agudiza o tédio do protagonista, pois
se suscita seu interesse pela viagem à cidade de Vittore Carpaccio, sua realização é bloqueada
179
pela presença da jovem moça. Esse vestido, cujos motivos são inspirados na pintura de
Carpaccio no batistério de São Marcos – “car tout doit revenir, comme il est écrit aux voûtes
de Saint-Marc, et comme le proclament, buvant aux urnes de marbre et de jaspe des
chapiteaux byzantins, les oiseaux qui signifient à la fois la mort et la résurrection” (LP, p.
871)350 – anuncia a morte da heroína, bem como sua “ressurreição” produzida pela visão que o
protagonista terá do sobretudo da jovem em um dos quadros da capela:
Sur le dos d´un des compagnons de la Calza, reconnaissable aux broderies d
´or et de perles qui inscrivent sur leur manche ou leur collet l´emblème de la
jouyeuse confrérie à laquelle ils s´étaient affiliés, je venais de reconnaître le
manteau qu´Albertine avait pour venir avec moi en voiture découverte à
Versailles. (AD, p. 226)351
Albertine estava, portanto, definitivamente atada à tessitura do texto proustiano, no
qual passou a construir uma unidade. Entretanto, o leitmotiv Fortuny não é o único elemento
na Recherche que estabelece conexões entre partes da narrativa. Constatamos, por meio da
análise do episódio da “janela iluminada” que Proust urdiu mais uma unidade entre os
personagens Swann e o herói, produzindo, com isso, outro motivo, o tema dos ciumentos.
Ainda que as versões manuscritas não façam menção à utilização do texto do romance
Côté de Swann na elaboração do episódio da janela de Albertine contido no La prisonnière,
observamos que os dois momentos narrativos são manifestamente correspondentes. As
imagens que caracterizam a janela de Odette retornam, ecoando fortemente na janela de
Albertine, como uma frase musical.
Verificamos também que essa imagem da “fenêtre éclairée” já havia sido elaborada no
romance inacabado Jean Santeuil, no qual Proust busca fazer considerações acerca do amor a
partir da discussão do texto De l´amour de Stendhal. Embora esse episódio tenha
350
“pois tudo tem que voltar, como está escrito nas abóbadas de São Marcos, e como o proclamam, bebendo nas
urnas de mármore e de jaspe dos capitéis bizantinos, os pássaros, que significam ao mesmo tempo a morte e a
ressurreição”. (Trad., p. 344)
351
“Sobre as costas de um dos companheiros da Calza, reconhecido pelos bordados de ouro e pérolas que
inscrevem sobre sua manga ou gola o emblema da alegre confraria à qual tinham se filiado, acabava de
reconhecer o sobretudo que Albertine usava para ir comigo a Versalhes em carro aberto”. Esse trecho não consta
na tradução brasileira.
180
incontestavelmente servido de base para a elaboração de Swann, há grandes diferenças entre
eles, notadamente com relação às imagens.
Longe de ser um exercício poético, o episódio de Jean Santeuil sequer contém
imagens relativas à janela, contrariamente aos episódios da Recherche que se concentram
fundamentalmente nessa construção imagética, como notamos nas versões manuscritas, nas
quais Proust abandona o termo “prisão”, altamente explícito, buscando com isso imagens que
sugerissem o contexto de tédio e servidão do protagonista.
Sob esse aspecto, o texto de Jean Santeuil estaria, de fato, voltado às questões teóricas
e filosóficas, conquanto possua muitos episódios de cunho ficcional que seriam
reaproveitados na Recherche, tais como: a “janela iluminada”, o episódio da visita vespertina
e o das cartas, transpostos para a narrativa de Swann, as constantes visitas aos salões, os
episódios de memória involuntária, o episódio da “bille d´agate” dada por Marie Kossichef
nos Champs-Élysées utilizado para Gilberte etc.
Mas, como constatamos, o ciúme de Jean se dá de maneira aleatória, sem nenhum
vínculo com o resto da narrativa que, inclusive, é feita a partir de curtos fragmentos
justapostos. O episódio não explica o nascimento dessa angústia, tampouco aprofunda os
sofrimentos de Jean, ficando deste modo sem articulação com o resto do texto.
Poderíamos, portanto pensar que entre Jean Santeuil e a Recherche há, no mínimo,
duas diferenças expressivas que provavelmente foram determinantes para o fracasso do
primeiro e a realização do segundo: o aprofundamento psicológico e a articulação.
Com relação ao primeiro elemento, Guilherme Ignácio da Silva (2000) definiu com
perspicácia o que foi a transição de Jean Santeuil para a Recherche: a passagem de cenas
harmoniosas e idílicas para um narrador que aprofunda, problematiza as situações, buscando
compreender as cenas que descreve movimento igualmente perceptível nos manuscritos
181
utilizados na elaboração da Recherche. Estudando o caderno 28, Guilherme Silva notou que
“Os textos de ‘idílios de lembranças e imaginação’ só atravessariam as fronteiras (manuscritoobra publicada) se trouxessem problematizações” (p. 34).
Na leitura que fizemos de alguns fólios do caderno 53, nos quais averiguamos a
presença da mãe do herói, inteiramente condescendente com a relação não oficial entre seu
filho e Albertine, atribuímos a essa presença um resquício do projeto Sainte-Beuve, no qual a
mãe desempenhava um papel essencial para o desenvolvimento da conversa estética. Vimos
que pouco a pouco a personagem materna, bastante biográfica no início da escrita proustiana,
esfacela-se, dividindo sua importância com a avó e sendo, no romance La prisonnière,
substituída por Albertine e Françoise, encarregada de levar o Figaro ao protagonista.
Podemos, assim, repensar esse apagamento da presença da mãe na obra publicada
como sendo mais uma estratégia de problematização e aprofundamento psicológico buscados
por Proust. A ausência materna permite a associação de Albertine com a mãe do herói,
recurso pouco provável se esta estivesse em cena.
Guardadas as devidas diferenças entre essas personagens, Proust constituiu por esse
recurso um traço de seu protagonista, colocando-o na estirpe dos sensíveis e doentios, algo
que será destacado tanto com a mãe, em Combray, como com Albertine em Paris. O
aprofundamento psicológico é, de fato, um dos componentes diferenciais entre Jean Santeuil
e a Recherche e sua elaboração permitiu tanto as conexões entre os personagens, como a
exposição de leis universais do amor a partir de casos particulares malogrados: Swann e
Odette, Saint-Loup e Rachel, Charlus e Morel, Marcel e Albertine etc.
Como vimos, esse caráter psicológico de sua obra foi destacado por Jacques Rivière
em um artigo em que comparava Proust aos escritores clássicos como Racine. Essa
comparação foi bem aceita pelo autor que, em uma carta, ratificou essa leitura: “J´ajoute au
182
post-scriptum à ma lettre pour vous remercier et vous assurer au sujet du côté ‘psychologique
de mon oeuvre’” (Corresp., t. XIX, p. 348)352.
A propósito do segundo elemento diferencial entre os textos de Jean Santeuil e a
Recherche, a articulação, Proust constrói como observamos, uma série de motivos e episódios
que percorrem a Recherche, fazendo verdadeiras conexões e fechamentos, traçando, com isso,
a unidade desejada. Para ligar um texto tão heterogêneo como o da Recherche, seria
necessário costurar suas partes não somente por meio de leitmotivs, mas de repetições
imagéticas, lexicais e sintáticas.
Rastreamos esse procedimento pela análise que fizemos da “janela iluminada” e pelo
estudo do leitmotiv Fortuny, e embora tenhamos utilizado apenas dois exemplos dessa busca
pela unidade e coesão, a Recherche transborda de ilustrações dessa natureza. Como por
exemplos, em dois episódios do mesmo volume do Côté de chez Swann: “Un plaisir délicieux
m´envahit, isolé, sans la notion de sa cause. Il m´avait aussitôt rendu les vicissitudes de la vie
indifférentes, ses désatres inoffensifs, sa brièveté illusoire (...) J´avais cessé de me sentir
médiocre, contingent, mortel” (CS, p. 44)353. O célebre episódio da madeleine vivenciado pelo
narrador-herói, estabelece um paralelo com o da audição da Sonata de Vinteuil por Swann:
Même cet amour pour une phrase musicale sembla un instant devoir amorcer
chez Swann la possibilité d´une sorte de rajeunissement. Depuis si
longtemps il avait renoncé à appliquer sa vie à un but idéal et la bornait à la
poursuite de satisfactions quotidiennes, qu´il croyait (...) que cela ne
changerait plus jusqu´à sa mort. (CS, p. 208)354
352
“Acrescento no post-scriptum a minha carta para agradecer-te e assegurar-te com relação ao lado ‘psicológico
de minha obra’”. Carta escrita em 1920.
353
“Invadira-me um prazer, isolado, sem noção de sua causa. Esse praser logo me tornara indiferente às
vicissitudes da vida, inofensivos seus desastres, ilusória sua brevidade (...). Cessava de me sentir medíocre,
contingente, mortal”. (Trad., p. 71)
354
“Também esse amor por uma frase musical pareceu um instante que devia trazer a Swann alguma
possibilidade de renovação. Fazia tempo que desistira de dedicar sua visa a um fim ideal, limitando-a às
satisfações cotidianas, que chegou a crer (...) que aquilo não mudaria até a morte”. (Trad., p. 263-4)
183
A madeleine e a sonata operam nos personagens uma desestabilização dessa realidade
homogênea e sem interesse, fazendo-os despertar, pela memória, para um real impensado e
misterioso.
Esses paralelismos e por que não dizer, repetições, acontecem também entre volumes
diferentes. As semelhanças imagéticas e lexicais entre o episódio em que o herói contempla
no alto do hotel de Guermantes o bairro parisiense é transposta, de forma flagrante para a cena
em que o protagonista, em Veneza, admira suas ruas:
Ce n´est pas à Venise seulement qu´on a de ces points de vue sur plusieurs
maisons à la fois qui ont tenté les peintres, mais à Paris tout aussi bien. Je ne
dis pas Venise au hasard. C´est à ses quartiers pauvres que font penser
certains quartiers pauvres de Paris, le matin, avec leurs hautes chéminées
évasées auxquelles le soleil donne les roses plus vifs, les rouges les plus
clairs ; c´est tout un jardin qui fleurit au-dessus des maisons, et qui fleurit en
nuances si variées qu´on dirait, planté sur la ville, le jardin d´un amateur des
tulipes de Delft ou de Haarlem. D´ailleurs l´extrême proximité des maisons
aux fenêtres opposées sur une même cour y fait chaque croisée le cadre où
une cuisinière rêvasse en regardant à terre, où plus loin une jeune fille se
laisse peigner les cheveux par une vieille à figure, à peine distincte dans l
´ombre, de sorcière ; ainsi chaque cour fait pour le voisin de la maison, en
supprimant le bruit par son intervalle, en laissant voir les gestes silencieux
dans un rectangle placé sous verre par la clôture des fenêtres, une exposition
de cent tableaux hollandais juxtaposés. (CG, p. 860)355
Proust constrói a imagem das chaminés alargadas que, sob a luz solar remetem às
tulipas e aos jardins pintados nos quadros holandeses. A cidade de Veneza é evocada por
conter elementos que a aproximam das cidades holandesas, como os canais, a estreiteza das
ruas etc., colocando o terceiro elemento de comparação, Paris, que promove a mesma vista
veneziana, evocando os quadros de Vermeer e de Pieter Hoogh. Contudo, esse episódio, ao
355
“Não é só em Veneza que se tem dessas perspectivas de várias casas ao mesmo tempo que tentaram os
pintores, mas em Paris também. Não digo Veneza ao acaso. É em seus bairros pobres que fazem pensar os
bairros pobres de Paris, pela manhã, com as suas altas chaminés dilatadas, às quais dá o sol os rosas mais vivos,
os rubros mais claros; é todo um jardim que floresce acima das casas e que floresce em matizes tão variados que
se diria, plantado sobre a cidade, o jardim de um amador de tulipas de Delft ou de Haarlem. Por outro lado, a
extrema proximidade das casas de janelas opostas que dão para um mesmo pátio faz ali, de cada quadrado de
janela, a moldura em que uma cozinheira cisma, olhando para o chão, em que, mais além, uma rapariga se deixa
pentear por uma velha, com cara – mal distinta na penumbra – de feiticeira; assim, cada pátio constitui para o
vizinho da casa, suprimindo o ruído pelo seu intervalo, deixando ver os gestos silenciosos num retângulo
colocado atrás de vidro pela divisão das janelas, uma exposição de cem quadros holandeses justapostos”. (Trad.,
p. 622-3)
184
mencionar Veneza, prepara o leitor para o volume posterior da Recherche, Albertine disparue,
no qual ocorrerá a visita à cidade italiana, feita pelo herói com sua mãe:
Je m´étais engagé dans un réseau de petites ruelles, de calli. Le soir, avec
leurs hautes chéminées évasées auxquelles le soleil donne les roses plus vifs,
les rouges les plus clairs, c´est tout un jardin qui fleurit au-dessus des
maisons, avec des nuances si variées qu´on eût dit, planté sur la ville, le
jardin d´amateur des tulipes de Delft ou de Haarlem. Et d´ailleurs l´extrême
proximité des maisons faisait de chaque croisée le cadre où rêvassait une
cuisinière qui regardait par lui, d´une jeune fille qui, assise, se faisait peigner
les cheveux par une vieille femme à figure, dévinée dans l´ombre, de
sorcière, – faisait comme une exposition de cent tableaux hollandais
juxtaposés, de chaque pauvre maison silencieuse et toute proche à cause de l
´extrême étroitesse de ces calli. (AD, p. 229)356
Excetuando-se algumas diferenças – Paris é vista de manhã, enquanto Veneza é
percebida à noite, e obviamente, não há o terceiro elemento de comparação presente no
episódio anterior, a cidade de Paris – há uma semelhança incontestável entre as duas cenas.
Não é fácil elucubrar sobre a composição desses dois momentos narrativos, pois como
Veneza sempre esteve presente no projeto da Recherche, o episódio veneziano pode ter sido
escrito antes do parisiense, e deliberadamente colocado no volume anterior, Le côté de
Guermantes, para estabelecer um paralelo entre os romances, constituindo, com isso, uma
memória no leitor.
Tampouco sabemos se Proust copiou o episódio do hotel de Guermantes no momento
da elaboração da contemplação de Veneza por prever o possível inacabamento do romance
Albertine disparue, mas o fato é que essa repetição, longe de ser um ato falho, foi uma
escolha deliberada do autor.
356
“Metera-me em uma rede de pequenos becos, de calli. À noite, com as suas altas chaminés dilatadas, às quais
dá o sol os rosas mais vivos, os rubros mais claros; é todo um jardim que floresce acima das casas que floresce
em matizes tão variados que se diria plantado sobre a cidade, o jardim de um amador de tulipas de Delft ou de
Haarlem. E por outro lado, a extrema proximidade das casas de janelas opostas que dão para um mesmo pátio
faz ali, de cada quadrado de janela, a moldura em que uma cozinheira devaneava, de uma rapariga que, sentada,
se deixava pentear por uma velha, com cara – entrevista na penumbra – de feiticeira, – fazia como uma
exposição de cem quadros holandeses justapostos, de cada pobre casa silenciosa e muito próxima por causa da
extrema estreiteza desses calli”. Apenas a primeira frase deste trecho foi traduzida na edição brasileira. (Trad., p.
211)
185
Seja como for, não há como negar que a Recherche seja uma “surnourriture”
alimentada por sua própria matéria, e que Proust, por questões metodológicas de composição
“plagie” seu próprio texto, revelando não propriamente um problema de criação e
inventividade, mas uma dificuldade de renunciar às imagens construídas que lhe parecem
apropriadas, como vimos no episódio da “janela iluminada”.
Todos esses elementos articulam os romances, promovendo uma unidade narrativa, e
embora muitos críticos ressalvem a correspondência existente entre o primeiro e o último
volumes, tema discutido na introdução deste trabalho, há não somente um encerramento entre
o incipit e o explicit da Recherche, mas muitos outros fechamentos intermediários.
Essas cláusulas intermediárias entre os romances podem, portanto, ter sido um dos
motivos das transformações do texto de Albertine disparue nos cadernos de mise au net, pois,
seguindo a dinâmica própria da narrativa, Proust inseria, na vida de descobertas do
protagonista, momentos
de perguntas e respostas, de ilusões e revelações.
A
homossexualidade de Albertine não seria mais hipotética, mas comprovada com a mudança
que o escritor faz nos últimos meses antes de falecer.
A partir de todos esses exemplos, fica clara a busca por unidade em meio à profusão
de textos fragmentados e dispersos nos cadernos e em meio aos textos de gêneros tão
compósitos, como os comentários e apreciações estéticas, e os episódios ficcionais e
altamente romanescos.
Para atingir essa articulação que faltava em Jean Santeuil, Proust constrói um narrador
em primeira pessoa que propiciará a costura de todos esses fragmentos. Acompanhamos, ao
longo do quarto capítulo, como Proust chega a essa instância narrativa, muitas vezes
confundida pela crítica.
186
Evidente que houve entrelaçamentos entre a composição literária de Proust e sua vida,
como salientado pelo autor na introdução de Jean Santeuil – “Puis-je appeler ce livre un
roman? C´est moins peut-être et bien plus, l´essence même de ma vie recueillie sans y rien
mêler”, ou mesmo em uma correspondência em que confessa: “Il est vrai que par excès de
fatigue, pour des détails purement matériels, je me dispense d´inventer pour mon héros et
prends des traits vrais de moi (...)” (Corresp., t. XIX, p. 580)357.
Mas foi a partir dessa construção do “je” empregado em Contre Sainte-Beuve que
Proust encontra o ponto de articulação de seu livro, que muito longe de ser autobiográfico – o
autor na passagem de Jean Santeuil para Contre Sainte-Beuve e deste último para a
Recherche abandona os traços biográficos – revela antes uma invasão da literatura na vida do
escritor.
Percebemos essa inflexão na leitura que fizemos das notas dos cadernos 53 e 55, nas
quais o “je”, misturando-se ao operador da escritura e ao narrador da Recherche, demonstra
antes um apagamento do autor, Marcel Proust, do que sua presença na narrativa, visto que os
manuscritos foram unicamente utilizados para a construção literária, havendo pouco ou
nenhum traço de seu autor nesses documentos.
Genette afirma que, quando Proust declara: “Maman viendrait près de mon lit et je lui
raconterais un article que je veux faire sur Sainte-Beuve” (citado por GENETTE, 1987, p.
32)358, o uso dos verbos no condicional, empregados como uma espécie de brincadeira
infantil, demonstram um caráter imaginário, pois “c´est bien Maman et moi qui sommes en
scène, mais cette scène est imaginaire” (GENETTE, 1987, p. 32)359.
357
“É verdade que, por excesso de cansaço, para detalhes puramente materiais, eu me dispenso de inventar para
meu herói e tomo traços verdadeiros de mim mesmo (...)”. Carta endereçada a Jacques Boulenger, em novembro
de 1920.
358
“Mamãe viria perto de minha cama e eu lhe contaria um artigo que quero fazer sobre Sainte-Beuve”.
359
“é realmente Mamãe e eu que estamos em cena, mas essa cena é imaginária”.
187
Nos termos de Genette, a Recherche seria uma “autobiografia sonhada”, o que reforça
nossa leitura, mostrando que em vez de ser uma transposição da vida de Proust, a Recherche é
fruto de uma construção fictícia.
Sobre a estratégia literária, basta lembrar que Proust sustenta que “Le ‘je’ est une pure
formule, le phénomène de mémoire qui déclenche l´ouvrage est un moyen voulu” (Corresp., t.
XIX, p. 630-1)360.
Nas palavras de Roland Barthes, a Recherche:
Issue du sommeil, l´oeuvre (la tierce forme) repose sur un principe
provoquant: la désorganisation du Temps (de la chronologie). Or, c´est
là un principe très moderne. Bachelard apelle rythme cette force qui vise
à “débarasser l´âme des fausses permanences des durées mal faites”, et
cette définition s´applique très bien à la Recherche, dont tout l´effort,
somptueux, est de soustraire le temps remémoré à la fausse permanence
de la biographie. (1984, p. 338)361
A invenção desse “je” que surge em meio ao sono, propicia a derrubada de uma falsa
durée, da cronologia biográfica, permitindo a construção de outro “je” que, segundo Barthes,
não é o “moi”, sujeito e objeto da autobiografia tradicional, mas um “je” da enunciação, um
narrador que não lembra, tampouco se confessa.
Como não conseguimos apreender em qual tempo esse narrador se encontra, está
permitido o cruzamento das duas instâncias narrativas da Recherche, que no final, confirmamse ser a mesma: o narrador e o herói. É com esse entrelace que Proust alcança a costura dos
comentários estéticos e filosóficos, próprios do narrador, com os episódios ficcionais das
experiências vividas pelo protagonista.
Outro fator relevante a sublinhar é a importância que Proust dá à invenção e à ficção.
Referindo-se ao “espírito Guermantes”, cuja conversa emprestou de Madame Strauss e ao
360
“O ‘eu’ é uma mera fórmula, o fenômeno da memória que desencadeia a obra é um meio tencionado”. Carta a
Régnier, vista no quarto capítulo.
361
“Saída do sono, a obra (a terceira forma) repousa sobre um princípio provocante: a desorganização do Tempo
(da cronologia). Ora, isto é um princípio muito moderno. Bachelard chama de ritmo essa força que visa a ‘livrar
a alma das falsas permanências das durações mal feitas’, e essa definição se aplica muito bem à Recherche, cujo
esforço, suntuoso, é de subtrair o tempo rememorado da falsa permanência da biografia”. Os grifos são do autor.
188
episódio do convite que o protagonista recebe da duquesa pensando ser um trote – algo que
realmente aconteceu, segundo Proust, com dois senhores. O escritor afirma em carta a Paul
Souday: “Ce sont peut-être les deux seules fois dans toute mon oeuvre que je n´ai pas
‘inventé’ de toutes pièces” (Corresp., t. XIX, p. 575)362.
Sem especular sobre a veracidade dessa afirmação, gostaríamos de frisar o estatuto de
ficção que Proust concede a sua obra, diferentemente dos escritores realistas como Balzac ou
Barbey d´Aurevilly, que não precisando, obviamente, consolidar o caráter não biográfico de
suas obras, colocavam seus textos ficcionais em um patamar de realidade ao utilizarem as
fórmulas: “All is true” ou “Really”363.
Proust reafirma todo o tempo o aspecto ficcional e inventivo de seu livro, apontando
não para suas “chaves” ou “modelos”, mas para seu processo escritural.
Se como notamos, ele sempre produziu diferentes tipos de textos, misturando narrativa
literária e demonstração estética, o que demanda uma intensa costura, este não foi o único
fator para o inacabamento da Recherche. Para buscar a unidade pretendida, o escritor teve de
se dedicar profundamente à composição de episódios propriamente romanescos, pois só
assim, as idéias filosóficas e as exposições estéticas fariam sentido e ficariam devidamente
articuladas.
O trabalho realizado para dar unidade à obra só ocorria, curiosamente, pelo acúmulo
de textos, o que de certo modo punha em xeque a construção da Recherche no que tange seu
fechamento. A pergunta que nos fazemos é: por que a Recherche ficou inacabada se, como
vimos na introdução deste trabalho, Proust declarava ter terminado seu livro antes de 1922?
Lembremos que em 1920 o escritor afirma : “le mot fin a été inscrit au terme du
dernier volume (non paru encore) avant que fussent écrits ceux qu´on vient de
362
“São talvez as duas únicas vezes em toda minha obra que eu não forjei”.
A primeira fórmula foi usada como epígrafe do romance balzaquiano Le père Goriot, enquanto a segunda foi
empregada por Barbey d´Aurevilly, na novela “Le rideau cramoisi”.
363
189
publier” (Corresp., t. XIX, p. 630-1)364. Entretanto, essa pretensa construção e conclusão da
Recherche explicam-se apenas com relação ao episódio da madeleine e as considerações
feitas a seu respeito no último livro. Segundo Bernard Brun:
Ce n'est qu'en découpant la dactylographie de Swann (1911) que Proust en
séparera les deux parties. Dans le Cahier 26, un souvenir involontaire de
même nature, celui de la halte du train évoqué par le heurt d'une fourchette
contre une assiette, apparaît au milieu d'un autre brouillon de Swann.Dès le
Cahier II, cet épisode est coupé à son tour, mais entièrement et il sera
déplacé dans Le temps retrouvé. (1979, p. 49)365
Proust as tinha construído juntas, pretendendo colocá-las em um único volume,
todavia, decide separar a experiência privilegiada de sua interpretação, postergando a
descoberta e construindo assim uma busca a ser perseguida pelo narrador-herói.
Certo é que a monumentalidade do audacioso projeto de abarcar muitos gêneros
desempenha um papel importante no inacabamento do livro, especialmente se levamos em
consideração não somente o projeto romanesco, mas também sua execução, que era feita por
fragmentos textuais, sucessivamente reelaborados.
A leitura dos manuscritos forneceu-nos algumas pistas sobre o caráter processual de
sua escrita que se fazia não em planos pré-concebidos, mas no ato de sua realização.
Observamos, no quarto capítulo, como Proust muitas vezes ignorava o destino que daria aos
seus textos, muitos possuindo um lugar “virtual” na narrativa.
Embora possuísse uma construção e ainda que Proust buscasse essa unidade “vital”
para sua obra, a Recherche se fazia artesanalmente, sendo, como afirmou Marine Garibal:
Plus qu'un système théorique, c'est une fabrication, un compromis entre des
forces contraires, l'histoire de brouillons successifs, sans cesse biffés et
364
“a palavra ‘fim’ foi escrita no final do último volume (ainda não publicado) antes que fossem escritos os que
acabaram de publicar”. Carta a Henri de Régnier de 1920.
365
“É somente recortando a datilografia de Swann (1911) que Proust separará as duas partes. No caderno 26,
uma lembrança involuntária de mesma natureza, a da parada do trem evocada pelo choque de um garfo contra
um prato, aparece no meio de outro rascunho de Swann. Desde o caderno, esse episódio é cortado em seu turno,
mas ele será inteiramente deslocado para o Tempo redescoberto”.
190
modifiés, sans cesse accrus et remaniés. Composer ne saurait, dans ces
conditions, se réduire à l'observation d'un plan préconçu. (1992, p. 91)366
Como observado neste trabalho, o ideal da Recherche é clássico, pois se quer uma
obra fechada e coesa, mas sua execução é moderna, a partir de fragmentos e cuja lógica e
amarração ocorria somente na releitura e reescritura, na relação entre os cadernos e na
montagem dos textos.
Nas palavras de Rainer Warning: “Or, si Proust possédait cette capacité de
structuration, et si néanmoins il n´est jamais parvenu à la fin de l´écriture, il faut en conclure à
des tensions, à un conflit entre théorie poétique et pratique narrative, entre projet et réalisation
scripturale” (1996, p. 16)367.
Ainda que Proust reserve grande importância à imagem, à metáfora, elementos que
definem muito bem a atividade literária e sustentam sua teoria estética, sua execução não
ocorre pela fusão, mas por justaposição. Notamos na análise feita das versões manuscritas do
episódio de “janela iluminada” que o escritor as constrói separadamente, para depois fundi-las
em imagens elaboradas em muitas etapas de reescritura, o que se comprova, mais uma vez na
margem de um fólio do caderno 71, no qual o escritor registra: “Je crois que pour fondre avec
plus d´unité il faudrait mettre cela quand elle joue du pianola” (C.71, fos 96rº e 95vº)368.
A busca por fusão e unidade entre os episódios poderia ser uma das razões para a
escrita incessante e o conseqüente inacabamento da Recherche, pois Proust persegue na
prática da escrita a teoria estética que seu narrador propala no livro. Talvez essa busca pelas
metáforas e por um estilo que portasse sua visão artística fosse para Proust o maior dos
desafios de sua escrita.
366
“Mais que um sistema teórico, é uma fabricação, um compromisso entre forças contrárias, a história dos
rascunhos sucessivos, rasurados e modificados incessantemente, ininterruptamente aumentados e remanejados.
Compor não seria, nestas condições, reduzir-se à observação de um plano pré-concebido”.
367
“Ora, se Proust possuía essa capacidade de estruturação, e se, no entanto, nunca chegou ao fim da escritura,
deve-se atribuir a tensões, a um conflito entre teoria poética e prática narrativa, entre projeto e realização
escritural”.
368
“Creio que para fundir com mais unidade, seria necessário colocar isto quando ela toca a pianola”.
191
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202
APÊNDICE – Transcrição do caderno 53.
Protocolo de transcrição dos cadernos
Segue abaixo o protocolo utilizado pela equipe Proust para a transcrição dos cadernos de
rascunho.
A transcrição é diplomática, ela reproduz, o tanto quanto possível, a disposição da página
manuscrita.
A unidade da transcrição é o fólio, frente ou verso; a mudança de linha é respeitada e os
acréscimos interlineares e as adições marginais são reproduzidos em seus respectivos lugares.
As passagens rasuradas são reproduzidas sob tachado simples. Se uma passagem
rasurada, uma ou demais palavras tiverem sido anteriormente rasuradas, elas figuram sob um
traço de tachado duplo. A cruz de Santo André é reproduzida.
Um caractere menor é utilizado no caso de modificações interlineares (supralineares e
infralineares), bem como no caso de acréscimo de letra(s) numa palavra.
As correções por sobreposição de palavras podem ser analisadas como uma rasura
seguida de um acréscimo. Elas são transcritas da seguinte forma: a parte da palavra que foi
objeto de sobreposição é tachada, seguida de um traço oblíquo e de um caractere menor
referente à versão ulterior. Exemplos: Toutes/s imaginaire/ée dédain/gneux dans/es.
As exceções são as seguintes:
- quando a sobreposição toca uma palavra inacabada, não se dá a versão ulterior em caractere
menor: Odet/Albertine.
- quando somente a primeira letra de uma palavra é corrigida, essa palavra é inteiramente
tachada, seguida da versão ulterior em caractere menor: les/des
-
um signo de pontuação é corrigido por sobreposição, é seguido, sem ser tachado, por um
traço oblíquo e do novo signo de pontuação: ,/.
204
TRANSCRIPTION DU CAHIER 53
DE
MARCEL PROUST
205
_Sodome et Gomorrhe (1-11)
_La Prisonnière (12-58)
LIII
206
1r.º
Que j´espère aller retourner à Amsterdam, dans q.q. mois a, en m’[ ?] près d´ici,
eh ! bien, regardez come c´est extraordinaire, c´est précisément la fille
À ces mots
propre fille de Vinteuil ‘’. A ces Alors, une image terri de a terri [enréser]
Combray
prononcés si loin de Balbec et de Montjouvain, si longtemps après la mort de
Vinteuil image tenue vint me frapper au coeur, une image tenue en réserve
pendant d´années que j aurais cru, qu´est-elle a ; même si j´avais pu deviner
qu’elle avait un pouvoir nocif, j´aurais cru qu´à la longue elle avait entre [remet]
perdre; tenue en réserve pour mon supplice, pour imaginer une nouvelle à
mon visage une nouvelle et terrible pour mon chatiment peut’être,
et peut´être pour mon bien, tenue en réserve pour après
d´imaginer pour moi une vie terrible, méritée, et nouvelle, et peut´être aussi
me
les actes mauvais
pour montrer faire éclater toutes les funestes conséquences que le met
engendraient indéfiniment non pas seulement pour ceux qui l´ont commis, mais
pour ceux qui n´ont fait que les contempler comme un spectacle [divertissant]
et curieux ainsi que j´avais fait cet après midi-là à Montjouvain.
Albertine descendait du wagon, je la retiens par le bras, j
207
2r.º
Albertine
descendait
du
wagon, je la retiens par le
bras. « Il serait matériellement
impossible que vous veniez
[ ?] ce soir à Balbec ».
« Matériellement impossible,
non. Mais surtout de sommeil.
Enfin, je viens, mais je ne
comprends pas pouquoi je
vous ferais donner une
chambre
dans
l"hotel. »
« Matériellement impossible
non. Mais je tombe de
sommeil. Enfin je viens mais
je ne comprends pas pourquoi.
à Amsterdan dans q.q. mois, en m’embarquant près d’ici
Aller retouner eh ! bien regardez, <ilegível>
208
3r.º
illuminait illuminait des
paysages naturaux des
le soleil
illuminait
des
paysages
naturaux lesquels la semble
ont
encore il n ont donné à mon
imagination une joyeuse envie
d’aller vivre
pareil à un cerf de flame, bondit à [braises] [braises]
couleur
enfondrais d’un bond le rideau de [ ?] à travers lequel je le
traversais
sentais depuis un moment frémissant et n’attendant que
l’instant d’entrer en scène le soleil et dont il effaça sous
ses flots de lumière la purpure mistérieuse. Mes sanglots
[ doublèrent] en pensant aux paysages matinaux qu’il
allait illuminer et parmi lesquels la ville [ ?] il m’eut
donné une
plus jamais
si joyeuse envie d’aller vivre, tandis que maintenant,
il
incapable à jamais de désirer un bonheur il ne se laissairait
plus jamais en pour moi son lever n’éveillerait en moi un
dans
désir en mon coeur qui ne cherchait plus demandait plus
la
que la force de supporter ce souffrance, son lever
n’éveillerait plus jamais un désir de bonheur. Co Ce que
Cottard m’avait dit au casino de Pauville(vérifier les
noms) ne faisait plus doute pour moi. Jolie comme était
laconnaître
Albertine Mlle Vinteuil n’avait pas se lier avec elle sans
chercher à avoir avec elle les mêmes relations qu’elle
avait à Montjouvain avec son autre amie. Et si Albertine
n’y a preuve qu’Albertine y avait en le même désir et avait
consenti c’est qu’elle ne s’étaient pas [ ?] mais
qu’Albertine leur intimité n’avait cessé de grandir. Ma
mère m’entendait-elle pleurer ? Elle entra et je fuis
n’attendais si je [à] le voir qu’au premier instant je ne le
reconnus pas.
1909
209
3v.º
210
4r.º
16 7
qu’alors
parceque je sentais que je
pourrais donner à ma femme
beaucoup de luxe et de plaisir.
Mais que je n’aurais pas osé
la
pourtant faire vivre auprès de
moi
si
souffrant
si
ennuyeux ». « Mais vous êtes
fou tout le monde voudrait
vivre auprès de vous regardez
comme on-vous recherche
chez les Verdurin partout,
comment on parle de vous.
Elle n’a pas du être
Vos [ ?] « Je me moque bien
des Verdurin, je ne tiens qu"à
ma petite Albertine, il n"y a
qu"elle en me croyant
beaucoup- dis-moi les pre-
Les [choses] [ ?] en désordre autour de ses figures
[semblées] et de ses yeux inquiets et de ses joues vieillis il
le devina au
me semble que c’était ma grand’mère qui entrait. Elle vit
que je fais
mon mouvement d’effroi car avant de me demander
Gentille avec vouss comme elle avait du, pour vous donner cette
impression. C’est une méchente. Ah ! si j’avais été à as place +
pouquoi je n’étais pas couché : « Tu trouves que je
mettre ce mot plutôt après le papier collé
ressemble à maman tu [ ?] croyais voir autre que ta pauvre
grand"mère. Me dit-elle Elle me le dit en souvenant en
tant il lui était doux de penser qu"elle commençait à pre
rappelait as mère. « Mais comment se fait-il que tu ne sois
pas couché. Et tu as
211
4v.º
Jamais je n’ai je n’avais vu commencer une journée aussi belle ni aussi douloureuse. Et
mais Ma mère s’en s’affligeait de ne pas me voir l’air plus heureux ne s’opposait pas à ce
quej’épouse Albertine s’é aurait voulu au moins que j’eusse l’air heureux. Elle ne savait pas
maintenant
que tous les jours, maintenant ce que comme celui-ci, ce
demander de plus à la vie c’était de <ilegível>
212
5r.º
me montre éprouve sans doute ressentait peut’être de chagrin, elle ne n’en montrait pas et
Ces
fut peut’être moins étonnée que je s’aurais [ce] de mon [revirement] Mon
suite de 16
+ à sa place. A l’à [ ?] où j’aimais Gilberte, je lui aurais dit : « Mais c"est vous que j"aime.
Mais je me rapellais trop ce qu"il m"avait couté de [ ?] à ce mouvement avec Andrée. Et se
continuait à meler de cette autre femme. Ce Albertine a-t-elle compris plus tard que cette
autre
213
5v.º
Tout le temps ; la mer, la lumière du [soleil]
étendaient qu’un voile sur elle qu
indifférent [morne] et très [ ?] comme
214
7v.º
Pour mettre un peu plus loin quand notre vie avec
Albertine à la maison commence.
et qui
Et cela
d’ailleurs avait un certain
charme, étant comme son
amitié subite après qu’elle m
s’était couché auprès de moi
rappelant le côte St. André des
Champs de Françoise et
Théodore de race franque à la
aussi (car la [ ?]
[ ?]
façon
de
« sympatique
souvenir » m’avait adressé le
soir au concert le jeune et
Santois depuis si [ ?] peut’être
à son avis si en voie de
parvenir.
Quand je dis à Albertine qu’habitait au rez de cha en face
la Duchesse de Guermantes, elle exprima deux ce nom
éveilla deux impressions différentes. Elevée pour une
famille bougeoise à ne pas avoir l’air de se préoccuper des
nobles qu’elle ne connaissait pas, elle prit un air distrait,
froid, presque désagréable. Mais au bout d’un instant elle
Des communes et la [ ?] sortait du moyen âge féodale
m’avoua que’Elstir lui avait cité la Duchesse de
Guermantes comme la femme de Paris qui s’habillait le
mieux et elle m’interrogea beaucoup sur elle.
215
7 8, 9,
8.rº
que j´ai cru que je me tuerais et c´est pour cela je vous ai demandé hier soir de venir si
vous ne pourriez pas venir coucher à Balbec. Si j´avais du mourir, j´aurais aimé vous dire
adieu ». Grâce à ce mensonge je´ au pouvais donner libre cours à mes larmes. « A mon
pauvre petit, si j´avais si j´aurais pensé la nuit après de vous. Je ne vous quitte plus je vais
rester tout le temps ici. »
et
Elle m´offrait justement- elle seule pouvait me l´offrir car elle seule le possedait- le seul
contre
calmant à contre à ma souffrance, et qui était d’ailleurs de même nature que cette
moi [seul]
souffrance puisqu’elle [ ?] : loin [d’où] venait Albertine. En ce moment Albertine, se
-moi [seul]
relâchant des souffrances qu’elle me causait, me laissait attendri comme un convalescent.
Mais je pensais qu’elle endroit [ ?] elle prendrait le [ ?] au qu’elle irait à Amsterdan.
La passion mystérieuse avec laquelle je pensais autrefois à le pays parce que c’était celui
d’où venait Albertine,
216
10 bis
9.rº
gaité des [ ?] en [ ?] [beauté] cela c’était
La passion mystérieuse avec laquelle
les habitudes d’[ ?] allaient renaître de
son [ ?] pour la Noël, pour le 1e. janvier,
dans des domaines dans des jeux. Ce Le
dates qui [déjà] pour elle-même par un
je pensais à ce pays autrefois à ces pays régions
souvenir incoscient de la tristesse qu’elles
pays auquel j’aimais tant [ ?] autrefois
m’avaient [ ?] quand elles m’avaient
parceque que c’était celui d’ont où venait
séparé de Gilberte autrefois. Et après les
Albertine, dont elle m’apportait le charme
longs diners, quand tout le monde serait
singulier dans son sourire pas fort qui
un peu gai et [ ?], elle aurait avec ses
celui de qui et que sa leur
avait dont la singularité géographique
eblui q la race qui les habitait, leurs
monuments, leurs paysages, avaient pour
mystérieux
amies de là bas ces mêmes pensées [ ?]
que je lui avais vu prendre avec Andrée,
alors que cette amitié m’avait aucune importance
et [ ?] [ ?] au contraire
qui sait peut’être [celles] que je revoyais,
moi quelquechose de [puissant] parceque
sans la lumière de telles qu’il qui avaient
je pouvais les considérer, comme dans un
repproché devant moi Mlle. Vinteuil et
atlas, comme dans un [ ?] de vues, dans le
obscur
sourire, dans les manières d’Albertine, ce
son amie, à Montjouvain, quand du soir
pays-là
passion
de [bisous], je les voyais se [promener] et
mystérieuse je l’éprouvais encore mais
s’enlacer sous la lumière de la lampe !
transposée dans interpretée ce domaine de
Ah ! que faire pour qu’elle n’allat pas là
l’homme. Oui, c’était de là qu’Albertine
bas, même si je le demandais avec [ ?], il
venait ! C’est là que dans chaque main on
faudrait en [dis lui], elle irait d’[un bond]
alle allait retrouver aussi la fille de M. de
rejoindre sa tante. Comme j’ai chaque
Vinteuil, et dans chaque maison des amis
moment si bien des moments de notre vie,
dont beaucoup sans doute avaient les
[je m’interrogeais] tout l’avenir contre un
mêmes goûts qu’elle les
souvenir qui par lui-même peut sembler
maintenant
cette
insignifiant. J’avais jadis
217
+ [bien] est infinément plus
stable. Les souvenirs peuvent
durer puisque indéfiniment en
nous sous cette forme
nouvelle et réduite où
d’ailleurs ils ne peuvent nous
ne [?] plus d’eux d’autre
souffrance que que, pour
certes jours où nous ferons [?]
[?] de nos [?] que’il est déjà
trop lointain, que nous
mourons déjà trop vieux qu’il
est déjà trop lointain pour
qu’il puisse nous faire souffrir
encore. [ coeur] ; ils ne sont
plus que d’ [morts] souvenirs
visuels, sous où même en plus
les dégré souscrire d’un nom,
d’air [ ?] [ ?]
de me [ ?]. [lancez] qui d’y
[relachant]. Les Cette dernière
forme les souvenirs ne diffère
pas seulement des deux
premières en ce qu’elle ne
possède aucune [ ?] sur notre
coeur, mais aussi en ce qu’elle
se compose +
9v.º
A un endroit de [défaut] de ce chapitre :
En somme me dis-je égoïstement, c’était un bonheur
qu’elle [fut] pauvre. Cela simplifierait beaucoup ma
manière d’agir avec elle et me permettrait plus facilement
de la rendre heureuse et docile.
Capitalissime.
A propos de l’oubli de ma grand’mère dont je parlerai là
(la réalité c’est la mort d’Albertine qui m’a donné l’idée
mais il sent [mieux] je [dois] le mettre pour ma
grand’mère) : les êtres que nous aimons meurent. Mais En
mourant ils nous [laissent] une certaine [provision] de
souvenirs. Mais ceux-ci ne durent pas très longtemps au
moins sous la forme où ils sont des [ ?] assez très vite
rapidement
[detectibles], au moins sous la forme où ils ont des
propriétés sur notre sur notre coeur, de lui [comme] de la
construction de l’angoisse, et même sous une 2e.forme,
dans un second état où ils après la désagrégation du 1er.
ils se refont ensuite et qui donne au contraire à notre
coeur une [ ?] sensation de douceur. Après ce second état
ils forment sont de nous ceux détails et forment alors un
résidu complètement différent, extrêmement [ ?], qui n’ont
plus donné d’aucune propriété • pouvait agir sur notre
218
Renoncé à tous les
Avantages de la vie pour
connaître Mlle. Blandain,
parce qu’elle était une
amie
des
Swann.
Aujourd’hui
pour
qu’Albertine n’allat pas à
Amsterdan, pour l’isoler
je l’aurais isolée, j’aurais
supporté
toutes
les
souffrances,
et
si
c’[eusse] été insuffisant,
je lui en aurais infligée,
je
l’aurais
isolée,
enfermée si je lui aurais
volé son argent si j’avais
pensé que le [dénuement]
peut l’empêcha de faire
le voyage. Peut’être à
10
Paris [ ?] je demandais à
Mme. De Guermantes
d’agir
[sur]
Mlle.
Vinteuil pour qu’elle ne
resta pas à Amsterdan,
accepter une [situation]
quelconque à l’etranger,
peut’être en Allemagne
chez le Prince de (celui
qui était chez Mme. De
Villeparisis) mais plus
Donnait tout ce qu’elle
que d’agir je voulais
[c’était]empêcher
Albertine de prendre ce
[but] l’emmener à Paris.
Certes de Paris elle
pourrait aller si elle
voulait à Amsterdan.
Mais peut’être peut’être
à Paris
13 10 bis
je pouvais demander à
Mme. De Guermantes
d’agir sur Mlle. Vinteuil,
pour
qu’elle ne resta pas à
Amsterdan
acceptait peut’être une
situation
quelconque à l’étranger
peut’être en Allemagne
chez le Prince de (celui
qui était chez Mme. de
Villeparisis)
lequel,
[prétendu]
par
la
Duchesse
empêcherait
Albertine d’aller voir sa
[serétenie]. Certes à Paris
si Albertine avait ces
goûts elle
eut pour trouver bien
d’autres personnes que
Mlle. Vinteuil auprès de
qui les [ ?] Mais ma
jalousie chaque moment
de
jalousie est particulier ;
Celui-ci avait été
ce nom
causé par la relation
qu’Albertine connaissait
Mlle. Vinteuil chaq et
porte la marque de l’être
qui l’a causée crée. Or
celui-ci
venait
de
Mlle.Vinteuil. Elle en
restait
la
grande
préoccupation.La passion
mystérieuse avec laquelle
j’avais autrefois pensé à
la Hollande parce que
c’était de ce pays que
venait Albertine. (Mettre
2 ou 3 pages avant à
10e.)
9r.º
13 12 bis
Pas
plus
que
l’imagination
la
sensibilité ne dispose à la
fois d’un grand nombre
d’images. De même que
c’était
une
église
[persane], une tempête à
l’aube qui m’[éveillait]
jadis vers Balbec en ce
qui me déchirait le coeur
en en ce moment je
pensais qu’Albertine était
à
qu’elle y
Amsterdan c’était une de
deux
Revenait avec Mlle.Vinteuil
cette chambre et cette
[ ?]même plutôt des noms
hollandais dont
jeunes filles dont elle
m’avait parlé <ilegível>
219
aurait dit qu’elles ne se
trouvaient pas à ce
moment là à Amsterdan,
qu’elles ne pourrait pas
voir Albertine, comme
j’avais
pleuré
de
[douceur] et de joie. Et
pourtant je savais bien
que cette localisation de
ma
jalousie
était
arbitraire, que si elle
avait ces goûts elle
pourrait les [assouvir]
avec
d’autres.
Mes
sentiments
peut’D’ailleurs
une
peut’être
même
ces
mêmes jeunes filles si
elles avaient du
de venir ailleurs
venir à Balbec n’avaient
pas autant torturé mon
coeur.
C’était
d’Amsterdan,
de ce
monde inconnu où je
sentais que se plaisait
Albertine, où étaient ses
souvenirs, ses amitiés,
ses amours d’enfance,
que [s’exalait] cette
spèce
d’atmosphère
hostile,
inexplicable,
comme celle qui montait
jadis de la salle à manger
jusqu’à ma chambre de
Combray, de la salle à
manger où j’entendais
rire avec les étrangers, en
un
lien de bruit des [ ?]Maman qui ne
10r.º
rendait pas un [ ?] besoin comme celle celle qui avait sans
doute [ ?] pour Swann, les maisons où [ ?] aller en soirée
sans lui et où il s’imaginait elle devait goûter des joies
qu’il n’imaginait pas. Ce
pays
n’était plus comme [ ?] une région délicieuse délicieux, où
la race est passive, les canaux dorés, [cérisiers] [morts] ,
mais comme à une enfance que j Sodome que j’aurais
voulu pouvoir faire [ ?] [ ?] [ ?] sur le champ et supprimer
du monde réel que je pensais sans cese à Amsterdan. Cette
ville était comme une pointe douloureuse et permanent
dans mon coeur.
Maman
« Grand’mère si je vais demander à Albertine de venir
passer quelque temps chez nous à Paris ». « Mais elle est
si libre, on la laisse sortir seule elle ne [distrairait] ».
Albertine accepta La vie réserve quelquefois des joies
qu’un amour pas[satisfait]
220
10v.º
q.q. point capital dans le cahier
O soufflait par les
[portes] mal jointes du
viel appartement que
nous habitions était
[enlevée], comme par les
oiseaux des bois les
beaux jours de l’été, par
les refrains
inconsciemment,
[éperdument],
inextinguiblement
chantés pour moi dans ce
froid délicieux, de toutes
les chansons de majot et
de [Dragson, Pragson].
Le froid dont on se plaignait beaucoup venait seulement
d’arriver et qu’on n’y était pas encore habitué, pour cette
même raison exaltait ma joie en faisant renaître
inconsciemment en moi les 1ers jours d’hiver oubliés Ces
mois
d’arrivée
à
Paris
où
j’allais
entendre
[Dragson/Pragson] et Majot. La belle saison en s’enfuyant
avait emporté les oiseaux. Mais d’autres musiciens
invisibles, intérieurs, les avaient remplacés. Car la brise
glacée qui O
qui me permettait de donner beaucoup de luxe à la femme
Et si [c’est] dans ce chapitre je
il dirai : pas jouait : mais je
n’allais plus au café concert
pour ne pas quitter Albertine +
que j’épouserais, j’avais sur été sur le point de céder
d’accepter le sacrifice de celle que j’aimais. [Guidé] par la
si près du grand déjeuner que j’avais connu
reconnaissance que m’inspirait la gentillesse d’Albertine,
[péjoration] que
celle-ci
de même qu’on [ ?] me [ ?] en graçon de café qui nous
[eusse] un sixième [pure] d’eau de vie, je lui dis que ma
femme aurait une auto, un yacht, qu’à ce prit de [ ?] il était
malheureux que celle que j’ puis qu’albertine aimait tant
[fuire] dans l’auto et dans yachting il était malheureux
qu’elle ne fut pas celle que j’aimais, que j’eusse été le
mari idéal pour elle, mais qu’on [verrait], qu’on [pourrait]
peut’être [arranger] malgré tout, comme dans l’ivresse ou
[surtout]
[l’ivresse] fini cependant [peu à peu] des coups
d’interpellar les passants, je me retiens de l’imprudence
que j’avais commis de [ ?] de Gilberte de lui dire que
c’était elle voir page 16 dans une [ ?] peu avant. Mais ce
16 est-il [fini] de la même
221
habiter seul avec moi car ma
mère devarit profiter ma mère
doit partir avec mon père et
d’un voyage d’inspection
me laisser seul à Paris. C’est
qu’allat faire mon père pour
aller à Combray auprès
ce qui me permet de lui
d’une
soeur
de
ma
grand’mère
proposer. Maman me dira :
« Si sa tante ni voit pas
d"incovénients, je veux bien
mais je t"assure que je trouve
cela drôle)
ma tante
Céline qui était malade et
et avait désiré, je [veux]
était en voyage oubli que
[avoir]ma mère auprès d’elle.
Ma mère voulait en profiter
pour faire faire certains
constructions.
La brusque réaction de
bonheur me jetat dans une
exaltation où les paroles des
toutes les paro rien n’existait
plus pour moi qu’Albertine et
la doceur du moment présent.
Les à mes lèvres se
[prononçait] les paroles qui
pourraient [ ?] mon amie. Jes
[ elevations]
dis ces brusques changements
de passion intérieure che font
[ ?] les paroles à un dégré où
l’on ne se sentait plus pas
longtemps [ ?] et qui peuvent
amener les jours suivants des
déceptions dans l’être qui les
écoute comme l’expression
non
d’[être]
était
[ ?]
momentanée mais d’une vérité
[ ?]
objective et duelle. Je
multipliais les paroles qui
pourraient faire plaisir à
Albertine je lui dis qu’ayant
fait un gros héritage +
11r.º
15
Je damanda à albertine si elle ne voudrait pas venir habiter
C’était en réalité +
avec nous à Paris. « ah ! ce ne serait pas possible en ce
moment. D"ailleurs quel besoin avez-vous d"y rentrer
puisque cette dame est partie ». « parceque je serais plus
calme dans un endroit où je l"ai connue plutôt à Balbec
qu"elle n"a jamais vu et que j"ai pris en horreur ». « Ma
tante ne voudrait pas que je parte en ce moment.
D"ailleurs même si plus tard je peux, est-ce que cela
n"aurait pas l"air drôle que je descende aussi chez vous. A
Paris on saura bien que je ne suis pas votre cousine ».
« Hé bien nous dirons que vous êtes sommes[à peu]
fiancés. Qu"est-ce que cela vous faites puisque vous surez
que cela n"est pas vrai ». Son cou qui était tout entier dans
[puissant]
sa chemise de [ ?] était gros bien, à gros grains, je
l’embrassais aussi chastement que j’avais embrassé ma
qu’
mère, ce soir de Combray, pour calmer ma peine dont
alors aussi que celle-là aussi, je croyais alors ne pouvoir
jamais arracher de mon coeur. Je dis à Albertine que
que j’avis fait un gros héritage qui me permettait de donner beaucoup
de luxe
j’avais été sur le point d’accepter le sacrifice de cette
femme et de plaisir à ma femme, j’avis été sur le point
d’accepter le sacrifice de celle que j’aimais.
222
11v.º
Je ne sais trop où je dis que le temps qui fait oublier m’avait seulement séparé d’Albertine
et ne lui donnait qu’une beauté de plus (peut’être la beauté pas dans le même passage) mais
m’[étais] en [ ?]
que je peux encore la rejoindre et l’aimer. Je dirai avant « Sans doute je avais dit en
Gilberte : si encore un peu de temps passe, je ne l"aimerais plus. Et cela s"était réalisé.
Mais pour Albertine l"intervalle avait été moins long, j"avais encore pour la rejoindre et
l"aimer.
+ dans le cahier net où tapis de mon à tapisserie de
per mon père
223
12r.º
19
xxx
xx
La vie nous [réserve] accordé quelquefois ce qui nous
semblait les plus insensé. Depuis le jour soir où ma mère
était venue coucher dans ma chambre à Combray, quand il
comme
me semblait à la fois un moment où il me paressait si
possible inévitable et mortel de passer la nuit sans
avoir
l’embrassée, ma mère était venue coucher dans ma
chambre à Combray, jamais [commune]
rentrée à Paris avec nous
Albertine avait renoncé à l’ídée d’aller à Amsterdan.
« Qu"est-ce que j"y ferais disait-elle, c"est froid,
[brumeux], je suis bien mieux ici. Elle habitait avec nous,
sa chambre
était
quelques pas
couchait au bout du couloir à deux chambres de la mienne.
de Combray maman
où je ne pouvais me décider à
passer la nuit sans l’ avoir
mamam
embrassée quand mon père
apaisée
l’empe par par miracle
apaiséee il, elle vint coucher
dans le grand lit à côté de moi
il me faut remonter à ce soir
où maman avait couché dans
le petit lit à côté de moi si je
grand
+veux trouver une [pareil]
exemple [comparatif] autre
cirsconstance où la vie, cont
fait [reprise]
m’ait accordé, contre toute
prévision, d’un malheur qui
me semblait à la fois
inévitable et mortel. A
Combray elle m’avait accordé
cette nuit mais elle ne me
donnait pas cette fois la joie
Jamais depuis le soir de ma mère, était venue coucher
auprès de moi soudain apaisée par mon père, était venue
ne m’avait
coucher dans le grand lit à côté de moi, la vie ne m"avait
ainsi accordé, co d au rebours de toutes les prévisions,
accordé Je ne puis même pas parler du soir où le capitaine
de Borodino avait permist à St Loup que je dormeisse au
quartier (cette faveur qui ne guérissait qu"un malaise
Non
passager) ; Non ; il me faut remonter jusqu"au soir de
Combray au moment quand je pense qu"Albertine vint
habiter à paris avec nous, qu"elle renonce à l"idée d"aller
à Amsterdan disait qu"elle se trouvait bien mieux à la
elle
maison que [en hord] de ces canaux si froids, que"sa
eut sa
vingt
+
chambre fit à quelques pas de la mienne, au bout du
couloir, il me faut me rappe ler remonter au soir de
que je ne voudrais rester
Combray où maman soudain apaisée par mon père, vint
coucher dans le grand lit à côté de moi, si je veux +
224
12v.º
+ pas de ne laisser épouser mais de laisser vivre sous notre toit une
jeune fille qu’avait été l’amie de Mlle. Vinteuil, de Mlle. Vinteuil
qu’elle n’avait pas voulu voir, tout en le plaignant, après la mort du
vieux professeur de piano, du grand homme que nous ne savions pas
[ce] qu’il était.
Capital...
Quand je dis que ma mère est obligée d’aller à Combray.
Toutes les vertus cela faisaient
surtout la noblesse de coeur,
la franchise, la bonté, et
certain naturel aff Le La sim
simplicité d’Albertine, ses
[vrais] [ ?] rougeurs qui
plaisaient tant à ma Gd mère
les feras si naturelles qu’elle
avait du parler de moi avec
des moqueries où [en]
[sentiment]
une
amitié
presque analogue à celle de
ma famille, tout cela plaisait
tant à maman que sa
sympathie [ont] rejoint ce
bom [fond] pour [dite] bien
des défauts, bien des vices
qu’elle n’avait pas compris,
n’avait
pas
cherché
à
s’expliquer. Mais malgré tout
sa [prudence] était [ ?] pour
qu’elle fut [d’accord] Je ne dis
même +
+
Ma mère en en était ennuyée qui trouvait un peu bizarre
que cette jeune fille habitait seule avec moi était ennuyée
Absence nécessaire
de cette voyage à Combray. J’en étais au contraire
heureux car si ma mère était restée j’aurais été obligé ce
qui m’était infiniment contrarié d’être obligé de prévenir
Albertine que je n’avais pas dit à ma mère, que ma mère
ne devrait pas savoir qu’elle avait été liée avec Mlle.
Vinteuil. Ma mère, plus encore depuis la mort de ma
grand’mère, trouvait d’une naturellement de sa [profonde]
[ ?], mais aussi parce que depuis la mort de ma gd mère
(de ma gd mère admiratrice même de la vie de Georges
Sand) elle avait donné quelquechose de plus libre à sa
conception de la vertu et l’avait fit [constaté] surtout dans
la noblesse de coeur, puis aussi parce que mon influence
[ ?] l’avait rendu peu à peu indulgente pour des femmes
qu’elle voyait gentilles pour moi, [bonnes], et dont la
conduite était cependant de celles qui l’ont [ ?] à [Mont]
avec une des ses amies bourgeoises de Paris ou de
Combray, ma mère contre
225
20
21 13r.º
la joie que j’avais connue à Combray. La présence
auprès de moi
d’Albertine + ne faisait que m’épargner une souffrance et
dès que j’eusse senti qu’elle était séparée de ses amies et
que mon existance sa séparation [d’avec] ses amies ne
faisaient que m’épargner une souffrance, permettre à mon
que
coeur de réparer et permettre à mon coeur qui ne recevait
plus de nouveaux coups de ramener peu à peu comme un
la part une
partie
pensement sur le coeur qu’elle mon coeur blessée elle lui
permettait peu à de refaire réparer peu à peu à mon coeur
d’autant plus de se [fier] que
je
souffrais
mon
ma
souffrance de ce soir là se
guérissait peu à peu comme la
mort [parait] l’où de la mort
s’affaibli chez un malade qui
au fur et à mesure qu’il
s’éloigne de la crise qui a failli
l’empoter
de réparer les parties qui qu’avaient été blessées si b
violemment déchirées les paroles d’Albertine qu’épargner
à mon coeur lu renouvellement dans une sorte de repos,
d’immobilité à la faveur de quoi il pouvait peu à peu
réparer les parties qui ne avaient été si brusquement
déchirées, le soir où j’avais appris qu’Albertine avait été
La de vérité que j’avais eu
découverte ce jour là, si en
rapport avec toutes les
[ressemblances] que mon
instinct avait remarquées, de
[nouveaux] maintenant ma
raison, peut’être cherchant à
obéir au mon [ ?] dans mon
coeur, cherchait chaque jour à
me faire apparaître cette vérité
comme moins probable. Et
Elle pendant
l’amie de Mlle Vinteuil. Apaisé le soir par un baiser
d’Albertine, doux comme celui tranquille sentant qu’elle
de la sentir savoir
dorma et par l’impossibilité d’elle était de voir [réussite],
toute la nuit
dormant d coucher dans dans la me dans une chambre
le jour
voisine, le lendemain jour Je restais souvent couché de
+
fois [entendais] + soit des chevaux, soit un automobile
Albertine
226
pour
qu’elle
peut
se
13v.º
promener ou se distraire,
et tachat [d’un]
O pas le temps de se former si
on a toujours le [ ?] de
[remédier] à la peine comme
la faim ne [metrait] jamais si
on mangeait toujours
+ des mois des années, de
dévorer
un
[ ?],
une
désillusion avec cette longue
patience sous lequelle il n’y a
D
pas de génie. S ailleurs
l’amour n’a O
quand dans la marge je dis la seule réalité,
la réalité spirituelle, il voudrait mieux dire
donner la réalité spirituelle. Et j’ajouterais
entre parenthèses. ( Autant dire la réalité
sans plus, car il n’y a pas d’autre réalité
que la réalité spirituelle. Quand j’attendais
anxieusement le jour d’ après la soirée chez
la Dusse de Guermantes j’attendais
anxieusement Albertine qui ne m’avait
oublié, je [ ?] existait pour moi parce et n’existait
A un moment quelconque de ce chapitre, ou avant, ou
pour autre chose (mais mieux pour cela) quand je parle de
l’influence que peu [l’allerte] du mariage, les présents, le
teléphone (elle me telephonera de ses promenades) j’ai vu
Albertine pour calmer mes douleurs, je dirai (capital) qu je
dis qu’alors je ne souffre pas.
des réalisations naturelles qui
ne réalisent une [où] avec
l’autre pour rien, d’imaginer
de
c’est-à-dire
la
fois
d’agrandir de rendre plus
important, et de donner la
seule réalité, la réalité
spirituelle aux autres. Par là
les avantages sociaux et les
progrès de la [ ?] ne [ ?], dans
[ ?]
les
aventures
du
romanesque et su génie et
[ ?] developpera plus- il
mieux chez
ne’en moment
une jeune fille d’un pays
perdu laquelle n’a pas sous la
main d’anesthesi qu’au jour
plus souffrants qui m’oblige
même + +
Et peut’être à cause de cela les avantages sociaux, les
relations, la richesse, même les je s avantages collectifs
que donne les progrès de la [ ?] comme l’image du
telegraphe et du teléphone qui abreg suppriment l’attente,
qui permettent d’avoir une réponse de faire faire une
proposition, d’avoir la réponse, avant la fin de la jounée
sont-ils des lecteurs de poésie en etant [destructeurs] de
souffrance de [ ?]- par conséquent destructeur de
l’obligaton, au lieux de s’- [ ?] [ ?] à
227
23 14r.º
21
et
Pas pour elle parce qu’elle
existait dans ma pensée, non
dans la sienne ; son absence
me forçait à lui donner un
substitut mental dont sa
présence m’ont dispensé que
sa présence n’eut pas plus
égalée qu’une photographie
même si on la regarde n’est un
souvenir. Cette existance d’un
on
être selon quand pense, à lui
on ne peut savoir tout à fait
[abolie] pendant les heures de
distraction où nous ne nous
rappelons même plus que
nous devons le [voir] peut
servir de symbole au caractère
forcément,
exclusivement
spirituel, de toute réalité). –
Dans ce ces je continuerai (la
parenthèse fermée) à la marge
du verso en face : Par là les
avantages sociaux. Ou bien je
laisserai la parenthèse du
verso telle qu’elle est et ce
passage
sur
la
réalité
spirituelle je la mettrai par
exemple dans le dernier
chapitre de l’oeuvrage, dans
les conditions de l’oeuvre
[dont] ce qui serait peut’être
mieux.
arranger ce qu’Andrée vint la prendre pour qu’elle ne peut
m’arra
ngeat
avoir l’idée de chercher des distractions mauvaises, tachat
toujours + ce
amie
que quelque personne de à elle en qui j’avais confiance et
grâce à
de préférance Andrée vint la chercher le soir Sans doute
je n’était plus fermé à certaines
cet apaisement me permettait de goûter des g joies mais
loin de les devoir à Albertine, je les goûtais surtout au
pendant qu’elle n’était pas auprès de moi
contraire dans la solitude, pendant que mon amie était
pour qui je me faisait venir chaque jour soit des chevaux,
soit en automobile était allée se promener avec quelque
- depuis quand c’était possible Andrée-
personne en qui j’avais confiance et à qui j’avais demandé
de venir la chercher, de préférance Andrée La r Dès le
matin, avant la tête encore tounée contre le mur et avant
de quelle
était
d’avoir vu la couleur du jour avec de la raie du jour en
haut audessus des pardessus des grands rideaux des
que
fenêtres, les premiers bruits de la rue je savais déjà quel le
temps qu’ il faisait par les premiers bruits dans la rueme et + avait appris
selon qu’ils m’arrivait était arrivés étouffés amortis et
déviés par l’humidité où vibrait comme des flêches sur les
trajectoires dans les sonorités l’espace sonore et vide d’un
matin froid et pur- par le roulements du premier tranway
selon que je l’eusse sorti
que je sortais [m’enfondrer] dans la pluie- ou en partant
pour l’azur. Et peut’être les bruits eux-mêmes
228
Capitalissime
Quand je dis dans ce cahier ou
dans le dernier que je ne me
souvenais plus que rarement
de ma grand’mère. Ces
souvenirs
étaient
sans
douceur. C’était celui de
quelque chagrin que j’avais
fait à ma gd mère dont elle
avait dû pleurer et que j’avais
oublié de pendant longtemps.
Alors quand c’était dans tours
de revenie les heures penibles
de la s du matin comme ces
rares
gran chariots qui passent alors
et ébranlent tout, mon coeur
se mettait à trembler aussi fort
qu’un verre qui n’est pas
d’aplomb. En un instant mes
anxiétés de Combray étaient
revenues et rien n’aurait pu
me faire du bien que d’avoir à
côté de moi ma grand’mère.
ce
Puis en c souvenir si lourd et
si violent s’éloignaient et peu
à peu mon coeur reprend son
équilibre et laissat ses [ ?]
vibrations
14v.º
L’après le petit bonhomme (qui en face au recto) on avait
mis dans une des [ ?]. J’entendais les pas d’Albertine qui
allait et venait dans le couloir et rentrait et sortait de sa
chambre qui était à tout près de la mienne.
Ni le [sang] ni le sexe et le crime est égal.
Moi-même...
Je suis à cette loi comme une autre soumise
Et sans le prévenir, il faut pour lui parler
Qu’il me cherche ou au moins qu’il me fasse appeler.
on avait mis à la fin dans le cahier
L’après le petit bonhomme. J’entendais les pas
car
d’Albertine qui dans le couloir, le bruit de sa jupe, toute sa
ce qui était arrivé le soir à Balbec le soir où elle était venue coucher
chambre était près de la mienne. Cela me paraissait
à l’hotel, était maintenant
étrange de penser que sa chambre était en effet chez moi
cette
et de une pour jeune fille que j’avais cru jamais pouvoir
toute près de la mienne
connaître était en effet dans mon appartement et que cette
confusion d’être sous le même toit qu’elle que j’avais
[connue] à Balbec. Cette est l’[éxistance] de contenu de
sensuel que cela donnait. Cela était arrivé d’une f. Ce qui
était arrivé en s
Car je qui peut me rendre compte de tout l’emploi
De temps d’Albertine car toujours s’y serais allé si je n’en avais pas
en des [pensé] pouvant me r elle en [dépit] de moi, elle fut sortie
seule, car l’image d’Odette d allant chez Forcheville pendant que
Swann la croyait à la maison d’ou ou vingt ans plus tard se donnat à
Bloch dans le train de Passy me revient toujours à l’imagination. Mais
pour pouvoir rester couché comme le médécin me le conseillat tant en
n’étant pas tourmenté par ces craintes qui m’eussent fit mal je devrais
[ ?] assimiler Albertine à Odette, je m’arrangeais à ce qu’Albertine
n’[ ?] la venais chercher par celle de ses amies, Andrée de préférance
qui [ ?] avait fait en auto
229
Mais seulement quand je
décida à interronpre ma
solitude j’avais [sommeil].
Car on avait ordre quoique il
arr à cause de mon état de
santé on avait ordre de ne
jamais entrer dans ma
chambre quoique il arrivat
sans que j’eusse appelé, ce qui
me faisait toujours comparer
par Albertine à [Assuérus].
Elle avait joué jouais
Esther au couvent et aimait à
dire me dire en riant : Est La
mort est le prix de tout
audacieux, qui sans être
appelé se présente à ses yeux
Rien ne s’est à l’abri de cet
ordre fatal
Mettre ici le petit bonhomme
barométrique qui est dans
le cahier brun
Puis voir au verso
Le médecin en ayant [ ?] de
garder
à
peu
près
continuellement le lit je dis
répondais à Albertine qu’elle
serait pour une autre foi, et
La [trouvasse] d’
Sortait jamais seule mais je
[ ?] tout ce qu’elles
O ailles quand elles allaient
<ilegível> le chauffeur était à
ma [dévotion]. Ainsi calmé je
pouvais lui répondre
15r.º
22
odeur
les odeurs ou pe
mêmes avaient-ils été [dessinés] par quelque émanation
peut’être une odeur
plus rap rapide et plus penetrante, qui traversait mon
et éblouissant
sommeil même permettait mon être et la journée commençat en
harmonie si immédiate traverse mon sommeil même mettait mon
organisme en harmonie avec
à
la journée, y répandait une tristesse sous laquelle je pouvais
conjecturer que viendrait au dehors s’[ ?] la neige, on y déclarait dé
mettait en [ ?] tout des cris de joie de
ceutiques
mélodie chants en l’[ ?] du soleil que ceux-ci – finissaient par amener
mon réveil, un réveil en musique, comme on
quand je jamais (Esther q.q. part)
dit au régiment. Françoise m’apporttait mon [ ?], je regardais dans le
Figaro si ne s’y trouvait pas un article que j’avais écrit adresé à – seul
travail ma seule oeuvre depuis page écrite depuis tant d’années – que
j’avais envoyée à ce journal et qui n’y paraissait pas. Puis
il faisait beau
Albertine venait me demander si pour qui j’avais fit venir soit des
chevaux, soit en automobile venait me demander si je voulais pas
venir me promener avec elle. Tranquille,
car
m’étais
que
car Je m’arrangeais toujours à ce quelque amie à elle [ ?]
toujours
vint la chercher (quand je pouvais c’était Andrée) je lui disais que ce
serait pour une autre fois.
Capital Mettre ici ou plus tard, je lui avait acheté aussi un auto
automobile et pensais si nous nous marions, lui donner pour pouvoir
Et parce que je savais que c’était ce qu’elle [ ?]le plus
beau
L’avoir avec moi, un beau grand yacht qui nous ferait faire du mais
pour tout cela, et pour les surpris, de toilettes ou d’objets que j’aimais
à lui faire chaque jour, il fallait
Présents de
beaucoup d’argent. Ayant entendu [vanter] par Bloch des
parler
fortunes qu’on faisait en achetant à [terme] des titres [ ?] qui
remontaient ensuite, je profitais de ce que les consolidés anglais
avaient un peu laissé pour en acheter une quantité énorme, certain
d’après ce que nous avait dit M. de Norpois qu’ils ne pourraient que
remonter. Je les vendais à ce moment-là
Il faudra quand Albertine me je demande à Albertine si cela ne
l’ennuie pas d’aller aussi sans moi. Ah non j’aime toute la compagnie.
Aujourd’hui je crois qu’Andrée veut que nous allions à St. [ ?] une
fois je fus effrayé demander [Robson]. Je demandais à la place
[Versailles]
230
15.vº
Si el elle entre chez moi avant de sortir : Je [ ?] Sa joie av matinale avait la rougeur lisse de ces fleurs foncées
qu’on appelle pétunias ( ?) et je ne pouvais me laisser d’y poser mes lèvres
+ Comment [ ?] que [ ?] cette parole
prononcée entre tant d’autres un mensonge
si cachat. Mais je lui conseillais plutôt
pour ce jour-là telle promenade, telle
distraction
Note [ bene]
Capitalissime
<ilegível> que fois je dirai distractions,
richesses, plaisirs, mettre q.q. chose de
concret, souliers à brillants comme Mme
de Guermantes, écharpe comme Mme.
De Guermantes, [ ?] pou un auto, pour
un yacht. Quand je ne suis plus trop
capital plus loin chercher une bonne place
elle
jaloux. Puis que elle ne me trompait pas,
quand ce surtout alors
le elle semblat en somme vertueuse, le
me font commencer à me paraître bien compliqué,bien grave
mariage n’était plus nécessaire, le yacht
à peine [utile], [audessus] de moyens, ruineux.
231
16r.º
Elle me disait »je ne connais
pas les [Baltes Chammort].
Andrée prétend que c’est joli.
Il faudra que j’y aille
[promener]
une
fois ».
Comment aurais-je eu du mal
à ce qu’elle allat aux [Baltes
Chammort] +
Je lui conseillais sous telle
promenade que [fut] le temps
la sorte de journée qu’il
faisait, me qui à laquelle le
temps la sorte particulière de
journée qu’il faisait me
semblait convenir. Elle me
disait que puisque j’aimais tel
« Puisque cela a l"air de vous
plaire tant, faites un petit
effort, venez avec nous ».
Mais je les laissais partir.
Seules, car je savais bien que
seul dans mon lit, les désirs
En effet le médecin
<ilegível>
que ce jour-là je resterais couché. Elle me disait mais il
fait beau. Je le savais bien disait la belle q comme il serait
par ce beau temps
celle que je comprend
agréable de faire une longue promenade, par ce beau
temps. Mais je la laissais partir sans moi, car le désir
Seuldans mon lit
même de ce tous les plaisirs de cette promenade je les
dans mon lit
depuis
goûtais[reveillés] par-là le désir à l’appetit que la journée
[jour] au
commençant en avait éveillé en moi. Je savais que seul
[rappelait un jour]
dans mon lit le désir de cette promenade m’en ferait
goûter tous les plaisirs. Il n’y eut pas suffi s’il ne dans
Resté
n’vait été Elle. Seul dans mon lit, je ne prenais pas moins
ma part des plaisirs de la journée commun
tout autre jour
[communicante] ; Le désir d pure le désir purement
s’
arbitraire, le capri une la velleité capricieuse et purement
individuelle de les goûter n’aurait pas suffi à me les mettre
à ma portée si le temps particulier qu’il faisait ne me les
bien
images posées
av m’en avait affir plus plus qu’évoqué les souvenirs
affirmé la pa réalité actuelle présen réalité actuelle,
accessible immédiatement accessible à tous les hommes
qu’une circonstance contingente et par conséquent
négligeable ; ne forçait pas à rester couchés. Certains
beaux jours il faisait pourtant si froid, l’air était si [cris]
large
qu’il semblait qu’on [ait écarté] on était en si libre
communication avec la rue, qu’il semblait qu’on ait écarté
les jointures de la [ ?] disjoint les murs si
232
16v.º
elle aurait voulu surtout me parler de la question du mariage mais
n’osait pas dans ces lettres, mais se rattrapait à me parler de Combray.
Comme depuis la mort de ma grand’mère elle relisait sans cesse avait
toujuors avec elle les volumes de Mme de Sévigné avec des reliques
maintenant
les, un des volumes de Mme Sévigné qui ne quittaient pas ma gd mère
c’est à travers Mme de Sévigné qu’elle me montrait Combray ce qui
me faisait un effet singulier. Elle me disait
Vers dix heures venait la lettre de Maman car elle
m’écrivait tous les jours comme elle faisait d’ailleurs
autrefois mais comme elle ait moins manqué de le faire
maintenant car c’était [imiter] sa m ma grand sa mère qui
Et il n’y avait pas de joie
qu’elle ne me cite [avec] à
propos Mme de Sévigné
Comment ai-je pu appeler ma grand as mère. Ce jour je lui écris
lui écrivait tous les jours. Mon Dieu un jour je lui dis si sa
mère la reconnaîtrait dans cette exactitude. Elle me
répondit : « Je Je te dirai comme Mme de Sévigné mais
une fois je fis pire ; j"écris cela à maman même [ ?] : « ta
mère te reconnaîtrait dans la façon dont tu cites Mme. de
Sévigné ». Ma mère me répondit tristement : « Mon
si c’était
pauvre fils tu invoques Sévigne bien mal à propos pour
me parler parler de ma mère » tu invoques Mme. de
Sévigné bien mal à propos. Comme elle a tout dit c"est
Je te ferai la même réponse qu’elle fit
elle que je charge de te répondrai dit ce qu"elle répondrai (
car elle a tout dit) à Mme de Elle pourrait répondre
comme elle fit à Mme de Grignar : « Elle ne vous était
donc rien, je vous croyais parents ».
représentation des plaisirs que je pourrais avoir,
je [rougeais] sans impatience sans l’espérance du
plaisir [promis]. J’en remettais indéfiniment la
réalisation. De sorte que comme si elle avait été
la [comme] pour [ ?] la loi même de ma vie, la
procastination suit toujours [ ?] moi plus loin dans
l’avenir plaisir aussi [ ?] <ilegível> travail
233
Capitalissime
N.B Quand là, ou bien à
Balbec je parle des femmes
[échantillons] que je promets
de voir et avec lesquelles je
vis tranquille (je pourrai
l’avoir dit à Balbec et le redire
ici, d’ailleurs il faudra
reconsulter pour des bonnes
formes ces [plusieurs] cahiers
vert ou [toile] ou ce genre là je
dirai :( et ceci en tous cas
ajouter une varian+C’était un temps que je
ma nouvelle et
connaissais
intéressante) : g Généralement
ceux qui permet l’habitude de
remettre de jour en jour dessin
de travailler n’en saisissait
que plus fréquement les
occasions de plaisir. Il n’en
était de pas de même pour
moi. Je Une fois décidé que je
ferais la connaissance de telle
fille que bien que le « [aluno
disce orunes] » ne s’applique
guère à elles j’avais décidé
être
17r.º
24
la maison et le quand le tranway passait, son timbre
réssonait aussi
auprès de moi
frappait j auprès de moi, comme, comme eut fit un
couteau d’argent semblait frappant une maison de verre ;
le ciel lumineux
Le le soleil brillant donnait un de désir des fleurs, mais des
seules qui brillent encore dans la rigoureuse saison, fleurs
vermillonnées ou bleues comme celles qui émaillaient à
Combray, au fond de l’abside, le grand pesantier de verre
du temps de St Louis, et comme j’avais conseillé à
Albertine d’en aller voir de semblables à la Ste. Chapelle,
fleurs vermillonnées ou bleues, qui ont av elles aussi ont
besoin de soleil, mais, non de chaleur, mais de soleil pour
s’épanouir, l’absorbant pour mieux s’épanouir, et
cependant l’absorber tout entier car il en coule en leurs
pieds de grandes mares rêveuses sur les dalles, de grandes
mares rêveuses qui changent lentement de place. X
Françoise venait allumer le feu et parfois pour le faire
prendre venait y jetait quelques brindilles dont l’odeur
inaccoutumée et reconnue me rappe suscitait autour de la
dans lequel me
cheminée un cercle magique dans lequ où je voyais tantôt
à Combray, tantôt,
la chambre de Don lisait tantôt à Doncières avant d’aller
en rentrant de promenade
dîner me lever on avait d’aller dîner avec St Loup, tantôt à
Combray, avant d’aller marcher du côté de Méséglise, et
l’air
intercalait dans ma chambre de Paris des véritables plains
où je
de belles incrustation de ma vie d’autrefois, et même
renda
me réjoissais comme
234
17v.º
similitude des journées avec des plus anciens
Cestte évocations où où ne passent seulement debvant ses
qui ne nous montrait pas seulement vus alors
yeux l’apparence des choses, mais où on soulève de en s
au fond fond de nous même dégagent comme le [salpteur]
de bloc chaotique, l’homme oublié que nous fummes
quand nous vivions, et qui ainsi jour par jour nous appelle
à une autre vie, nous fait pénetrer dans une une autre
profondeur des choses, était celle qui convenait [ ?] à ce
que je’avais de plus profond en moi, qui me donnait les
joies d’une mémoire profonde, intéressant à son mon
souvenir les couches les plus souterraines de moi-même,
les soulevent [ ?] à la plus gdr profondeur. C’était le trait
particulier de ma nature, ces joies que j’éprouvais dans les
promenades avec Mlle de Villeparisis quand je croyais
reconnaître trois autres. Mais même pour ceux qui ne sont
pas ainsi faits, quand on a assez déjà un peu vécu, chaque
b [ ?] de pluie, chaque bouffée de chaleur, chaqué bouée
de br odeur de brume, déroule au de sa main invisible
déroule devant nous un petit tableau, paysage
sous
[ ?]
le’espérance d’être guéri
chaque le lendemain les
empêchait de n’être qu’un [ ?]
soucrire mais en faisait une
réalité à laquelle j’épérais [ ?]
mieux
que nous avons vu par un le bleu, au soleil, par un temps
de brume n’est-ce pas assez pour qu’il doit doux de vivre
les yeux fermés, surtout quand comme pour moi, la
maladie de chaque jour arrivait en moi le prire de ces
tableaux que je ne pouvais [ ?] et pourtant
Suivre en face. Ainsi je n’étais pas allé faire avec [ ?]
235
18r.º
25
si j’allais sortir du lit pour aller dîner avec St Loup ma
retrouver
prom dîner avec St Loup et ses amis où dî me promener
du côté de Méséglise. Ainsi en j’avais refusé d’aller g
prendre
Ainsi je n’étais pas allé faire avec Albertine sa longue
en
promenade ; mais mon esprit se’promenait davantage.
[ ?] avec mes ses
J’avais refusé Pour avoir refusé de jouir de cette matinée,
Pleinement, avec mon imagination
passées
je jouissais de toutes les matinées pareilles ou plutôt d’une
pareilles
matinée passée ou possibles, ou plutôt d’une matinée
comblait mon esprit de sa plénitude et
Je l’avais vite reconnue ; l’air
vif avait de lui-même tourné
la page où se trouvait
l’Évangile du Jour et qu où je
pourrais le suivre de mon lit
comme faisait autrefois ma
tante [ ?]
unique, éternelle, dont j’avais reconnu les signes toujours
apparition intermittente
elles n’étaient que l’
identiques. Et qui emplissait Elle comblait mon esprit de
sa. Sa plénitude combl Elle comblait sa pl mon esprit de
sa plénitude et lui communiquait une allégresse que mon
débilité
état de maladie ne diminuait pas. Notre bien être résulte
en effet
bien moins de notre bonne santé, de nos forces, que de
l’excédent de forces que nous n’employons pas, et qui
reste le même si nous que nous ne transformons pas en
activité. Le convalescent qui a faim comme un homme
bien pourtant jouit de tous les miets qu’on lui refuse
a travers la
encore ma force. A travers [le clous] ou [ ?], de
Convalescent qui effemé qui jouit de tous les miets qu’on lui refuse
encore, à travers la
+
transparente de mon corps un rayon de soleil, me
chauffait, en [ ?] comme un de verre une cloche de un
verre ; un
Ce Celle que
dont je débordais
j dont je débordais et qui je restais immobile dans ma
236
18v.º
Mettre (capitalissime je me à l’endroit où cela pourra se
bien
placer dans notre vie ; q.d avant la soirée Verdurin).
Capit
Souvant Je cherchais toutes les manières de faire plaisir ;
l’une était de lui donner de jolies choses pour sa toilette.
Souvant elle m’a
Pourtant quelquefois pendant qu’elle était sortie je me
levais et j’allais un instant faire une visite à la Duchesse
entre
de Guermantes. C’est que dans toutes les manières de faire
plaisir à Albertine – et je tâchais qu’il n’y eut pas de jour
pour moi
où je ne lui eusse un plaisir la joie d’un plaisir à lui faire –
une des plus certaines était de lui donner de jolies choses
pour sa toilette. Souvant elle m’avait parlé de quelque
ravissante brimborion ravissant écharpé, ombrellé, sac à
main ( ?), étole, elle avait me à madame de Guermantes.
par
de la fenêtre on en passait dans la cour, de ses yeux qui
distinguait si vite tout ce qui se
et longuement aiguisé. Choisi pour Albertine qui l’avait
aperçue comme voilée, pour moi qui cherchais à me faire
expliquer longuements par Mme de Guermantes en qui sa
particularité consistait, comment il me fallait m’y prendre
et où il fallait aller pour la commander, cette toque
<ilegível>
237
33 19r.º
celle dont je débordais et que je tenais immobile dans mon
lit, lit, tr me faisait tressanter intérieurment bondir, et
chanter, comme une machine sous pression qu’on arrête.
Alors, convalescent affamé qui jouit de tous les miets
me demandais si en
trop lourd pour moi de me
consacrer à un autre être,
qu’en vivant absent de moimême par cette présence
continuelle et en me suivant à
jamais dans
qu’on lui refuse encore je sentais que si j’ épousais
j’échouerais ma vie si je tant en assumant une la tâche fuites
Albertine je me privérais la fois à jamais des joies de la
solitude. et de ceux plus réels et encore inconnus Et pas de
ceux-là seulement. Même en me demandant à la journée
que des désirs, encore en est-il ceux qui provoquent les
personnes dont le caractère est d’être individuel, de ne
s’adresser qu’à un être, comme si aucun autre ne pouvait
les satisfaire et par conséquent qu’on fasse, si on y
des
substitue dans sa pensée un désirs différents si on leur
un cet
donne auxquels on donne pour objet un abstrait et,
contradictoire et inexistant, la Beauté. Aussi si je je’allais
écarter sortait de mon lit, j’allais écarter un instant le
rideau de ma fenêtre ce n’était pas seulement comme un
musicien qui a composé de tête et écouté dans sa pensée
s’assied un ins
et
les notes qu’il écrivait, moment un instant au piano pour
écouter écouter les notes qu’il a écrites dans sa tête
voir s’il est toujours bien à l’[unisson] avec son instrument
et vérifier la sonorité des notes qu’il a écrites -, pour
et sur les pavés
vérifier si la lumière du soleil dans la rue et sur le balcon
était bien en [diapason] exact de celle qui baignait mon
imagination, c’était pour apercevoir dans la rue quelque
frère jume blanchesse portat ses
238
19v.º
rapportait à l’élégance me à madame de Guermantes. Je ne répondais rien [ ?] au premier
porté par
jour mais j’allais voir la Duchesse pour tâcher de me faire expliquer ce que c’était où je
cela avait été fait. Comment je devrais le faire faire.
En quoi consistait le secret de bleiseur, le charme de sa manière ou la beauté de son étoffe car surtout je ne
voulais pas donner à Albertine dont le goût
toilette
Les femmes riches avec un bien de la multitude de leurs robes si jolies qu’elles jouent sont
toilettes
Si difficile avait encore été raffiné par Elstir de simples à peu près de jolies que [ ?] qu’elle et les jolies
choses
comme les visiteurs errants dans un musée, éblouis, fatigués, précédé de nul désir, dans un
Suivre sur la feuille collée au dos : Ces visites à Madame de Guermantes
seulement
musée donne bien vite une [ ?] de’éblouissement, de fatigue et d’ennui. Mais une jeune fille
pauvre et le jeune homme qui veut lui faire plaisir ressemblent à les étudiants qui ayant la
[force] livres sur un certain peintre, était d’après une reproduction, un tableau [ ?], devenus
amoureux de son art, se désesperent que leurs moyens ne leur permettent pas d’aller dans la
ville où on pourrait voir ses oeuvres. Chacunes de ces oeuvres là ils savent par des ouvrag
livres d’art, par des photographies, comment elles sont faites, ils en désirent les moindres
détails et enfin ils peuvent les voir elles viennent mon leur donner tout au contraire de la
fatigue infligé au valeur [ignorant] du musée, la satisfaction délicieuse d’une [ ?] préalable
+ Tandis qu’ D’Albertine, elle, je n’avais plus rien à apprendre. Chaque
jour elle était moins jolie, elle grossissait, et souvant elle était de mauvaise humeur, du moins à ce que me disait Françoise qui à vrai dire ne
l’aimait pas et que ce service supplémentaire gênait
239
Mais si le [ ?] de vie que me
laissait une telle vie me
laissait laissait plus heureux
en me faisant paraître la rue
comblée beautés
plus pleine de trésors que
rêve
le’imagination
ne
peut
imaginer parce qu’ils sont
individuels la vie plus digne
d’être vécue, j’avais soif de
guérir, de sortir, d’être et non
pas avec Albertine, d’être
libre, et parfois au moment où
j la femme inconnue passait
dans la rue, pi tantôt à pied,
tantôt de toute vitesse de son
automobile, je souffrais de ne
pas poursuivre [ ?] elle
comme une flêche tirée de
l’[ ?] de ma fenêtre par une
arquebesse et immobilisé la
fuite du visage où m’attendait
la possibilité des [ ?] que je ne
goûterais pas. +
35 20r.º
28
quelque [ ?] aux [ ?] de toile blanche
[paquets] quelque fière jeune fille aux cheveux roux, au
nez droit suivant son institutrice, et image que des
différences de lignes, peut’être [ ?] insignifiants,
suffisaient à faire profondément différents de touts les arts
et sans la vision unique de laquelle j’aurais appauvri la
journée dans plus unique particulier de tous les [bruits]
qu’elle pouvait proposer à mês espérances de bonheur. Et
puis parfois sous la fin de la ma Et puis parfois l sous la
fin de la matinée l’air froid s’adoucissait ; le ve timbre du
tranway qui et il y a une [ ?] perçait co de son fifre l’air
transparent et bleu comme avec une vrille, y chantait
comme un violon, et au milieu
Tout l’après-midi ma pensée suivait vaguement
Albertine dans sa promenade, découvrait un horizon
lointain, bleuâtre, autour engendrait autour du centre
Alors je voulais partir dès que je serais guéri partir pour
Venise, et comment le faire si A j’épousais Albertine, si
jaloux d’elle, je m’estraignais à nejamais sortir dès que je
me lever
pourrais sortir ce serait pour sortir avec elle. Ah !
240
O lisais, la phrase de Franck
ou de Vinteuil que je jouais
l’amour pareil
comme si l’art avait développé
en cela au bonheur
peu mon imagination de
pendant chaque fois
penser mon amour et comme
que je la cherchais plus
si on ne peut [vrai] se
retrouvait dans que je ne le
cherchais plus, et comme si
l’imagination
lui
était
nécessaire de [proposer] se
dès qu’un objet imaginaire lui
faisait sortir du [refaire] où il
se trouve, l’imagination.
+ avait autrefois inspirés
Albertine quand je ne la
connaissais pas encore et qui
j’ é qu’avait fait rentrer
renforcés le train train de la
vie de tous les jours. Mêlées
Gardat ce charme ambigu
d’être seulement l’une des
jeunes filles au bord de la mer
elle mais autrefois plus aimée,
elle que je trouvais laide
quand je la regardais, quand
elle était massaude, j’étais fou
d’elle quand c’était elle la
phrase sur l’amour de
Sthendal ou de Bergotte que
Shakespeare
ou de Bergotte que je O
20v.º
+ + + + que l’art remettait entre elle
et moi ces distances de l’imagination
qui me l’avait fait aimer à Balbec
quand je ne la connaissais pas et
Mêler cela avec ce qui est
ci dessous
31 bis
Quelquefois en l’attendant pour que le temps me semblait
feuilletais un album du Tableau d’Elstir
moins long, je prenais un livre de Bergotte je jouais
quelquech quelque phrase mélancolique de Vinteuil. Alors
Alors ma ma tendresse bien différente de l’ennui que j’avais
souvent
cette Albertine les rêves ce grand rêve qui avait dans cet
auprès d’Albertine, du sentiment médiocre qui m’arrivait quand je
acte que l’on fait pendant qu’on lit pendant qu’on écoute
pensais à elle, soudain en lisant Bergotte, en jouant Vinteuil, une
de la musique, pour [dire] dont remplir de pensée leur
[ ?ceuse] tendresse pour Albertine m’envahissait.[Autrefois]
forme que nous offre l’artiste Mais les formes verbales ou
on avait dit que c’était cette [appatie] et qui se traînait à [terre]les
musicales, ou picturelles, sont de la pensée, nous savons
médiocrités de la vie réelle, quand je jouais lisais Bergotte quand je
jouait
que ce que nous regardons ou écoutons, il [fut] fait le
pend pendant
penser si nous voulons le connaître. Alors, dans cet acte
on la qui [ ?] ou ou l’audition qui d’ d’une on
pour lequel nous dirigeons des pensées vers une oeuvre
d’art, vers une oe vers une oeuvre d’art de la
contemplation d’oeuvres que nous, pendant au cours de
nous le savons bien
nos
cet acte que nous de’oeuvres qui même si elles s’adressent
aux yeux ou aux oreilles mais à la pensée, au cour ne se
voient pas seulement avec les yeux et ne s’écoutent pas
seulement les oreilles, pendant au cours de cet acte où
nous dirigeons pendant au cours ce cet acte où nous
réveillat notre pensée nous lui
demandons à notre pensée de collaborer étroitement avec
nos yeux ou nos oreilles, pour prendre connaissance d’une
oeuvre qui n’est pas seulement semble seulement visible
et audible mais qui est en réalité intellectuelle ce que je
adapter
faisais sortir de moi, pour aller l’[amir] à la phrase du
poète
l’écrivain ou du musicien, c’était ces rêves que m’ +
241
29
où je ne savais ce qu’elle
pouvait
Vinteuil me [ ?] tendresse
soulevait
pour Albertine me’[adressait].
enlevait
Etait-ce parce que l’art
développait en moi une force
de sentiment dont je ne
disposais pas d’habitude.
Etait-ce que aurait je n’étais
pas peu [dressé] quand je
pensais à Albertine à me
figurer que j’aurais, que j’étais
aimé, que’elle grâce à elle je
connais un sentiment général
de l’humanité l’amour, de
sorte que tout ce
+ que j’avais entrevu déjà
quelquefois, et particulier par
exemple dans la nuit de
Balbec où un instant j’avais
fautes
pu ne considérer les aventures
passées d’Albertine que
chapitre
comme un récit qu’on a dans
un roman, et qui est sans
influence sur notre vie réelle
ceci va avec le recto les reste
de la marge avec ce verso
ce qui me parlait d’amour me
parlait d’elle. Etait-ce que le
désir ne se trouva comme le
bonheur ne se trouve pas
quand on le cherche.
et arrive quand il est recontré
quand on ne s’y attendais pas.
Etait-ce que + + + +
21r.º
Certes tout l’après midi je suivais ma pensée la suivais dans sa
promenade, décrivant un horizon lointain, bleuâtre, engendrait autour
du centre que j’étais une zone vide d’incertitude et de vague. Ah ! 37
si elle avait pu ne pas rentrer aujourd’hui, partie tout à fait.
Mon coeur qui depuis que’il ne souffrait plus, commençait
à ses plaisirs guérissaient, commençait à ne plus adhérer
au sien ; à pouvoir se déplacer sans souffrir je pouvais
[jouer] l’imagination l’éloig la déplacer, l’éloigner de moi
sans souffrir. Peut’ Sans doute je ne savais pas que si je à
dépit de moi, quelque autre serait son époux, que libre elle
aurait peut’être de ces aventures qui me faisaient horreur.
faisais pas
Mais je n’y pensais pas peut attachais pas d’importance,
peut’être parce qu’il faisait si beau, peut’être parce que
j’étais sur qu’elle rentrerait ce soir. Et même si l’idée
ma pensée pouvait
+ne pas rester dans
m’importunait, je pouvais par un acte vraiment libre sortir
de la [ ?] de mon [ ?] où l’hypothèse d’Albertine
appartenait à d’autres êtres et surtout à des femmes
mille fois
m’apparaissait comme la plus terrible de que la mort. Je
mille fois
me
pouvais sortir de cette [cen] en poussant les portes, je en
en faisant jouer
sentais jouer les grands assouplis, dépasser l’état où je
m’étais trouvé jusqu’ici, d’un mouvement à la fois
intellectuel à l’aide de quelquechose qui semblait à la fois
dans mon esprit et dans mon [ ?]
me [ ?] de la pensée et le mouvement d’un muscle, sorti
des préoccupations habituelles où j’avais été confié, je
riais à l’air libre, d’où le mariage d’Albertine avec un
possibles
autre, ses goûts pour les femmes, me semblaient aussi
[démées] et auxquelles il ne vaut pas la peine de rien
sacifier, que cela l’eut paru à quelqu’un qui ne l’eut pas
aimée.
242
21v.º
31 bis Capital
Quelquefois en l’attendant je charmais mon ennui à jouer
lui à laquelle
quelque phrase mélancolique de Bergotte Vinteuil. Sur
j’identifierais Albertine la mettre ou qui [ ?]que je l’[ ?] [ ?] elle [ ?]
faisait venir qu’allait venir
chez moi ou bien Françoise
me disait qu’Albertine n’allait
sans
doute
pas
venir
maintenant,
qu’elle
était
rentrée chez elle et avait
demandé du feu. Ap
Dès qu’Albertine était là ou venait me prévenir, et
j’entendais ses pas , le bruit de sa jupe dans le petit
Albertine me disait qu’
couloir ; tant sa chambre était près de je pensais comme il
était étrange que pour cette jeune fille que j’avais cru ne
jamais connaître, rentrer chez elle ce fut précisément
rentrer chez moi. L’impression d’ Déjà à Balbec le
premier soir où elle était venue coucher à l’hotel j’avais en
cette impression si nourissante du [ ?] et du désir
me fragmentaire à demi
L’impression incomplètement éprouvé à Balbec le soir où
elle était venue coucher à l’hotel était devenue
La complète
quelquechose de p s’était devenue complète et
stabilisée
permanente, du mystère, du plaisir sensuel, devenu
quelquechose de domestique, de presque familiel, enclos
dans les murs où je vivais [ ?] dans le couloir, sans même
mettant dans
et mettant faisant dans mon appartement quand de ma
chambre, ou de dehors j’y pensais, au milieu du vide qu’il
avait été jusque là un fruit auquel m6eme dans les
j’étais loin de lui
moments où je n’allais pas la voir je ne pouvais ne
pouvais revoir dans ma pensée qu’avec une collaboration
de tous mês sens qui goûtaient à lui, de tous mes sens
apaisés par la possibilité permanente d’y goûter encore
243
22r.º
30
39
s’était voilé et le temps s’était adouci ; le
jour gris tombant comme une
pluie fine, filant sans arrêter
une passementerie de nacre,
qui enveloppait toutes choses
dans ses filets transparents et
donnait aux rideaux de [tuille]
de la fenêtre le cassant
vapoureux et pol d’une aile de
libellule ou d’un verre de
d’abord
Venise. Mais l’absence du
soleil ne’ enlevait rien
[retiens]
empêchait [ ?] pas au jour
cette intensité <ilegível>
Cependant le ciel se voilait. L’après-midi restait sans
soleil. Un triangle Mais l’absence du soleil n’enlèvait rien
à l’intensité cette intensité du jour qui signifie quel ; qui s
signifie le temps qu’il durera encore.
La journée grise, lasse, résignée, occupée pour plusieures
heures encore à sa tâche immémoriale était intallée devant
la fenêtre, me voyait sans me connaître, comme une
ouvrière qui s’est installée près de la fenêtre pour faire sa
besogne et qui ne s’occupe pas des gens qui sont dans la
chambre.
Mais Enfin
tout à fait
carré
Cependant la nuit tombait ; un triangle blafard de lumière
blafarde venait par le couloir de la cuisine toute éclairée
le sommeil
me rappelait celui qui le premier soir à Balbec m’avait
du fond
écoeuré audessous du parquet de verre et celui aussi le
corridor le soir le soir s’
244
32 bis
22v.º
précède q.q. chose de capital
passait Ceci est la suite de ce qui est en face (passer 48 bis à ce [campagne] chez des amis)
+ on venait me prévenir dès qu’elle était là, et encore avait-on l’ordre de ne pas la nommer
voir au verso
si je n’étais pas seul, si j’avais auprès de moi Bloch, ou Mme de Guermantes, ou St Loup et
personne
j’attendais qu’elle fut rentrée dans sa chambre avant qu’elle de faire sortir la’ami ou amie
qui était venu me voir ; car je cachais qu’elle habitait la maison, et même, et même qu’elle
vient me voir tant j’avais peur qu’un de mes amis ne s’[approchait] d’elle, ne l’attendait
devant la porte ou que dans l’instant d’une rencontre dans le couloir ou dans l’antichambre,
‘ote mon chapeau mes affaires
elle peut faire un signe et donner un rendez-vous. « Tenez pendant que je me déshabille je
vous envoie Andrée elle est entrée une seconde pour vous dire bonsoir. Et x elle se retirait
ayant encore autour d’elle le grand voile gris qui descendait de sa toque et que je
lui avais donné à Balbec pour mon
vite comme si elle eut deviné qu"Andrée chargée pour moi de veiller sur Albertine allait
promenade en automobile et elle se retirait x
mettre quelque en me donnait tel détail en me racontant la rencontre d"une personne,
quelque détermination dans ces les régions vagues de cette promenade où jen"avais pas
<ilegível>
245
31
41 22 bis
désolation infinie, alors brusquement l’ordre des valeurs
dans la vie étaient se relo renversait brusquement pour
moi. Avant tout je voulais garder Albertine pour moi seul,
j’attendais anxieusement l’heure de son retour, je la [ ?]
[ ?] tous les soirs, de ne m’avoir
d’en avoir encore j’avais demander d’aller passer 48
dans toute
je
l’embrassais,
répond
avouais en réponse à ses
questions que je n’avais pas
travaillé
fait n’ayant
heures à la campagne chez des amis. + et toute la soirée,
je jouais
jouant aux cartes avec elle qui était assise à côté de mon lit
dans au moment où elle me laissait calme et confiant pour
je lui demandais ses baisers un apaisement comme je
sa
aller se coucher dans la chambre,si [proche] de la mienne
n’avais jamais connu depuis le soir où ma mère montait
m’embrasser à Combray. Sans doute tout ce que j’avais
dans un [instant]
imaginé autrefois d’Albertine quand je la voyais à Balbec
sur la [dège], n’était pas faisait sans que j’en eusse
l’avoir
conscience partie du plaisir que je trouvais à [ ?] toute la
cela seul c’était cela qu’
soirée cela auprès de moi, puisque ces [rêves]seuls avaient
d’o abord donné à sa personne ce [prix] sans lequel le rêve
ne s’attache pas à un être. Les longues [cènes] [ ?] des
caresses qu’elle m’avait accordées depuis pendant mon
second séjour à Balbec, n’étaient pas étrangères non plus à
soirs de
ce plaisir. Mais il s’y mêlait autre chose. Depuis les
Combray et les soirs où ma mère montait m’embrasser
quand j’étais dans mon lit, je n’avais jamais conçu à
personne un pouvoir d’apaisement pareil égal à celui
qu’avait sur moi Albertine. J’avais bien avoir douté
246
+ l’impression de sécheresse
vide
et de’ennui j’avais dans la vie
mondaine et même auprès
de
d’un ami comme Bloch ou St
Loup. La sensualité est tout de
même en nous quelquechose
d’assez profond pour donner à
son objet plus de consistance
que les plaisirs de vanité ou de
la conversation. Et puis elle,
n’était-ce pas
auprès d’elle les jours que
j’avais eus dans la solitude,
mais tout en regrettant, en
trouvant que dès qu’elle était
là, je vivais moins, je
m’ennuyais, pourtant ell je
n’éprouvais pas la auprès
d’elle +
parallèle à moi et que je ne
pourrais jamais m’approcher,
se détacher sur la mer
33
mon question habituelle
succédant
mon doute [ ?]
Ainsi ce petit fragment de réponse à l’ imense doute
que sur son temps
indolore que je relatif à Albertine à ce que faisait Albertine, doute qui
était trop indéterminé pour être douloureux, qui était à la jalousie ce
qu’est au chagrin ce commencement d’oubli où la calme naît de
[vague] – ce petit fragment de réponse posait de nouvelles questions.
en
je n’avais réussi à explorant pet partie de la grande région
en
qui s’étendait autour de moi que’passa en voir reculer
[l’incomandable] celui qu’est pour nous, quand par hasard
nous la représentons en
nous la regardons dans sur profondeur, la vie d’une autre personne. A
Elle s’était déshabillée
Albertine venait auprès de moi. Nous passions
Elle portait quelqu’un de ces jolis peignoirs en crêpe de chine dont
toute la soirée comme Assise au coin de mon lit elle jouait
j’avais demandé la description à Madame de Guermantes et pour
aux cartes avec moi, je l’embrassais en jouant s’essayait
lesquels afin d’avoir plus de précision x (suite au papier collé ci
sur mon lit que que nous puissions n mieux nous
dessous. Le seul doute est si : Elle s’était déshabillée doit veniraprès :
Albertine venait auprès de moi et assise en robe de chambre devant
mon pianole elle me faisait de la musique
embrasser. Sans doute Toute la soirée, nous jouions aux
l’
dames, non et sans cesse on, tout en nous embrassant,
sur ses joues refroidies, je me faisait battre pour elle, je causais
nous jouions aux dames, nous causions. Certes, je avec
Certes elle je m’y trouvait auprès de
elle. Avec Elle, la même fille ! Albertine la même Albertine – cette
jeune fille au fond de laquelle resi residait habituellement une idée de
moi fort familière, celle comme de la personne qui lui était sans doute
auprès sa tante, le moins étrangère de toutes, qu’elle distinguait le
la même
moins – de soi-même – que que celle dont j’avais vu la première fois,
l’image [rieuse] sous sa so sur la [digue] de
+
B à Balbec, sous sa polo [plate], avec ses yeux insistants
moi
inconnue, mince comme une allouette
et rieurs, se détacher sur la mer ; La celle-là et bien d’autres encore
qui venaient se rejoindre dans la
247
22 bis
Capitalissime
un
suivant
Ajouter à ce verso ou au ou au précédent.
charme
valeur
Oui, elle dans le jeux qu’elle aurait pour moi, il y avait
encore de tout ce désir que j’avais eu connaître les
jeunes filles dont le p cortège insolent et fleuri, se
dévoilait le long de la plage, de l’agitation que j’avais eu
alors, de la souffrance qu’elle ne savaient pas que je
connaissais
Sans doute dans une tendresse pour
Albertine
Robert de St Loup. Et comme dans l’amour que lui avait
[ ?] avait persisté
Robert
eu si longtemps pour Rachel, il y avait en si longtemps
même
persisté qu’elle même après qu’il l’avait fait renoncé à
elle, une fin de prestige de la vie du théâtre, sans doute
tout à la base de mon amour pour Albertine
Et sans doute, recouvrait d par bien d’autres choses,
avait
au fond de
persisté dans mon amour pour Albertine, - et au fond de
l’amour qu’avait en si longtemps Robert de St Loup
pour Rachel – chez lui, bien des années encore a même
après qu’il l’ont fait renoncer aux [planches] le prestige
de la vie
Albertine
du théâtre – et chez moi, même quand elle habite dans,
cloitrée par moi, dans ma maison, le charme, l’émoi, la
curiosité, l’émoi, le desarroi social, de la vie de bains de
mer.
248
L’amie [ ?] avec laquelle
jusqu’à ce jour je n’avais eu
que je n’avais pas le moindre
rapport
249
38
peut [ ?]
+ ainsi dans ma synthèse
de
aussi [ ?] que ces les plus
vastes de du Boulbon sur les
névroses familiales au regard
de la présence de la famille
que nous considérons à cause
de ses manies de [dévotion]
comme St
Mettre (capitalissime à la fin
de ces diverses journées de
farniente,
Seulement repos (ou autre
mot peu pour mettre en
opposition sans commencer
une phrase) peu apprécié de
Françoise qui disait « Et
Vous savoir êtes toujours
couché et savoir dans quand
que vous vous léverez ». Et
même un jour elle ajoute ce
mot : « Voilà monsieur qui
commence à faire tout à fait
comment celà pauvre Ml
Vitesse » me rapprochant
mettant au regard +
23r.º
38
d’elle m’être affligé, m’être demandé à [monsieur] si
elle n’avait pas eu des relations avec Mlle Vinteuil, une
fois qu’elle était auprès de moi, je déposais mes doutes
en elle, je les lui remettais pour qu’elle m’en déchargeat
comme on croyait fait sa prière, et je la prenais sur mes
sa figure
genoux, je tenais contre la mienne, c’ je la déshabillais
et je l’embrassais comme si elle m’eut administré
successivement toutes les pensées de son innocence et
me laissait goûter à tous les parties de son corps.
« ViendrezLe lendemain quand je m’éveillais c’était comme si je
vous demain avec nous, me disait-elle », s’il « où irezvous ? » »Cela dépendra du temps » Avez-vous travaillé
au moins tantôt ? » « Non ». « Alors c’était bien la
peine de ne rester ici. » Demain si vous ne voyez pas,
travaillez ».
Mais le lendemain comme si la maison avait voyagé
par un temps différent
pendant la nuit, je m’éveillais sous un ciel différent,
nouveau
autre climat
chaque jour
homme nouveau dans un pays, comme dans un autre
pays nouveau où on est un autre homme aux conditoins
duquel il faut s’adapter quelquefois quelquefois qd on
ne travaille pas en débarquant dans un pay Qd
On ne travaille pas en débarquant dans un pays nouveau
où on est un autre aux aux conditions duquel il faut
s’adapter, où on est soi-même un homme nouveau de
chaque jour était pour moi un jour d’arrivée. Parfois
250
23.vº
34
sa figure rebondie que j’embrassais, entre deux coups de
dame, j’embrassais sur les deux joues. mince. Elle
semblait alors dans un plan parallèle au mien que dont
et que voulant par
je ne pouvais jamais approcher, mais pour la
présentation chez Elstir, par mes paroles qu’elle avait
entendues, par une certaine idée, puis par nos relations à
Balbec, ma vie devenue perpendiculaire à la à la sienne,
avait pu la rejoindre q j’avais rejoint.
son image elle
Ces différentes années de ma vie elle occupait ainsi par
Hélas ce n’était pas que dans
ma mémoire c’était aussi
dans mon coeur qu’elle se
occupait
ainsi
diverses
positions successives. Entre
l’Albertine pour qui j’étais
inconnu, qui me recherchait
et celle d’aujourd’hui qui
n’embrassais
pas
que
machinalement certes, la
distance était grande. Mais
enfin je me disais que
l’Albertine d’autrefois était
contenue
dans
celle
d’aujourd’hui
et
la
possession de toutes calmait
je me consolais de ne plus
être aimé par ces anciennes
en les possédant toutes. Les
images + successives
qui derrière [ ?]
rapport à moi des positions différentes qui me faisaient
[ ?]
des
mieux sentir la beauté des espaces éc interférants. Et
[ ?] écoulées
étaient
maintenant c’était toutes ces Albertine venues se rendre
en celle des années où j’étais resté sans le voir, de tout le temps
sous les jours rebondie dont j’en m’arrêtant un instant de
écroulé sur la diaphane profondeur duquel qui mettent
jouer aux dames j’embrassais les joues rebondies et
duquel
donnait un singulier relief sur la profondeur desquelles e
elle se modelait l’image que j’avais auprès de moi se
relief et des ombres
modelait avec un puissant. et [ ?] relief. D’ailleurs ce
n’était pas seulement que ce volume cette multiplicité
qui l’augmentait son volume n’exist ce n’était la
multiplicité de les images d successi successives qu’elle
Albertine
donner
avait été pour moi m n’étaient pas seules à lui faire ce ce
qu
volume. Elle même avait multiplié Pour elle-même, elle
avait multiplié, s’était [accrue] par la supposition à une
nature autrefois à faire formée des qualités, des défauts,
répétant
qui allaient se développant, s’inrichissant développant
poussait
des vertualités que je n’avais pas connues indiquait ici et
là comme des [ ?] hors d’un une graine qui se divise et
fruit tels traits de caractère que je n’avais pas connus et
qui
251
Seulement je commencerai
par le jour chaud et je finirai
par navigation.
pour décidément je laisse
comme c’est.
45 24r.º
39
D’ailleurs aurais-je reconnu son Et ma D’ailleurs
même habitudes toujours idéal
comment aurais-je reconnu mes paresse ? quand, une
ma paresse
que pourtant des [ ?]imédiatement mauvais la résidence dans la
fois par un la pluie tombait doucement sans
maison situé au milieu d’une pluie la réclusions dans ma chambre
descontinuer autour de la maison la réclusion dans une
avait la égale et continue avait [ ?] et fraîche
chambre avait la silencieuse et fraîche silence douceur,
tout le silence calmait, tout
et quand une autre
et l’intérêt d’une navigation ; et une autre fois, par un
c’était comme
jour clair, en restant immobile dans mon lit comme un
autour d’un tronc d’arbre
une fleur je laissais la lumière tourner autour de moi
autour
une fois
comme d’un arbre ; ou que une autre fois encore quand
dans
air tempêtueux
tiède
par un temps [tempêtueux] et doux dans leq où dès le
; ou bien j’avais dès l’aube,
discerné un jour tempêtueux
des [ ?] doux
et très do, aux cloches d’un
couvent voisin à faire
blanchissants
que j’avais discerné déja discerné dans l’aube aux cloches
l’aube matin, les cloches les fin de d’un couvent voisin à peine
blanchissants, rares comme les dévotes matinales clair –
clairssemées comme les gouttes de pluie éclairait
fondait et
le ciel sombre de leurs incertains giboulés que dispersait
entendu
le vent tiède, tour à tour j’avais entendu le vent se prolonger comme
un tonnerre qui s’achète [caresse] et
je voyais
moins [clair] d’une [ondée] intermittente
j’avais vu au soleil voyais au soleil intermittent les
que
sèche un souffle ou un rayon
ardoises toits laisser leurs ardoises irisées et laissant tou
glisser
une
gouttes de pluie
égoutter en roucoulant les gouttes de la pluie qui sèche et laissaient
leurs ardois avec le soleil momentané leurs
je
ardoises irisées comme des gorges de pigeon, puis
puis
à tourner
entendais le vent recommencerait se commander ; et prolongeait un
tourneur qui s’éclairait en caresse ; et à la fin de la journée me
remémorait et a la journées pleines
incidents atmosphériques
chargées d’incidents atmosphériques s’y est enlévez, et
dont
oisif
d’une activité à laquelle le paresseux croit avoir pris peut-être
parcequ’il
eux
il
où si l’on n’a pas ag le temps agit, sinon doux [ ?] et qu’on ne croit
lui
ils n’ont
pas plus avoir [prendre] parce que’on [ ?] rien
252
24v.º
[ ?] aux amours, aux voyages, au [labeur], se retrouve [ ?] dans la
marge de 40, là où j’aurais inséré ce morceaux
(en face)
Pour ajouter dans la marge de la page 40 à peu près à
« Alors lui apparaît le [ ?] de temps »
La vie parait Alors la vie prend soudain une valeur
qu’elle n’avait pas avant la menace de danger, mais
qu’elle prendat quand si celui-ci est écarté. C’est que
ce[ ?] Soudain la vie prend à nos yeux une valeur plus
grande mais c’est parce que nous la considérons y
mettons tout ce qu’il semble qu’elle peut donner, et non
pas ce qu’elle nous donne habituellement, c’est à dire ce
qu’en réalité elle peut nous donner. Nous la voyons non
telle que notre expérience nous a appris que nous
savions la faire mais telle que notre désir pourrait être le
extraordinaires
plus satisfait. Aussitôt elle se remplit de voyages,
[nouvelles][ marges]
Après ces 2 e premières
lignes de 35 se placent ces
feuillets détachés intitulés 20
bis et que je pourrai faire
précéder après ces 2 lignes
(après somptueusement) elle
s de devenait une musicienne
montrait se un g vif goût
pour la musique. Je lui avait
acheté un pianole et souvent
à peine la 1er. partie de
dames finie elle me disait : «
Voulez-vous que je vous
joue quelquechose ? »
Chaque soir j’hésitais
d’abord. « jene sais pas trop
si à cette heure-ci cela ne
peut pas ennuyer la Duchesse
de Guermantes qu"on
joue. ».Son visage
s’assombrissait un instant,
car les riches qualités qui
ponctifiait en elle la faisaient
cependant dans l’envelloppe
bourgoise que sa famille lui
avait donnée en naîssant. Et
elle prenait à entendre parler
des gens plus brillants
qu’elle le même air froid
d’amours, d’oeuvres, dont nous allons être privés si la
mort arrive. Hélas pour que nous en soyions privés il n’y
a besoin de la mort, la vie suffit. Le danger passe, les
mêmes +
35
tels traits de caractère que je n’avais pas connus et qui
l’enrichissement, l’ard alourdissait la teignant et la
valeur
teignant somptueusement. Prix que le désir ajoute à la
peut ajouter
vie Quelle valeur le désir ajoute à la vie ! Quand je ne
croire
connaissais pas Il n’avait, quand je ne connaissais pas
Albertine, donné à croire que touts ses actions rend
sa vie intéressante
donné croire que tout ce qui elle faisait était intéressant.
Etrange
Et maintenant Merveille Quelle se Quel plaisir de
ce
qui ne nous paraisse
s’apercevoir que sous un être qu’on n’était pas pour
nous qu’une image il y a une vie qui se développe parce
que nous y avions trop pensé ne nous semblait plus
qu’une image,
253
qu’eut pris sa tante. Mais
souvent elle riait : « D"abord
on ne peut pas. Suivre 20 bis
feuillet détaché
il y a un être qui existe et croît et pas seulement par
rapport à nous, une merveilleuse image, et qui du reste
s’anime
(N.B plutôt d ; une figure
pour une sorte de magie descend chaque soir de son cadre
de la du frèsque de Gozzoli cela que j’avais cru voir passer devant
et vient jouer aux dames et se laisse embrasser, il y a un
la mer et de même rappeler plusieures fois le disque de [ ?]
être qui existe, croît et pas seulement par rapport à nous.
des yeux nous)
Au reste si quelqu’un venait me demander queje ne
disperser
dire quelques mots
pouvais me’empêcher de recevait, je faisais disparaître
pour lu quelques instants un instant la mystérieuse vie
intense et bien il n’est peut’être pas un seul de mes amis
apercevoir
qui ait pas réussi à connaître cette vie intense ne sont
mystérieuse
restée aussi inconnue que celle pour qui le marquis
d’Effiant, dans les mois qui précéderent sa mort trouvait
toujours le moyen de renvoyer à une certaine heure les
personnes que [ ?]
254
25r.º
+ (Et après qd je dis qu’au contraire on agit moins bien
après) la soumission à la règle n’est pas le fruit des heures
d’exception, mais la mais la pratique de la sagesse ne dans
d’un d’un plaisir qu’on osait à faire espérer. (mais
on est sou
[pendant] d’une souffrance)
Pour ce que j’ai ajouté en marge de ce recto (en haut) sur
les événements autres que barométriques (et cela serait
peut-être
mieux pour un duel, ou la Berma), dire bien nettement,
cet il semble que ce soit le seul empêchement, on pense à
tout ce qui, même Les lui empêche aussi, la vie redevenant
merveilleuse pour la raison que comme on pense à tout ce
même
qu’il empêche, qu’on oublie tout ce qui sans lui empêche
aussi, la vie reprend la beauté d’un âge d’or <ilegível>
malheur les jours parce qu’on fait tout ce que l’événement
peut appréhender, et qu’on oublie tout ce qui, même sans
lui, empêcherait. Mais cela on le retrouve dès qu’il est
produit +
255
Et d’ailleurs quand même ce
qui était arrivé c’eut été des
grands événements autres que
barométriques
quelle
inflluence aauraient-ils pu
avoir sur mon travail. Un
paresseux va se betre en duel
dans
des
conditions
dangereuses. Tout d’un coup
Alors lui apparaît le prix du
temps dont il aurait pu profiter
pour accomplir son oeuvre les
charmes de la vie dont il a
négligé des jours. Ah ! s’il
n’est pas tué, à la minute
même il se met à travailler et à
jouir. Il revient du duel
[indenme] ; mais l’événement
ne peut exalter en nous que ce
qui s’y trouve chez le
laboureux, le travail chez le
paresseux la paresse [ ?] dit :
Pour aujourd’hui congé et ce
congé il ne l’emploie même
pas qu’au plaisir. Car le il se
retrouve en [ ?] des mêmes
difficultés
des
mêmes
habitudes dont le regret ne
donnait pas compte. [ ?] la vie
[devient] un passant si [ ?] un
moment où elle allait lui [ ?]
redevient si [ ?] [ ?] il ne s’[ ?]
pas et se dit de travailler
demain
Pas paraître davantage [vide]
au
paresseux
qu’au
fonctionnaire ces
Ce jour là comme tous les
précédents
étaient
mon
[avenir] depuis ma veille
résolution de travailler prix à
Combray, et qui me semblait
dater d’hier. Je me
25v.º
40
fait qu’un temps de [guerre] le fonctionaire dont le bureau
est resté fermé mais qui fit le voir dans le journal puis veut
recommençait à former, journées chargées d’incid
+
remplies d’incidents atmosphériques et que l’oisif tant il
chargées
elle lui apparaissais aussi remplies d’incidents
qu’elles ne pouvaient
atmosphériques comme il n’y a pas qui semblent plus
un fonctionnaire
remplies que les journées du temps d’événement où le
il
fonctionnaire n’a pu aller à son bureau mais il où son
le journal
journal il apprend par son journal tout les les ce qui s’est
passé si lui même n’y a rien fait et dont son esprit tire
inutilité et son oisivité [excède], bien que ce ne soit pas luimême qui l’ait accompli.
Comme ce duel[ ?] sorti [ ?] et sauf de la rencontre je me disais que
Le lendemain Je met mettrais à l’ouvrage le lendemain ;
le lend
sous un ciel
[ ?]
mais je n’y étais plus le même, dans un climat différent ; et
sous ce soleil éclatant resta tout le jour les yeux clos c’était
chose une permise, plaisante, visitée, comme de tenir ces
persiennes fermées contre la chaleur sans
coble
nuages ; le bruit des cloches, plus précieux que le miel qui
ne contenaient que de la lumière, non pas seulement
comme lui de la lumière, mais la sensation de la lumière ;
et pour être celui qui s’était tant attendri comme une grâce
aussi
à midi Combray sur notre table desservie il gardait un goût
de confitures. Et Par ce soleil éclatant, rester tout le jour
souhaitée et
les yeux clos c’était chose permise, visitée, plaisante,
visitée, comme de tenir ses volets persiennes fermées
contre la cha
256
26r
.º
en entrant
mon
Tantôt quand
Quelquefois elle me disait : « Vous avez reconnu mon pas, vous avez déviné
que c"était moi ? ». Et moi, lui caressant les cheveux je répondais : « Est-ce
qu"on pourrait se tromper ? Est-ce qu"on ne reconnaîtrait pas les pas de sa
petite bécasse ». Et comme elle allait se partir se coucher, je lui disais,
laissez-moi défaire vos bottines, cela me fait tant de plaisir ». Et dans ces
mots je reconnaissais cuex que me disait à Balbec ma grand’mère. Car je
n’aimais pas seulement Albertine sans compter de bien d’autres façons et
nottamment celle dont Swann aimait Odette comme j’avais aimé ma
grand’mère mais aussi comme ma grand’mère m’avait aimé. Et je ne veux
pas dire par là seulement que mon amour pour Albertine avait quelquechose
de
même temps que d’impur, d’à la fois filial et maternel,
mais aussi qu’à partir qu’on ce <ilegíve> beaucoup
éveillons
en nous ce <ilegível>
257
Je metterai le 35 (oeuvre
peinture descendre de son
cadre avec ce qu’il y a dans
les feuillets détachés, il faudra
en effet peut’être mieux que
l’étonément fut que ce fut
toute
assise
jouant
la
bicyclette qui se pedalait au
pianole au [bien] de la
bicyclette ne pas oublier cela
qui n’est [ ?] peut) et de là je
dis que j’aurais pu avec tout
ce que je déposais pour elle
avoir une colléction acheter
des Elstir mais n’était –elle
pas une oeuvre d’art aussi.
Longtemps désirée et enfin
jalousement possédée (mettre
mieux. Puis : Certes (c’est à
dire cette page-ci 36)
26.vº
36
auprès de lui sans qu’elle aient pu jamais réussir à plus
qu’à il entendre parler dans sa chambre quand on était
[persuadé] qu’il était seu. Mais tous ces
Certes
les multiplie
Mais tous ce désir qu’ certes amour qu’elle m’avait inspiré
chaque amour différent
autrefois origines le désir successifs que m avait inspiré
Albertine, était présent présents dans le besoin que j’avais
encore
était, dans un se présent et q car puisque seul le désir
pour nous
d’une s personne
donne de l’intérêt à la vie, au caractère, aux propos d’un
des êtres
si multiple
être, calme que su av, chaque année différent, que m’avait
inspiré Albertine était, en se présent dans ce besoin que
d’aimer
j’avais de garder ainsi Albertine tous les soirs auprès de
moi. Mais autre chose s’y était ajouté : un pouvoir
+
d’apaisement qu’elle avait sur moi, tel que je n’en avais
ma mère
pas connu de pareil depuis celui que m’apportait chaque
quand elle venait m’embrasser dans mon lit
soir à Combray le baiser de ma mère. J’avais peu avant
qu’elle fut rentrée douté d’elle, l’avoir imaginée autrefois
dans la chambre de Montjouvain, une fois qu’elle était
auprès de mon lit, je déposais mês doutes en elle, je les lui
remettais pour qu’elle m’en déchargeat, avec l’abandon et
dans l’abdication d’un croyant qui prie.
Toute la soirée elle avait pour pelotonnée en boule sur
grosse
mon lit jouer [espèce glanet] avec moi comme une petite
Et alors ces [ ?] comme son petit rose qu’elle diminuait encore peu
chatte. au petit nez rose, quand elle me quittat pour me
un petit air lequel suffisait pour [ ?] pour
dire bonsoir, c’était leur douceur devenue p familiale que
j’embrassais dans les
258
Capitalissime
Mettre probablement dans le
verso en face avant que je dise
qu’il y a de l’amour filiale. Je
viens de parler des baisers. Un
jour
pendant
que
je
l’embrassais aussi j’ai aperçu
dans la <ilegível> ce [ ?]
frappé de <ilegível> de
dévotion de la [tendresse]
passionnée avec laquelle je
l’embrassais en l’appelant
mon enfant. On aurait dit que
oubliant q je’avais oublié
consecutivement sans [ ?] en
oubl rien fait de repréhensible
en oubliant Gilberte, de même
que peut’être plus tard je ne
ferais rien de repréhensible en
oubliant Albertine, et que je
remplissais comme un oeuvre
sacré ma dévotion passionée
douloureuse à la jeunesse et à
la beauté de la femme, qui là
où elles étaient incarnées pour
moi dans le moment. Et
pourtant ce n’était pas que la
jeunesse des femmes indique
le souvenir de Balbec Suivre
en face
t
ongue
mêche de ses cheveux, elle
fermait à demi les yeux
[décroisant] ses [ ?], elle avait
l’air de dire, fais de moi ce
que tu veux, et par peur de la
[ ?] je n’osais pas en profiter.
M Elle avait peut’être cette
petite fille vicieuse toute la
journée. Mais quand elle me
quittait pour me dire bonsoir
suivre au verso en face
dernière ligne.
Faire d’elle comme je l’avais
remarqué à Balbec et le 1er.
jour où je l’avais embrassée
une autre femme, mais que
cette image lui donnait un pas
sa figure était +
26bis
contre la chaleur. Mais Par un si beau temps, Albertine
avait du aller loin. Que pouvait-elle faire des ces
promenades. Toute la’ journée après-midi ma pensée lui’
bleuâtre, bleuâtre
y suivait décrivant un horizon lointain, engendrant autour
x
vide
du un contre que j’étais, une zone indéterminée vague,
bleuâtre
autour déterminait
vide, pratique dans laquelle Andrée mettait rétrospectivemettent détermination
retrospectivement, parlait des quelques
ment une un point, détermi, en mol indiquant tel détails,
en me parlant d’un mon doute,
de la rancontre d’une personne, s petit fragment de
mon doute incertitude
réponse à l’ immense question que je me posais
relativement aux actions d’Albertine, trop va indéterminée
pour être douloureuse, et qui était à la jalousie ce qu’est au
chagrin le’oubli commencement d’oubli à le calme [vent]
de vague. Mais le fait qu’Andrée me racontait, [ ?] il était
une réponse, posait à son tour beaucoup de questions.
Elles avaient rencontré une amie dont Albertine ne
m’avait jamais parlé. « Qu"ont-elles dit ». « Je ne sais trop
car j"ai profité de ce qu"Albertine n"était pas seule pour
aller acheter de la laine »me répondait Albertine qui était à
la fois ma confidante et la gardienne d’Albertine.
« Acheter de la laine ? » : « Oui c"est Albertine qui me
Raison de plus, pour ne
l"avait demandé ». « Elle vous l"avait demandé pas y aller
c"était peut-être pour vous éloigner. « Mais non, elle me
l"avait demandé avant que son amie fut là » « Ah ! Mais
qui sait si elle l"avait pas donné d"avance rendez-vous à
son amie et n"avait pas confirmé un [télégramme]
259
en [ ?]
mon
Et alors de mo instinct comme
pas, peut’être égaré par la
jalousie, ranimait d’autres
vérités comme celle qu’elle
aimait les femmes, celle
deux
d’autres vérités qu’elle se
gardait bien ne me disais
jamais en tous cas mais qui
me semblaient hélas prof
possibles : d’abord que qu’elle
se
sentait
surveillée,
empêchée
soupçonnée,
surveillée, empêchée de se
livrer à son des vices ; et une
autre plus terrible : que
peut’être elle avait décidé de
se soustraire à cet esclavage et
qu’elle me quitterait
27r.º
45
dont son visage comme rond comme un oeuf rose était
rempli. Parfois il fallait elle était obligée de m’en
Pour ajouter vers le bas de la page (après les mots : sans cela elle
n’eut pas tellement tenu à cette visite) X Il est vrai qu’elle ne m’avait
pas dit : « J"y tiens ». Malheureusement suivant dans ma vie ma
marche inverse de celles des [peuples] qui, ne se servant de l’écriture
phonétique qu’après l’avoir longtemps considérée comme une suite de
symboles, moi qui pendant tant d’années n’avais cherché la vie et la
pensée réelle des gens que dans ce qu’ils n’en disaient directement je
n’attachais plus au contraire d’importance qu’aux témoignages qui ne
sont pas une expression [ ?] analytique et directe de la vérité ; pour les
parles elles-mêmes elles ne me renseignaient que comme les brusques
rougeurs ont des silences subits. Tel advent chimiquement forcé parle
rapprochement involontaire de deux idées que l’interlocuteur
manière nonchalante dont elle disait : « Je ferais, peutrelativement à son projet était
être, je ne sais pas si j"irai »et qui était une manière à la
fois d’en notifier l’intention, d’en préparer les moyens et
d’en diminuer l’importance.
cette fois elle fut de son projet qu’elle avait, elle fut
Parfois elle était obligée de m’en dire un mot, je
faire
visite
comprenais qu’elle voulait aller le lendemain déjeuner
chez les Ver aux Verdurin, ce qui en soi-même ne m’eut
en rien contrarié ; Mais quelle personne devait-elle y
aboutie
rencontrer, à quel plaisir cette visite devait-elle la conduire
eut résolu
pour qu’elle en eut un désir que je pouvais [ ?] à vouloir la
faire une énergie que je pouvais mesurer rien qu’à la
nonchalance qu’exprimait assez la nonchalance avec
laquelle elle disais Mais certainement elle di c’était pour y
rencontrer quelqu’un, pour arriver à quelque plaisir. Sans
tenu
+ de son énergie
cachée
cela elle n’eut pas aussi obstinément résolu
irréversiblement tellement tenu à cette visite. Or elle
avec une nonchalence
qui était à la fois apparence +
m’avait dit « Madame Il serait possible que j"aille demain
chez les Verdurin, je ne sais pas su tout si j"irai ». Et le
ton doubitant elle employais
260
27.vº
37
deux côtés de son gros coin que je ne trouvais jamais
Viendrez-vous avec nous demain ? » « Où
moi
assez [ ?] à assez gros grains. Elle aussi en embrassant
Irez-vous ? » Cela dépend du
temps. Avez-vous seulement
était quelquechose tantôt ?
Non ? Alors
était fait quelquechose
alors Avez-vous seulement travaillé tantôt.-Non ? Alors
c’était bien la peine de ne pas venir avec nous. Permettez
Mettre ça [ ?]
moi que demain je vous ne venez pas vous travaillez »Puis
« Oui, mais ne remettez pas encore votre peignoir vous êtes qui est
ça dans
si gentille comme cela tout en blanc dans les dentelles. Puis c’était
mon tour ête
c’était son tour de me dire bonsoir en m’embrassant aussi
si incomparables, [ ?]
Et si différent que ce faveur
fussent ces deux fins
fut de celui que m’apportait
chaque soir ma mère à
Combray, Albertine me
Albertine
donnait pour remettait pour la
[ ?] me remettait alors
nuit un viatique aussi d
qui
calmant que ma mère quand
elle en venait poser ses lèvres
sur mon front. Combray,
quand avant du
Après ce verso reprendre au
recto à peu près 4 pages moins
loin. Mais le lendemain
comme si la maison avait
voyagé
de[changeant]du
dans le cou, les ai as chevelure donnait me caressait à
dans ma bouche
droite comme une aile.Puis elle glissait un instant sa
de
no
langue, comme un un alime une sainte et divine et
quotidienne
nourriture dans ma bouche chaude et douce comme un
pain quotidien, nourricer nourrissant et presque sacré.
Mettre ce [ ?] de phrase à la fin du morceaux(ainsi : à
Puis ; car les souffrances que nous avons [endurées] à
à Combray : car les souffrances que nous avons endurées à cause
cause d’un être, finissait par donner à sa chair une douceur
O d’un être comme je ne moi à cause d’Albertine finissant par donner
à sa chair une douceur morale
morale, quand au dernier instant avant de me quitter, et si
différents de nécessairemant différents, si incomparables
que fussent l’un et l’autre besoin, quand Albertine glissait
un inst recevait un instant ma langue dans sa bouche
glissait
comme dans un nid et [ ?] dans ma bouche sa langue,
petit
chaude comme un pain quotidien, chaud, nourrissant,
presque sacré, elle me remettait – si in demesurément
différentes, si incomparables sans que [poussant] l’un et
l’autre baiser, un viatique aussi sur pour toute la nuit que
tenait sa joue
ma mère quand elle venait poser ses lèvres sur mon front à
mes tempes, chaque soir, à Combray, j’avais dit à
Albertine que je travaillerais le lendemain
261
en [ ?]
mon
Et alors de mo instinct comme
pas, peut’être égaré par la
jalousie, ranimait d’autres
vérités comme celle qu’elle
aimait les femmes, celle
deux
d’autres vérités qu’elle se
gardait bien ne me disais
jamais en tous cas mais qui
me semblaient hélas prof
possibles : d’abord que qu’elle
se
sentait
surveillée,
empêchée
soupçonnée,
surveillée, empêchée de se
livrer à son des vices ; et une
autre plus terrible : que
peut’être elle avait décidé de
se soustraire à cet esclavage et
qu’elle me quitterait
27r.º
45
dont son visage comme rond comme un oeuf rose était
rempli. Parfois il fallait elle était obligée de m’en dire
amener dire un mot
quelquechose, je comprenais qu’elle voulait aller ici ou là,
faire telle ou telle chose, je ne savais pas pourquoi, dans
quel but, pour arriver à quel plaisir, mais je savais qu’elle
voulait rien qu’à la manière nonchalante dont elle disait :
relativement à son projet était
« Je ferais, peut-être, je ne sais pas si j"irai »et qui était
une manière à la fois d’en notifier l’intention, d’en
préparer les moyens et d’en diminuer l’importance.
cette fois elle fut de son projet qu’elle avait, elle fut
Parfois elle était obligée de m’en dire un mot, je
faire
visite
comprenais qu’elle voulait aller le lendemain déjeuner
chez les Ver aux Verdurin, ce qui en soi-même ne m’eut
en rien contrarié ; Mais quelle personne devait-elle y
aboutie
rencontrer, à quel plaisir cette visite devait-elle la conduire
eut résolu
pour qu’elle en eut un désir que je pouvais [ ?] à vouloir la
faire une énergie que je pouvais mesurer rien qu’à la
nonchalance qu’exprimait assez la nonchalance avec
laquelle elle disais Mais certainement elle di c’était pour y
rencontrer quelqu’un, pour arriver à quelque plaisir. Sans
tenu
+ de son énergie
cachée
cela elle n’eut pas aussi obstinément résolu
irréversiblement tellement tenu à cette visite. Or elle
avec une nonchalence
qui était à la fois apparence +
m’avait dit « Madame Il serait possible que j"aille demain
chez les Verdurin, je ne sais pas su tout si j"irai ». Et le
ton doubitant elle employais
262
27v.º
Ajouter Pour le recto en face en bas : Elle était elle-même entrain de
téléphoner à quelqu’un et tandis qu’elle achevait sa communication, je
me demandais comment puisque tant des peintres cherchait à
du 18e siècle
renouveler les portraits femme [ingenieusiment] mise en scène du
XVIIIe siècle est un prétexte à des expressives d’étaler d’intêret, à un
[ ?], à une rêverie, à une [ ?], comment [ ?] de nos modernes
« Bouchee »n’a fait cette scène de ou bien de ce « La lettre » « Au
[clavelin] ». « La rêverie » Cette scène où habitait si spontanément
une ces lèvres
de la femme
qui
écoute
un mot
sourire
d’autant
plus
qu’il
sait
n’être
pas
vu :
« Au
téléphone »
Enfin
Andrée
peut me
répondre
« Vous
venez
prendre
Albertine
demain
suivre au
recto en
face
trois lignes
avabt le bas de
la page.
La jalousie n’est souvent qu’un inquiet besoin de tyranie
appliqué aux choses de l’amour. J’ avais sans doute hérité
de mon père ce brusque désir arbitraire de menacer les
gens que j’aimais le plus dans leeurs espérances
dont ils se [ ?] avec une sécurité que je voulais. Car
montrer trompeuse, non seulement je quand je croyais que
Françoise avait élaboré à mon issue un plan de sortie, je
disais négligeament que je comptais sortir ce jour là, bien
que si elle m’eut demandé de sortir et expliquer pourquoi,
j’eusse pris toutes les peines du monde pour lui faciliter et
lui rendre agréable sa sortie. Mon Mon amitié pour elle
Bien plus quand il s’agissait de ma gd mère
eut souffert qu’elle ait de la peine. Mais en moi c’était
quelquechose de colérique et de dominateur qui tressaillait
quand je sentais quelqu’un à l’aise dans un projet qu’il
n’aimait pas, dont il se croyait sur, et que je pouvais
Et il avait souvent [ ?] que ces brusques
briser. Bien plus avec ma gd besoin de tyranie s’appliquait
à une personne qui me plaisait seulement physiquement
avait déterminé plus tard, peut’être par [ ?] d’Albertine, un
commencement d’amour
263
Quand Andrée paraître dans
ce cahier : elle n’était plus tout
à fait la même qu’à Balbec,
une espèce d’inquiétude et
d’ennui était toujours chez elle
à fleur de peau, devenu ses
regards, prêts à s’ arresser, à
[ ?] intièrement son visage à
[ ?] ses yeux si on je parlais de
n’
quelquechose qui était à moi
ou à Albertine ou qui indiquait
ou
que j’étais bien ou avec
Albertine ou <ilegível>
28.rº
La quelqu’un m’avait dit su bien d’elle. Dans ces moments là un franc
rayon brillait dans ses regards et elle avait l’air de m’aimer. Ajouter
encore à ce qu’elle n’aime pas faire plaisir. Si je le elle était de bonne
donnait toujours une expression humeur et que lisant près
d’elle un livre gai je ris tout haut elle n’avait pas
ce sourire attendri de me voir gai qu’avant
toujours le ton doubitatif pour signifier une aux re Or je
en maman ma gd mère
Lors peut’être
stt
me trompais d’autres avec moins de la nonchal Cette
Albertine, elle avait l’air conturbé, choqué de co n’admettait pas un
hésitation
plaisir oui elle peut [ ?]
nonchalance apparente qui co récouvrait une volonté
arrêtée, que c’était et n’avait [ ?] tout en me signifiant
l’intention de sa visite pour que savoir si je n’y mettais pas
obstacle que de même d’en diminuer l’importance. Je m’y
trompais d’autant moins qu’Albertine employait toujours
le ton doubitatif pour les résolutions irréversibles.
264
28v.º
Suite de la marge du recto précédent, elle même enclasse dans la du recto
précédent.
Ce jour de la soirée fête chez la Princesse de Guermants quand il m’avait
dit venez voir Odette, et que j’avais pensé à ce que malgré tout il y avait de
pour lui fort
aux yeux de
et d’
[ ?], de posséssif dans ce prénom, qui pour tout le monde pour Odette ellemême et
265
266
g
na
yeux
elle
jaloux d
était ainsi ; se yeux
y semblaient toujours pe
inquiets n’était pas eu
claires par le rouge
des joues ; et si ma
jalousie na’avait pas
[ ?] compensation l’
espèce de [ ?]
de son teint + + +
267
29r.º
quand Albertine
je viens de téléphoner
avec une<ilegível>
ému que cette <ilegível>
a bien passé à nous dire
268
269
29v.º
le style. Mais le
parallelisme des
promenades ets
bien.
270
Mais qui sait si elle-même ne me trahissait pas, si demain elle Je ne lui dirais pas ne dirait pas à Albertine « Il
m"en dit de t"empêcher coûte que coute d"aller chez les
qui [ d’autres ]
Verdurin, si elle ne lui avait pas révélé déjà,
Je
malgré les sermants qu"elle m"avait fits, elle
me ne lui avai avait déjà
plusieures fois
plusieures fois révélé à Albertine des recommandations analogues. Elle m"avait affirmé que non. Mais
<ilegível >
271
55 30rº
Madame Verdurin l’autre jour ? » « Madame Verdurin, je ne me rappelle pas »répondais-je
en ayant l’air de penser à autre chose, à la fois pour sembler indifférent à cette rencontre et
pour ne pas trahir ma Andrée. Mais elle-même ne me trahissait-elle pas. Albertine ne
saurait-elle « A propos de mad « Et peut-on savoir pourquoi vouz avez téléphoné à
Andrée ? » « Pour lui demander de venir si cela ne la contrariait pas que je me joigne à
vous demain et que j"[aille] chez les Verdurin ». « Comme vous voudrez. Mais je vous
préviens qu"il y a un brouillard atroce ce soir et qu"il y en aura sans doute demain. Je vous
dis cela parce que je ne voudrais pas que cela vous fit m fasse mal. Vous venez bien que
pour moi, je préfère que vous veniez avec nous. Du reste je ne sais pas du tout
Au Bon marché ou aux Trois quartiers
[Du] Il faut absolument que je passe aille
j"irai chez les Verdurin ». Je l’avais forcé à avouer que
une gainte blanche avec cette robe est trop [ ?]
des [ ?] Grand magasin acheter des [rubens]pour les moeurs de ma
me [ ? il y a eu]. Alors, je ne pouvais p recommençais à
chemise ( Je me [ ?] bien de de pas la laisser aller seule dans
être méchant avec elle, comme autrefois. Je m’irritais
un grand magasin où on ets frôlé par tant de gens où il y a tant des
même de son air déçu. Et j’employais pour [bien] blêmer
portes, où on <ilegível>. Dire qu’on n’a pas [ ?] as voi à la sortie
les <ilegível> autrefois su. Moi-même je ne <ilegível>
Ajouter encore à ceci (capitalissime) et peut’être à la fin de ce verso (avant de repondre dans le marge lors cet
autre homme [ ?] à Albertine) : Peut’être aussi cet autre homme est-il chez beaucoup d’hommes une autre
face qu’ils montrent. [Alors] qu’ils agissent avec les autres [eu mentor], vis à vis d’eux-mêmes avec
exaltation. Et c’est peut’être a Peut’être chez mês parents qu’ils [penseraient] à moi y avait-il autant de
sensibilité que de froideur en me parlant +
C’est peut’être la vérité [ ? ] [ ? ] de ce double aspect selon la vie intérieure et selon les rapports sociaux qui
est caché dans ces mots qu’on doit [si] finalement il a l’air froid hommes les plus froids, il est aussi, mais cela
272
cache une sensibilité extraordinaire ( [ ? ] [ ?] de morts qui on), il a le [ ? ] de as sensibilité. C’est peu [excès]
de <ilegível>
273
30vº
Ce qui est dans ce verso s’intercale dans la marge et est capital
Car quelquefois, [ au lieux] de faire l’homme sage en parlant à Albertine ou à Françoise, je
m’[ ?], j’entendais si pareil à ma grand’mère [comme] quelquefois comme quand je
frappais à ma porte ma mère [croyait] dire « entrez » à mon père, tant de mystérieux
[contact] subconscient et inconnus de moi [ ?] ainsi en de petits choses, mês doigts, ma tête,
mes soucils, à [tatiner] les les mêmes tourbillons qui avaient entraîné tout leur vie
Mes pensées
quand elles parlaient.
Au vrai comme les plantes qui poussent en se dédoubalnt, en face de l’enfant
sensible que j’avais uniquement été lui faisait face maintenant, et ap un tout homme
absolument [obscur] plein de bon sens, de sévérité pour la sensibilité [maladroitement]
autres, un homme ressemblant à ce que mês parents avaient été avec moi. Sans doute
chaque homme devrait
faire calmer en lui la vie
developper [ au bien des] dees parents, cet homme qui n’existait pas en moi [tant à ?] au
début m’avait [ ?] et
274
Mettre là au à un passage voisin.L, là, commencer par d’ailleurs, D’ailleurs j’étais maintenant à l’égard des
autres, plein de bom sens, de sévé de sévérité pour la sensibilité maladroite, comme parents l’avait
Alors cet autre homme
été avec moi. A mon tour. « Il ne disait à Albertine je n"apprecie pas la tendresse qui
manifeste en nous faisant oublier parce
qu’on paense trop à
vous, ce qui fait vous rende [ ?], les lettres qu’en nous a demandé d’importer ». Soit parce que avec l’âge, le
tempérament moral de nos parents apparaissait chez moi, soit que même ce bons sens fut le point de vue
qu’on a quand il ne s’agit pas de soi-même et part pouvait ne pas exclure même chez mon père une sensibilité
profonde et cachée
275
57 30bis
Alors je recommençais à être méchant avec elle comme
blêmat
autrefois. Je m’irritait même plaisant. Et critiquant son air déçu, j’ j’employais à blêmer son
air déçu les mêmes raisons qu’ dont qui [avait] paru si inintelligentes à mon enfance
incomprise. « Non je " malgré votre air triste, je ne peux pas vous plaindre, je vous
plaindrais si vous étiez malade, s"il vous était arrivé un malheur, si vous aviez perdu un
parent ce qui peut"être ne vous ferait aucune peine étant donné le gaspillage de fausse
sensibilité que vous faites pour rien ». Et Je parlais Ma grand’mère disait de ces choses, par
ex Donc je ne pouvais mal agir être blamé des les dire à Albertine, Pas plus que je ne de lui
avoir annoncé que j’irais chez les Verdurin, puisque mon père avait de ces brusques
décisions qu’il me signifiait tout à coup de la façon qui
à
deva pouvait le plus m’agiter. Or, tout en gardant ma
Autr d’enfant que je connaissais été qui n’ait dit à
propor nature et qui me faisait bien comprendre les tristesses celle d’Albertine les regrets et
cet affolement d’Albertine et me donnait m pour les atteindre l’habilité que donne à un
policier qui a été lui-même voleur, depuis que je devenais homme, la sagesse trop inflexible
de ma grand’mère, et la volonté [dans] les velleités
[ ?] l’un et les autres
arbitraires demon père, si longtemps extérieures à moi
276
plus + un amour, ma jalousie pour elle, donné seulement l’espoir de réussir là où j’avais échoué à Balbec,
mais qui maintenant me [faisant] me pose des questions sur les personnes qui avaient pu les lui apprendre
(dire cette fin mieux). Et pas tout de suite après mais un soir où je ne cranderais pas de la fâcher je lui
demandera à [ ?] parfait : Ο
277
Ο « Albertine un jour je vous ai entendu dire le mot [ ?] est-ce que vous pourriez me dire
pour q.q.chose que j"étais pour que cela m"[ ?] de voir comment le langage se forme qui
vous a dit la 1er. Fois » Je lui demandais [aussi/assez] curiosité comme je lui avais ce jour
là demandé [ ?] : « Pauvre vieux »mais ma curiosité [ ?] douloureuse.
Un jour (voir quel jour, il faudra que ce soit à un endroit où il y a un vide
pour boucher un trou) je sentis tout d’un coup un grand désir de déjeuner avec mes amis,
près d’un grand feu, je sentais une odeur de
[ ?]
saison parfumé, je me j’aurais volu entendre les musique madelaine des [ ?] de Doncières,
je vis du haut
brouillard
d’une fenêtre du chateau un parc noyé dans la brume :
des
C’est que je venais d’entendre, aussi évocateuses des [ malinées] brumeuses que à la can
que l’odeur de pétrole des champs brulants en juillet, le [ ?] de [ ?] à [ ?] qu’o
bientôt
venait d’allumer. Mais aussitôt il me rappela à ce joyeux désir une douloureuse inquiétude
se mêle, comme un des tristes instruments [assoudis] belot, un allegro joyeusement
commencé : vous venez de me rappeler dans cette convalescence avec Albertine lu jour où
je l’avais embrassé la 1er fois et ces mots selection, distingué [ ?], qui avant ve jour-là,
comme je n’avais lui avoué ma jalousie en me donnant l’idée de’une vie nouveautés
sensible et [ ?] dans as vie, ne lui ce jour là comme je n’avais +
ne m’avaient
278
je me disais : si je ne l’aurais pas, je ne suis pas méchant avec elle et peut’être elle n’aurait pas de gratitude
mais car je ne serais pas aussi méchant avec elle. Mais je suis moins gentil, lui suivant. Certes la seule
manière
le la
J’aurais pas lui avouer mes
mes
rass frontière que dont j’avais osé avec elle en la faisant surveiller par Andrée. , faire excuser ma méchanceté
pour Albertine, et même la frontière dont j’osais avec elle depuis quelque temps en en lui avouant mon lui
avouer mon amour – mais cet aveu n’est-il pas refroidi Albertine
on [ ?]
plus que d’ailleurs peut’être
rien appris à Albertine,
gentille, car eut peut’être refroidi eut peut’être Albertine puisque ma dureté et mes [ ?] – ont été été la mani
seule manière de me faire pardonner les [miens] et les autres. Etre [ ?] et méchant avec ce qu’on aime
279
59 31r.º
qu’elles avaient fit souffrir, av étaient venues depuis que j’étais homme., péritant se
recréant dévellopant dans mon âme, alors que si longtemps elles étaient resté extimais à
toute mon enfance qu’elles avaient fit souffrir, la sagesse trop inflexible de ma grand’mère
et les velleités arbitraires
[alors] Petit [ ?].
aurais
de mon père. Certes Certes si je n’avais pas [aimé] été méchant avec Al Si je ne l’avais pas
aimé J’aurais pu lui
mon amour
si avec elle depuis quelques temps
confesser que j’étais méchant et, que j’avais été [ fourbi]
en ce moment
et rusé et que maintenant j’étais cruel, c’était [par] amour. Alors avoir été [fourbi] et rusé
avec elle et maintenant
est
Si
méchant, c’était si naturel. C L’’intérêt que nous témoignons aux autres, à en ne nous
empêcha pas d’être
c’est que
doux avec eux et complaisant à ce qu’ils désirent, puisque cet intérêt est mensonger. Les
autres Autrui nous est
engendre
indifférent, et l’indifférence ne pousse pas invite pas à la
avouer cet amour avouer mon
méchanceté. D’. Mais j’avais peur que l’aveu de mon
amour
d’Albertine
amour est ne refroidi plus encore les sentiments pour moi que m’avait pu faire ma
méchanceté dureté. D’ailleurs cet amour ne s’en doutait- elle pas ? Et puis s’il était la
[considère] <ilegível> tracassais, il c’était aussi de gentillesse qui, et les seconds
[suprimaient]
280
que Swann d’abord n’avait pas trouvé jolie
Odette jolie,
+
tandis que Alb
premier
mon amour
pour Albertine,
même même
s’il n’avait
pas duré,
même
si les mes
doutes étaient
sans durée
angoisse
Amours
suivants
mon oublie
puisque
étaient
nés d’
une
angoisse
le
pressionnat
qui n’avait
pas duré
mais avaient
du rester
tout de
même
involontairement
aux autres,
était
[vivement]
né ; involontairement
d’un désir le
premier jour de Balbec,
d’un désir.
281
31r.º
Capitalissime : quand je dis ( je me sais trop où qu’elle est à la fois ce que maman avait
été pour moi et ce qu’Odette avait été pour Swann, j’Ajouterai après le mot Swann, et avec
une phrase Flaubert, exc avec cette différence pourtant entre tant d’autres, car ce qui a le
plus d’analogie dans la vie n’est jamais [ ?] fut pareil
Alors si c’était l’apaisement du baiser de ma mère à Combray que m’apportait d’habitude
Albertine, ces soirs là, ce que j’éprouvais c’était bien l’angoisse de Combray les soirs où
ma mère fâchée, ou [ ?] par des invités ne montait pas me dire bonsoir. Non pas peut’être
seulement cette angoisse de Combray transposée dans l’amour. Non ; cette angoisse encore
indivise quand on est enfant et qui se spécialise plus tard dans l’amour quand le partage des
part, quand la division des passions se fait, cette angoisse
d’abord
qui est encore indivisible s’éteind à toutes pendant l’enfance, cette angoisse encore indivise
pendant l’enfance, il semblait que d qu’elle le fit déjà redevenue dans ma vie courte comme
un jour d’hiver où le soir vient vite, vies vie vie où une sénescence prévue rassemblait déjà
tous les sentiments en un seul, de sorte que c’était avec un les tendresses d’un frère d’un
[ ?] d’un fils d’un
terribles de ne pas posséder [ ?] toujours
amant que je portes [garder] auprès de moi Albertine auprès de moi mais un temps où
282
Quand je suis jaloux dire : En somme j’avais beau voir Albertine à Balbec, savoir beaucoup plus ce qu’elle
faisait, ma curiosité impuissante et douloureuse était en abîme que des renseignements sur toutes ses
occupations me pourraient combler. Eusse-je pu la garder nuit et jour à côté de moi
0 [ ?]
comme le et pas heureux que
et
le [génie] dans visible et une nuit qui pendant qu’il dort est trompé, cela ne m’eut servi à rien. Car un être
humain car un être humain n’existe pas que dans l’espace, mais dans le temps où la personne +
de Combray quand
j’avais
quelquechose me faisait de la peine et qui devait m’empêcher de dormir je
saurais
pouvais encore la traduire ne disant dire j’ai de la peine, je ne pour à maman qui ne la causait : j’ai de la peine
je ne pourrai pas dormir. Maintenant Depuis bien longtemps ma manière de le traduire n’était que d’avoir
froid
l’air indifférent de parler des choses indifférentes et [ ?] me faisait faire avec progrès vus une solution. Mais je
ne saurais plus dire je suis [ ?]
283
61 32r.º
+ comme une comète traîne derrière elle une longue queu. J’aurais en avoir Albertine sous une [ ?] dans
l’espace, attaché à elle, donnait sa formeà sa personnalité, [ ?] peu se [ ?], son [passément] échappé.
n’invite pas à la méchanceté.
bientot
Je sentais que chaque minute me rapprochait viendrait elle me dirait bonsoir La soirée
passait, que bientôt elle me dirait si elle ni moi ne prendions l’initiative pour que le baiser
qu’elle me donnerait en me quittant peut m’apaiser
d’abord
vraiment, il eut fallait que’les elle ou moi prit l’initiative
nous
de faire la paix il si elle ou moi voulait[ons] prendre l’initiative de faire la paix, de
recommencer à nous embrasser, il n’y avait plus grand temps avant qu’elle allat se coucher.
Aucun de nous n’en avait pasencore pris l’init
comme autrefois à Combray les soirs où maman me disait un bonsoir fâchée
où je n’osais pas
la rappeller
initiative. Je sentais que chaque minute me rapprocher du moment où elle me dirait bonsoir.
Elle me le disait , . Mon s [j’avais] Mon coeur battait Son Le froid baiser que si Mais son
baiser d’où elle était absente et qui ne me
pendant
trouvait pas me laissait si anxieux que jusque pendant les
le coeur palpitait
les quelques secondes qu’elle mettait pour aller jusqu’à la
je la
regardais
pour aller
porte je comptais chaque pas qu’elle faisait jusqu’à la porte en me disant encore aller
jusqu’à la porte en me
trouver un prétexte la retenir
disant : « Si je veux la rappeller, faire la paix, elle n"a plus que" – Fois sans à faire, plus
que deux, plus qu"un, elle tourne le bouton, elle ouvre, elle a refermé la porte,
284
Qu’elle le fasse paraître plus jeune un ne lui coutant plus
c’est tout ce qu’elle demanda en
rien et si elle m’épousait en lui
attendant si Albertine de
rapportant quelquechose (car il n’y a nul doute que cette tante délicate ne trouva alors la majeur de se faire
donner une comission) recevoir la comission que cette parente délicate saurait bien se faire donner !
285
32r.º
(N.B
pas trop tard pour préparer
à l’idée de l’indélicatesse de
Ml Bontemps)
A un moment Albert de ce cahier ou d’une autre Albertine me demandera si je tiens à ce
qu’elle porte toujours cette coiffure. « Ma tante trouve que cela me veillit » dit-elle d’un air
maussade. Puisse sa tante dire vrai pensais-je à part moi. Elle désire qu’Albertine ait l’air
d’une enfant pour paraître elle même plus jeune maintenant qu’il nelui suffit plus de laisser
couler ses boucles rousses le long de ses joues. Mais si Albertine pouvait dehors avoir l’air
vieux, être laide, au lieu d’avoir cet air provocant et et mutin qui fait [relever] tout le
monde, combien je serais plus tranquille. La vieillesse d’une [ ?] rassure moins un amant
jaloux que la vieillesse de visage de celle qu’il aime ». Mais j’étais ennuyé que la coiffure
que je lui faisai adopter paraît lui être une castration de plus.
286
à Combray, des mois j’avais la ressource d’envoyer [ ?] porter
un mot
à maman
prétexte d’aller frapper à sa chambre. Mais non, rien
287
63 33r.º
c’est trop tard ! » « Non, peut’être pas, je me levais je me passais et repassais dans le
couloir espérant qu’elle
dans ces salles à manger on a soudain
sortirait de sa chambre et m’appellerait ; il me semblait
me postais
d’Albertine
avoir et je restais immobile à la porte pour ne pas risquer de prendre ne pas entendre un
faible appel, je rentrais dans
si elle par bonheur elle n’aurait pas oublié
ma chambre [ ?] si s’il n’y avait pas par hasard oublié un livre, un mouchoir, quelquechose
que j’aurais pu [paraître]
qui m’eut donné le
avoir peur qui lui manquait et voulu lui rapporter. Non, rien. Je revenais me mettre dans sa
porte. Mais je n’entendais pas de bruit, elle était couché, se il n’y avait plus de lumière sous
la [porte], elle avait éteint sa lumière, elle était couchée, je restais là immobile, espérant je
ne
comptant
sais quelle chance qui ne viendrait plus venait pas ; et longtemps après, glacé, je revenais
me mettre dans mon lit sous mes couvertures et je pleurais toute la nuit.
Le lendemain du jour où elle avait manifesté l’intention
faire une visite à Mme
de’ aller et les Verdurin, elle n’alla pas chez celle-ci. Je lui fis dire que cela m’était égal,
mais elle avait changé d’avis. A la fin de la journée je me leva Je me levais pour le diner,
[ ?] en habit. Et quand Albertine rentra : « Ma [jetile] chérie lui dis-je, d"abord je
commence par vous dire que cet habit je vais l"enlever si vous [voulez] [venir]
288
289
64 34r.º
que je reste ici. Mais j’avais envie d’aller il, en si longtemps que je n’ai vu du monde que
j’avais pensé aller passer une heure chez dans tel ou tel de mes amis, peut’être chez les
Guermants. S’ils sont là. Je vous retrouverais vers onze heures. Mais le plus gentil ce serait
que vous veniez avec moi. Cela me ferait plaisir qu’on connaisse un peu ma petite
Albertine, je serais si fier de vous emmener. Elle reponda.
« Je ne connais pas tous ces gens là, cela ne m"amuse pas. Je tiens à ce que vous alliez « et
en vous attendant je causerai avec votre mère et je ferai de la musique ». « Si c"est
parceque vous ne les connaissez pas, voulez-vous que nous allions voir des gens que vous
connaissez, les Verdurin dont c"est le Vendredi ou les Cambremer qui sont revenus depuis
quelques jours. Ils seraient ravis de vous voir ». « Non je cela m"assome Allez de les voir.
Je suis fatiguée. Allez et revenez bientôt ». « Alors, voulez-vous que je vous laisse chez
ou que je lui dise de venir vous voir ». « Mais non je ne veux voir personne ». Je dis que je
ne savais où j"irais et j"allais chez les Verdurin.
Les Verdurin
290
291
35r.º
Elle n’alla pas le lendemain chez les Verdurin et, me fit dire qu’elle y avait renoncé et irait
se promener à cheval avec Andrée, si je ne voyais pas d’inconvénient à ce qu’elle eu fit
venir du manège.
me dire au revoir
Elle vint m’embrasser avant de partir sortir : « Soyez prudente Albertine, songez s"il vous
arrivait malheur ne fait pas d"exercices de voltige comme l"autre jour.
Pensez, s’il vous arrivait un malheur, je crois je deviendrais fou ». Tels furent les mots que
je lui dis. Mais
Au fond je
ce n’était que des mots. Je me disais comme rappelais ce qu’on m’avait raconté de Swann
quand il pensait à Mahomet II qui avait se rappelant quand Odette chaque fois souhaitant
que quelque et la phrase de Mahomet II et qu’on m’avait racontée avoir honté Sw être
venue souvant à l’esprit de Swann quand sortait Odette et je me disais que se tout en
souhaitant pour elle qu’elle vécut, je me disais que sa mort aurait supri été la supression de
mes souffrances, m’aurait rendu ma liberté d’esprit et ma liberté d’action.
elle
pas
certes, sans me dire plus
sans me dire jamais qu’elle ne
A partir de ce jour elle ne voulait plus jamais sortir seule. On eut dit qu’elle devinait que
je’étais n’ voulait pas sortir se un seul instant sans Andrée ou sans ma mère, c’est à dire
sans une personne avec qui j’avais confiance car c’eut été me dire qu’elle
292
293
69 36r.º
devinait mon manque de confiance que je ne lui avais pas avoué
A pa elle s’arrangea pour ne jamais sortir sans même un instant sans Andrée être avec
Andrée, ou avec ma mère. Je ne lui avais pas dit je n’ai pas confiance en vous, elle ne me
dit jamais : « Je sais que vous n"avez pas de confiance en moi et je veux essayer de calmer
vos soupçons.
elle ne me dit
qu’avant : je sais que vous n’avez pas confiance en moi, je et je veux essayer de calmer vos
soupçons » « ni « je sais que’ Andrée vous dit tout ce que je fais » ; mais elle ne me le dit
jamais ; mais ne fut-ce pas le sens ce’ le pensait elle pas peut’être le pensait-elle puisque
dès lors elle s’arrangea à ne plus jamais sortir fut-ce un instant sans
elle
être avec Andrée, ou avec ma mère. Et même quand le téléphonait n’était pas chez moi était
chez la concierge chez la concierge, elle s’arrangeait sous un prétexte quelconque à
emmener avec elle soit Andrée, soit ma mère, sans doute pour que je puisse être sur qu’elle
n’avait rien dit pour le téléphone qu’elle ne dit pas on n’avait profité pour sortir de la
maison. Je ressentis en effet les précautions qu’elle prit pour calmer ma jalousie me
donnèrent en effet un
294
295
71 37r.º
certain calme mais elles m’éffrayèrent aussi. Cette inquiétude que je ne m’étais pas avouée
à moi-même, si Albertine je l’avait en avait conscience et comme de quelquechose
d’important et de [durable], elle devait se sentir chez moi comme et une comme une
prisonnière, qui
me
ne peut même sortir que sous la garde d’un geôlier. Elles
en
montraient qu’Albertine concevait sa vie chez moi comme une captivité avait des
intuitions, des projets dont elle chez Albertine l’intuit laissaient supposer chez Albertine
la’intuition découverte- que je n’avais pas faite moi-même
secret et jamais
avoué
tout un travail d’esprit dont elle ne m’avait rien confié et
avait
qui lui ayant donné l’idée que je n’avais en moi-même
et même pendant ses sorties
véritable
qu’elle était chez moi dans une véritable captivité, ne sortait que sous la surveillance d’un
geolier, la conduirait peut’être sans qu’elle m’en avertit davantage peut’etre détestée dont
elle détestait peut’être ne supportait peut’être le joug parceque sans me le dire davantage
elle
Mais sans
avait décidé qu’il ne serait que temporaire. Plutôt que
attendre qu’elle le secourat
d’attendre qu’elle le secourait je voulais y mettre fin moimais [ ?]
allais me
même, et espérant chaque jour que le lendemain je’me mettre non seulement au travail mais
à sortir d’une façon
chaque jour d ‘elle un
régulière, je continuais d’accepter sous sacrifice
296
dont son visage rond comme
un oeuf rose était rempli.
de ses yeux y
sentais tantôt l’espérance,
tantôt le souvenir, tantôt le
renoncement et le regret
297
73 38r.º
46 46
auquel je croyais mettre fin le lendemain.
D’ailleurs était-ce un sacrifice, elle prétendait que non.
Je l’incitais à sortir, à aller faire des visites, je lui disais qu’elle menait une vie de
prisonnière, elle me répondait comment pourrais-je être plus heureuse ? »
Mais certains soirs je sentais dans ses regards muets yeux le regret de joies que’ellene me
do je ne devinais pas et auxquelles elle préférait renoncer plutôt que de me les dire.
Combien alors je souffrais de cette position où nous a réduits le caprice de la nature quand
elle a institué la division des corps et n’a pas permis l’interpénétration des êtres, combien je
souffrais de’être av me trouver auprès de l’âme de cet autre être comme un spectateur
qu’on n’a pas laissé entrer dans la salle et qui par l’oeil de boeuf d’une porte colle ses yeux
à un l’oeil de boeuf de la porte sans pouvoir rien apercevoir de ce qui se passe sur la scène.
A quoi bom demander à Albertine ce qu’elle voyait à ce moment là de quels spectacles
intérieurs Et toute la soirée
longtemps
Albertine gardait dans ses yeux le reflet de spectacles intérieurs dont la contemplation
qu’elle était seule à contempler et qui l’empêchait d’être ce soir là d’être
d’être
pareille unie à moi, pareille à moi qui ne pouvais les contempler. A « A qui pensez-vous ma
298
299
38v.º
+ compacte et joyeuse de gens qu'elle connaissait puisque tous
et ne me disait pas [emplisser] les miens
+ puisque tout le monde je me disais qu'elle y avait
refletis
peut'être de mauvaises relations dont je croyais voir
dans
derrière les yeux brillants d'Albertine, comme dans les
rapide
glaces trompeurs d'une voiture les feux [immuables], immobiles, [?] et mobiles. Alors sous
ce visage rose encore comme tout l'heure mais pourtant trop [?] pour moi pour qu'il peut
s'être indifférent
300
(metrre en
son corps)
Elle me parlait aussi des ses promenades en voiture dans
avait
qu'elle faisait(fait) avec des amies dans la campagne
à
hollandaise, de retour par les rues d'Amesterdan où jusqu'à des heures tardives il y en
dans [?]
avait du monde dehors où elle avait peut'être
[dont]
Elle y con une foule où [dans] elle elle connaissait+
301
75 39r.º
47
chérie» «Mais à rien». Quelquefois pour répondre à un reproche que je lui faisait de ne me
rien dire, elle me
racontait
donnait sans précision aucune, des détails que ne pouvaient une sorte de «fausses
confidences», des promenades en bicyclette qu'elle faisait à Balbec avant de l'année d'avant
de me connaître et comme je l'avais supposé la 1ere fois que je l'avais vue. Et l'évocation de
ce temps insinuait dans ses traits ce même mystérieux comme si j'avais déviné du juste en
rend autrefois en inférant de lui qu'elle était une devait faire de longues être une jeune fille
très libre faisant de longues parties de bicyclette, l'évocation de ces promenades insinuait
dans ses traits le même mystérieux sourire que je lui avais qui m'avait séduit en elle, le
premier jour, quand je ne la
connaissais pas encore à Balbec. Aussitôt je jetais sous ce
rose encore comme tout à l'heure mais
trop
visage trouve que je n'avais pas revu depuis si longtemps
le sourire
que je qu'il peut m'être familier et indifférent, je sentais sa
se [eusse] comme un gouffre à mon coeur
[?] un [réseau], l'espace inexhaustible des jours que je
Alors je comprenais combien je me
trompais dans les soirs heureux où je m'excusais auprès d'elle
n'avais pas connue. Comme je me trompais en croyant
duelles [?]
qu'un ornement [?]
n'était
qu'elle aimer li avoir dans ma chambre que une belle rose [?] aux plis nombreux, qu'une
belle oeuvre d'art, une
attentif et câlin
statue un ange de crêche musicien, aux cheveux cres joues rebondies, aux cheveux
crespelés, à tout mettre du mieux
captive
une merveilleuse Princesse de la Chine, possédée à
302
303
77 40r.º
48
l'aise de tous et ceux qui venaient me voir ne devinaient pas plus enrichir ma demeure de sa
présence mystérieuse
dont
que cet homme personnage que personne ne devinait qu'il avait dans enfermé dans une
boutielle la Princesse de la
Elle
Chine. Elle était mon elle pouvait être tout cela un moment où des moments au aux
moments où justement je l'aimais le moins parceque j'étais heureux de la posséder comme
une fleur, comme un ange de crêche, comme la Princesse de la Chine et qu'on n'aimes pas
vraiment ce qu'on possède. A d'autres moments, plus douloureux et où je l'aimais davantage
car on n'aime vraiment que les choses sous l'apparence desquelles on poursuit une réalité
innaccessible, elle était presque une Grande Déesse je
cet un
sentais se verser en elle comme un âbime où se pressaient sans que je puisse les apercevoir
le torrent des jours
sans que je puisse l'apercevoir
écoulés. où se pressait le torrent des jours écoulés. Je pouvais toucher ses mains, ses joues,
mais comme on
coquillages
manie ces fleurs l'écorce de ces fleurs au fond desquelles habite quelque ref le rayon
originaire d'un la rumeur ou le rayon originaires de l'océan immémorial ou d'un astre
pouvais l'envelop caresser cet l'envelopper de'cet être
inconnu, je caressais l'envellop un être que je sentais donner par ailleurs donner sur un
infini.
304
305
79 41r.º
pour
Pendant qu’elle était sortie, sa tante vient me voir ma mère qui
et de ma liberté
Pendant qu’elle était sortie
Quand elle rentre Andrée vient me dire bonjour. Hé bien vous n’êtes pas allées chez les
Verdurin ? Non nous sommes allées à Versailles. Je vous remercie. Cette promenade m’a
fait un bien. Je n’ai pas beaucoup d’air cette année ». « C’est vrai vous n’avez pas été
longtemps cet été à Balbec ». « Cela a été une mauvaise [ ?] je devais revenir y passer la fin
de Septembre et Octobre et puis juste la ville de 15 le 14 Septembre, le voilà que j’ai une
soeur est tombée malade et alors il a fallu que je reste près de ma grand’mère. C’est encore
bien tombé heureux que
que ce soit
je l’ai appris le 14 Septembre. Je l’aurais
Dans Il y a en au moins cela dehors que je [ ?] au temps. Un jour plus tard la [ ?] de, nous
avions un mois et demi de plus de location à payer pour notre chalet » « Pourquoi cela ? »
« Parceque notre lou avions [ ?] recommencait le avions loué en 3 fois, nous avions un
terme à payer le 15 Septembre et alors cela recommencait jusqu’à la fin d’Octobre. Hé bien
c’
306
307
81 42r.º
est juste le 14 Septembre que j’ai appris que je ne pouvais pas revenir, j’ai vite télégraphié à
Albertine pour qu’elle prévienne le propriétaire et ainsi tout a été arrangé ». C’était le 14
Septembre qu’Albertine m’avait dit le matin qu’elle ne pouvait pas quitter Balbec et
encore
« Qu"est-ce que vous avez me dit Albertine le soir. C"est encore les Verdurin.
« Non ma petite Albertine je n"ai rien. Mais il y a des gens méchants qui essayent de nous
brouiller ».
« Je m"en doutais, cela devint [ ?] ». On voit que vous m’aimez bien, alors naturellement
on s’in[ ?]. Mais pourquoi y faites-vous Et je lui dis que maintenant ce n’était pas avec [ ?]
qu’on m’avait dit qu’elle avait des relations mais avec Andrée ».
« Avec Andrée d s"écria-t-elle d"un ton où je ne sentais pas ironique, au fond duquel je ne
sentis plus de volonté de paraître étonnée que que d"étonnement véritable ». Je lui dis que
je n’avais pas voulu lui parler de cela mais qu’il y avait une quinzaine de jours une mot
lettre
si
veille de notre
anonyme m’avait ra m’avait appris que elle jour où elle
départ de Balbec Albertine m’eut
m’avait dit le matin qu’elle ne pouvait pas partir et le soir m’avait demandé à partir c’est
que dans l’intervalle elle avait reçu
308
83 43r.º
une lettre d’Andrée lui disant qu’elle ne viendrait pas. « Je sais très bien qu"Andrée m"a
écrit qu"elle ne viendrait
ne
pas
pas, je elle m"a même télégraphié, je peux vous montrer la dépèche+ vous voulez je crois
que je l"ai encore parceque je ne l"ai pas gardée, mais ce n"était pas ce jour là, d"ailleurs
c"aurait été ce jour là, qu"est-ce que vous voulez que cela me fase qu"Andrée soit venue à
Balbec ou non ». Mais Albertine ne’avait n’avait pas dit qu’elle mettait en doute la lettre
anonyme Quand je disais ainsi
renseignements
quelquefois à Albertine que je recevais des lettres
et que
anonymes, elle en me disant elles m’accueillaient de mes
paraissaient
sinon
paroles avec n’avaient pas l’air de la laisser sceptique du moins la rendre [ ?], et qui
revenait presque au même. Car elle avait l’air elle n’avait pas elle ne manifestait aucune
incrédulité mais la même mauvaise prenait le même air, non pas sceptique, mais irrité
comme si elle eut cru que
me disait jamais
n’a ne avait n’avait pas elle ne d n’eut ne manifestait
que ces renseignements c’était moi qui les avait demandés mais elle
aucune incrédulité mais la même colère contre moi que si
manifestait la
elle ne m’avait pas cru, et n’eut supposé même mauvaise humeur humeur contre moi que si
elle l’avait cru. Cette fois sa colère s’étendit à Andrée et sans
jusqu’
309
75 44r.º
voyait sans doute que maintenant je ne serais pas plus tranquille quand elle sortirait avec
Andrée que seule elle s’écria : « D"ailleurs Andrée m"exaspère. Elle a été assomante tantôt.
Je ne veux plus sortir avec elle. Quand vous pouvez sortir nous sortirons ensemble. Quand
vous ne pouvez pas si votre mère veut de moi, ou quand ma tante viendra à Paris si elle
veut sortir avec moi, j"irai avec l"une ou avec l"autre. Mais je ne sors plus avec
annoncer
vous ont dit
Andrée. Vous pouvez le" dire aux gens qui croient que je suis revenu à Paris pour elle ».
« Mais ma chérie puis
le
comment voulez-vous que je leur annonce puisque ils ont écrit une lettre anonyme.
Vo Nous n’avons qu’à nous en moquer ». Je Mais elle
et
continuait à me regarder et dans ses prunelles avec l’attention qu’on prête à quelqu’un qui
n’a pas encore fini
brute
de parler Cette réponse était si juste que qu’elle aurait du dissoudre dans les yeux d’ Albert
Albertine les objectifs et les doutes que je que les remplis je voyais cristallisés dans les
prunelles d’Albertine. Mais elle les laissa intacts ; et
m’
je’ avais beau avoir fini étais tu et elle continuait à me regarder avec cette attention
persistante qu’on prête à quelqu’un qui n’
310
87 45r.º
a pas fini de parler. « D"ailleurs par le temps qu"il Le lendemain fait finit-elle par dire, je
ne serai pas bien malheureuse de rester à la maison ».
Mais le lendemain je m’éveillai sous un ciel d’Italie.
311
89 46r.º
49
Albertine Quand je m’éveillai Le lendemain je m’éveillai sous un ciel d’Italie
Albertine venait de partir pour sa matinée. Je repris le Figaro que j’avais laissé en voyant
que mon article
312
91 47r.º
n’y était pas (le dire mieux) et mes yeux tom je cherchais si aux nouvelles théâtrales on ne
parlait pas de la matinée où allat Albertine pour voir ce qu’elle entendait ; et je lis ces
mots : « Au programme de la matinée que nous avons annoncées hier nous venons ajouter
le nom de Mlle Léa qui a tenu à donner son concours etc ». C’était la commédienne qui
était à Balbec et était amie des deux jeunes filles qu’Albertine sana avoir l’air de les voir
aurait regardées dans la glace. Je n’avais plus pensé à elles depuis Balbec ; ce sa ma
mémoire comme ces terrains sur lesquels ont plu les projectiles étaient était encore pleine
il fallait Albertine allat Peut’être serait-elle là seraient-elles venues applaudir leur amie et
Albertine les les retrouverait-elle. Qui sait alors ce qui se passerat. Et je n’étais même pas
certain qu’elle ne connut pas Léa. En tous cas quel danger de le lui laisser voir ainsi,
embellie par la scène, par le succès. Je sortai à [ ?] de mon lit et pour faire plus vite « F
j"appelai Françoise. « Françoise vous allez prendre le taxi l"automobile q le plus rapide que
vous allez pouvoir trouver, vous allez vous rendre à le Porte St Martin Trocadéro. Vous
prendrez un billet,
313
93 48r.º
si la matinée est déjà commencé vous entrerez, vous regarderez partout jusqu’à ce que vous
aiyez vu Mlle Albertine et d vous lui direz que j’ai quelquechose de très important à lui dire
qu’elleveille bien sortir un moment et venir m’attendre devant la pâtisserie au coin de
l’avenue Henri Martin. » » Pendant que’Albert Françoise partait je m’habillai vite, mais du
moins pendant si De cette façon Albertine ne serait toujours pas au Trocadéro pendant le
temps que je mettrais à me préparer et je m’habillai vite. Je Françoise revint comme je
partais, Elle avait trouvé Albertine au promenoir qui était allée à l’orchestre prévenir
Andrée qu’elle ne pouvait rester avec elle et qui était partie aussitôt m’attendre avenue
Henri Martin. « Elle n’avait pas l’air fâché » « Pas du tout, elle est venue tout de suite. Il ne
manquerait plus qu’elle soit fâchée, elle va voir Monsieur » « Mais je ne sais pas si cela lui
fit si plaisir que ça ? de moi voir dis-je à Françoise pour avoir le plaisir de lui entendre dire
que cela en faisait Albertine « Il faudrait qu’elle soit bien ingrate ». « Mais non je trouve
que ce « Mais non je trouve que c"est moi qui suis ingrat, qui reconnais mal tout ce qu"elle
fait pour moi ». Quand on aime on souhaite tant d’avoir l’air d’être aimé. Avenue Henri
Martin je trouvai Albertine qui m’attendait l’air
314
95 49r.º
nullement de mauvaise humeur en effet. Je lui dis que je venais de recevoir une lettre de la
dame dont je lui avais parlé à Balbec et que je m’étais senti si bouleversé que
faire appeler
j’avais un besoin de la voir, comme elle m’en avait donné la permission dont je n’avais
[aucune] jamais osé. Elle me dit que j’avais très bien fait, qu’elle était bien plus heureuse
d’être avec moi que de rester enfermée par ce beau temps à cette matinée qui devait être
assomante. Et nous [partons] faire un tour en voiture dans le bois. Il faisait un temps
[insoleilleux] (dire mieux) j’étais attendri de la gentillesse d’Albertine et de sentir aussi à
côté de moi, une [ ?] m’appartenant, celle qui loin de moi m’eut donné tant de
préoccupations. Mais ce plaisir tout égoïste exclamait en quelque sorte ceux que la solitude
m’eut donnés.
Je voyais vis de la Seine à [Suresses] des plaques de soleil habitait à une région
superficielle de moi-même de Dédoublé en quelque sorte, habitait à la fois mon corps et le
corps aimé que j’avais à côté de moi, je ne pouvais descendre dans ces régions profondes
de moi-même d’où
j’aurais pu jeter
nous jetons sur la nature un regard qui aurait eu une profondeur égale. Ceux Ils furent
superficiels ceux que je
à Suresses [peut] vis à Suresses
et
jetai à la Seine ma pleine de plaques d’or plus si miroitante que la voile blan rouge d’un
bateau y dessinait un triangle rouge, à la petite église
une
maison
315
49v.º
O possession était-ce se renouvelait sans cesse, en état jamais interrompu quand je la
regardais, mes main sans Quand je levais mes yeux sur elle,ou même les tenais baissés, mes
tous mes sens
mains, mes lèvres mon toucher, ma vue, mon goût, mon odorant ne s’interrompaient point
étaient si solidement tissés avec ma Pour ce qui la concernait, mes sons étaient si so
sans la toucher où même de la sentir
indissolublement. Tresses les uns avec les autres, qu’il ne suffisait de la voir près de moi,
on se je regardais par la [ ?] [ ?] de l’entendre me parler, ou si je ne la regardais ni ne
l’entendais, de sentir sa robe, de seulement de la savoir à côté de moi, pour que ma vue,
ce
l’[ ?]
<ilegível> à moi
mon toucher, mon odorant, mon goût fussent autour dans’elle un réseau qui fussent d’elle
complément
comme une amorce [ ?] de moi-même, cependant que ma pensée [infusée] en son corps qui
s’y infusait cherchais le [ ?] Dans ce corps annexé au mien s’infusait ma pensée inquiète et
caressée. Q et que je la sentisse où je le tenais suspendue, lourde, opulente et captive et
pourprée comme un fruit opulent et doux. Quand arrivée devant (suivre au verso suivant)
+ de son volume elle fut près de moi comme un fruit opulent empourpré et doux.
Certes
Mais
Sans doute pour p C’était la possession d’un corps. Certes pour posséder, il faut
aimer
d’abord avoir désiré, il avoir aimé. Nous ne Qu’ possédons les lignes, les volume
surfaces il s’agisse de la’art ou de la vie, nous ne possédons si une ligne, une surface,
un volume que si notre amour l’occupe et s’y tient. M La supputation de mes lèvres,
C’est parceque l’
de mes mains L’imagination de mes yeux, de mes mains, de mes lèvres eussent
colore
constant à Balbec si solidement [constant], si tendrement poli et caresse le corps de
d’Albetine, qu’elle occupait à côté de moi dans la voiture, là ou toute autre personne
se fit évanouie en une poussière caus impersonnel de chair et d’étoffe la consistence
d’un fruit opulent et doux. Cette pensée de possession était constante D’ailleurs
cette pensée de O
316
C’est que
Le plaisir que j’avais à l’avoir
à côté de moi était tout
égoïste, et pourtant infiniment
plus profond que’un plaisir
tout autre plaisir mondain et
d’ambition, était pourtant un
plaisir égoïste. Sans doute
pour avoir sentir qu’on a un
être à côté de soi, il faut
d’abord l’avoir longtemps
désiré ; il faut Balbec j’avais
pu assez cons j’avais mes reg
mon désir sans organes autres
organes que mon désir, j’avais
assez construit colo poli,
coloré, parfumé le corps
d’Albertine
pour
que
maintenant elle fut près de
moi dans la consistence +
97 50r.º
rouge de St Claud comme un coquelicot blottie dans le
ciel comme un coquelicot, à des effets de lumière et
d’ombre qui enchantèrent Albertine parcequ’elle ignorait
ce que c’est que regarder vraiment la nature et que le
plaisir lui vient seulement de dehors et qui m’ennuyèrent
parceque je me [ ?] à les constater d’un regard superficiel.
Quand nous rentrons, el j’eus la satifaction de voir ce joli
corps descnedre devant moi s’engouffrer sous la voiture,
monter avec moi, comme si elle avait déjà été ma femme.
Mais en même temps j’étais déçu de sentir que ma vie
resterait de plus en plus fermée à ce qui en pourrait cette
satisfaction était toute négative, ne faisait que supprimer
les inquiétudes que j’aurais pu avoir, j’étais déçu parceque
je de sentir que ma vie serait de plus en plus fermée à ce
qui en ait été les b joies véritables, comme un h et je me
disais comme un homme qui aurait
dans un [ ?]
ce qu’on appelle une belle situation et s’en feliciterait tout
en ne menant pas la vie moins rustique et brillante moins
brillante où il eut [chalet] et [donné] et du bonheur. Ma
mère ne dînait pas ce soir là à la maison. Je proposai à
Albertine qu’on nous servit dans sa chambre nous nous
fîmes servir Albertine et moi dans Pa sa chambre, dans
cette chambre où qu sa chambre où elle passait de plus en
de
plus temps à dessiner et qui était comme
317
50v.º
ma porte (mais peut’être mettre les brunantes qui
s’obscurcissent et la lune prématurée que j’avais peinte
pour la promenade à St Claud) et qu’elle descendit devant
moi, elle était je la suivis avec, mais mes sens
l’enveloppement encore et, mes mains aut autour
l’imagination de mon toucher enveloppait sa taille, q celle
de mes muscles soulevèrent son corps, et je la sentais dans
disparaître
mes mains comme tout en la voyant s’alonger devant moi
d’où elle ne
bougerait plus
ce soir
dispa de cette main on qui était [même] et
ma
sous la voiture, je la sentais, dans ma main lourde, captive,
ssavoureuse
odorante, empouprée, comme si j’eusse rapporté un fruit
opulent et doux. Sans doute c’était en grand apaisement
pour moi que cette possessi
318
99 51r.º
la bouteille bien close où je sentais enfermée ma Princesse
de la Chine. Un lustre l’éclairait en pleine lumière et je me
levais entre chaque plat pour l’embrasser.
Autour de nous [couraient] des bibliotèques, je sortais des
temps en temps un livre et lui lisais des vers qu’elle
trouvat beau en un passage d’un livre de mémoire qui la
faisait rire. Vers 8 heures ½ je lui dis : puisque « d"être
sorti aujourd"hui me donne envie de sortir, vous ne
viendrez pas avec moi soit chez les Guermants qui
seraient ravis de vous connaître, ou chez les Cambremer,
ou chez les Verdurin ou où vous voulez ? » « Non,
allezvoir les j"aime mieux rester ici » ; je serai très bien
avec tous ces livres, sortez vous me ferez bien ».
« Vraiment cela ne vous ennuie pas »,mais « Mais non, au
contraire je suis ravie que vous vous distraiez » « Je serais
si fière de montrer « Hé bien et vous » « Moi je suis très
heureuse comme cela » « Je serai ici vers 10 heures ».
« Mais non, ne rentrez qu"à minuit vo je vous n"aimez pas
vous coucher tôt moi non plus, je pourrai rester avec vous
jusqu"à 2 hs, aussi tandis que vous voudrez ». J’av Et je
partis chez les Verdurin
Soirée Verdurin.
nous sortimes de chez les Verdurin
Quand je rentrais le ciel une legère ondée était tombée, le
ciel de nouveau brillait était plein d’étoiles. Avais-je vu un
319
tout cela
et tout
ce qui
précède
est à
reécrire
beaucoup
mieux
101 52r.º
un tel ciel en chemin de fer, il me donne l’envie de
voyager ; dès que je ne serais plus jaloux d’Albertine je la
qui je tâcherais que nous nous quittions, car j’étais pers
l’obstacle que mon besoin d’être auprès d’elle mettait à
de travailler
mon désir de voyager me faisait croire que si j’avais été
seule, je ne serais mais au oublier qu’il y a eu avant
d’autres dans ma santé, dans ma paresse, dans mes
mauvaises habitudes de vie qui si je fusse rentré resté sans
elle m’auraient sans doute retenu à Paris sans rien faire.
Conversation de retour avec M. d Brichot sur Charlus.
Nous étions arrivés devant ma porte. Nous ne Il n’est pas
tard vous ne voulez pas me conduire jusque dans ma
lointaine [ ?] me dit Brichot. Je me disais que si j’y étais
allé j’aurais pu rester à mi chemin et entrer chez la
maquerelle dont m’avait parlé St Loup et chez qui à defaut
de voyage à Venise j’aurais pu au moins connaître ici soit
la femme de chambre de Mlle [Punttons], soit Mlle la
jeune fille de bonne famille. Mais devant la fenêtre de la
chambre d’Albertine dans notre appartement sombre, la
fenêtre de la chambre d’Albertine laissait passer à travers
ses volets une lumière qui signifiait qu’elle m’attendait
peignant. Il fallait rentrer, et je dis adieu à Brichot avec un
mouvement de regret, [mourant] de désir en pensant aux
caresses que j’étais sûr de trouver, et
320
où j’avais
été, je vis à l’
103 53r.º
pourtant un regret comme si j’avais refermé moi-même
sur moi la porte de ma douce mais ennyante prison.
Je n’avais pas pensé que j’ennuierais Albertine en lui
dès
que j’ais été
disant que j’avais été chez les Verdurin. Mais jadis en l’
la chercher dans sa chambre et l’ais emmenée dans la
mienne, quand
emmener avec laquelle elle l’apprit qu’elle croyait que
je lui dis
+ d’autant plus
qu’en parce que m’
avait dit Mme
Verdurin je sentais
qu’elle avait du
représenter à
Albertine sa
vie comme une
captivité qu’elle
avait trop bon
caractère de
supporter et qu’
elle devait m’
envoyer promener.
Et sachant
d’une part
j’avais voulu elle chercher à savoir pourquoi elle avait
voulu y aller. Peut’être avait-elle peur que je l’eusse
appris, à tout hasard elle jugea préférable de ne pas me le
dire. Mais je sentais qu’elle avait un air si ennuyé, si [ ?]
que je craignais qu’elle ne prit en horreur la
d’une part
vie qu’elle menait chez moi + Et sachant que rien ne nous
fait apprécier un bien que de croire qu’on va en être privé,
d’autre part pensant que’ le meilleur moyen une [ ?] était
par la réconciliation qui la suivait le meilleur moyen de ne
pas nous quitter fâchés comme cela arriverait
infailliblement à l’[envie] qu’elle avait, enfin peut’être par
survivance de ma croyance du temps de Gilberte que
quand une amitié ne marchait pas il n’y avait plus qu’à en
fonder une nouvelle : « Ma petite Albertine en n"est pas
parceque vous êtes fâchée que je vous dis cela car je vous
adore, mais c"est parceque votre fâcherie me fait mieux
comprendre combien la vie que vous menez ici vous est
ennuyeuse pour vous, et pénible, comment vous vous
satisferez
321
105 54r.º
pour moi, voyez-vous il faut vous quitter.
322
55r.º
Page Hurlus
+ mais j’avais quelque tristesse à penser que maintenant dédormais le plaisir physique
n’était plus pour moi l’appat qui m’aiderait à pénêtrer dans des pays et dans des vies
inconnues. Il Pour moi le trouver il ne me fallait plus Il n’était pas dans les rues ne
dans un double sa
[chassait] pas hors Et par une sorte de symbole car Albertine n’était pas seulement chez
par une
moi, elle était en moi, elle était devenue un complément, un double, une [amorce] de moimême, le plaisir n’était plus maintenant pour moi en dehors dans l’inconnu de la rue, des
ce que je faisais
ce n’était
routes, des pays, pour le trouver il ne me fallait plus partir en voyage ou en n’était pas
comme j’avais rêvé partir en voyage, ou simplement sortir c’était rentrer.
323
56r.º
157
Page Hurlus
Hé bien vous
D’en bas je voyais au second
étage, la fenêtre + celui de
notre, a la fenêtre d’Albertine
dont la lumière passait sous
irradiation
les rideaux. émanation de la
riche
présence qui mettait d tant de
plénitude
dans
mon
appartement,
devenue
familiale et domestique qui
appaisait
mettait irradiation de la
celle raison
riche
présence devenue familiale et
domestique. Elle J’avais une
sorte Je rentr d’une froide
attente froide, d’une présence
devenue
familiale
et
domestique. Mais elle n’était
mais
plus et qui n’était plus
mystérieuse que pour les
autres. J Si je me [réjoiais] de
penser que Brichot ne savait
pas pourquoi je le quittais,
c’était par un retour égoïste
sur moi-même, et comme si
mon corps se fut trouvé
doublé, accru d’un autre corps
invisible aux autres. Mais je
sentais une tristesse que
maintenant le plaisir Puis la
pensée des caresses qui
m’attendaient réveillèrent mon
désir +
lumière de la
Je rentrai. D’en bas je vis la fenêtre d’Albertine éclairée
qui m’attendait (le dire mieux). Mais j’avais depuis
quelque temps si peu de plaisir avec elle que’elle fit l’effet
de la fenêtre d’une prison, ce bonheur situé hors que
perpétuelle
j’avais cette présence d’Albertine qui remplissait ma vie
n’y mettait plus de j joie.
En apercevant cette fenêtre je pensai à cet autre être qui
m’empêchait d’être seul, qui me faisait déjà mener
d’avance si jeune une vie de famille et, je n’eus qu’un
désir ce fut de m’en délivrer. Et quand je refermai la porte
ma
cochère ce fut comme si je refermais la porte d’une prison.
Si encore Albertine avait eut l’air heureuse. Mais au dire
de Françoise chaque jour elle devenait plus exigeante et
quand je lui faisais dire de ne pas rentrer trop tard haussait
les épaules. J’allai la chercher dans sa chambre et elle me
conduisit à la mienne. « Hé bien vous êtes-vous amusé ».
Du « Pas beaucoup j"ai entendu d"assez belles choses ».
Et pour qu’elle ne put pas croire que j’avais voulu la lui
cacher si elle le voyait le lendemain dans le journal,
peut’être aussi pour voir si c’était à cause d’elle qu’elle
avait
était allée voulu il y a q.q. temps aller au Trocadéro :
« J"ai
324
la comédie de
la remplacer, je
pensai,
109
57r.º
d’abord entendu une personne assez commentée qui
s’appelle Léa ». Elle ne répondit rien. « Vous savez bien,
celle qui jouait à la matinée du Trocadéro où vous je suis
venu vous chercher ». « Elle y jouait, s’écria Albertine sur
un ton vif et dépité, comme si elle regrettait de ne pas
l’avoir vu et que je l’eusse privée de l’entendre ». « On
dirait Mon dieu ! quel regret ! » m’écriais-je irrité à mon
retour. « Elle qu’est-ce que vous allez encore chercher »
« Oh ! Albertine je n’aime pas « allez encore chercher »
cela ne fait pas partie du vocabulaire de la personne
Sans vouloir aller jusqu’à
recommencer
supérieure que vous devenez. Je pensai que le moment
que je ne
était puisque elle était de mauvaise humeur, je ne risquais
pourrais pas trouverde vrai
de rien de lui faire savoir ce que je lui caché depuis
ce
qui était
plusieures semaines pour éviter une scène, et pour à en lui
nécessaire pour reprendre mon empire et la soumettre
montrant que je le savais reprendre l’avantage et faire le
maitre. Après cela nous nous embrassions d’autant mieux
que je n’étais plus jaloux de l’une ni de l’autre chose que
je n’étais expliqué auxquelles j’avais trouvé des
explication qui innocentait Albertine. « Albertine lui dis-je
vous devez être moins amère. J"ai souvent à cause de vous
des chagrins que je ne vous dis pas. » Des gens qui ne
nous aiment pas m’envoient des lettres anonymes sur
vous, je ne vous en
325
58r.º
111
parle jamais ». « Et que disent-elles ces lettres
anonymes ». « Oh ! je ne j’en ai oublié les ¾ » « Ah ! il y
un tant que cela » »Vous avez l’air de ne pas me croire ? »
« Mais si, je mais si, je vous crois, allez toujours » « A
dit-elle ironiquement. « Albertine vous n’êtes pas polie. Je
vous citerai en [?] deux de ces lettres anonymes puisque
vous avez l’air de ne pas y croire. L’une me disait que si v
la ville de notre [ ?] de Balbec vous avez voulu le même
jour en y rester puis en partir, c’est parceque entre vos
[résolutions] vous avez été reçu une lettre d’Andrée vous
disant qu’elle ne viendrait pas.
203
As abreviações são respeitadas (“1er” por “premier”, “Me” por “Mme”, “Mlle” por Mlle,
“gd” por “grand”, “q.q.” por “quelque etc.), bem como os antigos usos ortográficos (“peut
´être” por “peut-être”, “grand´mère” por “grand-mère) e os hábitos de Proust (omissão do
hífem, números em algarismos arábicos, locuções em uma palavra como “parceque” etc).
Os erros ortográficos são respeitados, todavia os acentos são restituídos em caso de
omissão, as maiúsculas são acentuadas. A pontuação é respeitada.
O itálico assinala a presença de outro scriptor (secretário ou copista). As anotações
manifestadamente posteriores à morte de Proust, de leitores ou colecionadores, não são
transcritas.
As palavras cuja leitura é conjetural são seguidas de asterisco. As intervenções eventuais
do editor figuram entre colchetes. Palavras cuja decifração não ocorreu, devem ser assinaladas
por [ill.] ou [n mots ill.]. Se não foi possível decifrar grupos de palavras, recorremos à
menção: [passage ill.]
326
ANEXO A – Inventários dos cadernos 53 e 55.
NUMÉRO DU CAHIER : 53
CHERCHEUR : SERVIN Catherine
COTE N.A.Fr.
DATE : 31 Mars 1982
16 693
Nombre de feuillets
Cahier rédigé à l'endroit
Cahier rédigé à l'envers
Partie rédigée à l'endroit
Partie rédigée à l'envers
Feuillets restés vierges
Feuillets arrachés ou découpés
Feuillets collés
Inscriptions sur couverture
et pages de garde
64
X
2 v°, 7 v°, v° avant 10 r°,
25 v°, 26 v°. Tous les
versos de 33 v° à 48 v°
et de 51 v° au dernier v°.
2 r°, 4 r°, 5 r°, 22 r°, f°
non n° après v° 33P, 25 r°,
26 r°, 29 r°, 28 r°, 30 r°.
1 r°, 5 r°, 9 r°, 10 r°, 15
r°, 18 v°, v° 33P, f° non
n° après v° 33P, 24 v°,
25 r°, 26 r°, petite
paperolle.
néant
SOMMAIRE
1. Fin du séjour à Balbec: la révélation, le bouleversement, les
nouveaux projets et le début des images obsessionelles (2 r° à 11
v°).
a) Le narrateur apprend qu'Albertine connaît Mlle Vinteuil
b) Le narrateur, de retour dans sa chambre d'hôtel, réfléchit aux
conséquences de cette nouvelle (3 r° à 7 r°)
c) Entrée de la mère à qui le narrateur annonce sa décision
d'épouser Albertine (2 r° à 10 r°)
d) Le narrateur avec Albertine dans sa chambre
L'obsédante question: Comment faire pour l'empêcher de faire ce
voyage? (3 v° à 11 r°).
3 fragments isolés: 8 v°, 10 v°, 11 v°:
2. A Paris: Les promenades d'Albertine Et celles de l'imagination
du narrateur (12 r° à v° 37 P)
a) Conséquences immédiates de la présence d'Albertine à la maison
(12 r° à 14 r°)
b) Départ en promenade d'Albertine (14 r° à 16 r°)
c) Les promenades de l'imagination du narrateur (16 r° à 21 r°)
d) Albertine de retour de ses promenades (22 r° à f° non n° après
26 r°)
e) On ne travaille pas en débarquant dans un pays nouveau (23 r°
à r° 40P).
3. Les hiéroglyphes d'Albertine; le début du décodage (27 r° à 46
r°)
a) Les mises en scènes d'Albertine (27 r° à 34 r°)
Savoir interpréter son langage: le contraste entre ses intentions
réelles et les signes linguistiques qu'elle emploie.
(A propos de la soirée Verdurin)
b) Le narrateur analyse la jalousie (27 v° à 33 r°)
«Quelque chose de colérique et de dominateur»
L'atavisme ; l'antithèse fondamentale: «C'est par excès de
sensibilité qu'il est glacial».
c) La prisonnière (35 r° à 46 r°)
Pour le supporter ainsi, Albertine a-t-elle décidé que son
emprisonnement serait temporaire?
4. La matinée du Trocadéro et la soirée Verdurin (46 r° à 58 r°)
a) Le Trocadéro: le théâtre gomorrhéen (46 r° à 49 r°)
Le retour des obsessions.
b) La promenade d'Albertine avec le narrateur en voiture (49 r° à
51 r°)
Les mensonges du narrateur. Son apaisement par la possession
d'Albertine qui est aussi un obstacle aux vrais plaisirs.
c) Le retour de la soirée Verdurin (51 r° à 58 r°)
Qui est réellement prisonnier. Pressentiment d'un proche départ
d'Albertine. Derniers efforts pour se rendre maître de la
situation.
INVENTAIRE DÉTAILLÉ
1. Fin du séjour à Balbec: la révélation, le bouleversement, les
nouveaux projets et le début des images obsessionnelles (2 r° à
11 r°)
a) Le narrateur apprend qu'Albertine ira rejoindre «la propre
fille de Vinteuil» à Amsterdam (2 r°)
b) Le narrateur, de retour dans sa chambre d'hôtel, réfléchit aux
conséquences de cette nouvelle (de 3 r° à 5 v° et 6 r°, 7 r°)
La «furieuse envie de vivre», que lui inspirait jadis la vue
des «paysages matinaux», fera place désormais aux tracas (3 r°).
Le narrateur revoit la scène de la chambre de Montjouvain
dans laquelle il introduit à présent Albertine (3 r°).
c) Entrée de la mère du narrateur à qui il va annoncer sa
décision de se marier avec Albertine (de 2 r° à 5 v° et 6 r°, 7 r
°, 10 r°)
Il ne reconnaît pas sa mère d'abord (2 r° et 4 r°).
Annonce
du
mariage
dans
les
larmes
qui
suscitent
l'incompréhension de sa mère (4 v°, 6 r°, 7 r°).
«Ces paroles firent sans doute du chagrin à ma mère» (r° 7) mais
elle ne s'y oppose pas.
«Maman si nous demandions à Albertine de
quelque temps chez nous à Paris»? (10 r°).
venir
passer
En regardant la mer, le narrateur y superpose la scène de
Montjouvain, et il y voit «Albertine pelotonnée comme une grosse
chatte» (5 v°, 6 r°).
Le sacrifice que représente ce projet de mariage pour le
narrateur. (7 r°).
d) Le narrateur avec Albertine dans sa chambre. L'obsédante
question: «Comment faire pour l'empêcher de faire ce voyage?» (3
v°; 5 r°; 6 r°; 6 v°; 7 r°; 8 r°)
Feuille intercalée (abréviation Fi); 10 r° à 11 r°.
Le mensonge proprement dit: «J'ai quitté une femme que j'ai
dû épouser» (3 v°).
L'«Héritage»; l'appât du luxe (4 r°; 9 v°; 10 v° et 11 r°).
«Ma femme aurait une auto et un yacht [...] puisqu'Albertine
aimait tant faire de l'auto et du yatching, il était
malheureux qu'elle ne fût pas celle que j'aimâsse» (10 v°).
Les remèdes d'Albertine aux souffrances du narrateur (3 v°
et 8 r°).
Le narrateur lui propose de venir habiter à Paris avec sa mère et
lui; avec lui seul, sa mère étant à Combray. Albertine refuse
d'abord, puis accepte soudainement. (3 v°; 6 r°; 8 r°; 10 r°; 11
r°).
Le «gros» cou d'Albertine «que j'embrassais aussi chastement que
j'avais embrassé ma mère le soir à Combray» (3 v°; 8 r°; 11 r°).
La «localisation arbitraire» de la jalousie du narrateur.
Comment l'empêcher d'aller à Amsterdam. Mais elle trouvera aussi
à Paris de quoi satisfaire ses goûts. «Je pensais sans cesse à
Amsterdam, cette ville était comme une pointe douloureuse et
permanente dans mon coeur» (9 r°; Fi; 10 r°).
Il reste trois fragments isolés:
8 v° dans lequel Proust indique: «pour mettre un peu plus loin
quand notre vie avec Albertine à la maison commence». Les
rapports d'Albertine avec la noblesse. Mme de Guermantes. Elstir
lui en a parlé comme d'une femme élégante.
10 v° dans lequel Proust indique: «quelque part capital dans ce
cahier» (bruit de la brise glacée dans le vieil appartement de
Paris).
11 v° Intervalle de temps qui le séparait d'Albertine. Le temps
et l'oubli dans l'amour. (Gilberte) «Mais pour Albertine
l'intervalle avait été moins long, j'avais encore pu la rejoindre
et l'aimer».
2. A Paris: les promenades d'Albertine et celles de l'imagination
du narrateur (12 r° à v° 37 P)
a) Conséquences immédiates de la présence d'Albertine à la maison
(12 r° à 14 r°).
L'impossible est réalisé: «Il me fait remonter à ce soir où
Maman vint coucher dans le lit à côté du mien si je veux trouver
une autre circonstance où la vie m'ait fait remise, contre toute
prévision, d'un malheur qui me semblait à la fois inévitable et
mortel (12 r°).
La présence d'Albertine calme seulement les souffrances du
narrateur et permet de «réparer comme un pansement les parties
qui avaient été si brusquement déchirées le soir où j'avais
appris qu'Albertine avait été l'amie de Mlle VINTEUIL». (13 r°).
La fin de la souffrance n'est-elle pas la fin de la poésie?
Ainsi le téléphone et les autres «progrès de la communication»
sont «destructeurs de poésie en étant destructeurs de souffrance,
au lieu d'imaginer, c'est-à-dire à la fois d'agrandir et de
rendre plus important et de donner la seule réalité, la réalité
spirituelle aux êtres....» l'amour ne peut pas se former si on
remédie toujours à la peine (13 v° + 14 r°).
Fragment isolé: 14 v°:
«Quand je dis... que je ne me souvenais que rarement de ma
grand-mère.....».
b) Départ en promenade d'Albertine (14 r° à 16 r°)
Albertine est surveillée par «quelqu'un en qui j'avais
confiance» (Andrée de préférence)», et distraite par une
«automobile ou des chevaux» (14 r° + 14 v°). L'apaisement est
possible.
Début des rêveries sur les bruits extérieurs du matin (14 r° + 15
r°):
«Je savais déjà le temps qu'il faisait par les bruits de la
rue». «Peut-être ces bruits eux-mêmes avaient-ils été
devancés par une émanation plus rapide et plus pénétrante
qui traversait mon sommeil et établissait entre mon être et
la journée commençante une harmonie si immédiate» (15 r°).
Le plaisir de rester seul «jusqu'à ce que «j'eusse appelé».
Françoise amène le Figaro. Albertine récite Esther (15 r°).
Indication structurale quant à la place à donner au «petit
bonhomme barométrique» (14 v° et 15 r°).
Les bruits d'Albertine à la maison (14 v°). Le même
sentiment qu'au 12 r°: «cette jeune fille que j'avais cru ne
jamais pouvoir connaître était en effet sous mon toit».
Le refus de sortir avec Albertine: prétexte aux développements
esthétiques (15 r° + 16 r°).
En réalité: «je préférais rester seul dans mon lit où «je ne
prenais pas moins part des plaisirs de la journée» les plaisirs
obliques (16 r°).
Les premiers mensonges d'Albertine pressentis: «comment le
deviner» (15 v° et 16 r°).
Fragment isolé (16 v°):
Correspondance entre le narrateur et sa mère. Il la froisse.
Elle lui rétorque comme disait sa grand-mère citant Mme de
Sévigné...
c) Les promenades de l'imagination du narrateur (16 r° à 21 v° +
v° 33 P)
Les variations atmosphériques renforcent le désir de rester
seul; le narrateur est toujours en communication intime avec
l'extérieur (16 r°).
Souvenirs et/ou désirs de voyages (17 r°): les réminiscences
surgies des brindilles dans le feu: Combray et Doncières.
17 v°: Toute la théorie proustienne de la réalité:
«les joies d'une mémoire profonde....».
18 r° «je jouissais avec mon imagination de toutes les
matinées pareilles, passées ou possibles, ou plutôt d'une
matinée
unique,
éternelle
dont
elles
n'étaient
que
l'apparition intermittente».
Image du convalescent qui «jouit de tous les mets qu'on lui
refuse encore».
19 r° Le narrateur vérifie si «la lumière du soleil était bien en
diapason exact avec celle qui baigne mon imagination».
Rêveries esthétiques sur la vision des jeunes filles dans la
rue (20 r°).
18 v° + 19 v° + 33 P: Pour Albertine, le pastiche des robes et
toilettes de la duchesse de Guermantes.
Les jeunes filles dans la rue ont fait naître un désir de liberté
(19 r° + 20 r° + 21 r°).
Albertine est un obstacle et de plus «d'Albertine je n'avais
plus rien à apprendre» (19 v°).
«Alors je voulais partir, dès que je serais guéri pour
Venise, et comment le faire si j'épousais Albertine?» (20 r
°).
+ 21 r°: «Ah, si elle avait pu ne pas rentrer aujourd'hui,
partir tout à fait!»
Seul l'Art (Vinteuil; Bergotte; Elstir) permet
d'éprouver encore de la tendresse pour Albertine.
au
narrateur
«Etait-ce que l'Art remettait entre elle et moi les
distances de l'imagination qui me l'avaient fait aimer à
Balbec quand je ne la connaissais pas?» (20 v° + 21 v°).
Le retour d'Albertine,
(semblable au 14 v°).
le
plaisir
de
la
possession
(21
v°)
d) Albertine de retour de ses promenades (22 r° à F° non n° après
26 r°)
La tombée du jour fait ressurgir Balbec (22 r°).
Le narrateur cache Albertine à ses amis (Bloch ou St Loup)
(22 v°).
Albertine de retour envoie Andrée au rapport comme si elle
avait deviné qu'Andrée était chargée de la surveiller (22 v°).
Le baiser d'Albertine fait ressurgir celui de maman le soir
à Combray. Tous deux ont le même pouvoir d'apaisement (f° 31 P
semblable au F° 37 P et au 31 v° + v° 36 P + 13 r°).
La dimension de l'inconnaissable (21 r° + 22 v° + v° 33 P +
page non foliotée après 26 r°).
Les réponses qu'Andrée soulèvent sans cesse de nouvelles
interrogations, et ne font que «reculer l'inconnaissable» qu'est
«la vie d'une autre personne» (v° 33 P).
La nature de l'amour du narrateur pour Albertine.
v° 33 P: pas de sécheresse, pas de joie non plus.
r° 31 P: Albertine procure au narrateur un réconfort semblable à
celui qu'il recevait, enfant, de sa mère. Et puis: «n'était-ce
pas la même Albertine... que j'avais connue à Balbec sous son
polo plat, avec ses yeux insistants et rieurs?» (v° 33 P).
Les différentes images d'Albertine (23 v° + 24 v°).
Il y a encore, dans l'amour du narrateur, en plus du pouvoir
d'apaisement d'Albertine, «tout ce désir que j'avais eu de
connaître les jeunes filles dont le cortège insolent et fleuri se
déroulait le long de la plage.» (Page non foliotée après v° 33
P).
Auprès d'Albertine, le narrateur renonce à ses doutes: «dans
l'abdication d'un croyant qui prie» (23 r°), repris au v° 36 P.
Est-ce un amour filial? (Page non foliotée après 26 r° + 26
r°). Non mais «un devoir sacré, ma dévotion passionnée,
douloureuse à la jeunesse, à la beauté de la femme».
e) «On ne travaille pas en débarquant dans un pays nouveau». (23
r° + 24 r° + 24 v° + 25 r° + r° 40 P)
Les «incidents barométriques» (24 r° + 25 r° + r° 40 P).
«Chaque ciel nouveau le matin est comme un pays nouveau
auquel il faut d'abord s'habituer».
«Comment aurais-je reconnu ma paresse?» (24 r° + r° 40 P).
«Je me mettrais à l'ouvrage le lendemain» (r° 40 P).
Quel est le prix de le vie, du temps?
«La vie devient chère à celui qui court le risque de la
perdre» (40 p).
240°: «La vie prend de la valeur parce que nous y mettons
tout ce qu'elle peut nous donner, et non pas tout ce qu'elle
nous donne en réalité».
3. Les hiéroglyphes d'Albertine, le début du décodage (Petite
paperolle avant 27 r° à 46 r°)
a) Les mises en scènes d'Albertine (Petite paperolle 27 r° + 27 v
° + 28 r° + 28 v° + 30 r° + 33 r° + 34 r°)
Choix du matériau linguistique sur lequel le narrateur va
effectuer son codage. (Petite paperolle après le v° 37 P):
«Je n'attachais plus au contraire d'importance qu'aux
témoignages qui ne sont pas une expression rationnelle,
analytique et directe de la vérité».
Application de ce théorème à Albertine (27 r° + 28 r° + 33 r
° + 34 r° + 30 r°).
«Je savais qu'elle le voulait rien qu'à la nonchalence avec
laquelle elle disait: «Je ferai peut-être; je ne sais pas si
j'irai» (27 r° + 30 r°).
Albertine parle de la soirée Verdurin. Le narrateur, en
exprimant à son tour son désir d'y aller, réussit à dissuader son
amie de s'y rendre, (30 r°) sans qu'il comprenne s'ailleurs,
pourquoi elle y tenait tant.
v° de page non foliotée après 30 v°:
douloureuse. Qui lui a appris certains mots.
une
réminiscence
Le «tableau» d'Andrée au téléphone (27 v° + 28 v°).
Le narrateur demande pourquoi les peintre modernes n'ont pas
l'idée de «cette scène où naîssait si spontanément sur les lèvres
de la femme qui écoute un sourire d'autant plus vrai qu'il sait
n'être pas vu.»
Le narrateur rêve sur le prénom d'Albertine comme Swann
l'avait fait sur celui d'Odette (28 v°).
b) Le narrateur analyse sa jalousie (27 v° + 29 r° + 30 v° + page
non foliotée après 30 v° + 31 r° + 31 v° + 32 r° + 33 r°)
27 v°: «Un inquiet besoin de tyrannie appliqué aux choses de
l'amour». Il remarque qu'il a donc changé et qu'il ressemble de
plus en plus à ses parents.
30 v°: thème de la filiation et du dédoublement = de la
présence en lui-même de plusieurs membres de sa famille. Thème
aussi de la dichotomie essentielle entre la vie intérieure et
celle dans les «rapports sociaux».
Etre méchant avec Albertine, «c'est si naturel» (r° non n°
après 30 v° + 31 r°). «Autrui nous est indifférent, et
l'indifférence n'invite pas à la méchanceté».
31 v° + 32 r° + 33 r°: Le narrateur tremble de ne pouvoir
garder toujours Albertine auprès de lui. Après un froid baiser de
son amie, il fait les cent pas devant sa chambre, et pleure toute
la nuit (33 r°).
Le Code d'Andrée (28 r°): Elle n'aime pas faire plaisir.
Elle est comme jalouse et «sa figure se brouillait toute entière,
devenait gluante comme un sirop tourné».
c) La prisonnière (35 r° à 46 r° + 32 v°)
Albertine prisonnière même de la coiffure que le narrateur
l'oblige à adopter (32 v°).
Albertine ne veut plus sortir qu'accompagnée, elle devine
les soupçons du narrateur (35 r° + 36 r°).
La prophétie du narrateur: «Je me disais que sa mort aurait
été la suppression de mes souffrances» (35 r°).
Le narrateur comprend qu'elle se sent prisonnière (37 r°).
Albertine: «Comment pourrais-je être plus heureuse?» (38 r°).
Mais le narrateur voit dans ses yeux «tantôt l'espérance, tantôt
le souvenir, tantôt le renoncement et le regret, le regret de
joies que je devinais et auxquelles elle préférait renoncer
plutôt que de me les dire».
Albertine répond évasivement aux questions du narrateur (38 r° +
39 r°).
Albertine n'est qu'une «merveilleuse Princesse de Chine captive
possédée à l'insu de tous» (38 v°, 39 r° + 40 r°).
Mais le narrateur ne peut que «caresser l'enveloppe de cet être
que je sentais par ailleurs donner sur un infini» (40 r°).
Révélation d'Andrée découvre un autre mensonge d'Albertine
(41 r° à 44 r°).
(A propos de la fin du séjour à Balbec et du brusque revirement
d'Albertine).
Pour tenter de faire parler Albertine, le narrateur dit avoir
reçu des lettres anonymes, disant qu'elle a des relations avec
Andrée (42 r°). Colère d'Albertine (43 r° + 44 r°).
«Mais
le
lendemain,
je
d'Italie» (45 r° et 46 r°).
m'éveillais
sous
un
ciel
4. La matinée du Trocadéro et la soirée Verdurin (46 r° et 58 r°)
(fin)
a) Le Trocadéro (46 r° à 49 r°)
46 r° à 47 r°: Révélation par le Figaro, Mlle LEA figure au
programme de la matinée théâtrale.
Il faut empêcher Albertine de la lui «laisser voir ainsi
embellie par la scène et le succès» (47 r°).
47 r° et 48 r°: Le narrateur envoit Françoise qui fixe à
Albertine un rendez-vous auquel il va se rendre.
Mensonge du narrateur à Albertine pour justifier son geste
(49 r°).
b) Promenade du narrateur avec Albertine en voiture (49 r° à 50 r
°)
Plaisir d'avoir Albertine à ses côtés, «mais ce plaisir tout
égoïste excluait en quelque sorte ceux que la solitude m'eût
donnés» (49 r°).
Ils
voient
«des
effets
de
lumière
et
d'ombre
qui
enchantèrent Albertine parce qu'elle ignorait ce que c'est que
regarder vraiment la nature» (50 r°).
Retour à la maison: le narrateur analyse ce qui constitue en
fait, la possession d'un être (49 v° à 51 r°).
«Qu'il s'agisse de l'art ou de la vie, nous ne possédons une
ligne, une surface, un volume, que si notre amour l'occupe
et s'y tient» (49 v°).
«Je la sentais dans ma main, lourde, captive, odorante,
savoureuse, empourprée comme si j'eusse rapporté un fruit
opulent et doux» (50 v°).
Ils sont dans la chambre d'Albertine qui est «comme la
bouteille bien close où je sentais enfermée
ma Princesse de
Chine» (51 r°).
c) Retour de la soirée Verdurin (qui n'est pas racontée dans le
Cahier 53) (52 r° à la fin)
Désir de voyage provoqué par «le ciel de nouveau plein
d'étoiles». «Dès que je ne serai plus jaloux d'Albertine, je
tâcherai que nous nous quittions» (52 r°).
A défaut de voyage à Venise, le narrateur entrevoit la
possibilité d'aller chez «la maquerelle dont m'avait parlé SaintLoup», et, qui sait, d'y rencontrer la femme de chambre de Mme
Putbus (52 r°).
La lumière aperçue à la fenêtre d'Albertine (52 r° et 56 r°)
= Le narrateur quitte Brichot et rentre «comme si j'avais refermé
sur moi la porte de ma douce mais ennuyeuse prison.» (53 r°).
Le narrateur apprend à
Verdurin. Mauvaise humeur de
Il a peur qu'elle parte
faut nous quitter» (53 r° et
Albertine qu'il est allé chez les
celle-ci (53 r°).
et tente de prendre les devant: «Il
54 r°).
Le narrateur essaie d'en avoir plus. Il lui dit que Mlle LEA
était à la soirée Verdurin (56 r°).
Il invente de nouvelles lettres anonymes (57 r° et 58 r°)
pour qu'elle se trahisse.
(Les F° 55 et 56 r° sont intitulés «Page Hurlus».)
N O T E
La Bibliothèque nationale n'ayant pas folioté toutes les
pages du Cahier 53, j'ai dû recourir à un certain nombre
d'appellations qui me sont propres et que je me dois de
justifier.
- Quelques pages ne sont pas foliotées par la Bibliothèque
nationale mais portent un numéro que leur a attribué Marcel
Proust.
Nous avons alors conservé cette pagination en y ajoutant
l'initiale de l'auteur.
Ainsi par exemple: v° 36 P ou r° 40 P.
- D'autres pages ne sont ni foliotées par la Bibliothèque
nationale, ni par l'auteur; nous avons choisi, pour que l'on
puisse s'y reporter sans risque d'erreur, de les nommer en les
situant par rapport au verso ou au recto le plus proche.
Par exemple: Page non foliotée après 26 r°.
ou: v° non folioté avant 31 r°.
Mais, c'est une constante de l'écriture proustienne, la
composition des cahiers n'est pas linéaire, le r° 40 P, par
exemple, se trouve avant le v° 36 P, aussi nous a-t-il semblé
nécessaire de donner le détail de l'ordre d'apparition des pages
qui devrait permettre de mieux saisir l'enchaînement des parties
de cet inventaire.
1 r°/ v°; 2 r°/ v°.....9 r°/ v°; r° 10 bis - 12 - 12 bis P; 10 r
°/ v°....22 r°/ v°; r° 31 P; F° non n° après v° 33 P; 23 r°/ v
°; ....25 r°/ v°; r° 40 P; v° 36 P; 26 r°/ v°; F° non n° après 26
r°; v° 37 P, Petite Paperolle; 27 r°/ v°....30 r°/ v°; F° non n°
et v° non n° après 30 v°; 31 r°/ v°...............64 r°.
NUMÉRO DU CAHIER : 55
COTE : N.A.Fr. 16 695
Nombre
Cahier
Cahier
Partie
Partie
de feuillets
rédigé à l'endroit
rédigé à l'envers
rédigée à l'endroit
rédigée à l'envers
Feuillets restés vierges
Feuillets arrachés ou découpés
Feuillets collés
Inscriptions sur couverture
ou pages de garde
CHERCHEUR : Emanuelle BOUCHER
DATE : juin 1983
96
X
50 pages
18 pages
5 pages
SOMMAIRE
1. «La fenêtre éclairée»: 9r°, 12 r°, 13 r°, 11 v°, 12 v°, 10 v°,
11 r°.
2. «Ce qui se passe dans la maison»: 13 r°, 14 r°, 15 r°, 13 v°,
14 v°, 16 r°, 17 r°, 18 r°.
3. La comédie de la rupture: 16 v°, 17 v°, 18 v°, 19 r°, 20 r°,
21 r° marge, 20 v°.
4. Citation de Mme de Sévigné: 21 v°.
5. Le «Renouvellement de bail»: 21 r°.
6. La tactique de la menace: 21 r°, 22 r°, 23 r°, 24 r°.
7. Retrouver le calme: 24 r°, 25 r°, 24 v° marges, 23 v°, 24 r°
marge, 24 v°.
8. Tableau d'Albertine au pianola: 26 r°, 27 r°, 28 r°, 29 r°, 33
v°.
9. Réflexions sur la musique, à partir de Vinteuil: 31 r°, 32 r°,
33 r°, 34 r°, 33 v°, 34 v°, 30 r° marge et paperole, 31 v°, 32 v
°, 33 r° marge.
10. Albertine est bien autre chose qu'une oeuvre d'art: 35 r°, 36
r°, 37 r°, 38 r°, 39 r°, 37 v°, 38 v°, 38 r° paperole.
11. Le chant d'un oiseau inconnu: 39 r°.
12. Sortie avec Albertine à Versailles: 40 r°, 41 r°, 42 r°.
13. L'odeur de pétrole d'une automobile: 43 r°, 42 v°.
14. Désir de Venise: 43 r°, 44 r°, 45 r°, 44 r° marge, 43 v°.
15. Le «choc» du départ d'Albertine: 45 r°, 46 r°, 45 v°, 47 r°.
16. «La souffrance va plus loin en psychologie que le meilleur
psychologue»: 47 r°, 48 r°, 48 v°, 49 v°, 47 v°.
17. Réactions secondaires: 49 r°, 50 r°, 51 r°, 50 v°.
18. La démarche de St Loup: 52 r°, 53 r°, 54 r°, 55 r°, 56 r°, 57
r°, 58 r°, 57 v°.
19. Comment le héros réagit au désir que semble avoir Albertine
de revenir: 58 r°, 59 r°, 58 v°, 60 r°, 61 r°.
20. Nouvelle de la mort d'Albertine: 62 r°.
21. Note-mémento: Le yacht, la rolls: 51 v°.
22. Une action militaire avant les négociations? 52 v°.
23. Note sur Françoise: «Le verso sur Françoise»: 55 v°.
24. Les différents moments du jour rappellent au héros ses
promenades avec Albertine: 83 r°, 84 r°, 85 r°, 84 v°.
25. Note sur Françoise, «quand Albertine est morte»: 83 v°.
26. La «lame» du petit jour: 85 bis r°.
27. «Les bruits de la rue»: 85 v°.
28. Savoir regarder: 62 v°.
29. Le pastiche Goncourt: 62 v° à 78 r°.
30. «L'étonnement que ces gens soient célèbres»: 76 v°, 77 v°
marges.
31. «Pour ce qui concerne le petit Dunkerque»: 72 v°.
32. Sur la conception de l'oeuvre: 81 r°, 82 r°, 81 v°.
33. L'opinion publique pendant la guerre: 87 r°.
34. Sur les articles de Bergotte pendant la guerre: 87 r°.
35. Conversation avec Gilberte: La Fille Aux Yeux D'Or: 91 r°, 92
r°, 93 r°.
36. Conversation avec Gilberte: Roussainville: 92 v°, 93 r°.
37. Conversation avec Gilberte: «comment vous avez-été fiancés?»
90 v°.
38. Conversation avec Gilberte: «Pourquoi ne vous mariez-vous
pas?» 91 v°, 92 r°.
39. Notes sur le souvenir d'Albertine au fil des saisons: 93 v°,
94 r°, 94 v°, 95 r°, 96 r°, 96 v°.
INVENTAIRE DÉTAILLÉ
1. «La fenêtre éclairée»
a)«Brichot me demanda où j'allais, je lui répondis: «chez
moi». [...] Conversation avec Brichot» (9 r°).
En répondant à Brichot qu'il rentrait chez lui, le héros
pensait que sa soirée allait seulement commencer. Des «ondes de
clarté» émanaient de la chambre d'Albertine. Voir P., p. 397 et
398.
b)«Comme je n'avais que de l'ennui de rentrer car je n'avais
plus de jalousie à l'endroit d'une rencontre possible
d'Albertine avec Melle Vinteuil [...] Je sentais que dans la
demeure où je rentrais, où j'étais obligé de rentrer comme
un mari» (12 r°, 13 r°).
Rentrer - en sachant qu'Albertine n'avait pas hésité à lui
sacrifier Mlle Vinteuil (P., p. 401). Le rectangle de lumière de
la lampe d'Albertine causait au héros un sentiment de douceur
(P., p. 398).
c)«Brichot me demande quelle adresse il devait donner au
cocher et je lui dis la mienne. [...] Dans cette chambre
dont la lumière d'ici me semblait humaine, trop humaine
mystérieuse parce que Brichot ignorait ce qui y veillait et
douce parce qu'elle était le signe de la vie jadis si
désirée, du corps charmant qui m'y attendait» (11 v°, 12 v°,
13 r° marge latérale).
Indication de régie: «Voir dans
ne comptent plus s'il n'y a rien que
le verso et le recto précédents» (11
dans le mince cahier bleu au recto et
ce verso et le suivant qui
j'aie oublié de mettre dans
v°). Renvoi: «Et voir aussi
verso (illisible)» (11 v°).
Retrouver Albertine qui l'attendait c'était renoncer à tous
les plaisirs nouveaux qu'il aurait pu goûter s'il s'était promené
seul (P., p. 398). «A travers les volets la lumière de la fenêtre
d'Albertine» étaient «comme les rayons de ce trésor si
soigneusement caché à Brichot» (P., p. 398).
d)«Nous étions arrivés devant ma porte [...] c'était
plaisir à la fois familial et sensuel» (10 v°, 11 r°).
un
Indication de régie : «Pour le morceau ci-dessous. Il
vaudrait mieux insister sur l'ennui et laisser la douceur, la
richesse des sensations pour quand elle est morte. Ceci est le
morceau définitif (quoique la forme soit à changer) qui annulle
(sic) les pages suivantes (mais non pas q-q pages avant quand
Brichot me demande l'adresse). Mais regarder dans les pages
suivantes où je disais moins bien la même chose si je n'ai rien
oublié.» L'important dans cette rédaction est que tout le contenu
thématique y soit = «inventaire» de ce qui doit être abordé dans
ce passage (10 v°).
Les rayons de la lampe d'Albertine signifiaient le «trésor
insoupçonné [...] en échange duquel», il renonçait à «la liberté,
la pensée, la solitude.» (P., p. 397, 398). Maintenant pour
trouver du plaisir, il devait rentrer et abdiquer auprès de cet
être «comme un enfant dans les bras de sa mère.» (P., p. 398). Le
«plaisir de sentir (sa) vie remplie par une personne».
2. «Ce qui se passe dans la maison»
a)
«Devinez
d'où
je
viens
Albertine?
de
chez
les
Verdurin» [...] «Naturellement, j'en étais sûre, il avait
des soupçons, il a voulu les vérifier, et pour que je ne
puisse pas le gêner, il a fait tout cela en cachette» (13 r
°, 14 r° ).
Le mécontentement d'Albertine transparut sur son visage, à
l'annonce de la visite faite par le héros chez les Verdurin (P.,
p. 400).
b)«[illisible] chercher Albertine dans sa chambre, je
l'amenais dans la mienne et après l'avoir embrassée:
«Devinez d'où je viens, de chez les Verdurin» [...]
«Naturellement, il avait des soupçons, cela ne lui a pas
suffi de m'empêcher d'aller chez les Verdurin, il a voulu y
aller pour se rendre compte» (14 r°, 15 r°).
Sur l'«altération énigmatique» du visage d'Albertine.
c) «Certes Albertine ne m'avait jamais dit qu'elle me crut
épris d'elle et jaloux d'elle, préoccupé de tout ce qu'elle
faisait [...] «Ah! alors je m'en doutais bien! alors vous
avez vu Melle Vinteuil!» (13 v°, 14 v°).
Indication de régie: «Ceci vient tout de suite après la
fenêtre éclairée. C'est par là que commence tout ce qui se passe
dans la maison» (13 v°).
Le héros se souvient des deux moments où autrefois, ils
avaient échangé des propos sur la jalousie et pensa qu'Albertine
avait depuis changé d'opinion sur «la nature de (ses) sentiments
pour elle», puisqu'elle avait explosé en apprenant sa visite au
salon Verdurin (P., p. 399 et 400).
d) «Je ne savais pas que cela vous ennuierait que j'aille
chez les Verdurin» [...] et puis d'autre part quand je la
sentais ainsi fichée je ne voyais qu'une manière d'amener
avant qu'elle allât se coucher un apaisement qui permettrait
qu'elle me dit» (15 r°, 16 r°, 17 r°, 18 r°).
Colère et découragement se lisent sur le visage d'Albertine:
si Albertine était «coupable dans ses intentions», elle se
sentait «empêchée de les mettre jamais à exécution», ou bien,
supposait le héros, si elle était «innocente de pensée et de
fait», elle voyait que, ni le sacrifice de la soirée Verdurin, ni
le retour du Trocadéro n'avaient suffi à lui faire regagner sa
confiance.
3. Comédie de la rupture
a)«J'eus tout d'un coup l'épouvante que l'idée de me quitter
ne traversât son esprit [...] Albertine qui jouait son rôle
sincérement et croyait devoir se préparer à partir
[illisible] l'angoisse d'une séparation véritable» (16 v°).
Le héros dit à Albertine qu'il serait mieux qu'ils se
quittassent, et cela dès ce soir pour diminuer le chagrin. (P.,
p. 410). Réflexion du héros sur l'obstination qu'il montre
souvent à menacer «un être», «dans sa sécurité». Indication de
régie s'y rapportant: «peut-être mettre ceci un peu plus loin,
parmi les raisons pour lesquelles je dis cela, mais il faudrait
mieux dire d'abord: ma chère petite Albertine etc... je continue»
(P., p. 423, 424).
b) «Elle parut à la fois stupéfaite, comme incrédule et déjà
désolée. «Comment demain? Vous le voulez?» [...] la croyance
que de toutes façons je la quitterais un jour ou l'autre,
croyance que ma scène de ce soir ne pourrait que
fortifier» (16 v°, 17 v°, 18 v°, 19 r°).
Le héros, afin qu'Albertine puisse comprendre entièrement la
situation, parle du temps où ils seront séparés: Albertine devra
restituer le livre de Bergotte. (P., p. 411). Dialogue où le
héros fait de la personne linguistique «nous», l'agent de la
séparation, ce qu'Albertine rectifie à chaque fois, en reportant
sur lui seul la responsabilité de l'action: «vous». Parallèle
avec les comédies qu'il pouvait jouer à sa grand-mère, indication
de régie s'y rapportant: «je pense que j'ai du marquer ailleurs
(sans cela le marquer ici) que cela ajoute au caractère familial
de mes relations avec Albertine. Et en tous cas mettre:»
c)«Et puis Albertine je vous demande en grâce une chose,
c'est de ne jamais chercher à me revoir [...] aussi elle
avait l'air de ne pas répondre» (20 r°).
La nuit avançait et se rapprochait le moment de se dire
bonsoir où il faudrait que le héros dise qu'ils ne se
sépareraient pas cette fois. (P., p. 430).
d)«Oh! ne pleurez pas comme cela mon chéri, non je ne
chercherai pas à vous revoir» [...] quand peut-être de
l'amour de l'autre, il ne resterait rien» (21 r° marge, 20 v
°).
Note de l'auteur (20 v°): «mettre de temps en temps (ou une
fois) à la fin des phrases dans cette scène: «Mais il faut finir,
il peut-être quatre heures du matin, c'est de la folie: enfin
pour le dernier soir, vous aurez le temps de dormir tout le reste
de la vie!» (P., p. 411).
Albertine promet de ne plus revoir le héros. Thème des
larmes, preuves de son grand amour, qui touchaient d'autant plus
Albertine qu'elle le transposait dans le domaine de l'amitié.
(P., p. 428).
4. Citation de Mme de Sévigné
Indication de régie: «chaînon important. A un des moments où
je dis que je veux lui proposer le mariage, ou ne pas le lui
proposer, enfin je veux dire à un des moments où je retarde
l'idée d'une séparation».
Fragment retranscrit intégralement: «Cependant ma mère
s'inquiétait de ne rien savoir, Elle finit par m'envoyer une
lettre recommandée avec prière de la lui retourner par le même
courrier où elle me copiait cette phrase de Mme de Sévigné: «Pour
moi, je suis persuadé qu'il ne se mariera pas; mais alors
pourquoi troubler cette fille qu'il n'épousera jamais? pourquoi
risquer de lui faire refuser des partis qu'elle ne regarde plus
qu'avec mépris; pourquoi troubler l'esprit d'une personne qu'il
serait si aisé d'éviter». (21 v°), (P., p. 437 et 438).
5. Le «renouvellement de bail»
«provisoires qui finissent par durer toujours» «Oh! ce que
vous seriez gentil» [...] «M'aimez-vous un petit peu?»
«Encore plus qu'avant» (21 r°).
«En souvenir d'un renouvellement de bail», expression que le
héros écrit en dédicace à Albertine sur un manuscrit de Bergotte.
On a ici la fin de la réconciliation puisqu'Albertine dit au
héros: «seulement alors c'est de la folie de nous être fait mal
comme cela pendant des heures», sans que l'on ait assisté au
déroulement de celle-ci: cette rédaction aura été déchirée (P.,
p. 431).
6. La tactique de la menace
«Qu'est ce que c'était que cette scène que je lui avais
jouée? [...] comme si à ce moment là il y eut eu au loin tel
plaisir que je ne savais pas, dont sa présence chez moi la
privait, et qu'elle avait envie d'aller rejoindre» (21 r°,
22 r°, 23 r°, 24 r°).
Note de l'auteur: «(Et tâcher de préciser les plaisirs que
je suppose voir l'Idiot)».
Les réflexions au sujet de la «comédie» du héros sont
intégrées à une problématique plus large. Celle des «menaces»
dont il avait l'habitude à l'égard d'Albertine, et celle de la
tactique choisie: comparaison avec le rôle du bluff dans une
déclaration de guerre entre deux peuples (P., p. 434 et 435, 436,
437).
7. Retrouver le calme
a)«Je sais que vous
essayer de calmer vos
que je pusse supposez
communications que je
n'avez pas confiance en moi je vais
soupçons.» [...] si elle avait craint
que par le téléphone, elle eut eu des
pourrais blâmer» (24 r°, 25 r°).
Selon le héros, afin d'enrayer ses soupçons, Albertine
s'arrangeait pour ne jamais téléphoner seule (P., p. 438 et 439).
b)«Et cette vie si cruelle pour moi [...] à l'affoller (sic)
de l'idée de la surveillance à laquelle elle était soumise
et que Françoise devait exagérer fort» (24 v° marges).
Sur Françoise: la vie d'Albertine lui apparaissait comme une
vie de «plaisirs immérités». Grande intuition grâce à laquelle
elle comprenait la situation et pouvait chercher à précipiter la
«chute» d'Albertine (P., p. 439, 440, 441).
c)«Au dessus des regards, les sous-entendus de Françoise qui
en avaient été l'orchestration perfide, avait du s'élever
plus claire et plus puissante, la voix calomnieuse des
Verdurin [...] le dernier mot de la sagesse était peut-être
celui de mon grand-père quand se refusant à présenter Swann
dans le «petit clan», au seul nom des Verdurin, il criait: à
la garde!» (23 v°, 24 r° marge).
Sur ceux qui apportent la brouille entre les êtres: les
Verdurin, symbolisant les gens du monde (P., p. 441). Distinction
à faire entre les «médicaments toxiques» et «les médicaments
dangereux» que l'on peut appliquer aux gens du monde.
Indication de régie: «Pour mettre probablement au verso
suivant quand je parle des personnes qui excitent la rébellion.
(dans ce cas sans doute avant Françoise, ou après, se suivant en
un seul bloc). Si c'est après ce serait tout à la fin du verso,
avant si le but d'Albertine était. Puis (et c'est cela le
nouveau:» (23 v°).
d)«Si le but d'Albertine était de me rendre le calme elle y
réussit en partie [...] D'ailleurs la séquestration absolue
qu'elle provoquait elle-même était le meilleur des calmants.
En m'otant la souffrance, il m'otait le soupçon, et je pus
recommencer» (25 r°, 24 v°).
Deux voies possibles pour appréhender la vérité au sujet
d'Albertine: celle de la raison qui se «laiss(e) guider par le
désir» et qui cherche à le «guérir», celle son instinct «se
laiss(ant) guider par la jalousie pour (le) rendre malade» (P.,
p. 442).
8. Tableau d'Albertine au pianola.
Les trois thèmes principaux qui constituent cette unité de
texte sont ceux de «la fille sauvage domestiquée», de la
description en blason du corps d'Albertine, et des regards du
héros sur Albertine. S'ils font l'objet de formulations répétées
qui alternent entre elles, il s'agit d'un même fragment
rédactionnel. C'est pourquoi l'on a choisi d'inventorier pour
chaque thème, ses occurences (26 r°, 27 r°, 28 r°, 29 r°, 33 v°).
a) «La fille sauvage» de Balbec, maintenant «domestiquée»
27 r°: «Elle que j'avais crue impossible - et étais arrivé à
posséder - fille sauvage ravissante bête sauvage aujourd'hui
mystérieusement domestiquée.»
Image d'Albertine s'asseyant au pianola, encadrée par la
bibliothèque comme par «l'enfoncement d'une niche» (P., p. 447,
p. 460).
29 r°: «Et c'était pour moi quelque chose de plus mystérieux
que la domestiquation (sic) d'une créature sauvage ou
surnaturelle» (P., p. 460).
«tout ce coin de la chambre semblait réduit à n'être plus
que la sa niche, le son sanctuaire éclairé, la sa crèche, de
cet ange musicien» (P., p. 462).
26 r°: Le héros pense avoir fait d'Albertine une fille
«instruite
et
domestiquée».
Peut-être
était-ce
une
«illusion» car il y a des animaux comme la panthère dont un
jour ou l'autre, «l'état premier revient».
b) Description en blason du corps d'Albertine
«Ses belles jambes»: «que dès le premier jour j'avais
imaginées
avec
raison
manoeuvrant
pendant
toute
l'adolescence les pédales d'une bicyclette» qui actionnaient
maintenant les pédales du pianola (27 r°, 29 r°, P., p.
460). A noter l'indication de régie: «Le dire en son temps
le premier jour et marquer qu'elles étaient hautes».
«Ses doigts»: «jadis familiers seulement du guidon, se
posaient maintenant sur les touches comme ceux d'une sainte
Cécile, d'un ange musicien.» (27 r°, P., p. 461).
Note qui évoque (27 r° marge) les «épaules basses et
sournoises» d'Albertine quand elle rapportait des clubs de golf,
et
qui
«s'appuyaient
maintenant
naturellement
à
(s)es
livres» (P., p. 460).
«Son cou» et «son visage»: «son cou que sa robe de chambre
laissait nu était rose mais moins que son visage». (27 r°).
«à son visage qu'ils ne voyaient
que de profil et penché comme celui d'une Ste Cécile ou d'un
ange musicien.»
«son cou plein et fort dont le
tour vu ainsi [...] et à cette distance et sous la lumière
de la lampe, paraissait plus rose, moins pourtant que son
visage» (28 r°, P., p. 461).
Les yeux: seulement évoqués au 28 r°, «paupières qui
fermaient comme à demi les yeux».
Signalés au 29 r° comme un thème à aborder puisqu'ils
sont nommés; «les yeux», après un point virgule, et que
cette désignation est suivie d'un espace laissé en blanc
(P., p. 461).
Les cheveux: «et les cheveux crespelés comme par un
sculpteur sur bois qui a mis tout son art à en fouetter les
mèches et semblait dépasser la variété que réalise la nature
et répondre plutôt au désir d'accumuler les difficultés pour
faire valoir la souplesse, la fougue, le fondu, la vie, dans
son éxécution» (P., p. 461).
«Et les cheveux noirs et crespelés avec leur «fouetté»
si riche, si multiple faisaient ressortir davantage en
l'interrompant pour la recouvrir la courbe animée et comme
la rotation du visage des joues lisse mat et verni comme un
bois peint celles d'un ange musicien» (P., p. 461, 462 et 25
r°).
Et voir 33 v°, où l'on trouve, intégrés à la rédaction de
l'unité textuelle suivante, des éléments précis pour le «tableau
d'Albertine au pianola», tel qu'il apparaît, P., p. 461, 462:
notes pour les images géométriques et pour la métaphore de la
chaîne de montagnes.
c) Les regards du héros sur Albertine
27 r°: «mes regards venant de parties si profondes de moimême, et brûlant d'un désir si fort ajoutèrent à son
visage[...].»
28 r°: «auquel mes regards venant des profondeurs de moimême chargés souvenirs et brûlant de désir ajoutaient un tel
brillant, un tel glissant, une telle intensité de vie, que
son relief semblait s'enlever et tourner avec la même
puissance presque magique que le jour à l'hôtel de Balbec où
ma vue se brouillait en la regardant dans son lit;» (P., p.
461).
9. Réflexions sur la musique, à partir de Vinteuil.
Cette unité de texte, qui va dans l'édition de la page 447 à
la page 460 (P.), s'y trouve agrandie de réflexions sur la
littérature analogues à celles faites sur la musique. Et de la
question de l'association possible de la musique de Vinteuil avec
Melle Vinteuil dans l'esprit du héros.
a)«[...] pour qu'elle nous le fasse changer contre un
autre», souvent s'il y avait pour moi, avec un morceau de
musique de moins dans le monde, une vérité de plus [...] où
les sonorités s'étouffent dans l'illimité des distances et
le feutrage de la neige» (31 r°, 32 r°, 33 r°, 34 r°, 33 v°,
34 v°).
Les premières études de Vinteuil et leur «arrière plan
moëlleux de silence». Ses dernières oeuvres qui se rassemblent
par «une certaine atmosphère mélodique». Les phrases fréquentes
dans toute l'oeuvre d'un même musicien et qui en deviennent Les
«divinités familières». Le héros compare une de ces phrases à «la
seule véritable inconnue qu'il (lui) eut été donné de rencontrer.
Impossibilité de communiquer la particularité de nos
sensations (P., p. 450). «Le vrai bain de jouvence [...] ce
serait d'avoir d'autres yeux, de voir tout d'un coup l'univers
d'un autre, c'est ce prodige que l'art accomplit si bien [...]»
Image d'Albertine jouant: la «coque de cheveux noirs en
forme de coeur [...] comme le noeud d'une infante de
Velasquez» (P., p. 448) 34 r°. Albertine exécute du Borodine et
du Rameau: le pianola est alors comparé à «une lanterne
magique» (P., p. 460).
b)«Quand Albertine commençait à jouer du Vinteuil, une
sonate du Vinteuil des dernières années [...] On se contente
plus simplement de rejouer et d'écouter en soi-même le
morceau» (30 r°, marge et paperole).
Chaque artiste a son accent. Différence très profonde entre
deux artistes, différence de pensée que le héros reconnaît «comme
on reconnaîtrait un monde éclairé mais à travers le verre qui
laisserait passer seulement la lumière et non point les formes.»
c)«Cette musique me semblait quelque chose de plus vrai que
tous les livres que j'avais lu; [...] ne suit pas forcément
manque de profondeur» (31 v°).
La musique, plus proche de la vérité? Le narrateur justifie
cela par le fait que «la traduction littéraire» en rendant compte
de nos sensations les «explique», mais ne les «recompose» pas.
(P., p. 450). Et que ces «moments de la vie où nous sentons le
plus profondément étant à ce moment inanalysables pour nous parce
qu'ils mettent en jeu des forces dont nous ne nous sommes pas
encore rendus compte, nous trouvons au charme d'une phrase
musicale
cette
ressemblance
avec
de
telles
impressions
[...]» (P., p. 459). Il faut noter que ces deux réponses à la
question de la vérité de la musique, alors qu'elles se succèdent
dans l'espace textuel du cahier, sont situées dans l'édition à
une dizaine de pages l'une de l'autre.
d)«Au fond c'était une même phrase parce que c'était fait
avec la même âme [...] c'était le plus profond de notre âme
qui soulevé s'unissait à l'identité» (32 v°, 33 r° marge).
Présence du «même rêve» dans toutes les oeuvres de Vinteuil,
«mais réfracté à travers des milieux différents». La ressemblance
entre deux oeuvres différentes est bien plus «frappante» qu'entre
les variations d'un même thème au sein d'une oeuvre. Exemple du
quatuor et du septuor.
10. Albertine est bien autre chose qu'une oeuvre d'art.
a)«les cheveux, Et pour des plus jeunes aussi, rattachant sa
beauté par l'habitude qu'il avait de ses rapprochements, à
telle oeuvre d'art prestigieuse [...] dans ses yeux comme
dans
les
glaces
trompeuses
d'une
voiture
les
feux
innombrables inaltangibles et reflétés» (35 r°, 36 r°).
L'association d'Albertine à «une idée artistique», «étendait
(s)on amour, lui ajoutait des preuves. Mais ce n'était pas de là
qu'il venait». (P., p. 462). Car Albertine est pour le héros
«tout autre chose qu'une oeuvre d'art», «plutôt comme une grande
déesse du Temps possédée». (P., p. 466). Cependant après quelques
heures d'illusion il se rendait compte qu'il ne la possédait pas
(P., p. 462).
b)«je ne possédais pas Albertine [...] je ne me résignais à
laisser mener à Albertine cette vie où malgré ses» (37 r°,
38 r°, 39 r°).
Il voyait flotter sur elle «le reflet de ces spectacles
intérieurs dont la contemplation la faisait ces soirs-là
dissemblable de (lui)» (P., p. 463). Et quand Albertine lui
parlait de ses promenades en Hollande, il souffrait de
l'impossibilité de l'interpénétration des âmes». (P., 464 et
465). La solitude eut été selon lui «plus féconde et moins
douloureuse», mais quelle oeuvre d'art lui aurait ouvert «ce
petit chemin de communication vers [...] la vie des autres?».
c) 37 v°: Plusieurs notes portant sur différents thèmes sont
entourées et isolées les unes des autres par un trait.
38 v°: Deux colonnes l'une à côté de l'autre traitent
chacune d'un thème différent.
A côté de cette curiosité douloureuse qu'il avait de ce pssé
d'Albertine, toute curiosité «artistique ou mondaine» lui
semblait de «l'indifférence». («Capitalissime») (P., p. 464). Il
avait d'autant plus peur chez Albertine de ce «perpétuel besoin
de roman nouveau», qu'il en était lui-même «dévoré». (P., p.
465).
A propos de l'église de Combray, par laquelle son
imagination avait perçu «cette dimension quatrième des choses».
Elle l'invitait «dans une forme pressante, cruelle et sans issue
à la recherche des jours écoulés, elle était comme un grande
déesse du Temps». N.B.: utilisation de cette dernière expression
à propos d'Albertine, fragment A.
d) Paperole collée en haut du 38 r°.
Indication de régie:
années où elle avait vécu
face ou au verso ailleurs
Capital». Proust parle en
narrateur.
«Pour ajouter à ces lieux, à ces
qui me troublent, mettre ici ou en
(ici me semble bien ou ce verso).
tant qu'auteur, mais s'assimile au
Note sur l'amour qui d'«extérieure» qu'elle était rend la
personne que nous aimons plus «intérieure» à nous.
11. Le chant d'un oiseau inconnu.
39 r°: Note marginale en bas de page, isolée par un trait.
Très proche de la version de l'édition (P., p. 467), note
sur «le chant d'un oiseau inconnu» entendu de son lit par le
héros et sur «la blancheur du jour» «quotidiennement accrue»,
dépassant du rideau. («Capital»).
12. Sortie avec Albertine à Versailles.
N.B.: Absence de notes sur les circonstances du
Versailles: furent-elles déchirées avec le 40 r°?
mentionné le retour de Versailles.
départ à
Seul est
a) 40 r°: quelques lignes sur le bas de page qui subsiste.
Suite et fin 41 r°: «[...] à mes forces convalescentes».
Évocation de la «belle saison» où notre «maison errante»
vient de s'arrêter «sous un ciel clément» (P., p. 486 et 487).
b)«Désir, Grâce sans doute au souvenir (sic) épars de
rendez-vous oubliés que j'avais eu collégien encore, avec
des femmes [...] comment la lune d'argent des anciens poètes
était devenue bleue avec Victor Hugo [...] et puis redevenue
jaune et métallique avec Baudelaire et Lecomte de Lisle» (42
r°).
Reprise de la rédaction du thème du fragment A. N.B
commentaire de l'auteur: «Dire mieux.» Thème du «jeune Adam» dans
un «univers nouveau». (P., p. 487). Au retour de Versailles, dans
la rue les pantalons rouges auprès des jupons de couleur
signalaient les rendez-vous amoureux. Désir d'être seul de la
part du héros et de pouvoir rencontrer une inconnue (P., p. 489
et 490).
13. L'odeur de pétrole d'une automobile.
a)«Comme un vent qui s'enfle mais par une progression
régulière, j'entendis une automobile, sous la fenêtre [...]
je me les rappelais bien les feuillages déjà touffus» (43 r
°).
Au réveil, l'odeur de pétrole d'une automobile rappelle au
héros les promenades à travers les champs de Balbec, et provoque
en lui une rêverie sur la campagne et tout ce qu'il pourrait y
faire (P., p. 495).
b)42 v°: Trois notes éparses sur la page dont la plus
importante entourée d'un trait se prolonge sur la marge du
43 r°.
Note sur la «sévère loi» et citation du vers (P., p. 496).
Dessin pouvant figurer un croissant de lune, des étoiles et une
cathédrale (à deux clochers). Long développement à partir de
l'odeur de pétrole venant de la rue, qui est très proche de celui
que contient l'édition (P., p. 495 et 496).
14. Désir de Venise.
a)«Mais tout d'un coup le décor changea; [...] «laissez-moi
que j'ai le temps de lire cela. Je n'avais pas encore ouvert
la lettre; m» (43 r°, 44 r°, 45 r°).
Le héros ressent tout à coup le désir, «réveillé quelques
jours auparavant par la robe bleu et or de Fortuny», de partir à
Venise. Evocation du printemps. (P., p. 496). Allusion à
«l'expérience de Balbec» (P., p. 499). Arrivée de Françoise dans
la chambre annonçant au héros «qu'Albertine a demandé ses malles»
et qu'elle est partie à 9 heures» (P., p. 499).
b)«Oui, il fallait partir; [...] quelque chose de visible ne
pouvait réaliser de l'ineffable, le gothique« (44 r° marge,
43 v°).
C'est le moment idéal pour quitter Albertine et partir à
Venise. Il projette de s'assurer qu'Albertine ne pourra aller, ni
en Hollande, ni à Montjouvain, (A.D., p. 24). Le narrateur se
souvient qu'il n'avait pas fait, sur le moment, le rapprochement
entre le désir qu'il avait eu de Balbec, et ce désir de Venise,
et qu'ainsi il ne s'était pas rappelé, que de sa visite à Balbec,
il ne lui était «rien» resté (P., p. 499).
15. Le «choc» du départ d'Albertine.
a)«C'était précisément ce qui j'avais cru souhaiter tout à
l'heure [...] j'ai toujours eu si peur devant vous, que même
en me» (45 r°, 46 r°).
Indication de régie: «plutôt resserrer et mettre ici ce qui
est trois ou quatre pages plus loin combien la souffrance est le
meilleur psychologue». Proust avait l'intention d'amalgamer les
deux unités 15 et 16 que l'on a distinguées. C'est ce qui a été
fait dans la rédaction de l'édition, voir: A.D, p. 7 à 14.
A ces mots «Mademoiselle Albertine est partie», le héros
ressentit une douleur telle qu'«il fallait la faire cesser
immédiatement.» Comparaison avec sa mère promettant à sa grandmère le remède qui calmera ses souffrances. (A.D, p. 7 et 8). Le
héros construit une nouvelle «croyance»: «tout cela n'a aucune
importance [...] je vais examiner les moyens mais elle sera ici
ce soir». (A.D, p. 8). Lecture de la première lettre d'Albertine
(A.D, p. 9 et 10) dont on ne trouve que le début à la fin du 46 r
°: le recto qui suivait a du être déchiré.
b) Fragment retranscrit intégralement, 45 v°: «L'avenir est
ce qui n'existe pas encore, ce qui nous semble n'exister que
dans notre passé. Aussi nous avons l'illusion de le tenir,
d'en disposer. Seulement des forces beaucoup plus pressantes
que nous agissent déjà sur lui; quand Albertine était encore
à la maison je me disais: «nous verrons je la garderai». Et
elle était tout de même partie? J'ouvris sa lettre» (A.D.,
p. 9).
c)«insupportable avec elle et me décide à l'épouser. [...]
et j'avais cru tout à l'heure que c'était une des choses que
je ne désirais pas» (47 r°).
Réflexion qui suit - suppose-t-on - la lecture de la lettre
d'Albertine. L'important était qu'elle fût rentrée le soir, dûtil offrir la moitié de sa fortune à Mme Bontemps (A.D., p. 10 et
11).
16.«La souffrance va plus loin en psychologie que le meilleur
psychologue».
a)«En voyant comment je m'étais trompé [...] Mais cette
connaissance
[...]
venait
de
m'être
apportée,
dure,
éclatante, étrange, comme un sel cristallisé, par la brusque
réaction de la douleur» (47 r°, 48 r°).
Avant le départ d'Albertine le héros pensait ne plus avoir
d'amour pour elle parce qu'il comparait la «médiocrité des
plaisirs» qu'elle lui «procurait» à la «richesse» de ceux dont
elle le «privait». Mais la «brusque réaction de la douleur» lui a
apporté une connaissance que l'intelligence n'avait pu lui donner
(A.D., p. 7 et 8).
b)«J'avais cent fois pensé au départ d'Albertine: il me
semblait alors qu'il serait souhaitable parce que je
l'organisais moi-même [...] pas plus que les approches de la
mort ne laissent intacte la bonne santé» (48 v°, 49 v°).
Le héros pouvait concevoir le départ d'Albertine, dans le
contexte de leur union, comme ceux qui, certains de leur bonne
santé, n'envisagent pas désagréablement la mort (A.D., p. 14).
c)«j'avais cent fois pensé au départ d'Albertine, j'aurais
pu y penser pendant des siècles que toutes ces pensées mises
bout à bout [...] avec la rapidité foudroyante d'un
phénomène naturel» (47 v°, 48 r°).
Indication de régie du 47 v° qui nous donne l'enchaînement
des versos: «Ce morceau ne vient pas ici, après la douleur + mais
après la douleur + vient le morceau qui commence au verso suivant
continue au verso d'après et finit ici.« Indication du 49 v°:
«Suivre 2 versos avant: j'avais cent fois pensé (ne pas confondre
qu'à 1 verso avant il y a aussi j'avais cent fois pensé mais
c'est parce que je redis 2 fois cette formule».
Le héros n'avait pu imaginer ce qui se passerait réellement
quand Françoise vint lui annoncer le départ d'Albertine parce que
«l'intelligence emprunte au connu pour se représenter une
situation». (A.D., p. 14). A une âme qui croyait garder Albertine
et nourrissait d'autres désirs, s'était substituée, chez le
héros, une âme inquiète de la seule possession d'Albertine.
17. Réactions secondaires.
a)«Et hélas réveillées par l'inquiétude nouvelle, toutes
celles que j'avais eues depuis mon enfance, accoururent la
renforcer. [...] je l'avais oublié ce moi là; son arrivée
fit éclater mes sanglots comme à un enterrement» (49 r°, 50
r°, 51 r°).
Dans l'angoisse de son départ «étaient venues se fondre
toutes celles qu'(il) avait eues dans (sa) vie», celles des
«soins de Combray» par exemple. (A.D., p. 15). Renaissance de la
douleur telle qu'il l'avait ressentie avant de l'enrayer par une
nouvelle croyance. (A.D., p. 20). Il fallait agir, se lever, en
évitant les objets qui lui redisaient le départ d'Albertine
(A.D., p. 21 et 22) en avertissant ses différents «moi» de la
séparation (A.D., p. 22 et 23).
b) Indication de régie (50 v°): «Cette phrase (apposition au
mot chagrin serait mieux ailleurs si ailleurs j'ai
l'occasion de la mettre, si ailleurs je dis alors renaissant
mon chagrin (le chagrin qui n'est nullement...)». Dans
l'édition, cette réflexion se trouve dans ce passage (A.D.,
p. 22 et 23).
Note retranscrite intégralement: «C'est à dire lui apprendre
mon chagrin qui n'est nullement une conclusion pessimiste et
abstraite
tirée
librement
d'un
ensemble
de
circonstances
funestes, mais la reviviscence intermittente et involontaire
d'une impression spécifique, venue du dehors et que nous n'avons
pas choisie» (50 v°).
18. La démarche de St Loup.
a) Débuts de phrases raturés et toujours recommencés. Le
texte compréhensible est barré en croix et déchiré presque
en entier. «Quand j'avais souhaité qu'Albertine m'aimât
[...]» (52 r°).
Tactique du héros qui consiste à dire à Albertine qu'il ne
l'aimait pas pour s'en faire aimer, qu'il voulait la quitter pour
qu'elle ne l'abandonnât pas (A.D., p. 29 et même 58).
b)«je pourrais être d'autant plus énergique dans les moyens
de la faire revenir, que j'aurais l'air personnellement
d'avoir renoncé à elle [...] Il y a tant de choses qu'on
ferait pour 30000 frcs, beaucoup plus difficiles que de dire
à sa nièce de ne pas rester en Touraine» (53 r°, 54 r°).
Stratégie pour faire revenir Albertine: lui écrire une
lettre d'adieux et envoyer St Loup en Touraine, auprès de Madame
Bontemps (A.D., p. 30 et 37).
c)«Une fois les trains consultés on vit qu'il ne pourrait
partir que le lendemain [...] il me fallait à nouveaux
frais, avec la même douleur recommencer l'apprentissage de
la séparation. Puis Ia concurrence des autres formes de» (54
r°, 55 r°, 56 r°).
Persuadé du succès du St Loup, le héros retrouve l'état où
il était avant qu'Albertine ne parte. (A.D., p. 41 et 43). Mais
l'apparition du «moi» du coiffeur à qui il fallait dire la
nouvelle, le fit sangloter «comme au lit de mort d'une personne
chère l'arrivée d'un vieux serviteur ignorant de ce qui se passe.
(A.D., 23 et aussi 51 r°). Recommencer toujours l'apprentissage
de la séparation (A.D., p. 45).
d)«qui plus tard serait chez moi un état permanent [...] et
je me donnais aux yeux d'Albertine un air de tenir à elle
qui ne pouvait que l'empêcher de revenir» (57 r°, 58 r°).
Fin d'une réflexion sur le thème de l'oubli (A.D., p. 45,
46). S'il supportait le départ d'Albertine c'était en le pensant
provisoire. Il n'en avait pas moins habitué son coeur, son corps,
à vivre sans elle (A,D, p. 47). Et bientôt le souvenir de sa
solitude viendrait remplacer celui de la vie commune (A.D., p. 47
et 48). Télégramme de St Loup annonçant l'échec de la démarche:
fureur du héros (A.D., p. 50 et 51).
e)«Mais que m'importait? [...] c'est à peine alors s'ils
peuvent encore l'apercevoir devenu imperceptible dans le
lointain» (57 v°).
Si ce moyen là a échoué, il y en aura bien un autre. Mais
souvent alors que l'on croit changer les choses selon notre
désir, c'est notre désir qui change (A.D., p. 51).
19. Comment le héros réagit au désir que semble avoir Albertine
de revenir.
a)«Je reçus peu après [...]» (58 r°).
Début déchiré du télégramme qu'envoie Albertine au héros, en
réaction à la démarche faite par St Loup (A.D., p. 52, 53).
b)«plus de ces démarches absurdes [...] ayant toujours été
partisan de ce mariage» (59 r°).
A réfléchir sur ce qu'a écrit Albertine: «J'aurais été trop
heureuse de revenir», le héros se dit qu'il ne fallait pas l'en
presser pour «effacer l'effet de la démarche St Loup» (A.D., p.
53).
c)«Quelle joie j'aurais de la revoir, comme nous allions
être heureux, me disais-je [...] tout ce qui est délivré des
terribles difficultés de réalisation, tout ce qui est
imaginé dans le vide, soustrait» (58 v°).
Le départ d'Albertine, en introduisant la distance, l'avait
faite
redevenir
«l'être
non
possédé
qu'elle
était
à
Balbec» (A.D., p. 53).
d)«à peu tout ce qu'on disait par mensonge devient vrai
[...] comme au moment où nous nous croyions seul le visage
brusquement apparu d'un étranger» (60 r° et marges).
A force de feindre l'indifférence, le héros finira par la
ressentir si Albertine laisse passer plus d'un mois avant de
revenir (A,D, p. 64). La souffrance constante du héros ne
signifiait pas qu'il ne cessait de penser à elle à proprement
parlé (A,D, p. 69). «Les images qui accompagnaient (sa)
souffrance, ce n'était pas celle d'Albertine, mais celle de la
gare d'Orsay [...]» (A,D, p. 70). Lettre-réponse d'Albertine
annoncée dans le texte, citée dans une indication de régie
(«mettre avant cette lettre»), mais déchirée (voir édition p.
74).
e) 61 r°: texte principal à
ajoutée en partie illisible.
moitié
déchiré
et
paperole
Le récit de St Loup a donné au héros des détails lui
permettant de se représenter précisement la vie d'une Albertine
de nouveau libre. L'espoir de son retour est annéanti (A.D., p.
79, 80).
20. Nouvelle de la mort d'Albertine.
«un prétexte pour courir auprès d'elle, morte j'eus retrouvé
comme disait Swann «la liberté de vivre» [...] mais ne
m'étais-je pas déjà dit quelquefois qu'elle ne reviendrait
peut-être pas?,je me l'étais dit; je m'apercevais que je
l'avais jamais cru un instant. Comme j'avais besoin de sa
présence, de» (62 r°).
Réception par le héros du télégramme de Mme Bontemps qui lui
annonce la mort d'Albertine: il est certain qu'Albertine ne
reviendra pas.
21. Note-memento: le yacht, la rolls.
Reproduite intégralement: «N.B.: Dire quand elle est partie
que je me décide brusquement à tout ce devant quoi j'avais hésité
jusque là, l'épouser et la commande immédiate d'un Yacht et d'une
Rolls» (51 v°).
22. Une action militaire avant les négociations?
«Sans doute si elle était partie comme les peuples qui
préparent une négociation diplomatique [...] et alors même
si je l'emportais ensuite (illisible) tout de même à jamais
vaincu» (52 v°).
Indication de régie: «Faire attention que j'ai fait ailleurs
cette comparaison - pas ce qui suit mais négociation action
militaire et la supprimer à l'un des deux endroits». (cf. unité
de texte n° 6).
Était-ce une action militaire afin de mener les négociations
d'une vie en commun plus avantageuse? (A.D., p. 26 et 27).
23. Note sur Françoise: «Le verso sur Françoise».
«De temps en temps quand il me semblait qu'on ne pouvait pas
voir que j'avais pleuré, [...] puis je la priai de me
laisser seul et je déchirai la lettre» (55 v°).
Le héros sonnait Françoise pour lui demander de faire faire
la chambre d'Albertine, afin qu'elle ne crût pas que ce départ
était «de longue durée».
A.D., p. 39: A la place que ce thème occupe dans le cahier i.e.
pendant la période de «la démarche St Loup», que l'on désigne
comme la position A.
A.D., p. 65: A la place qu'indique l'indication de régie du 60 r
°: «mettre avant cette lettre le verso 10 pages moins loin sur
Françoise.», i.e. avant la réception de la lettre d'Albertine
(son 3e et dernier message), que l'on désigne comme position B.
Parler d'Albertine à Françoise permettait au héros de
«remettre quelque chose d'elle dans cette chambre». (A.D., p. 65,
soit la position B).
Inquiétude de Françoise quand le héros cherchait l'adresse
de la tante d'Albertine. (A.D., p. 73, position B, juste avant la
lettre).
24. Les différents moments
promenades avec Albertine.
du
jour
rappellent
au
héros
ses
a)«grand rideau, j'étouffais un cri à la brusque déchirure
que venait de faire en moi ce rayon de soleil ancien [...]
où le clair de lune, dématérialisant la terre, la
faisait» (83 r°, 84 r°, 85 r°).
Dans sa chambre parisienne, le héros reconnut tout à coup
«ce rayon de soleil ancien» «qui lui avait fait paraître belle la
façade neuve de Bricqueville l'orgueilleuse», lors de son
excursion là-bas avec Albertine (A.D., p. 88, 89). Le jour
baissait et avec le crépuscule revenait le souvenir des retours
de promenade. Traversée de la plaine de Doncières («Autre nom»,
écrit Proust entre parenthèses - dans l'édition il s'agit de la
plaine de Cricqueville), dans la brume ou sous le clair de lune
(A.D., p. 90). Courte note sur la façon qu'il avait de
«recueillir un rayon de lune» dans les rues de Paris (A.D., p.
92).
b)«Et alors en son temps je mettrai plutôt Nous retrouvions
les champs, les coteaux par lesquels nous avions passés
[...] s'élançait si légère vers lui l'astre, tout le long de
la route, la vocalise éperdue des glèbes opâlisées». (84 v
°).
Comparaison qui n'apparaîtra pas dans le texte de l'édition,
du prolongement de la terre dans le ciel, avec celui du mot par
le chant: au «firmament timbré par l'énorme écu mauve de
l'astre»,
répond
«la
vocalise
éperdue
des
glèbes
opalisées» (A.D., p. 90).
25. Note sur Françoise, «Quand Albertine est morte».
«Françoise devait être heureuse de la mort d'Albertine [...]
... elle était trop heureuse la pauvre, elle n'a pas su
connaître son bonheur» (83 v°).
Régie: «Quand Albertine est morte (je choisirai le moment
sans interrompre le développement)». Dans le cahier, cette scène
se trouve au milieu de la rédaction de l'unité précédente, alors
que dans le texte de l'édition, elle est situé juste après
l'évocation des promenades avec Albertine (A.D., p. 91).
Scène où Françoise surprend le héros en train de pleurer
(A.D., p. 91 et 92).
26.«La lame» du petit jour.
«L'élan de ces souvenirs si tendres venant se briser contre
l'idée qu'elle était morte [...] sa lame [...] entrait comme
un couteau dans mon coeur.» (85 bis r°, ainsi désigné parce
que compris entre 85 r° et 86 r°, mais non composté).
Dans le coeur du héros, déjà ému par les souvenirs auxquels
il venait de se laisser aller, la «lame» du «petit jour», «au
dessus des rideaux», fit l'effet d'un «couteau» (A.D., p. 93).
27. «Les bruits de la rue».
«Bientôt les bruits de la rue allaient commencer [...] la
même vie morne où rien de tout cela n'existait pour
nous» (85 v°).
«Les bruits de la rue» et «le degré de chaleur» de l'air
déduit par la qualité de «leurs sonorités», n'exprimaient plus
pour le héros «le désir des femmes mais l'angoisse du départ
d'Albertine» (A.D., p. 93 et 94).
28. Savoir regarder.
«Je savais que je ne savais pas regarder,
[...]».
Suite et fin dans la marge latérale (62 v°).
pas
écouter
Indication de régie: «Kapital peut-être tout de suite avant
Goncourt quand j'ouvre le volume Dire». Reférence à un autre
cahier: «voir dans Babouche».
Note pour le passage où le héros se dit qu'il ne savait pas
regarder et ne pouvait percevoir les choses que d'un point de vue
général (T.R., p. 41).
29. Le pastiche Goncourt.
a) «Avant hier tombe chez moi Verdurin, l'ancien critique de
la Revue Bleue. [...] mais c'est un grand écrivain
Stevenson, l'égal des plus grands, mais oui, absolument des
plus grands» ( 63 r°, 62 v°, 64 r°, 63 v°, 65 r°, 66 r°, 67
r°).
Commentaire: «Si je ne laisse pas les
développements cidessus mettre ailleurs cette phrase excellente un nom qui met
dans la bouche de... cette phrase» (67 r°). A relier avec un
autre commentaire sur le style artiste, à la Goncourt: «il faudra
autant que possible ne pas souligner les adjectifs étranges et
souligner les mines Drôlettes, le beau» (74 v°).
Goncourt, qui devient le narrateur, (puisqu'il s'agit d'une
page de ses «volumes») croque Verdurin en quelques mots et
rapporte ses dires à propos du fumoir à décor vénitien (T.R., p.
29 et 30, p.39). Arrivée quai Conti où l'hôtel Verdurin peut
donner «la sensation d'un palais de Venise» (T.R., p. 30).
Énumération
des
personnes
assemblées:
Cottard,
Swann,
le
sculpteur polonais, la grande dame russe (T.R., p. 31 et 32). Les
bouquets de chrysanthèmes japonais (T.R., p. 31). Étonnement de
Goncourt devant les perles noires de Mme Verdurin qui en raconte
elle-même l'histoire ( T.R., p. 37: où c'est Swann qui raconte).
Analogie, faite par Swann de telles altérations avec celles
qui se produisent «dans le cerveau des gens» (T.R., p. 38).
Intervention de Cottard à ce sujet. L'anecdote du bijou, autre
objet sauvé de l'incendie, est absente de la version de
l'édition. Il fut donné par Elstir à Mme Verdurin. A la
suggestion de Goncourt que le récit «des existences successives»
où le bijou amènerait la guigne serait «un curieux sujet de
nouvelle», Mme Cottard parle de Stevenson (T.R., p. 38).
Exclamation de Swann sur la grandeur de Stevenson T.R., p. 39).
b) «Avant hier, dans la crainte que je n'oublie son
invitation acceptée il y a quinze jours, tombe chez moi
Verdurin [...] cette conspiration organisée contre nous par
la Sorbonne, et apportant jusque dans l'aimable salon où je
suis fêtée, la contradiction, l'hostile, d'un silence voulu»
(69 r°, 70 r°, 71 r°, 72 r°).
Trois rédactions du commencement du pastiche dont deux sont
interrompues. La dernière est celle qui se trouve dans l'édition
(T.R., p. 29). Proust y a remplacé La Revue Bleue par La Revue et
les noms de Manet et de l'école de Barbizon par celui de
Wisthler. Note sur les tours du Trocadéro. (T.R., p. 30).
Évocation du fumoir et de «la margelle de puits» représentant «un
couronnement de la vierge», «du plus beau Sansovino» (T.R., p.
30). Illusion de Venise au quai Conti (T.R., p. 30 et 31). Sur le
quartier qu'il a connu et qu'il se prend à «raimer» (T.R., p.
31). Présentation de Brichot, «à la cravate [...] d'un magistrat
traducteur d'Horace», qui sans cette qualification correspondrait
à celle de l'édition (T.R., p. 32).
c) «Lequel les religieuses d'autrefois, les Miramiones, se
rendaient aux offices de Notre Dame [...] comme le sont les
vagues de la mer de L'huître et Les plaideurs de La Fontaine
dans l'édition des Fermiers Généraux» (73 r°).
Développement du thème du quartier de son enfance que
Goncourt se met à «raimer», par le biais de la boutique du «Petit
Dunkerque» et du XVIIIe siècle que celle-ci évoque.
d) «Nous passons à table et alors c'est un défilé
extraordinnaire d'assiettes qui sont des chefs d'oeuvre de
l'art de la porcelaine [...] une barbue qu'on sert non avec
la colle à pâte que préparent sous le nom de sauce blanche
des chefs» (73 v° et sa paperole).
Rédaction
du
«défilé
d'assiettes»
(T.R.,
p.
31).
Développement sur «les choses servies là-dedans» (T.R., p. 33).
e) «Un manger finement mijoté, tout un fricot comme les
parisiens il faut le dire bien haut n'en ont jamais dans les
plus grands dîners [...] il y a un tas de mouvements
intéressants, d'une grâce tout à fait «Léonardesque» (74 r°,
75 r°, 76 r°, 77 r°, 78 r°).
Reprise de la rédaction sûr «les choses servies làdedans» (T.R., p. 33). Description des assiettes qui contiennent
«cette raffinée mangeaille» dans les mêmes termes que ceux
utilisés au fragment D. Note de Proust très intéressante quant à
la «hiérarchie» des thèmes abordés dans le pastiche, transcrite
intégralement:
«N. B) peut-être cette description doit continuer je ferai
bien de voir, en tous cas pendant que j'y pense je profite
de placer le morceau si important sur la Normandie, quitte à
mettre entre bien des choses, morceau sur la Normandie que
je pourrai peut-être amener tout autrement que par la
nourriture. Mais dans le cas où j'enchaîne, il faut au lieu
d'un point une virgule» (75 r°).
Portrait de Verdurin par sa femme (T.R., p. 34). La
Normandie vue par Mme Verdurin : 1re rédaction (T.R., p. 34).
Évocation de la vie de «la colonie d'artistes» et note sur la
«paperole» de cette femme qui raconte (T.R., p. 35). Mme
Verdurin, conseillère d'Elstir (T.R., p. 35 à 37).
f) Deux notes marginales, portant sur le même sujet,
précédant ce qui vient dans le texte principal (75 v°).
Appartenant à l'évocation des promenades en Normandie, thème
de l'oiseau qui se baigne dans «la corolle d'une rose blanche».
(Notes marginales). Dans la version de l'édition, se rapporte à
la vie de «la colonie d'artistes». (T.R., p. 35). Les crises
d'asthme de Verdurin provoquées par l'odeur des sardineries (dans
la version éditée ce passage s'intègre au tableau de la Normandie
fait par Mme Verdurin, T.R., p. 34). L'occasion de la découverte
de la Normandie par Verdurin qui est présentée ici comme celle
d'un voyage pour accompagner un ami, professeur de faculté,
n'existe pas dans la version de l'édition.
g)«qui serait un immense parc anglais [...] Là-dessus l'été
suivant
ils
revenaient,
logeant
dans
une
admirable
habitation moyenâgeuse louée pour rien toute une colonie
d'artistes» (75 v° paperole).
Évocation de la Normandie : Rédaction la plus proche de
celle de la version de l'édition non seulement dans les thèmes
eux-mêmes mais dans leur agencement, c'est probablement une
rédaction postérieure à celle du fragment E. Ici, il n'y a pas
d'allusion à Flaubert.
30. «L'étonnement que ces gens soient célèbres».
«Car le temps engloutit si vite les particularité [...] ce
qui ne prend son importance, que réalisé intellectuellement
par la lecture de mémoires ou d'oeuvres» (76 v°, 77 v°
marges).
Indication de régie: «Capitalissime: dans le morceau qui
précèdera ou conclura ce pastiche quand j'explique l'étonnement
que ces gens soient célèbres ajouter ces 2 raisons:»
«Le
temps
engloutit»
vite
«les
particularités»
qui
subsistent dans les mémoires, mais que les contemporains
eux-mêmes ne se rappellent plus. Exemples de la situation
littéraire de Verdurin et celle, mondaine, de Swann (A
l'origine des p. 42 et 43, T.R.).
«La vie nous fait apparaître en petit», ce qui prendra de
l'importance, une fois «réalisé intellectuellement par la
lecture de mémoires ou d'oeuvres».
N.B. Commentaire de l'auteur à la fin de cette rédaction:
«(sans doute que cette importance reprise par les gens hors de la
vie, Pompadour, Verdurin etc, se rattache aussi à la conclusion
de mon ouvrage, seule réalité est la réalité intellectuelle.»
31. «Pour ce qui concerne le petit Dunkerque».
Note-memento pour ce qui suit le pastiche Goncourt,
reproduite en entier [72 v°]: «Il faudra après ce pastiche
dire pour ce qui concerne le petit Dunkerque. Que j'aurais
voulu voir cette boutique. Pourvu qu'elle existât encore.
Dire que je n'aurais eu qu'à le demander à Brichot. Et ce
papier du 18e siècle à entête ornementée que j'aimerais
avoir. J'irais sûrement revoir les Verdurin pour me le faire
montrer» (72 v°).
32. Sur la conception de l'oeuvre.
«La courte vue que nous avons des autres ne doit pas être
celle du romancier [...] tout d'un coup la page des
Goncourt, la vraie vie de Charlus, d'Albertine, le génie de
Vinteuil et d'Elstir, en une accumulation foudroyante et
condensée» (81 r°, 82 r°, 81 v°).
Indication
de
régie
(81
r°):
«Ceci
qui
est
Kapitalissime pourrait être mis avant ou après pastiche de
Goncourt mais mieux dans la dernière partie quand je conçois
l'oeuvre d'art. Je l'écris comme pour la dernière partie. Si
mis après Goncourt il faut enlever la 1ere phrase».
Combien la «surface» des «Etres et des faits» diffère selon
le point de vue du spectateur. Et différence entre ce que nous
voyons et ce qu'il y a dessous: exemples de Vinteuil, Elstir et
Charlus. Commentaire de Proust dans la marge du 82 r°: «Je cite
ces faits de ma vie pour servir d'exemples et faire comprendre ce
que je veux dire.»
L'oeuvre doit être faite d'une «histoire» suivie d'un
«épilogue» qui serait une sorte de «second roman» où l'on dit ce
qu'étaient les personnages «pour d'autres» ou «en eux-mêmes»; et
tout cela «en une accumulation foudroyante et condensée». Est-ce
à l'origine des pages 257 et 258, T.R.,: «La vie enfin découverte
et éclaircie [...] c'est la littérature»? ou de la page 423?
33. L'opinion publique pendant la guerre.
«Comme les diverses fractions de l'opinion publique avaient
été réunies en deux blocs, au moment de l'affaire Dreyfus,
[...] en réalité personne n'en savait rien. Mais les
journaux» (86 r°, 87 r°).
Pendant la guerre, grâce aux journaux, il
réunification de l'opinion publique derrière «le
y eut une
drapeau du
gouvernement», contre l'ennemi. Référence ponctuelle, T.R., p.
122 et 123 dans le long discours tenu par Charlus au héros.
34. Sur les articles de Bergotte pendant la guerre.
«Il (Bergotte, de façon que ce soit plus que une parenthèse)
faisait chaque jour dans un grand journal des articles sur
la guerre [...] Il aurait pu les apprendre. Mais il savait
que son public ne les connaissait pas» (87 r°).
Sur les articles que Bergotte écrit quotidiennement pour un
grand journal, prétendant ainsi sacrifier son talent à son
devoir. Si la guerre avait été déclarée contre la Russie, il
aurait
pu
incriminer
«l'antimilitarisme
de
Tolstoï»,
«l'incohérence des personnages de Dostoïevski». Mais il n'y avait
pas d'écrivains allemands qui aient fourni «une seule direction
importante à la littérature contemporaine».
Il n'existe pas de références directes à la version de
l'édition: on ne peut qu'en rapprocher certains thèmes,
p. 111: les journaux sont dits être rédigés «par des Brichot, par
des Norpois, par Morel même et Legrandin.»,
p. 115: Charlus critique (dans son long discours au héros) les
articles de Brichot,
p. 120: Charlus critique les articles de Norpois, mais il n'est
pas question d'articles de Bergotte.
35. Conversation avec Gilberte: La Fille aux yeux d'or.
«Que lisez-vous là, oh! un volume du journal des Goncourt
qui m'amuse parce qu'il y a quelque chose sur Papa... [...]
Dans le je pris le journal des Goncourt» (91 r°, 92 r°, 93 r
°).
Note de régie: «Capital. Quand je suis à Combray» (91 r°).
Discussion à Combray, du héros avec Gilberte sur l'amour
entre les femmes, en référence à La Fille Aux Yeux D'Or. (T.R.,
p. 26). A la proposition de Gilberte de se renseigner pour savoir
si la jeune femme qu'il avait aimé avait des goûts homosexuels ou
non, le héros répond que cela ne l'intéresse plus. Deux
indications de régie s'y rapportant: «Capital dans cette
conversation qui aura sans doute lieu non à Combray, mais dans la
dernière matinée Guermantes.» (93 r°). Et «Au sujet de ce qui est
au haut du recto suivant (et il vaut peut-être mieux à Combray
que tous ces pers à la dernière matinée car cela affaiblirait
peut-être - cette causerie à bâtons rompus - mes considérations:
Dire «mais j'y songe vous avez du la connaître [...]» (92 r°).
36. Conversation avec Gilberte: Roussainville.
a) «On n'est pas toujours aimé, ainsi je vous aimais
tant.» [...] Et voyez-vous ce n'est même pas ces caprices
d'enfant que je me reproche le plus. «Confession de
l'opération de son père et de son caractère» (92 v°, 93 r°).
Indication de régie: «Quand je dis à Combray cccapitalissime
(et ce ne sera peut-être pas à Combray car il n'y aura peut-être
pas de Combray, ce sera peut-être à la matinée qui clôture
l'ouvrage), je dis à Gilberte: » (92 v°).
Confession entre Gilberte et le héros de leurs sentiments
mutuels et passés. Et Gilberte parle de Roussainville. Dans la
version de l'édition placé à Combray (Tansonville), T.R., p. 10
et 11. Le héros se souvient que plus tard, l'ayant pris Melle de
L'Orgeville, il avait demandé des renseignements à Robert, son
futur mari (T.R., p. 14).
N.B. Notes de régie intégrées au texte rédigé du 93 r°:
«(mettre là la petite image de Clary) - puis les paysannes de
Méséglise (copier la femme de chambre de Mme Putbus)».
b)
Note
de
régie
et
élément
textuel,
retranscrits
intégralement (93 r°):
«P.S. Kapitalissimum à ce qui est au verso et ci-dessous
quand je parle du Donjon de Roussainville et quand je
transporte à Albertine ce que je dis de la famme de chambre
de Mme Putbus. (Aussi quand j'aurais voulu qu'une paysanne).
ajouter: Ainsi résumant ce que j'avais désiré dans ces
PROMENADES (sic), AYANT FAILLI ME LE FAIRE GOUTER DES MON
ADOLESCENCE, PLUS COMPLETEMENT ENCORE QUE JE N'AVAIS CRU
ELLE ÉTAIT «DU COTÉ DE MÉSÉGLISE». (T.R., p. 14).
37. Conversation avec Gilberte: «Comment vous avez été fiancés»?
«Comment vous avez été fiancés; et elle n'était pas plus
reconnaissante... [...] ces paroles que nous répandions avec
complaisance étaient vraies et ne pouvaient plus rendre
possible, parce que Albertine était morte, cet excellent
plan d'existence qu'elles lui (illisible)» (90 v°).
Indications de régie: «ce verso finit au bas de ce
verso, ce qu'il y a au verso suivant ne s'y rattache pas».
«Capitalissime. Dans cette conversation de Combray ou chez
la Pcesse de Guermantes quand je rencontre»
A la question de Gilberte, le héros répond par l'expression
de ce qui eut peut-être été vrai: le bonheur d'Albertine était
auprès de lui. Mais elle l'a refusé (T.R., p. 26).
38. Conversation avec Gilberte: Pourquoi ne vous mariez-vous pas?
«Pourquoi ne vous mariez-vous pas, cela vous ferait changer
de vie [...] et si Albertine (sic) me demande ce n'est pas
celle-là avec qui vous avez été fiancé je pense, je
répondrai ah! non c'est une autre!» (91 v°, 92 r°).
Indication de régie: «Capital. Il faudra que je dise en
pendant à ce que j'ai dit (indiqué en marge au début du
cahier Vénusté sur le grand rôle joué par Albertine dans ma
vie) et si je mets ce pendant à Combray avec Mme de St Loup
(Gilberte) cela n'ira peut-être pas avec la fille aux yeux
d'or qu'il faudra peut-être supprimer ou après». Le cahier
Vénusté correspond au cahier 54.
Le héros parle de son occasion de mariage ratée à cause de
son hésitation et de son mauvais caractère. Voir T.R., p. 26 où
Gilberte lui dit à Tansonville que Robert et elle pensaient qu'il
devait se marier. Au même endroit se trouvent aussi le thème de
la fille aux yeux d'or, et l'aveu par le héros qu'il a été
fiancé. Dans la version de l'édition, il y a donc concentration
de trois éléments textuels du cahier 55 en un seul.
39. Notes sur le souvenir d'Albertine au fil des saisons.
a) Indications de régie: «excellente formule même si je la
fonds avec ailleurs quand je rencontre des femmes à Paris, à
Venise (cahier Kerby).» «mettre quelque part dans le recto
suivant ou ailleurs,» (93 v°).
Fragment transcrit intégralement: «Même ces soirs glorieux
où dans la poussière dorée du soir les pensionnats, les offices
entrouverts, comme des chapeles (sic), à la poussière dorée du
soir laissent la rue se couronner de ces demi-déesses aux
délicates chevelures, mystérieuses (illisible), qui en causant
non loin de nous avec leurs pareilles nous donnent la fièvre de
pénétrer dans leur existence mythologique, ne me rappelaient plus
que la tendresse d'Albertine qui à côté de moi, m'empêchait
d'approcher d'elles» (93 v°) Voir A.D., p. 97.
b) Indications de régie: «j'aime mieux faire bloc ici des
thèmes imagés sur l'hiver». «ou plutôt en laissant ce qui
est en face pareil il serait peut-être curieux de mettre ce
qui est ici au verso ou au recto de la page suivante après
espérances à moins que je».
«Peut-être mettre ceci après comme une maladie c'est l'hiver
ou
finir
(illisible)
par
comme
une
maladie
c'est
l'hiver» (93 v°).
Sur les jours de janvier où Albertine lui rendait visite.
Voir A.D., p. 96 et 97: allusion aux dimanches de mauvais temps.
N.B.: à mettre en parallèle avec la note de régie du 22
v°: «En pendant aux questions que je lui pose, bien avant
d'être jaloux sur ce qu'elle voulait dire, quand elle disait
«ce pauvre nous» (équivalent car ce n'est pas elle qui le
dit), il faudra quand je dis jaloux lui demander qui lui a
appris (illisible) alors me revinrent ces mots qui m'avaient
donné quelque espérance de l'embrasser un dimanche d'automne
et qui maintenant ouvraient à ma jalousie de nouveaux
espaces (peut-être mettre cela dans le cahier mince bleu,
quand j'entendrai le calorifère, ou s'il faut dans le buc;
ou si c'est dimanche) plutôt le calorifère et le dimanche
sera pour après sa mort».
c) Ce qui reste du 94 r°, déchiré.
Bribes
d'Albertine.
peu
compréhensibles
où
apparaît
le
prénom
d) Indication de régie transcrite intégralement (94 v°):
(illisible) qui se placera sans doute verso suivant, (après
la fin du verso suivant) après indestructible azur et avant
«comment Alberti// m'avait elle paru morte»// (Voir A.D., p.
99).
e) Fragment du 95 r° déchiré transcrit intégralement: «//
tour à tour à sa lumière l'anxiété de savoir Albertine au
Trocadéro, peut-être avec Léa et les deux jeunes filles,
puis la douceur familiale et domestique de l'attendre à mon
piano (illisible) comme une épouse qui me semblait
embarrassante et que Françoise allait me ramener. Com(ment)
Albertine eut-elle paru morte qu//» (Voir A.D., p. 97 et
101).
f) 96 r°, déchiré.
Plusieurs
impressions
«semblaient
rendre
incroyable
qu'Albertine fût morte». Le héros pensait que «(son) amour pour
elle n'était pas simple» (A.D., p. 102).
g) 96 v°.
Contradiction entre une souffrance que le héros ressent
toujours et sa cause: des soupçons à l'égard d'une personne morte
(A.D., p. 103).
ANEXO B – Fólios do caderno 55 utilizados na tese (transcrição feita por Yuzawa e Nathalie
Mauriac Dyer)
Brichot me demanda où j’allais, je lui dis répondis :
« chez moi. » « Cela c’est bien me dit-il de finir sagement
votre soirée dès cette heure ci. » Il ignorait que pour moi, elle
allait seulement commencer qui en avais seulement un peu
retardé le moment en allant chez les Verdurin, elle allait
seulement commencer, et qu’une jeune fille, prête à m’offrir
son corps, m’attendait un corps auquel que même loin d’elle
tous mes sens ne cessaient d’envelopper, m’attendait patiemment,
à la lumière de la lampe dans cette chamb cet appartement
que le vieux professeur s’imaginait vide et que remplissaient
pour moi, inconnues insoupçonnées de lui chaudes et
brillantes comme les ondes de clarté de la chambre d’Albertine, les insou les promesses d’un plaisir que j’étais pressé d’
aller goûter. Conversation avec Brichot.
Pour le morceau ci dessous
il vaudrait mieux insister sur l’ennui
et laisser le/a plaisi douceur ; la richesse de sensations
pour quand elle
est morte.
sur ce verso et ce recto
Ceci est le morceau définitif (quoique
la forme soit à changer) Ma qui annule les pages suivantes
( mais non pas q. q. pages avant quand Brichot me demande l’adresse.) Mais regar
der dans les pages suivantes où je disais moins bien la même chose si je n’ai rien oublié
Nous étions arrivés devant ma porte. Ce fut Je descendis de
voiture et donnai au cocher l’adresse de Brichot. D’en bas
je voyais le à travers les volets les rayons de la lampe de
d’Albertine. Pour d’autres ils n’eussent peut’être été qu’
une lumière superficielle, mais moi sous leur éclat, je savais
toute la plénitude de vie qui m’attendait paisiblement là haut
en laquelle
et où mon corps et ma pensée allaient se perdre, se confondre
ennui, sans
se reposer Ce n’était pourtant pas sans regret que je voyais
m’attendre, me rappeler ces reflets dorés du
ces rayons m’attirer, me* me dire qu’on m’attendait (dire
aussi aussi
cela mieux) Ces reflets du trésor, insoupçonné de Brichot,
,orgueil secret de ma vie,
qui rempl qu’il était des amis qui venaient me voir et que
je reconduisais dans le couloir sans qu’e ils rien trahit la
présence d’Albertine, mais en échange duquel il me semblait
que j’avais vendu la liberté, la pensée, la solitude. Si Albertine
pour
n’avait pas été là haut, pour avoir un plaisir sensuel, pour
ce que j’aurais fait c’eût été sinon prendre un train, tout au
moins faire dans le Paris nocturne de ces promenades qui sont presque un
voyage, aller dans cette maison q dont m’avait parlé Robert et qui comme un
était un plaisir
doux, ennuyeux
de
flatteur
et humilié,
sensuel et
familial, mêlé
musée eut rassemblé auprès de moi dispensé d’un voyage en en rassem
flatteur pour mon amour
propre
blant les trésors auprès de moi ; avoir du plaisir c’eut été sinon partir,
déprimant pour mon intelligence,
ennuyeux comme ce qui nous prive de la
du moins sortir, rechercher des êtres inconnus, tâcher de me
nouveauté, doux comme ce que nous apporte
l’habitude.
faire des aimer d’eux, au lieu de retrouver une femme qui était
comme une autre partie de moi-même et qui ne m’offrait plus
et à qui je savais ne plus pouvoir offrir de nouveauté, qui me donnait
au lieu des inquiétudes exaltantes du dépaysement, la douceur
profonde, nécessaire, mais abêtissante de l’habitude ; si je n’
quand j’
avais quitté
mon piano
au coup de
sonnette d’
Albertine
ramenée
pour moi
du Trocadéro,
un peu plus
tard quand je
l’avais
sortie assise
à côté de
moi en voiture,
ou quand elle
avait descendu devant
moi passant
devant moi
elle était
rentrée sous
la voûte, c’
était le plaisir
de sentir ma vie
remplie par une
personne qui ne*
ét qui/e m’
empêchait de je
rester avec
moi-même, c’
avais pas connu Albe Albertine n’avait pas été là haut pour avoir
du plaisir c’eût été partir, ou du moins sortir ; maintenant
c’était au contraire rentrer. Et non pas rentrer comme celui
qui dans sa maison ayant quitté les autres se trouve enfin seul,
c’était et n’ayant plus d’aliment étranger fourni par du
dehors à sa pensée et est enfin contraint d’entrer en commerce
avec soi-même. Pour Rentrer c’était retrouver non seulement
ma maison mais la personne dont ces lumières que je voyais
d’en bas étaient comme l’émanation douce, vivante, humaine,
trop humaine, un être relativement auquel, quand j’étais avec
les autres, comme chez les Verdurin par exemple, j’étais seul, tandis
qu’auprès de lui j’abdiquais enfin complètement comme un
pet enfant dans les bras de sa mère. Cet appartement comme
il le remplissait de toute la plénitude de sensations qu’il y
tenait à me Le plaisir que j’avais à voir d’en bas ces rayons
qui ne où je sentais circuler qui remplissaient la chambre et où
je sentais circuler toute la richesses de sensations qui étaient là haut à
ma disposition (dire mieux) c’était, comme cet après midi
musée, mettant les fruits de voyage auprès de moi
et voir aussi dans le
Voir dans ce verso et le suivant qui
mince cahier bleu au recto
ne comptent plus s’il n’y a rien que j’aie
et verso
oublié de mettre dans
appelés page
le verso et le
Hurlus et qui
recto précédent
sont supprimées si j’
ai bien mis ici tout
Brichot me quitta au pont. J’étais ennuyé de rentrer. Je
ce qu’il y a dans
pensais à tous les plaisirs inconnus que j’aurais pu aller goûter,
cette Page
Hurlus
si je m’étais promené seul, si j’étais allé dans cette maison
Et en pensant
pour qui je à
rentrais la
raison pour laquelle
+ bertine, puis quand
je l’avais eue à côté
de moi dans la voiture,
et quand passant devant
moi elle était rentrée à
la maison.
avec celle qui m’
avait jusque là
attendu paisiblement
dans sa chambre. J’
éprouvais à y
penser ce même
sentiment de
bien être, d’
orgueil, d’
égoïsme et
de renoncement à
toute eff curiosité
nouvelle, ce même
sentiment à la
fois doux, ennuyeux,
flatteur, humiliant,
sensuel et familial
que j’avais éprouvé
cet après midi même
quand j’avais entendu
Albertine quitté mon
piano au coup
de sonnette d’Al +
que m’avait indiqué Robert
Brichot me demanda quelle adresse je il devait donner
au cocher et je lui dis la mienne. Il me « Ça c’est très
bien dit-il. » Pas plus que les amis qui venaient me voir et
que je faisais passer dans le couloir sans qu’ils rencontrassent
Albertine, il ne soupçonnait pas qu’en rentrant j’allais
trouver justement commencer ma soirée, que le temps que
j’avais passé chez les Verdurin n’avait été pour moi qu’un
court intervalle pendant lequel m’attendait paisiblement dans
sa chambre celle que j’avais hâte de retrouver. Et pourtant
nouveaux
j’étais ennuyé de rentrer, je pensais à tous les plaisirs inconnus
dont à la recherche desquels j’aurais pu aller si je m’
étais promené seul, si j’avais été dans la maison que
m’avait indiqué Robert. Avec L’espoir La pénétration
d’une vie inconnue, l’espoir de me faire aimer d’un être qui
ne me connaissait pas, tout cela n’existait plus avec Albien connu
bertine. C’était là même plaisir sensuel, familial et
même,
domestique, goûté cet après midi que je revenais chercher
auprès d’elle auprès d’elle, dans cet appartement où sa
soigneusement cachée à Brichot
présence, ignorée de Brichot mettait comme une plénitude
une tré richesse insoupçonné, qui faisait qu’au moment où j’
Bric
Brichot me quitta au pont
J’aurais La
nuit ciel qu’avait rafraîchi
Com Je n’avais que de l’ennui de rentrer car je n’avais plus
de jalousie à l’endroit d’une rencontre possible de’Albertine avec
Mlle Vinteuil. Alber Mlle Vinteuil n’était pas venue à Paris.
Albertine devait le savoir par Me Verdurin. Et si au
contraire elle le savait Me Verdurin l’avait trompée en lui
disant le contraire, en tous cas elle n’avait pas hésité à me
sacrifier sa s Mlle Vinteuil, ce qui prouvait que je resterais
maître d’elle comme je voulais. Aussi la vue du rectangle de
la
lumière que sa fenêtre d’Albertine faisait sur l’avenue me
allais rentrer dans mon appartement à une moment où les autres se fussent trouvés seuls. J’allais au
en fleurs
contraire cesser complètement de l’être. Une jeune fille qui n’était pas seulement pour moi visible mais qui
perçue par tous mes sens était comme richement couverte d’une carapace de baisers, dont je voyais n’y était-elle
pas qui pour moi n’était pas seulement visible revêtu en lignes et en couleurs, visible couverte de couleurs, du visi mais de
visible
tant d’autres sensations, de tant de baisers dont j’écartais la richesse et retrouvais l’odeur pour seulement apercevoir de teinte de ses
joues que pour seulement voir dans ma pensée le tant de ses joues il me fallait écarter,
plaisir, ce n’ét
au cont
au
contraire retrouver
un être connu, pas
devenu un complément
de mon organisme,
hors de la présence
duquel je ne pouvais
m’aventurer que peu
de temps, avoir du
avoir du
al allait entrer dans mon appartement en*les autres à ce
exfolier les pétales d’innomblables baisers dont je retrouvais l’odeur, comme si son visage
moment où les un autre s les autres se fussent trouvés seuls
avait été une rose aux innomblables pétales. Et de ce que cette rose avait
j’allais au contraire cesser complètement de l’être,
homme
été cueillie à la treille. (voir petit cahier bonne femme* je crois), ce mystère matérialisé
me trouvant à ma disposition dès le moment où j’aurais
dev que je trouverais à ma dispositon matérialisé devant moi dès le moment où j’aurais
f ouvert ma porte la personne qui remplissait le
ouvert ma porte, s’il nourissait tous mes sens vidait mon imagination la dispensait
plus complètement la mienne dans laquelle se perdait la
de le recréer. N’aurez N’aurez-je pas à ma disposition rien qu’en ouvrant ma porte la personne
plus complètement la mienne, devant laquelle j’abdiquais
plaisir ce n’était pas
partir en voyage,
ce n’était même pas
sortir, c’était
le plus entièrement, me remettant tout entier à elle, comme
un enfant sur les genoux, de de sa mère. C’était chez
les Verdurin que j’étais seul, un moment privé de cette
riche
Et Par-
Albertine
rentrer. Encore
d’ailleurs
tir ce n’était même
pas pour moi comme pour
les autres, me retrouver
seul, pouvoir descendre
avoir besoin d’un
aliment que les autres
jusqu’à ce moment là
vous fournissaient et
qu’après les avoir quittés
on trouve en soi- même. C’
était rejoindre à cet
me
qui était devenu le complément de mon organisme
et hors de laquelle je ne m’aventurais qu’un moment, pressé
d’aller me rejoindre et m’unir à elle. D’ La voiture s’
était arrêtée devant ma porte. D’en bas je voyais le
grand carré de lumière qui faisait à travers les volets la
lumière de la fenêtre d’Albertine, comme les rayons de ce
si soigneusement caché à Brichot, à Robert, insoupçonné de tous
trésor qui m’attenda insoupçonné des autres qui m’attendait,
que j’étais si pressé de retrouver mais en échange duquel il
que j’étais si pressé de retrouver, mais en échange duquel
être loin duquel même
me semblait que j’avais vendu la liberté
chez les Verdurin je m’étais
j’avais
vendu la liberté de ma vie et la possibilité
senti relativement seul, car
pour avoir
chez auprès des autres je n’
d’être seul ! Si je n’ Albertine n’avait pas été là, j’aurais
avais pas une
ç’aurait
si entièrement
été à défaut de partir en voyage des parties presque étrangèresde Paris
absorption de
du plaisir pu me promener seul dans Paris, aller dans cette maison que
moi-même, cet être par lequel
et sollicité pa
que , pour me dispenser
m’avait indiquée Robert, même si aller à la rechercher
de songer même une
minute à moi, j’allais
du plai d’es êtres inconnus, tâcher de pénétrer leur vie et
être reçu dès que j’aurais
tandis que maintenant c’était
ouvert ma porte et dans
de
me
faire
aimer
d’eux./,
Mais
maintenant que pour avoir
la personne duquel se+ ++
du plaisir ce qui Mais maintenant pour moi avoir du
perdait le plus
+
+
+ + le plus
+
complètement
la mienne, cet
être dans lequel
j’abdiquais avec
un sentiment aussi
complèt entièrement qu’un enfant
sur les genoux de
sa mère. J’avais
hâte de me décharger
auprès de lui de
moi-même, d’
entrer dans cette
chambre dont
la lumière d’ici
me
semblait
humaine,
trop humaine,
car elle [ill.]
mystérieuse parce que
Brichot ignorait ce
qui y veillait et
douce parce qu’elle
était le signe de
la vie jadis si
désirée, du corps
charmant qui m’y
attendait.
causa-t-il un sentiment de plénitude, de douceur et d’ennui.
Je sentais que dans le demeure où je rentrais, où j’étais obligé de
rentrer comme un mari,
« Devinez d’où je viens, Albertine ? de chez les Verdurin.
Ah Ah ! vous avez Je n’avais pas cru déplaire à Albertine
en all lui disant que j’étais allé chez les Verdurin. Mais
embrasser
quand, venu la’ chercher dans sa chambre, je l’eus emmenée*
préoccupé et mécontent
dans la mienne, je vis sur son visage une crispé par un
mécontentement intérieur./, Il me semblait dont je je lui eus
sur
dit d’où je venais, je vis aussitôt son visage boulever un de ces
changements que je dont je croyais que les pensées qu’il
traduisait ne fussent : « C’est cela ; il sans me le dire, il
se méfiait que de l’intérieur les pensées produisent, et
des dehors
Ceci vient tout de suite après la fenêtre éclairée. C’
est par là que commence tout ce qui est se passe dans la maison
Certes Albertine ne m’avait jamais dit qu’elle me crut
épris d’elle et jamoux d’elle, préoccupé de tout ce qu’elle
faisait. Les seuls mots que nous avions échangés au sujet de
l’un très anciens, il est vrai
la jalousie, assez anciens il est vrai, avaient été un des premiers
soirs où je lui avais proposé de la reconduire jusqu’à sa tante et
où comme j’avais ajouté : « Ce n’est pas par jalousie vous savez, si
vous avez quelque chose à faire » et en effet je n’étais pas jalo Les
paroles fort anc assez ancien il est vrai
seuls mots que nous avions eussions échangé relativement à la jalousie
par
semblaient prouver le contraire. Les unes C’était un soir de clair
reconduite
de lune, o un des premières fois où je l’avais ramenée chez elle.
Comme je la je lui proposais de la ramener jusqu’à chez elle, je lui
avais dit en riant : « Nous savez, ce n’est pas par jalousie, je si vous
avez q. q. chose à faire je m’éloigne discrètement. » Et elle m’avait
répondu : « Mais je/Je sais bien, mais je n’ai rien à faire qu’à être avec vous. » Et
préoccupa le moins. Même si Albertine avait eu rendez-vous
avec elle chez lez Verdurin, elle m’avait aisément sacrifié ce
rendez-vous. Il m’était facile d’e e continuer à empêcher Albertine
de la voir, jétais maître de ses actions tant qu’elle était chez
moi. Ce qu’il fallait c’est qu’elle y restât. Or pour la pre
se
mière fois je venais de voir dans son visage comme j’avais vu sur
superposer au visage
la figure d’Albertine au moment où je lui avais dit que je
revenais de chez les Verdurin, une apparence de ces masques
Capital
Certes Albertine
ne m’avait jamais
dit qu’elle crut
que je fusse épris
et jaloux d’elle.
« Depuis les soirs
lointains de clair
de lune où je lui
disais ce n’est pas
par jalousie que
je vous propose de
vous reconduire
me énigmatique qui ne sont que la synthèse mêlée d’
idées transformées, et que nous cherchons à notre tour à
remener par l’analyse à ses éléménts intellectuels afin
de nous rendre compte de l’état d’esprit de notre la
personne qui est avec nous. Celui Celui d’Albertine semblait
pour la 1re fois trahir une sorte mélange de colère et
de découragement qui pouvait se traduire ainsi : « Naturellement, il avait des soupçons, cela ne lui a pas suffi de
empêcher d’aller chez les Verdurin, il a fallu qu’il y
tout
aille en cachette pour se rendre compte. » Et Alors j’eus
tout d’un coup l’effroi que’ la pensée d la pensée de me
qui quitter ne traversât son esprit, soit qu’innocente
même d’intentions
elle se décourageât de voir que depuis Balbec où elle
avait même évité de rester jamais seul avec la petite poupine
elle jusqu’à aujourd’hui où elle n’était ni allée chez les
Verdurin ni restée au Trocadéro, elle n’avait réussi à
Ce qui est en marge est Capitalissime, surtout l’enclave du milieu
il pourra peut’être y avoir intervalle où je mettrai autre chose avant
+Et puis chaque
: Mais quoique habitué à ces sortes de scènes
fois que je manaçais
un être, Françoise,
ma gd’mère, Albertine
dans sa sécurité,
j’eus tout d’un coup l’épouvante que l’idée de me quitter
comme je n’e allais pas
ne
réaliserais pas ma
ne traversât son esprit. » Aussi, désespéré, mais d’une voix
menace, pour ne
chère
pas faire croire que
calme, je lui dis : « Ma petite Albertine, voyez-vous la vie que
c’était une parole
vous menez ici est ennuyeuse pour vous, il vaut mieux nous quitter, et
en l’air j’allais assez
comme les séparations les meilleures sont les plus courtes, je vous
loin dans les apparences
de la réalisation et
demande pour abréger le grand chagrin que je vais avoir de me
ne me repliais que
partir
quand l’adversaire,
dire adieu ce soir et de me quitter demain matin. » pendant que
vraiment convaincu,
je dormirai. » Je lui dis cela pour bien des raisons. Je sentais que
ou du moins
ébranlé dans sa
Quand je la sentais fâchée la seule
sécurité avait
tremblé pour de bon
pas puisque je ne songeais pas à la quitter. N’importe cette mise
Peut’être mettre ceci
un peu plus loin, parmi les
en scène, cette fiction, que j’interromprais quand je le voudrais portait
raisons pour lesquelles
en elle un peu de l’angoisse d’une séparation vér mais où
Albertine était une actrice sincère et telle qu’elle eût été si cela
je dis cela mais il vaudrait
mieux dire d’abord : Ma
avait été vra portait en elle – peut’être parce que elle était telle pour un
des deux acteurs Albertine qui croyait jouait son rôle sincèrement et croyait
chère petite Albertine
devoir se préparer à partir, un peu de l’angoisse d’une séparation
etc Je continue
véritable et
Aussi Mais quoique habitué
à ces sortes de scènes, je
tout en les sachant mensongères, elles me faisaient
la fois stupéfaite, encore incrédule et déjà désolée
éprouver un peu de la
à
demi
incrédule, à demi désolée
tristesse que j’aurais
Elle
parut
bouleversée
« Comment demain ? vous le voulez ? »
eues si elles avaient été
vraies. J’aurais eu
J’eus le sentiment de de reprendre de nouveau l’avantage sur
une peine infinie
elle que j’avais eu à Balbec le jour de la visite de Me de
de quitter Albertine
Cambremer, quand Albertine m’avait demandé des explications
Il n’importait
+
sur ma dureté. Pour qu’elle ne pût pas croire que je mentais
++
navré, plutôt que de se faire couper un doigt, puis un autre, j’ai
pensait : « il dit
cela, mais ce n’est
pas possible, il sera
fatigué, il restera
couché comme les
autres jours. » Et l’
instinct* la/e sentiment
de son incrédulité
augmentait la
machiavélisme de
ma persuasion.
j’aime mieux donner la tête tout de suite. » Elle dit cela d’un air
navré qui m’aurait ravi, si la nécessité d’imaginer les choses
quie je lui disais, ne m’avait fait leur ajouter cette demi croyance
qu’on accorde par exemple aux fictions d’une tragédie et qui suffit pour faire pleurer. Peut’être la fatigue de
ses traits due à l’heure tardive Quant à elle me croyait
sans, même si la fatigue de l’heure indue, par le fléchissement qu’elle imposait à ses traits ajoutait à son air de tristesse,
elle me croyait sans doute, comme elle m’avait cru l’après-midi
Je pense
quand je lui avais dit que j’avais reçu des nouvelles de la
femme que j’avais tant aimée. Elle me croyait elle qui
que j’ai
dû marquer
si souvent semblait se défier de moi, ne pas ajouter foi à mes
ailleurs (sans
cela marquer
paroles, se défier de moi. Et si elle me croyait en ce moment c’
ici) que cela
ajoute au
était sans doute parce que j’étais habile comédien mais et savais
caractère familial
rendre vraisemblable mon projet de la quitter, comme autrefois je
de mes relations
avec Albertine.
savais rendre vraisemblable à ma grand’mère telle décision qui
Et en tous cas
mettre : Et
pouvait l’ennuyer et qu’en réalité je n’avais nullement prise;
peut’être était-ce
en ce moment
n’était
même plus fort avec
mais de plus la crédulité d’Albertine venait peut’être en ce de
ma gd mère qu’avec Albertine
car qu’avec ma gd mère. Car ce qui
défiance qu’une
conséquence partielle de sa défiance générale
me faisait feindre avec cettesa
persévérance
une
chose qui pouvait être désagréable c’était la pensée
que l’autre en doutait, pensait que c’était une menace
vaine. Alors pour qu’e elle ne triomphât pas en se disant il ne
ma gd mère
fera pas, je disais avec calme tout ce qui semblait impliquer que mon
projet était irrévocable. Or ce doute dans la pensée de l’autre qui m’enrageait,
était forcément plus grand pour Albertine parce que ma santé, la vie que je menais
faisaien rendaient plus improbable encore improbable le moindre projet que j’
annonçais. Si pour qu’Albertine ne pût faire de projets je
disais je’ irai sans doute demain me promener avec
vous, je sentais qu’elle
++
Chaînon important
A un des moments où je dis que je veux
lui proposer le mariage, ou ne pas le lui proposer,
enfin je veux dire à un des moments où je retarde l’idée d’
une séparation : « Cependant ma mère s’inquiétait de ne
rien savoir. Elle finit par m’envoyer une lettre recommandée
avec prière de la lui renvo retourner par le même courrier où
copiait
elle me citait cette phrase de Me de Sévigné : « Pour moi je suis
persuadé qu’il ne se mariera pas ; mais alors pourquoi troubler cette
fille qu’il n’épousera jamais ? pourquoi la risquer de lui
faire refuser des partis qu’elle ne regardera plus qu’avec mépris ; pourquoi
troubler l’esprit d’une personne qu’il serait si aisé d’éviter ?
En pendant aux questions que je
lui pose, bien avant d’être jaloux sur
ce qu’elle voulait dire, quand elle disait
« ce pauvre vieux » (équivalant car ce n’est pas elle
qui le dit), il faudra qd je suis jaloux lui
demander qui lui a appris sélections
mousmé, :
Alors me revinrent ces
mots qui m’avaient donné quelque espérance
de l’embrasser un dimanche d’automne et
qui maintenant ouvraient à ma jalousie de
nouveaux espaces (peut’être mettre cela
dans le cahier mince bleu qd j’entendai le
calorifère, ou s’il fait de la brume, ou si
c’est dimanche) plutôt
le calorifère et le dimanche sera pour après
sa mort.
Capitalissime
Ajouter
encore au
verso en face
tout à la fin de
l’ajoutage
mince.
Et peut’être n’
est-ce pas seulement vrai de
certaines personnes mais de
certains milieux
où les paroles qui
nous ont semblé
le plus naturelles
éveillent à notre
insu le plus
singulier, le
plus interminable écho, où les
choses les plus simples
prêtent donnent
matière non seulement
à des commentaires,
mais à des démarches, à des
incidents où se
complaisent les
prét que croient
se devoir à euxmêmes
alinéa un
peu marqué
sur sa tête et ne pouvoir être évité écarté que pour
être repris dans quelques semaines. Pour
Pourtant dans la suite je n’ai jamais menacé Albertine
de la quitter que pour prévenir répondre à une idée semblable
qu’elle ne m’exprimait pas mais que/i me semblait résulter
mecontentement incom
de sa/on mauvaise humeur inexplicable, de sa refus
mystérieuse
de s’expliquer. Et encore bien souvent je la constatai
sans parler de séparation, espérant que c’était la
mauvaise humeur d’un jour. Mais souvent cela durait
des semaines de suite et semblait vouloir provoquer un
conflit, comme si à ce moment là il y eût eu au loin
telle cause* tel plaisir que je ne savais pas, dont sa
présence chez moi la privait, et qu’elle avait envie d’
aller rejoindre (dire cela autrement) (et tâcher de préciser les plaisirs auxquels que je suppose. Voir l’Idiot)
m’avait jamais
A partir de ce jour Albertine ne me dit pas (elle ne
m’avait jamais dit avant non plus) « je sais que vous
n’avez pas confiance en moi je vais essayer de calmer
de créer en
vos soupçons.» Mais toutes ses actions pouvaient être inter
vertu de prétendu
principes des gens
prêtées A partir de ce jour Elle a conti A partir de ce jour
qui consi trouvent
que les amis ne
peuvent « laisser
A partir de ce jour l’idée que je n’avais pas confiance
passer » les choses
les plus naturelles.
en Albertine elle n’expri Elle continua à jama ne jamais exTout cela pour la
distraction sans doute
primer une telle idée. Mais celle-ci parut, à partir de ce
de ceux qui s’y
livrent mais
jour, pouvoir être une des explications de ses moindres
abolissent au
malheur ceux qui
en sont l’objet si bien
actes. Non seulement elle s’arrangeait à ne jamais être
qu’au fond mon g le dernier
réjouit
encore
mot de la sagesse était peut’être
celui
mon gd
plusde
d’avoir
quipère quand se
refusant
à présenter
Swann
dans
joue avec
nous dans
notre
le « petit clan », au seul nom
chambre, une
petite
des Verdurin
panthère un jeune
il criait :
sanglier. Mais les a la garde ! »
naturalistes prétendent qu’elles ne sont
nullement domestiquées
et qu’un jour ou l’
autre l’état 1er
revient.
+
Bien rarement
me offrait de me jouer quelquechose. Si à cause de l’
quoique bien souvent j’éprouvasse
heure je manifestais la crainte de mécontenter ; à cause
de l’heure tardive, la Duchesse de Guermantes qui
pouvait très bien nous entendre, le visage d’Albertine s’
Qd je dis
assombrissait, prenait ce même air froid qu’avait sa
que je l’ai
domestiquée
tante quand on parlait de gens brillants. Car les
dire : Cette
le visage d’Albertine se voilait un instant, tout rayon
Car alors le
fille qui à
s’y éteignait il devenait sombre, froid. C’est que
Balbec me
fleuriss germaient
semblait aussi
les riches qualités qui fructifiaient en elle la faisaient
lointaine, à
cependant dans l’enveloppe qu’elle avait héritée de ses
qui il me
paraîssait
parents bourgeois, de sa tante qui perdait sa pétulance
presque aussi
et sa gaîté quand on parlait de gens brillants dans sa peur
vain d’adresser
d’avoir l’air de souscrire à leur éclat ou dans son
la parole qu’
mécontentement qu’on pût se parer de quelque chose qu’
à un animal
sauvage , je
elle n’avait pas. A Tout Tout cela Tout cela juxtaposé chez
l’avais ins-
Albertine se présentait tour à tour, tantô et elle en elle
truite et
parlait successivement l’artiste naîssante et le bourge
domestiqué.
Les dons remarquables qu’elle développait n’avaient pu
Du moins j’en
expulser d’elle ces mesquineries qu’elle avait héritées et
avais le
un instant
plaisir et
après avoir vu la manifestation éclatante des premiers quand
peut’être l’illusion. Car il y
reparaissaient les secondes restées intactes, à côté d’eux,
a des bêtes qui
je me disais combien peu l’es êtres même supérieurs son libres,
deviennent domesti-
et combien leurs plus beaux élans sont obligés de compter
ques comme le chien
et le chat. Et
d’autres qu’on se
avec des entraves dont ils ne vivantes dont ils ne
+
petit alinéa
peuvent se débarrasser. Elle a Adossée à ma bibliothèque
pour Vinteuil
à mettre dans
ce développement (je ne dis
pas à cette pageci mais faute de
place je le mets
là, c’est pour
ces pages-ci)
Quand Albertine
commençait à jouer
du Vinteuil, surtout du Vinteuil des
dernières années où
il était devenu tt
à ft lui-même)
quelque chose même
que je ne connaissais pas ; je
reconnaissais tout
de suite que c’était
que c’ét que c’
lui de comme quand
était lui qui parlait
on hésit on hésite,
comme* on
enfant quand j’
de même que
hésitais à entrer dire
bon Swann quand
rent
il hésitait à entrer
au salon dir dans le
salon de sa femme
écoutait un instant
le bruits des voix
afin de savoir qui
était là, et se
disant, c’est M.
Cottard, c’est
Palamède. Car
chaque artiste
véritable a
son accent qui n’
est qu’à lui comme
chaque personne. Bien
plus que chaque
personne. Entre Il n’y a pas entre le discours de Vinteuil et
celui d’un autre artiste, que la petite différence qui
Ajouter encore à ce qui est ci dessous. D’ailleurs si une même phrase apparaissait tantôt brisée comme le matin qui se suspend aux chèvrefeuilles (voir ci
dessous) tantôt comme le matin brillant sur la mer, il y avait aussi plusieurs phrases,
plus fines*, car l’esprit ne contient pas une seule personne mais est un salon où
il y en a de diverses. (prélude variation et fugues)
Ajouter à ce que je dis des œuvres
diverses et pareilles de Vinteuil (pareilles les
autre chose
le forçaient à se
2 motifs questionneurs et virginal de la Sonate,
ressembler, c’était
la parenté des idées
du Quintette de Franck, différents préludes
l’unité de l’esprit
qui créait.
fugue et variations). Au fond c’était une même phrase
Voir la fin
de ceci en face
parce que c’était fait avec la même âme, cheren marge.
chant le même rêve. C’était le même rêve
devenue vrai
mais réfracté à travers les milieux différents de
remplis de recherches, de
jours autres et, de pensées autres, qui ici brisaient,
diversifier une
même phrase,
en la rappelant
sans cesse, de sorte
qu’on en reconnût
les fréquentes brisées,
ici multipliées de
vitesse, là se
recomposant plus
larges et plus lentes.
derrière
Mais ces ressemblances
que l’artiste avait
soigneusement
cherchées au sein
de ces œuvres, l’
amateur en apercevait d’autres involontaires celles-là,
inconnues de l’
artiste et qui
même quand il
croyait faire
là liaient certaines lignes, et donnaient par exemple
à une certaine caresse virginale comme celle du
matin le charme de l’aube du matin, tantôt quand
il brille uni sur il se suspend dans un jardin aux
flexibles* chèvrefeuilles, tantôt quand il brille uni
sur la mer. Aussi le si la ressemblance nous
pouvions comme le chimiste extraire la même
substance, il est bien certain que pour l’artiste
il y avait eu création entièrement autre. Et
précisément leur analogie, d’être faite avec la même
âme ajoutait encore à la richesse de cette diversité.
Car la surprise miraculeuse pour l’auditeur c’était
justement que de nouveau univers* pût naître, c’est
à dire que la même chose pût être recréée tout
autrement, s’incarner en une créature toute différente
comme étaient sa sonate et son quatuor. D’ailleurs dans le
sein même de l’œuvre l’effort de l’artiste avait été de+
l’évocation de ces promenades insinuait dans ses traits le
même mystérieux sourire qui m’avait séduit en elle
le premier jour, quand je ne la connaissais pas encore
à Balbec. Elle me parlait aussi de ces promenades que’
elle avait faites avec des amies dans la campagne
hollandaise, de ses retours à Amsterdam à des heures très
où quand
tardives, dans ces rues où une foule compacte et joyeuse
de gens qu’elle connaissait presque tous emplissait les rues
dont je croyais voir reflétés dans les yeux brillants d’Albertine.
Comme dans les glaces d’une trompeuses incertaines d’une
voiture rapide les feux innomblables et fuyants. Alors
sous ce visage rose je sentais se creuser, se réserver l’
se creuser comme
espace des jours un gouffre l’inexhaustible espace des
jours où je ne l’avais pas connue. Alors Combien je souffrais
alors de cette position où nous a réduits le caprice de la
nature quand en instituant la division des corps, elle nous
rendu impossible
l’interpénêtration
a donné la cupidité et l’impossibilité aux âmes le désir
n’a pas songé à rendre possible l’interpénétration des âmes.
pas
même
Et je me rendais compte qu’Albertine n’était pour moi ni une
œuvre d’art, ni même pour moi une merveilleuse captive
dont/e la présence de qui
pos gardée à l’insu de tous et que ceux qui venaient me voir ne
mettre en
meilleure
forme
que javais su
devinaient pas plus enrichir ma demeure qu de sa présence que
mystérieuse que cet homme qui personnag dont le personnage
dont personne ne devinait qu’il gard possé avant dans une
tenait enfermée
Capitalissimus
Non plutôt
elle me rendait
sensible, mais sensible
pour ajouter au verso
précédent, sans doute après
à mon cette dimension
quatrième
les baisers qu’elle avait
des choses que mon
reçus. « Ah ! sans doute je
imagination avait perçues/e
dans l’église de Combray,
doute perpétuel
n’aurais pas eu cette souffrance
elle la rendait sensible
en la déchirant selon
elle, elle la rendait
si ce désir infini et curieux que
je soupçonnais en elle, ce perpétuel besoin
sensible à mon cœur ;
elle était m’e invi
de roman nouveau, de plaire, de connaître,
pressait sous m’
invitait sous une
forme pressante,
cruelle, et sans
issue à la recherche
des jours écoulés que
elle était comme une
Grande Déesse du
Temps.
de plaire, d’aimer, je ne’en avais
pas été dévoué moi-même. Il n’est Je
savais
reconnais me rappelais mes regards en
allant au bois sur les cyclistes attablées et
le même soir dans les casse croûtes de la
rive gauche, mon amour pour Gilberte, pour
Mlle de Silaria, pour Me de Guermantes, ma
curiosité de chaque fille qui paraissait sur les routes
de Balbec ; et il il n’est de connaissance
que de soi-même ; ce n’est l’observation de
bien peu
pénétre
ne sert à rien, on ne connaît que
plaisirs
ce/les qu’on a sentis, et on ne souffre
reçoit de souffrance il n’y a que cela
qui se change en savoir ou en
souffrance.
qui se cicatrisait assez vite mais
que le le petit heurt avec elle
et les indifférents inconsciemment maladroits, et
à défaut de personne d’autre moi
même savaient si bien
reouvrir*
et
maintenir*
+ privé mais qui donne sur la
route où tout le monde passe
la
je me réjouissais de la « sévères loi »
qui me cachait aux « timides mortels »
et me permettait d’achever ma rêverie.
Au fond de mon palais une majesté
terrible
Affecte à mes sujets de me rendre
invisible
Et la mort est le prix
Et la mort est le prix d
Il faudra en son temps mettre
la phrase sur les bleuets non
dans les promenades avec
de
Me Ville parisis mais dans la
promenade en Auto allant
de q ’Albertine et
comme une chose*
qui se
Les penseurs qui croient Je sentais son odeur de
pétrole. Elle peut sembler regrettable à deux sortes de personnes aux
délicats qui sont toujours des matérialistes et à qui elle gâte la campagne, et à certains
penseurs qui croyant à l’importance du fait s’imaginent que l’homme serait plus
heureux, serait capable de poésies plus hautes, s’e il ses yeux étaient susceptibles de
voir plus de couleurs, ses narines de sentir plus de parfums, travestissement philosophique de l’idée de ceux qui croient que la vie était plus belle quand on était en
fraise et en costume qu’avec l’habit noir. Mais cette odeur de pétrole qui avec
la fumée qui s’échappait s’était évanouie dans la pâle azur des après midis d’été
[à] Balbec, la comme elle m’avait suivi dans toutes mes promenades elle semait de
[chaque] côté maintenant de chaque côté de moi les trèf coquelicots, les bleuets,
les trèfles incarnats ; elle enivrante odeur de campagne, elle n’était même
pas une odeur limitée immobile comme eût été celle de
l’aubépine attachée une haie, mais devant elle fuyait
la route, pâlissait le ciel,
avançait le soleil, se décuplaient les forces.
Elle était le symbole de la puissance, de
bondissement, et j’ai elle surexcitait
dans la bondissante cage de cristal et d’acier
mon désir de monter comme*alors
à Balbec. Mais cette
fois pour aller vers une femme
nouvelle, vers de
belles campagnes
où je pourrais
+
dit elle d’un air embarrassé Je ne savais pas ce que je devais faire
Ce matin à 8 heures
m’
Mademoiselle Albertine a demandé ses malles ce matin de
bonne heure. Elle est partie. Elle a Je’ n’osais pas y refuser,
j’osais pas venir réveiller Monsieur,/. Elle est partie à
donné
9 heures, elle m’a laissé cette lettre pour Monsieur.
Je répondis à Françoise à Françoise : « Très bien, vous avez
très bien fait. Il fait beau n’est-ce pas ? Laissez-moi que
j’aie le temps de lire cela. Je n’avais pas encore ouvert
la lettre, M
Plutôt
resserrer
et mettre
ici
ce qui
est trois
ou 4 pages
plus loin
combien la
souffrance
est le meilleur
psychologue
C’était précisément ce que j’avais cru souhaiter
tout à l’heure. Or je sentis ce mots : « Mademoiselle
Albertine est partie » comme un moule brûlant et
d’une forme sans pareille, imprimèrent dans mon cœur
douleur
jamais
une souffrance que je n’avais connu et s ; je sentis
plus longtemps
que je ne pourrais y résister un instant de plus ; il
fallait la faire cesser immédiatement ; maternal tendre
je me disais
Maman
à sa ma grand mère
pour moi-même, comme ma mère dans la dernière
mourante
maladie de sa mère se lui disait : « on on va te trouver
quelque chose, nous ne te laisserons pas souffrir cela »
qu’on a à ne pas vouloir
et avec la bonne volonté de ceux qui ne ne voulant pas
laisser souffrir ce qu’on aime, je me disais à
moi-même, comme Maman à ma grand’mère mourante,
« Un inst Aie un instant de patience, on va te trouver
un remède on ne va pas te laisser souffir comme cela. »
Cependant mon amour n’oubliant pas qu’il lui importait
Ce morceau ne vient pas ici, après douleur + mais
après douleur + vient le
morceau qui commence
au verso suivante,
continue au verso
d’après et finit
ici.
L’intelligence
Après douleur petit alinéa. Et cette
douleur comment aurais-je pu la
connaître par l’intelligence. L’intelligence
supporte le connu construit l’inconnu avec des connus,
pour se représenter
donne donne emprunte des éléments au connu, c’est à dire ne
se le représenté pas Mais la sensibilité, hélas, le corps, ne peut
Mais la sensibilité hélas, le corps, reçoivent, comme le sillon
la
du/e foudre, la signature originale, longtemps indélébile, de
l’évènement nouveau. J’avais cent fois préparé
dans mon esprit raté calculé les posit pensé à à finir*
au départ d’Albertine, et ce que j’avais j’aurais pu y
penser pendant des siècles que toutes ces pensées mises bout
à bout n’auraient à pas égalé ni n’auraient pas eu la moindre
ressemblance avec ce départ tel que me l’avait dévoilé Françoise
en me disant : « Mademoiselle Albertine est partie. L’intelligence
emprunte des éléments au connu pour se représenter une situation
inconnue
nouvelle et donc ne se la représente pas ; mais la sensibilité et le
corps, reçoivent hélas, comme le sillon de la foudre, la signature originale, longtemps indélébile de l’évènement nouveau.
Une fois de plus je voyais le rôle immense, comme celui de la
pression atmosphérique ou de la grav pesanteur, de ces croyances
dont
ne
que nous f voyons de mon nous apercevons pas mais qui soutiennent
tout l’équilibre de notre âme. J’étais sûr de garder Albertine q si
je le voulais quand je me rep disais que son départ si désirable. Cette croyance
me permettait à mes désirs mille désirs d’occuper le premier plan
à la
de mon âme, que la brusque suppression de cette croyance ils avaient
les éléments qui le composent premiers qui le composent et
restent insoupçonnables tant que de l’état volatil où le plu ils
qui le plupart de temps restent invisible ils existent
le plupart de temps, un phénomène qui les isole ne leur
restent
en nous à l’état volatil, insaisissables insoupçonnables
tant qu’un a pas fait subir un commencement de solidification
Je m’étais trompé en croyant voir clair dans le fond co de
mon cœur. Mais cette connaissance que m’auraient pu me
donner les plus fines perceptions de l’intelligence, elle
le faisant apparaître
venait de m’être apportée, – dure, éclatante, étrange,
dure
fixe, comme un sel cristalisé – , par la brusque réac-
+
tion de la douleur. Et aussi bien n’était-ce pas avec
phénomènes de la nature
la rapidité foudroyante d’/es une substitution chimique, que
la certitude de voir Albertine si je le voulais, certitude qui
maintenant mes anxiétés loin de moi, me permettait de
à tant de désirs, de plaisirs d’occuper le premier plan de mon
en dis
âme et de m’y paraître si grands, que cette certitude en disparaissant a substitué à cette âme fonctionnant nor
dire mieux
(ce dire mieux
peut’être
dit plusieurs
fois dans ce
qui précède)
calmée, à cette âme fonctionnant normalement, les avait
une âme anxieuse [illi] remplie
d’un seul* souci*
anéantis anéantis et avait substitués à l’âme calmée où
il y avait place pour leur fonctionnement normal fonctionnement.
calmée
été chassés avec la rapidité disparu ; à une âme où il y
avait place pour que cette croyance calmait et où il y
une âme anxieuse qui ne
avait place pour leur fon jeu normal, s’était substitué
tenait pas qu’à une seule chose à la posséssion à jamais d’Albertine, même laide, même malade, même
vieille
avec, avec la rapidité foudroyante d’un phénomène naturel.
s’était substitué
dirais pas que le calme – pas plus qu’eux ne se disent que
la bonne santé – ne sont pas des milieux inaltérables, mais
au contraire fort sensibles, sensibles surtout au dép
au contact et que ce n’est pas avec le calme apporté
par la certitude de la présence d’Albertine que je
pourrais ressentir son départ, pas plus que le/es contact
des a approches de la mort ne laissent intacte la
bonne santé. Je Suivre 2 versos avant : J’avais
cent fois pensé (ne pas confondre qu’à 1 verso avant
il y a aussi J’avais cent fois pensé mais c’est parce que
je redis 2 fois cette formule. C’est 1 verso avant
qui vient d’abord, puis ce verso-ci, puis, 2 versos
avant)
+
c’est à dire lui apprendre mon chagrin, le
chagrin qui n’est nullement une conclusion
pessimiste et abstraite tirée librement d’un
circonstances funestes
ensemble de faits fâcheux, mais la réminiscence
intermittante et involontaire d’une impression spécifique,
venue du dehors, et que nous n’avons pas choisie.
Cette phrase (apposition au mot chagrin serait
mieux ailleurs si ailleurs j’ai l’occasion
de la mettre, si ailleurs je dis alors ramassant*
mon chagrin (le chagrin qui n’est nullement etc)
N.B. Dire quand elle est
partie que je me décide brusquement à
tout ce devant quoi j’avais hésité jusque là,
l’épouser et l’a ach commande immédiate
d’un yacht et d’une Rolls.
Dire quelque part là : Sans doute si elle n’était partie
comme les peuples qui préparent une négociation diplomatique
pour une action militaire (faire attention que j’ai fait ailleurs
cette comparaison – pas ce qui suit mais négociation action militaire
et le supprimer à l’un des 2 endroits) si que pour obtenir de
moi de meilleures conditions de lib liberté, de confort, si elle reve au retour,
celui qui l’apporterait de nous deux ce serait moi, si je savais attendre et comme
on dit au temps de guerre « tenir ». Mais on peut résister à un bluff aux cartes,
à la guerre, parce que la seule chose qui importe est la victoire finale. Mais dans
l’amour et dans la jalousie sans pqrler de la souffrance, que m’imp le but poursuivi pendant
près d’une année c’était qu’elle ne fût pas libre une heure. Or si pour attendre [illi]
je la laissais loin
de moi, une
semaine, qui
sait un mois,
deux peut’être
jusqu’à ce qu’elle
eût prît* peur
et se rendît, toutes
mes précautions
étaient anéanties
elle avait le temps
la facilité de me
tromper tant qu’elle
voulait, et alors
même si je l’
emportais en* suite*
je serais
ce serait tout de
même à jamais
vaincu.
Ces moyens avaient d’autant plus de ch[ance de réussir que
Je ne sais si je dis plus haut que en effet que son départ a refait pour
moi ce qu’elle était pour moi à Balbec mais bien le redire en effet. La suppression
de l’habitude me força brusquemant à penser à ce qu’elle était à me
rappeler l’heure de vie interne* (c’est horrible mais le dire bien ces heures si
rares où la vie ne
compte plus pour
moi) la boîte*
coquillage
qui rendrait*
boîte* sa
coquillage
au moment
où on
s’en
Co Quelle joie j’aurais de la revoir./, Comme/comme nous allions sépare
pour le
être heureux./, Car s me disais-je. Car si son départ
donner à
q. q. un
avait refait pour moi d’Albertine l’être non possédé, l’
tandis que
depuis
être presq le rêve qu’elle avait été pour moi à Balbec, si
longtemps
comme la ville de Balbec même, pa et ce que Balbec
elle
était
même avait été longtemps pour moi, un nom, un rêve ; s’il
plus
que
avait réuni entre elle et moi les distances de l’imagination qui
vide
poches
la rendaient plus désirable, il avait aussi refait de la vie
+
de m
où elle répondait
en commun avec elle, ce quelque chose d’aisé, de tout facile
à toutes mes questions ferait ce que je voudrais, tout ce que cette vie
qu’elle n’avait pas été mais que j’étais persuadé qu’elle serait,
comme j’étais persuadé que le serait la vie de travail,
tout ce qui comme semble devoir l’être tout ce qui n’existe
pas actuellement, tout ce qui est délaissé dans terribles difficultés de réalisation, tout ce qui est soustrait aux tensions*
imaginé dans le vide, soustrait aux
tous les jours
Sauf sans si des choses plus
profondes que l’extérieur, de
Kapital
sorte que si arrivant dans ce dîner je
n’écoutais ni ce qu’on me disait,
Peut’être tout de suite Avant Goncourt
ni je ne voyais ce qui était devant
moi, en revanche une similitude
quand j’ouvre le volume Dire. Je savais que
(comme l’identité de salon
Verdurin)
je ne savais pas regarder (voir dans Babouche) pas
faisait de
moi un
écouter, qu’il fallait les choses ne fussent permis d’
instant un
abord par l’imagination, je savais que les peintres* ont pour
autre homme
qui goûtait
artistes
avec une joie
qui donnent les plus gds visions d’élégance le prennent chez leurs
pure
au Général
amis (voir Babouche) que les gdes élégantes se font peindre par
Cotte, par Chaplin, et que ce qui fera concurrence àux gds
ce qui évoquera le beau moderne
portraits de la Renaissance, ce n’est pas celui de la Pcesse de Sagan par par
Cotte, mais celui que Renoir a fait de la femme de l’éditeur Charpantier. Pourtant je savais Mais tout cela, et bien d’autres expériences encore ne m’
que la connaissance
empêchèrent pas d’éprouver
de Vinteuil, d’Elstir
et de Bergotte
un vif sentiment à
m’avaient fournies*
la fois du regret
pour tant
de fil en aiguille, car c’est vraiment un érudit en tout
de désirs
genre que ce Verdurin
l’amène
dont je n’
Ce qui l’amène, en parlant du brun que cette cendre met à
avais pas
son grand regret dans l’albâtre de la vasque, à me parler de
su
marquées
voir
ces taches sombres imprimées sur le papier les livres ayant
près de
appartenu à Napoléon 1er, taches ayant fait croire que l’
moi la
empereur chiquait, alors que selon Verdurin elles proviendraient
réalisation
de l’habitude qu’il avait pour calmer ses douleurs de foie d’
et de désillusions
devant les rêves
avoir toujours dans la main des pastilles de réglisse, dont même
que nous donnent
dans ses plus grands batailles il faisait un incessant usage. Eh
les tableaux et le
nous voilà
livres quand je
lus la page suivante Suit la pastiche. Et après la pastiche ces simples mots : Verdurin
le Duc de Guermantes, Me Cottard, le petit Cottard, le Dr Cottard .........
Cottard Et que tout cela fasse un astre dans la nuit !
Verdurin a déclare superstitieusement qu’elle s s’être
rendait
le renvoy
défaite au plus vite de la pierre maléfique et ignorer
à Elstir. Et
demande
sur la question
question
que pos faite
par quelq un
des convives, si
la pierre avait
conservé son
pouvoir
maléfique, la
maîtresse de
maison a cette
jolie réponse :
« Jugez-en. Deux
jours après il
a connu la femme
à cause de laquelle
il se br s’est
brouillé avec moi.
il
Et Depuis il ne m’a
jamais revue et
ne fait plus que
ce qu’elle est devenue. Sur le remarque que je fais qu’il
y avait là un curieux sujet de nouvelle où seraient
imaginées l’existence successives où le bijou a pu depuis
amener des catastrophes, Madame Cottard dit que
rait
cette nouvelle existerai dans les « Nouvelles Mille et Une
Nuits de Stevenson » , un auteur anglais que Swann
égale aux plus grands. A un pâté de crevettes un
nom d’auteur anglais mettant da qui met
dans la bouche de Swann cette phrase : « Mais
c’est un grand écrivain Stevenson, l’égal
des plus grands, mais oui, absolument des
plus grands »
Si je ne laisse pas les développements
de la mauveise
ci dessus mettre ailleurs cette phrase
peinture
excellente
un nom qui met dans la bouche
de ...... cette phrase :
Mettre : « il faut le déclarer »
il faudra autant que possible ne
pas souligner les adjectifs étranges
et souligner les mines drôlettes, le
beau
rub ou que noue sur l’à plat, de sur le crémeux de
et galant
la pâte sans pareille, le délicat relief d’un ruban d’
or. (N.B.) Peut’être cette description doit
continuer je ferai bien de voir, en tous cas
pendant que j’y pense je profite du morceau
de placer le morceau si important sur la Normandie, quitte à mettre entre bien des choses, et que
je pourrai morceau sur la Normandie que je
pourrai peut’être amener tout autrement que par
la nourriture. Mais dans le cas où j’enchaîne, il
Et Sur le plaisir Comme je faut au lieu d’un point
une virgule après ruban d’or.
n’en a derrière ses
vitrines
d’un ruban d’or « On voit bien que vous ne le connaissez
pas me jette mélancolieusemant la maîtresse de maison. »
Et elle parle des son mari comme fantaisies de son mari
pour qui tout cela ne vaudrait pas l’appétit passa
ger instantané d’une bouteille de cidre bue dans la
lux frais comme d’un homme original maniaque,
un maniaque indifférent au fond à toutes ces jolités,
un maniaque ayant tout d’un coup à l’appétit
au contraire
musta
d’une
au contraire un maniaque oui dit-elle absolument cela
bouteille de cidre bue dans l’a encanaillé d’une
un maniaque à l’appétit
tourelle la fraîcheur un peu encanaillée d’une
ferme
à la parole
clos normande. Et la charmante femme, de en une
vraiment amoureuse des colorations d’une contrée
langue avec des mots qui piquent, nous parle de
avec enthousiasme débordant ils ont
cette Normandie qu’elle a longtemps habitée, une Nor-
Suite du verso précédent : ne se rappellent plus, Verdurin est vraiment
inconnu (Brancovan me demandant si Joubert le penseur est parent de
celui de Me Hochon) l’instruction étati une lutte contre l’oubli,
contre le temps
perdu, mais si
partielle, coulant*
à peine un
oubli sur
mille, comme
les sous marins
allemands.
Q. q. part là. Maintenant il faut dire bien
D’autre part cela
tient aussi à ce
haut (ne pas dire bien haut, mais c’est le sens)
que la vie nous de
tous les jours
fait apparaître
en petit ce qui
ne prend son
importance, que
réalisé intellectuellement par la
lecture de mémoires ou d’
œuvres (de sorte
que cette
importance reprise
par les gens hors
de la vie, Pompadour,
Guer Verdurin etc,
se rattache
Dire le duc d’Haussonville
le duc La Rochefoucauld
aussi à la
Swann et le Docteur Cottard, le
conclusion de
Docteur Cottard, à la finesse à
mon ouvrage, seule
réalité est la réalité
intellectuelle.
la fois scrutatrice et bonne, de l’œil
du regard
Ceci qui est Kapitalissime
pourrait être mis avant ou après pastiche
de Goncourt mais mieux dans la dernière partie quand je conçois l’œuvre d’art. Je l’
écris comme pour la Dernière partie. Si mis
après Goncourt il faut enlever la 1er phrase.
A plusieurs reprises dans ma vie je m’étais rendu compte
autres
de la co La courte vue que nous avons des gens et des
évè ne doit pas être celle du romancier, mais donner
par comparais
rendre ce que cette vue a de court par en montrant des
parties qui lui sont cachées peut être un des objets du
m’étais
romancier. J’e avais dans bien des circonstances de ma vie
rendu compte combien nous allons peu au delà de la surface des
êtres et des faits, et combien cette surface même diffère
Entre bien d’autres découvertes
selon le spectateur. Un mot de Bloch m’avait fait comun
prendre le mensonge de Me Swann et la continuation de son
inconduite, une conversation de Charlus m’avait donné la
clef de bien des choses obscures pour moi, les récits qu’on m’
avait faits du salon Verdurin m’avaient montré E un Elstir où je n’aurais pu soupçonner l’homme de génie que j’avais
connu, de même qu’inversement je n’avais pas soupçonné
à Combray
dans le bonhomme Vinteuil le sublime auteur de la Sonate
en et du Quatuor, ni qu’en fréquentant les Verdurin je
n’avais vu ce que m’en apprenait le journal de Goncourt qui d’
nous pénétrons comparativet à un
qui est ... Et
Peut’être cette fin depuis en somme
brusquement un second roman serait placée
tout de suite après écorce de profondeur à laquelle
+
de l’histoire, mais où l’on dirait ce qu’ils étaient pour
d’autres, ou ce qu’ils étaient en eux-mêmes pendant
le cours de cette même histoire, un second roman, si je
suppose l’histoire racontée ici comme un roman, où ce qui
est y apparaît ça et là, serait au contraire réserré, en et
au lecteur qui n’en soupçonnerait pas plus que moi
accumulation inattendue foudroyante et condensée
tout d’un coup
la page de Goncourt, les/a vraie vie de Charlus, d’
Albertine, la génie de Vinteuil et d’Elstir, en une souvenir
foudroyante accumulation foudroyante et condensée
grands rideaux, et laissant entrer un rayon de soleil, je il
j’e étouffais un sanglot cri
se je retenais un cri à la brusque déchirure que venait
contenais étouffais
ancien
de faire en moi ce cou rayon de soleil que brûlait que nous
avions admiré Albertine et moi m’avait fait paraître belle
neuve
celle la façade de Bricqueville l’orgueilleuse quand Alber
tine m’avait dit : « Elle est restaurée ». Françoise
Ne sachant comment expliquer mon soupir à Françoise, je
disais j’ai soif. Elle m’apportait du cire sortait, re
mais je me détournais violemment, sous la décharge doulouà tout moment
reuse d’un des mille souvenirs invisibles qui éclatèrent autour de moi dans l’ombre, quand je voyais qu’elle m’avait
qu’
apporté du cidre et des cerises, – ce cidre et ces cerises que
que qu’on/un nous avait ap garçon de ferme nous avait apportées dans la voiture à
Alb et qui
jadis eussent été les, espèces sous lesquelles j’aurais communié
jadis
le plus parfaitement avec l’arc en ciel des salles à manger
obscures par les jours brûlants,/. F Je disais à Françoise po de refermer
les rideaux pour ne plus voir ce rayon de soleil. Mais il continuait à
dans ma
filtrer à la mémoire. « Elle ne me plaît pas elle est restaurée,
mais nous irons demain à St Martin le vêtu, après demain à
Demain, après demain, c’était un avenir de vie commune
peut’être pour toujours, qui commençait, mon cœur s’élance
vers lui, mais il n’est plus là, Albertine est morte. Cela me
à Françoise
f Petit alinéa. Cela Ce Je demandais l’heure. Six heures. Enfin
je me
Dieu merci allait disparaître cette lourde chaleur dont nous
avec Albertine av
et
autrefois
nous plaignions/ais tous deux à Bricqueville mais que nous aimons tant
ce
Ce verso finit au bas du/e verso, ce
Mlle de Forcheville. Mais
alors c’est peut’être
un peu tôt
qu’il y a au verso suivant ne s’y
Capitalissime
rattache pas.
Dans
A propos de cette conversation de Combray.
ou chez la Dsse de Guermantes qd je rencontre
En Comment vous avez été fiancés ; et elle s’est
car
n’était pas plus reconnaissante./, En somme elle
sortirent la
simi
Mon amour était
assez mort pour
que la conduite
d’Albertine m’
apparût comme
celle d’une personne
indiffé
vous a fait du mal et du tort. » Alors, ayant entendu
analogues telles
que
Alor dire des phrases du genre de celles comme j’eusse*
à tant d’autres que j’avais entendu prononcer par
Me Swann, par la Dsse de Guermantes, par
Me Verdurin, quand il s’agissait de critiquer la
conduite d’un indifférent « Je vous dirai qu’elle s’est
surtout fait du tort et du mal à elle-même
répondis-je. Elle pouvait être tout ce qu’il y a de
plus heureuse. Elle n’a pas su garder son bonheur. Elle
a été au fond très bête. » Ces pl Telles, pareilles à tant
d’une abondante sincérité, d’un bon
du même genre que j’av ces phrases sortirent de mes
sens qui imposait et me rendait sympathique à Gilberte sortirent de ma bouche,
lèvres, pareilles à tant du/e même genre que j’avais entendu
si aisément
phrases du
si
prononcer par Me Swann, par la Dsse de Guermantes, par
elles avaient à juger la conduite passionée de
Me Verdurin quand il s’agissait d’e critiquer une personnes
qui leur étaient
Seulement les paroles
de Gilberte et les
miennes avaient beau
me donner raison,
agi autrement
mais tout la était
du passé et
et et or
me l’était
indifférente./; C’est que Albertine en était devenue une pour moi,
le similitude des circonstances facilitait les réflexes de ma mémoire,
Seulement ces paroles étaient vaines ; tout le monde me donnent raison ,
et je parlais avec cette abondante sincérité, ce bon sens qui impose
les circonstances me donnent raison, si Albertine avait pu les prévoir elle
et nous rend si sympathiques, et qui sont si aisés quand il s’
agit de juger des circonstances qui ne nous touchent pas.
prouver qu’Albertine avait eu tort, que son bonheur était auprès de moi, ces paroles que nous répandîmes
avec complaisance étaient vaines et ne pouvaient plus rien rendre possible, puisque Albertine était
morte, l’excellent plan d’existence qu’elles lui traçaient rétrospectivement
Capital
Quand je suis à Combray
Que lisez- vous là, oh ! un volume du journal de
Goncourt qui m’amuse parce qu’il y a quelque chose sur
Capital
Dans ce
dialogue
dire dans
une
incidente
: le temps
Papa et sur des gens qu’il a connus autrefois. Pourriez-vous
me le prêter ? » « Je ne l’a vous Quand je l’aurai fini je
vous le laisserai, vous Je peux vous le laisser, vous le lirez dans
le train. » « Merci. Et l’autre L’autre est un vieux Balzac
sépare
comme l’
e sépare,
indécision l’empêchant
espace,
de se résoudre aau
son étendue,
mariage,sesson
distances.
caractère
Elleseffrayant
Celles qui m’
Il Elles
avaient
sa fiancée
pour
l’
illi*
d’
avoir. Mais peut’
éloigné Alêtre cel Mais avaient
était-cediminué
et
parce que
c’est de
différent
bertine
moi.
de ce queSon
le lecteur
image a
Je ne
vo n’
lu en son
temps
était-ce
dit
inexact. Simplement
apercevais plus
maintenantElle
je l’avais
ne
image
racontéson
du dedans,
séparée de moi Elle ne
maintenant
à distance
ne m’apparaisje l’apercevais
sait plusduque
dehors. Tous
bien les
diminuée
touteapprenons
petite ; jajours nous
mais je ne
des fi mariages
pourrais
la
fiançailles
rompues,
rejoindre
des divorces, des
lui rend
adultè qui nous
semblent la la
de simples incidents
tout aussi* de la
l’
que je pioche pour me mettre à la hauteur de mon oncle
Guermantes. Du reste C’est très Ne regardez pas ce que je vais
lire est très inconvenant. Cela s’appelle la Fille aux yeux
d’or. » « C’est admirable » « Ah ! vous le connaissez. Mais je ne
crois pas que ce soit vrai. Je crois que ces femmes là ne sont
c’est la même chose pour
jalouses que des femmes, » comme les hommes « Quelquefois
mais pour d’autres l’homme est l’ennemi, il est celui qui
apporte la mauvaise caresse, qu’ell la seule chose qu’elle
ne permet pas donner. Je La réciproque du reste est vraie. J’ai
seraient
des amis qui ne seront pas jaloux si féroces si leur maîtresse
avait un autre amant et qui restent indifférents si elle
a des relations avec une femme. Moi c’est le contraire. J’
une femme
ai été très malheureux quand j’ai su que des femmes que j’
aimais aimaient un autre homme, mais jamais aut il n’
tant
est cela ne m’a jamais causé la même souffrance que si
une femme que si elle aimait les femmes. » « Cela vous est arrivé ?
de la vie bourgeoise
parce que vie bourgeoise
tout aussi simples que
le résumé que je faisais
à Albertine,
parce que et qui avait été pour moi, « celle celle qui Toi seule
un rôle exceptionnel
ceux là aussi nous les voyons
pour parus ce qu’on cherche toujours. » Il y avait sans doute une grande différence
du dehors ; si nous les
et peut’être la vérité était-elle entre les deux) entre ces premières paroles et celles que je
avions vus comme le
lui tenais maintenant. et où mes rapports avec Alber Le lecteur qui a connu à leur
+
lecteur a vu en son
époque mes relations avec Albertine pense peut’être que la vérité était entre les deux et
temps l mes relations avec
que c’étaitpar
un résumé
un peu trop simple de mes relations avec Albertine que d’y voir seulement
Albertine,
le
un projet
mariage
qui n’avait pas abouti à cause de caractère indécis et jaloux du jeune homme, son
dedans,
telde
qu’ils
apparaistracassier
Capital
Il faudra que je dise en pendant de ce que j’ai
dit (indiqué en marge au début du cahier Vénusté sur
le gd rôle joué par Albertine dans ma vie) et si je mets
ce pendant à Combray avec Me de St Loup (Gilberte)
cela n’ira peut’être pas avec la fille aux yeux d’or
qu’il faudra peut’être supprimer ou après.
« Pourquoi ne vous marriez-vous pas ? » Pourquoi ne vous mariez
vous pas, cela vous ferait changer de vie. Vous n’en avez jamais
eu l’intention » « Si, mais j’ai trop mauvais caractère. » « Je
suis sûre que non. » « Je vous assure, j’ai été presque bien
fiancé, et c’était avec et j’avais tant de scènes avec ma fiancée
que je ne n’ai pas pu me décider à l’épouser et qu’elle
y a renoncé d’elle-même. La vie aurait été un enfer. »
On part A quelque A quelque temps de distance mes rapports avec
Al Cette manière de résumer mes relations avec Albertine
contrarié
comme un projet de mariage abandonné à cause abandonné à
cause de mon indécision et de la crainte que mon mauvais
devant
caractère J’avais parlé une fois à Gilberte de mes rapports avec
+
Albertine comme d’avec une femme qui avait joué dans ma vie
Capital Dans cette conversation qui aura sans doute lieu non à
Combray mais dans la dernière matinée Guermantes, Gilberte me
dira : Si il y a une personne comme cela qui m’a raconté toute sa vie
Mlle Vinteuil
– Hé bien, elle
a peut’être
connu mon amie.
Voulez-vous que
je lui demande ?
……Oh ! non il
y a bien longtemps. Cela n’a plus d’intérêt. Ce serait trop compliqué à vous expliquer qui c’était
elle
ne
se rappellera
près d’
ici, j’aurais peut’être pu le savoir et même en faisant appel à vos
souvenirs d’enfance, vous auriez pu vous-même m’aider aussi. » « Hé
bien ! » « Oh ! non c’est trop ancien. Cela n’a plus d’intérêt. » «
P.S. KapitalisTenez je crois que j’ai une photographie d’elle dis-je et je sortis de
sime à
ce qui est
mon porte cartes la petit ph dernière photographie d’Albertine.
au verso et
ci dessous quand
Elle parut Gilberte celle que j’avais montrée à Robert.
je parle du
Ah ! c’est
donjon de RousGilberte
parut
aussi
étonnée
que
lui.
«
C’est
ça la jeune
sainville et quand
je transporte à
fille que vous aimiez et elle ajoute d’un air inquiet : Alors
Albertine ce que
je dis de la fem. de
j’étais comme ça moi. » « Mais non vous êtes mille fois
ch. de Me Putbus.
mieux et puis la photographie ne la rend pas du tout. »
(Aussi quand j’
aurais voulu qu’une
Dans le train je pris le Journal des Goncourt.
paysanne) ajouter
Ainsi elle était encore
plus « du côté résumant ce que
j’avais désiré dans ces PROMENADES, AYANT
FAILLI ME LE FAIRE GOUTER DES MON
ADOLESCENCE, PLUS COMPLETEMENT ENCORE QUE
JE N’AVAIS CRU ELLE ETAIT « DU COTE DE MESEGLISE. »
Toujours KKKKapitalissime
Tansonville
avais la même envie exactement qu’à Combray
vous aviez si peu changé étiez au fond resté tellement le même
Ainsi (mettre là la petite image Clary) – puis les paysannes
de Méséglise (copier la femme de chambre de Me Putbus) Puis : Enfin ce jour où je l’avais rencontrée, bien qu’elle ne fût pas Mlle
de l’Orgeville, comme j celle que Robert avait connue dans
la maison de passe, (et quelle drôle de chose que ce fut juste à son
futur mari que j’en eusse demandé l’éclaircissement) tout de
même je ne m’étais tout à fait trompé ni sur la signification de
son regard, ni sur l’espèce de femme qu’elle était, qu’elle n’avait
maintenant avoir été. « Tout cela est bien loin me dit-elle, je n’
ni plus jamais aimé que Robert une fois que je l’ai épousé. Et voyez-vous
ce n’est même pas ces caprices d’enfant que je me reproche le plus. Confession
de l’opération de son père de son caractère.